terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Simpósios INCLUSÃO 2017

A Pró-Inclusão vai realizar na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto (FPCE-UP), mais um ciclo de Simpósios INCLUSÃO 2017.
À semelhança do que está a acontecer em Lisboa, acreditamos que estes finais de tarde serão igualmente espaços para conversarmos sobre temas atuais e caros a todos os profissionais da educação.

Horário - 17h30/20h00

Datas e palestrantes convidados:
8 de março
Sessão de Abertura: José Alberto Correia (Diretor da FPCEUP), David Rodrigues (Presidente da Pró-Inclusão-ANDEE) e Helena Costa Araújo (Vice Presidente do Conselho Científico da FPCEUP) 
Palestrante: João Costa - Secretário de Estado da Educação
Local: Auditório 2A (piso 1)

5 de abril
Palestrante: Rui Trindade - FPCE-UP
Local: Auditório 1 (piso 1)

3 de maio
Palestrante: Manuel Sarmento - Instituto da Educação - Universidade do Minho (IE-UM)
Local: Auditório 1 (piso 1)

7 de junho
Palestrante: José Luís Fernandes - FPCE-UP
Local: Auditório 1 (piso 1)

28 de junho
Palestrante: Isabel Menezes - FPCE-UP
Local: Auditório 1 (piso 1)

INSCRIÇÕES ABERTAS (clicar para aceder ao formulário de inscrição)
Lugares limitados, assegurem a vossa vaga!

Morada: FPCE-UP, Rua Alfredo Allen, 4200-135 Porto

Promulgado o diploma sobre contratação de docentes

O Presidente da República promulgou esta segunda-feira o diploma do Governo para a contratação de cerca de 3.200 professores precários pelo Estado, mas ressalvando que, ao fazê-lo, atendeu "ao equilíbrio atingido" numa "matéria sensível". (...)

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2017

"A indisciplina é grande no 3.º ciclo"

O psiquiatra Daniel Sampaio afirma que só numa situação grave é que a transferência de escola de um aluno se deve ser considerada.

A transferência de escola, no âmbito de procedimentos disciplinares, é uma medida pedagogicamente aceitável?
Eu vejo-a como uma medida extrema. Antes dessa medida ser executada há muitas coisas que podem ser feitas, desde a admoestação, falar com o aluno, procurar um compromisso, falar com os pais. Ou mudar de turma, porque há muitos focos de indisciplina que têm a ver com a dinâmica de turma. Só numa situação grave, é que é uma medida aceitável.

E é sempre uma punição ou pode ser uma solução?
Sim. Como medida extrema mas, sim, pode ser. De facto, cada escola tem um clima escolar diferente. A mudança para outra escola, para outro clima escolar, pode favorecer a mudança do aluno.

Na maioria dos casos, trata-se de adolescentes. Por vezes a rebeldia, alguma instabilidade emocional comum nessas idades, pode ser confundida com intencionalidade?
Por vezes há psicopatologia associada, como nós dizemos. Podem haver sinais de ansiedade, de depressão, que dificultam a integração do aluno e o tornam mais agressivo. Mas na maioria dos casos são situações que derivam da relação professor/aluno ou dos alunos entre si. As medidas devem ser menos dos campos da psicologia e psiquiatria e mais de pedagogia.

A descida acentuada do número destas transferências compulsivas é um bom sinal?
Acho que é positivo. Apesar de tudo, significa que estão a ser tomadas outras medidas e não estamos a recorrer tanto às medidas extremas.

A Direção-Geral de Educação só aprovou metade dos pedidos das escolas. Não há também uma opção assumida?
Isso não sei. Provavelmente há aqui um filtro da DGE. É uma medida extrema, não convém que exista muitas vezes. É preciso dizer que a indisciplina é muito grande nas nossas escolas, particularmente no 3.º ciclo. São precisos mais estudos para se perceberem as razões.

