As Nações Unidas proclamaram o dia 3 de Dezembro como Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, com o objectivo de promover uma maior compreensão dos assuntos relativos à deficiência, mobilizar para a defesa da dignidade, dos direitos e do bem-estar destas pessoas. Em 2006, a Assembleia das Nações Unidas viria a adoptar a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
A Associação Portuguesa de Deficientes entendeu, este ano, não celebrar este dia, no estrito sentido de festejar, mas não deixará de assinalar uma data que foi criada com o firme propósito de assegurar os direitos das pessoas com deficiência. Direitos que hoje, mais que nunca, estão ameaçados por uma visão caritativa e assistencialista da deficiência. A "síndrome Susaninha" – figura criada por Quino, que, muito perturbada ao ver um pobre na rua, sugere que, quando forem grandes, organizem chás e jantares com peru, e bolos, e guloseimas... para depois comprar pão, massa e essas porcarias que os pobres comem – corrói as políticas públicas, incluindo as da deficiência, e constitui uma ameaça aos direitos humanos dos cidadãos.
Os retrocessos nas políticas de inclusão das pessoas com deficiência são visíveis, particularmente na educação. A revitalização e aumento de financiamento das instituições de ensino especial, associado à diminuição pelo Ministério da Educação de uma verba de mais de 17 milhões de euros em 2104 para o ensino dos alunos com necessidades educativas especiais, deixam adivinhar o regresso em massa das crianças com deficiência às instituições.
Ouve-se nos corredores do poder que haverá pessoas com deficiência em quem vale apostar e outras que, “coitadinhas”, terão de estar protegidas e isoladas em locais onde não conviverão com os seus pares. Stephen Hawking, um dos mais consagrados cientistas da actualidade, segundo a visão dos nossos governantes, estaria numa destas instituições a fazer puzzles e quando conseguisse resolver um destes problemas com três cores e formas diversas faria rolar uma lágrima de alegria pelos grandes progressos alcançados com a “educação” aí ministrada.
Esta visão de menorização das capacidades e dos direitos das pessoas é perigosa e os tempos encarregaram-se de o provar.
As pessoas com deficiência exigem direitos e rejeitam a caridade! Querem a solidariedade de todos os portugueses que, como eles, acreditem e defendam que todo e qualquer ser humano tem o direito à sua dignidade e que essa dignidade está indelevelmente associada ao direito à educação, ao emprego, à cultura, ao lazer.
Não aceitamos que nos digam que os sacrifícios que nos impõem se devem ao facto de termos gasto mais do que o que tínhamos. Há uma ideologia que sustenta este retrocesso dos direitos humanos e que tem de ser combatida por todos os portugueses.
O Estado Português ratificou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Comprometeu-se a promover, proteger e garantir o pleno e igual gozo de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais por todas as pessoas com deficiência e promover o respeito pela sua dignidade inerente.
Cumpre-lhe assumir os seus compromissos.
Ana Sezudo
Presidente da Direcção Nacional da Associação Portuguesa de Deficientes
In: Público por indicação de Livresco
Sem comentários:
Enviar um comentário