Fonte: DN

domingo, 26 de fevereiro de 2017

"Quem defende que as crianças têm de trabalhar mais, depois de um dia inteiro na escola, esqueceu-se do que é ser criança"

Saltou para a ribalta ao ser considerado um dos 50 melhores do mundo pelo Global Teacher Prize, uma espécie de prémio Nobel da Educação. Aos 45 anos, o espanhol Cesar Bona quer avisar o mundo que ser professor é um privilégio. Afinal, se uma pessoa tiver paixão pelo que faz, mais facilmente imprime esse gosto nos outros.
Em Portugal para promover o seu mais recente livro A Nova Educação, este maestro, que em castelhano designa o professor dos primeiros anos de escolaridade, assume que, além de ensinar, a escola também existe para educar os adultos de amanhã, para os estimular a querer viver num mundo melhor.
"O importante é promover a cooperação, educar por empatia", salienta. Oriundo de uma pequena aldeia perto de Zaragoza, filho de um carpinteiro e de uma dona de casa, o professor que sabe de onde vem, e para onde vai, diz que foi o destino que o pôs neste papel: "Quando era mais novo queria ser futebolista."
Porque diz que ser professor é um privilégio?
Todos os dias são um desafio e também uma grande responsabilidade. É um privilégio porque podemos convidar as crianças a olhar para o mundo à sua volta e a tentar melhorá-lo. Para mim, ser professor não é só abrir um recipiente e enchê-lo de conhecimento. É a possibilidade de estimular a ser melhor e a querer mudar o que o rodeia. É também uma grande responsabilidade porque essa marca fica para sempre sobretudo quando se é o professor referência, o primeiro contacto com a escola e a aprendizagem. E se aqueles alunos se vão lembrar de mim para toda a vida, quero que seja uma lembrança positiva.
É o mesmo lema do Homem-Aranha: "Com um grande poder vem uma grande responsabilidade."
É por aí, exatamente. O professor tem esse poder imenso nas mãos: imprimir a melhor mensagem possível em milhares de crianças que lhe passam pela frente.
O que valoriza mais na sala de aula: que aprendam, que fiquem curiosos e queiram saber mais, que sejam pessoas bem formadas?
Há de facto muita coisa que hoje recai sobre a escola. Mas o desafio é esse: ensinar-lhes o que precisam, estimular-lhes a curiosidade para gostarem de aprender e irem à procura de mais conhecimentos, e ainda formar boas pessoas, gente que trate bem os outros, que respeite o meio ambiente, que tenha responsabilidade social.
Ter paixão pelo que faz é meio caminho andado?
Paixão e esperança. Se convives com quem está cheio de esperança na sua essência, porque as crianças são os adultos de amanhã, são ambas imprescindíveis. À mistura com a curiosidade e a criatividade, as possibilidades que se apresentam a um professor para provocar alterações nas vidas dos seus alunos são imensas. Temos de ensinar muitas coisas, mas temos de ser um abre-portas, para que todos tirem a curiosidade da caixinha e a ponham ao seu serviço, para que seja o motor do seu dia a dia. Uma criança que gosta de aprender vai fazê-lo a vida toda. Estimulando a curiosidade das crianças, alimenta-se ainda a criatividade, muito importante para resolver problemas e encontrar caminhos novos quando já ninguém sabe o que fazer. Porque lhes permite ver as coisas de outra maneira.
Parece então que subestimamos constantemente as crianças...
Sim, em todos os sentidos. Eles têm imensas coisas que podem partilhar connosco e não valorizamos. A nível social, isso também acontece. Faz falta perguntar às crianças como mudavam um parque, que alterações gostariam de ver no bairro onde vivem, o que gostariam que acontecesse para melhorar a vida dos outros. Quando uma pessoa arrisca fazê-lo, os resultados são sempre surpreendentes.
Regra número um: nunca esquecer a criança que há em nós. É isso?
Nunca. Nas crianças está toda essa maleabilidade, esse olhar sem preconceito, sem ideias feitas. Isso permite compreendê-las melhor e ajudá-las no seu percurso. Ao colocarmo-nos ao seu nível, olhos nos olhos, tudo fica mais fácil.
No livro A Nova Educação, alinham-se ideias como "Não faço nada de extraordinário, apenas me divirto na sala de aula" ou ainda "Sou professor mas não sei tudo. Vocês também podem ensinar-me". Como é que se faz isso ?
Quando me divirto, desfruto. E isso é muito importante porque à minha frente estão pessoas que, durante toda a infância e adolescência, não podem mudar de vida, como um adulto faria. Estão ali e têm de ali estar, na escola, na sala de aula, diante do professor. Daí a grande responsabilidade: conseguir que tenham ganas de voltar no dia seguinte. Todos os dias, aqueles miúdos são obrigados a estar sentados durante seis horas, apenas a escutar e a repetir, e isso é aborrecido para qualquer um. Para um adulto também, não?
Imagino que o desafio seja maior por vivermos numa zona do globo mais envelhecida e onde as crianças são cada vez mais raras e crescem superprotegidas...
É importante não cair nesse equívoco: nem sempre tudo corre bem e é importante ensiná-las a lidar com a frustração. É assim que se estimula a resiliência na circunstância em que você é diferente de mim, e temos todos de aprender a respeitar essas diferenças.
Como se educa para a cooperação e não para a competitividade se vivemos num mundo cada vez mais competitivo?
Daí a sua premência. Porque uma das maravilhas da escola é que ela pode mudar a sociedade. Se acreditamos que é a chave para mudar o mundo, então temos de educar para a cooperação. A escola é o lugar ideal para promover o que queremos para o mundo em que vivemos.
Muitas famílias mudam os seus hábitos e a suas rotinas por força das aprendizagens que os filhos trazem da escola: alteram o que compram, passam a fazer reciclagem... Imagine--se isso replicado por milhares de casas, em todo o mundo. É um poder extraordinário à nossa disposição.
A crise perturba esse processo? A escassez torna-nos mais competitivos?
Depende. Temos vivido em crise nos últimos anos, mas isso não nos tornou menos sensíveis, por exemplo, à questão dos refugiados. As crianças, e as escolas, têm promovido os valores da solidariedade com quem tem menos insistindo que juntos somos todos mais fortes. Claro que tanto podemos instigar uma criança a ter uma nota melhor do que a do companheiro como podemos estimulá-la a ajudar o outro para os dois terem notas melhores. Depende do que queremos.
E os pais, preocupados com o sucesso do seu filho, não perturbam esse processo?
Às vezes penso que temos de nos reeducar todos. Claro que cada pai quer o melhor para o seu filho. Mas às vezes o melhor para um filho é dar um passo atrás para ajudar o colega do lado e depois seguirem os dois em frente. Melhoramos a sociedade sempre que ajudamos um companheiro. E é uma maneira maravilhosa de aprender: aquele que ajuda o outro sente-se depois tão bem, tão orgulhoso, que nunca mais esquece o que se tratou ali. É disso que se trata: somos seres sociais, não podemos continuar a ensinar como se fossemos indivíduos que vivem isolados.
Ainda ouvimos muitas vezes que a escola ensina, a casa é que educa. O que pensa sobre isto?
Temos de apagar isso do discurso da educação. A casa e a escola são parceiros num projeto educativo. Há um ditado africano que diz que é preciso toda uma aldeia para educar uma criança e a escola é o melhor lugar para ajudar os pais a educarem os seus filhos. A aula funciona como uma espécie de micro sociedade. Se queremos mudar a sociedade, então devemos promover também essas alterações na sala de aula.
Recentemente, cresceram as críticas a uma instituição que está igual ao que era há 150 anos. Porque é que a Escola resiste tanto à mudança?
É uma forma de nos sentirmos mais tranquilos. Queremos educar os nossos filhos como fomos educados, esquecendo todas as transformações que o mundo conheceu. Há ainda um outro fenómeno: aplaudimos os exemplos de fora, mas não aceitamos mudanças cá dentro: por exemplo, a escola finlandesa anunciou que acabou com as paredes e todos aplaudem. Se eu, aqui, quiser derrubar um muro que seja, já me acusam de estar a querer fazer uma revolução. As escolas estão organizadas como fábricas, como locais de trabalho. Penso que quem desenha escolas devia saber tanto de arquitetura como de crianças. O meu objetivo é que, ao fim do dia, quando vão para casa, todos reflitam sobre o que aprenderam e como vão utilizar essa aprendizagem.
E tem sempre autonomia para fazer isso?
Nem sempre e não é fácil. Mas os professores têm estado muito à defesa. Optam demasiadas vezes por fechar a porta da sala, proclamando que a aula é deles e portanto fazem como querem. Defendo o contrário: deixar a porta aberta. Prefiro sempre partilhar o que faço. É neste processo que descobrimos que não somos ilhas e não estamos sozinhos na difícil tarefa de educar os outros.
Polémicas de Portugal que se repetem em Espanha. Como vê a questão dos TPC?
Quem defende que as crianças têm de trabalhar mais, depois de um dia inteiro na escola, esqueceu-se do que é ser criança e como, quando era mais pequeno, gostava de aprender mas também de estar com a família e de brincar. Eu gostava de ir ao parque e ao rio. Hoje, há milhares de crianças a fazer deveres horas a fio, depois da escola, até à hora do jantar. E não têm culpa que os currículos escolares sejam tão compridos. Todos os dias, segunda, terça, quarta, quinta, sexta. Quem é que, depois disto, tem vontade voltar de ir para a escola no dia seguinte e aprender? Os TPC são uma prática ultrapassada.
Mas esteve contra a greve aos TPC, que os pais promoveram em Espanha?
Sim, porque uma greve implica estar contra alguma coisa. No caso, opõe pais a professores, e eu acredito que esse caminho deve fazer-se antes pelo diálogo. Devemos pensar como chegar a um acordo, tendo em conta que no centro está a criança e temos de pensar é no que é melhor para ela. Sabemos que a força dos TPC e da obsessão dos resultados escolares assenta também no impacto que têm na elaboração de rankings de escolas... Vemos o que está a acontecer com o PISA: Parece uma competição desportiva. Ah, Espanha ficou em quinto lugar, ah, Portugal está à frente. E o quê? O que quer isso dizer? Qual o impacto disso? E tem muita importância para quem? Para os governos. Sei que Portugal melhorou mas Espanha está na mesma, em 15 anos a avaliar as competências matemáticas, científicas e domínio da língua materna. Então e a respeitarnos uns aos outros? E a ter consciência ambiental? E ser tolerante com o diferente?
E é possível manter essa aposta numa educação diferente mesmo com as piores turmas?
Sobretudo bom, e não dividiria as turmas em piores ou melhores. Há turmas menos fáceis, geralmente constituídas por crianças que têm milhares de razões para estarem tão descontentes, tão revoltadas. Primeiro, temos de tentar saber o que passam, nas horas em que não estão ali, e temos de ver isso como um investimento. Para lhes ganhar a confiança, o respeito e depois arrancar a alta velocidade para as outras aprendizagens.
Soa a provocação...
E é, um bocadinho. Mas a verdade é que todos temos algo para oferecer. Se nos focarmos no mal, só vemos o mal. Se desviarmos a atenção para o bom, então esse valor vem ao de cima. Estimula a sua autoestima e isso pode fazer maravilhas no futuro.

“Tendemos a educar como fomos educados”

É espanhol e um dos 50 melhores professores do mundo, finalista do Global Teacher Prize. no livro “A Nova Educação” defende que o papel da escola é convidar os alunos a pensar.

Qual o papel da escola? 
A pergunta é: para que serve? É algo sobre o qual todos têm opinião. Mas falar dela ou fazer rankings, como o PISA, não significa que se lhe preste verdadeira atenção. A educação tornou-se uma competição desportiva, não é valorizada. E falamos demasiado de macroeducação — PISA, Governo — e não da microeducação, que começa nas famílias.

Em Portugal há uma insatisfação generalizada. Como descreve a escola de hoje? 
Penso que as intenções de mudança chocam contra uma grande resistência. A mudança não passa por mexer nos programas ou por comprar computadores. Tem de se ir à raiz e acabar com a oposição entre escola tradicional e inovação. Há coisas que há 50 anos funcionaram e que daqui a 50 continuarão a funcionar.

Por exemplo? 
Ouvir. Perguntar aos alunos que tipo de escola querem. Esta é a proposta de “A Nova Educação” — não um método novo, mas um convite a pensar na educação que queremos. E a educação que quisermos será a sociedade que quisermos. Um dia perguntei a uma mãe: “Como queres que o teu filho seja?” Ela respondeu: “Quero que saiba muitas coisas.” Mas que coisas? O conhecimento é importante, mas outros aspetos também o são. Noções como a empatia, a imaginação e o respeito são essenciais numa sala de aula.

Fala desta como ‘microssociedade’. Quais os erros mais frequentes nesse contexto? 
Diria antes vícios — coisas que continuamos, por inércia, a repetir. Um é pensar que o respeito se impõe, em vez de se ganhar. Outro é achar que a escola serve para transmitir conteúdos. A educação para a felicidade é banalizada: à escola não se vai para ser feliz, vai-se para aprender.

O que significa educar para a felicidade? 
Significa voltar ao básico. Dar ferramentas, entre elas o conhecimento. Mas também o respeito por si próprio e perante o outro, a responsabilidade social. John Hattie, investigador nesta área, concluiu que os dois fatores de sucesso académico são a autoestima e a forma como lidamos com as expectativas dos outros.

Num dado momento aborda a ‘autoexigência’. O que é? 
É uma criança poder avaliar o seu próprio trabalho e dizer: se eu não acho isto bom, o professor também não vai achar. Isto é válido para o docente: não grites se não queres que gritem; respeita se queres que te respeitem; usa corretamente a tecnologia se queres que eles a usem... Não podemos pedir-lhes o que não lhes vamos dar.

O que pensa sobre a relação entre exames e a reprodução de conteúdos? 
Damos importância a perguntas cuja resposta já lhes demos previamente. E queremos que a reproduzam, esquecendo o processo. A pergunta serve para eles se envolverem, investigarem, partilharem. Mas, no fim, o que conta é que repitam o que o professor disse. Que saibam ‘a’ resposta. Creio que devemos ensiná-las mais a refletir e menos a passar nos testes.

A dificuldade em mudar a educação não tem a ver com o facto de que as decisões são tomadas por quem não está no terreno? 
Para haver uma mudança significativa, as decisões deveriam envolver famílias, estudantes e professores. E os políticos só deveriam assinar. Muitas vezes quem legisla não sabe como funciona a educação nem percebe as dificuldades dos pais. Isto chama-se microeducação e é muito mais importante do que os resultados do PISA. Conheço centenas de professores disponíveis para ter esta conversa. Para falar do ‘para quê’ da educação.

E o que está a faltar na formação dos professores? 
Em geral, aprendem cada vez mais matéria de língua e de matemática, mas não as ferramentas para ensinar. E acredito que, no ingresso à universidade, ter notas altas não deveria ser suficiente. Deveria ser possível medir o grau de compromisso social do candidato, porque trabalhar em educação é um privilégio e uma responsabilidade enorme.

Defende que o professor deve convidar a aprender em vez de empenhar-se em ensinar. 
Deve convidar os alunos a extrair o que está dentro deles. Eles são curiosos por natureza. Bastaria sermos capazes simplesmente de alimentar essa curiosidade.

Em Portugal assistimos a uma excessiva escolarização das crianças. A escola entra-lhes em casa. 
As escolas têm horas estabelecidas, que se podem alargar consoante a necessidade dos pais. Isso é uma questão. Depois está o tema dos TPC, que é o braço invasivo da escola e dos seus piores vícios em casa. É o absoluto esquecimento da infância.

Porquê? 
Porque o tempo voa, a infância passa num instante. Se as crianças passarem as tardes a trabalhar, vão perder coisas verdadeiramente importantes. Os TPC impedem que elas façam coisas com os pais, mexem com o tempo interno das famílias, carregam os laços familiares de tensão e de uma sensação de perda de oportunidades. E o mais paradoxal é haver famílias que exigem TPC para os filhos. A essas gostava um dia de lhes perguntar: conseguiram desfrutar da infância deles?

Como é que este assunto deve ser gerido? 
As crianças não têm culpa que os currículos sejam tão extensos. E os TPC não podem servir para compensar isso. Se existirem, devem servir para complementar ou investigar certas coisas. Mas pontualmente. A criança tem direito ao seu tempo, a chegar ao fim de semana e desligar — e ao fim de semana levam mais trabalhos porque têm mais tempo! Não podemos exigir-lhes algo que não queremos para nós.

Porque é que os currículos são tão extensos? 
Porque quem os revê não se atreve a cortá-los e acrescenta sempre qualquer coisa. No entanto, há outras formas de educar. Conheci escolas que baseiam os programas nas perguntas dos alunos. Por exemplo: porque temos umbigo? Isto leva a uma explicação e a uma outra pergunta. E o impulso vem da curiosidade.

Como explica que haja tanto medo de mudar? 
Tendemos a educar como fomos educados. E achamos que qualquer mudança vai levar ao cataclismo. Mas o cataclismo já está a acontecer: os resultados não são bons e há cada vez há mais fracasso escolar. Porém, as crianças são a projeção dos pais, e os pais da sociedade. Vivemos submersos em stresse, consumismo, competitividade — e é o que lhes estamos a dar.

Como se reverte isto? 
Não tenho a receita. Talvez deixando de dar tanto valor aos números. O exame não é importante, o que importa é a avaliação. E o que devemos avaliar é a aprendizagem. Aprender é encontrar as ferramentas para obter a informação e partilhá-la. Quem souber fazer isso, pode fazer mil exames. Queremos dar às crianças ferramentas para o futuro, mas quais são elas? Os conteúdos, aquilo que todos nós esquecemos? Não. A maior ferramenta é saber pensar.

Fonte: Expresso

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Disléxicos aos sete anos? Pode existir um problema de sobrediagnóstico

Com a realização de provas de aferição no 2.º ano de escolaridade, o que aconteceu pela primeira vez no ano passado, embora com caráter facultativo, emergiu uma realidade que o Júri Nacional de Exames (JNE) classifica como “preocupante”: o número de crianças que aos 7 anos estão diagnosticadas como tendo dislexia ou incapacidade intelectual.

Estas duas problemáticas estão enquadradas nas Necessidades Educativas Especiais (NEE), podendo os encarregados de educação dos alunos abrangidos requerer condições especiais para a realização de provas ou exames. No ensino básico foram apresentados 10.524 pedidos, sendo que 44% deles diziam respeito a alunos do 1.º ciclo de escolaridade.

Relativamente aos alunos que realizaram provas de aferição (2.º e 8.º ano) e para os quais foram solicitadas condições especiais, “verifica-se uma prevalência de 49% [3113] de situações assinaladas como incapacidade intelectual, sendo que destas 1887 foram diagnosticadas no 1.º e 2.º ano de escolaridade”, assinala o JNE no seu relatório sobre os exames de 2016, que foi divulgado nesta semana. Em 2016, foram realizadas 252 mil provas de aferição.

Em termos de prevalência, a dislexia aparece em segundo lugar, com 2035 registos, dos quais também “588 foram diagnosticados no 1.º e 2.º ano de escolaridade”, frisa o JNE.

Tanto a primeira situação como a segunda, tendo em conta a idade das crianças abrangidas, podem indiciar “uma eventual precocidade em alguns dos diagnósticos”, alerta este organismo, que no caso da dislexia lembra que, estando em causa crianças com seis ou sete anos, “podem não existir dados suficientes que consubstanciem um diagnóstico definitivo desta problemática”.


O JNE recorda ainda, a propósito, que “nos primeiros anos de escolaridade podem ser encontrados erros característicos de um aluno com dislexia, em alunos dito normais, que poderão apresentar dificuldades de leitura”. Por isso, adianta, “a precocidade de diagnósticos deste tipo pode ter um efeito perverso ao nível da aplicação reiterada de respostas educativas menos adequadas, que podem inclusive limitar o potencial de aprendizagem de um aluno”.

(...) o Ministério da Educação (ME) esclarece que "a referenciação dos alunos com necessidades educativas especiais é da total responsabilidade dos serviços de educação especial das escolas" e considera que o alerta feito pelo JNE "surge como forma de sensibilizar as escolas para a complexidade desta matéria".

O ME frisa ainda que é exemplo da importância desta matéria o facto de "as escolas, no âmbito dos seus planos de ação estratégica dirigidos à promoção do sucesso escolar, terem identificado maioritariamente o desenvolvimento das competências de leitura e da escrita, nos dois primeiros anos de escolaridade, como os domínios a privilegiar nas medidas implementadas".

Um problema de sobrediagnóstico?

O psicólogo José Morgado subscreve o alerta do JNE. “Não temos dados que permitam dizer que há um aumento de casos. O que penso que existe é um aumento de diagnósticos”, sendo que algumas destas “avaliações são feitas com alguma inconsistência”, diz.

Como “as dificuldades na leitura e na escrita são características do processo de aprendizagem”, o também professor e investigador do Instituto Superior de Psicologia Aplicada considera que também no campo das dislexias possa existir um problema de “sobrediagnóstico”, seja por “pressão das escolas por causa dos resultado ou dos pais que veem assim uma possibilidade de garantir apoios aos filhos”.

“Trata-se de uma identificação demasiado precoce. Nestes níveis etários, muitos alunos estão ainda no exigente processo de aquisição de uma leitura fluente e as hesitações, os erros que se fazem não são na maioria dos casos senão tentativas para obter a fluência na leitura. Classificar estes alunos como disléxicos aos 7 ou 8 anos pode contribuir para lhes criar um estatuto de separação dos seus colegas o que não é em si positivo”, alerta o presidente da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, David Rodrigues. 

O também professor da Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa chama ainda a atenção para o seguinte: "continuamos a ter dificuldades na identificação clara do que é a dislexia. Os profissionais que deveriam fazer esta identificação - professores de Educação Especial e psicólogos - encontram-se mal apetrechados ao nível de instrumentos e modelos de avaliação para realizar uma identificação clara da dislexia. Assim, seria recomendável que os alunos fossem acompanhados preventivamente antes de se considerar que esta dificuldade específica na aprendizagem da leitura se considere existente”. 

As condições especiais para a realização de provas ou exames podem passar, entre outras, pela adaptação de enunciados, grelhas de classificação diferentes ou pela possibilidade dos alunos realizarem provas diferentes das dos outros, o que só acontece em “casos especiais”.

A partir de 2014 esta listagem de condições especiais passou de novo a incluir as “limitações do domínio emocional e de personalidade”, o que inclui as crianças com autismo. Os outros “casos excecionais” são os de “alunos cegos, com baixa visão, surdos severos ou profundos, com limitações motoras severas ou com limitações do domínio cognitivo”.

David Rodrigues defende, a propósito, que “os alunos devem ser avaliados com as formas e com os processos como foram ensinados”. Por isso, acrescenta, “era importante que a avaliação externa tivesse uma informação circunstanciada sobre o percurso do ensino e da aprendizagem do aluno para poder existir uma avaliação útil para se aquilatar dos progressos do aluno”. 

Provas de escola

No que respeita às provas finais do 9.º ano de escolaridade, houve 4483 alunos que solicitaram condições especiais e destes quase metade pediu para realizar provas a nível de escola, um número que o JNE descreve como “muito significativo”. Dos 2079 pedidos apresentados foram indeferidos 245. Mais uma vez, a problemática com maior peso foi a da incapacidade intelectual (82%), seguindo-se-lhe as perturbações ligadas ao autismo (9%).

Os alunos com dislexia passaram, desde 2012, a ser obrigados a realizar os mesmos exames nacionais dos seus colegas sem NEE. As suas provas têm contudo critérios específicos de classificação para evitar uma “penalização dos erros característicos da dislexia”. Nos casos de “dislexia severa” pode ser autorizada a leitura dos enunciados por um dos professores vigilantes.

No ensino secundário houve, em 2016, 1882 pedidos para a realização de exames com condições especiais. Destes apenas 276 pediram para realizar exames a nível de escola. À semelhança do que aconteceu no básico, as duas principais problemáticas na base destes pedidos foram a incapacidade intelectual (36%) e as perturbações ligadas ao autismo (24%).

Para além dos alunos com NEE, houve outros 659 que pediram condições especiais de realização de exames devido a situações clínicas graves. E tanto no ensino básico, como no secundário, estas devem-se sobretudo a diabetes e a perturbações depressivas e de comportamento.

Fonte: Público

Quase um terço dos alunos com necessidades especiais estão no 1.º ciclo

Dos 78.175 alunos que no ano letivo de 2015/2016 frequentavam o ensino regular, estando identificados como tendo Necessidades Educativas Especiais (NEE), 27,8% estavam no 1.º ciclo de escolaridade, segundo dados divulgados então pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência.

No conjunto eram 21.136 e destes só 2604 tinha um currículo específico individual, que é a medida para os casos mais severos de NEE e que prevê a adaptação do currículo às características e necessidades de cada aluno, substituindo as competências definidas para esse nível de ensino.

A medida educativa mais generalizada entre os alunos com NEE em todos os níveis de ensino estava identificada como sendo o apoio pedagógico personalizado. Seguia-se-lhe as adequações no processo de avaliação, que visa adaptar o modo como se avalia o aluno às crianças e jovens com NEE.

Considera-se que um aluno tem Necessidades Educativas Especiais quando apresenta dificuldades de aprendizagem e participação, devendo ser apoiado por professores e técnicos da educação especial. Entre as NEE existem as que são consideradas de caráter temporário, em que se incluem os alunos com problemas ligeiro de desenvolvimento e/ou aprendizagem. E as permanentes, que integram os estudantes com deficiência mental, problemas de cegueira e de surdez, entre outros.

Dificuldades com tarefas diárias

No ensino básico, o principal grupo de dificuldades, que abrangia 52.951 alunos, dizia respeito à utilização da linguagem. Em segundo lugar, com 47.012 alunos, surgiam os problemas com tarefas diárias (escolares, atividades lúdicas, entre outras apropriadas à sua faixa etária).

Já no ensino secundário, o principal problema que afetava os alunos com NEE eram o da mobilidade, o que inclui a utilização de cadeira de rodas ou canadianas, e que abrangia 9932 alunos. Seguia-se-lhe os problemas de autonomia, com 8906 afetados, e que incluem entre outros dificuldades na alimentação e na higiene.

No conjunto dos 78.175 alunos identificados como tendo necessidades educativas especiais, 46.638 eram rapazes. Na altura em que estes dados foram divulgados, o presidente da Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, David Rodrigues, alertou para a possibilidade de se estar a classificar problemas de comportamento como NEE. “É provável que os rapazes apresentem mais frequentemente comportamentos desafiantes que acabam por afetar as aprendizagens e sejam por isso encaminhados para a educação especial”, disse.

Fonte: Público

Nota: 
A notícia contém algumas imprecisões.
Considera-se que um aluno tem necessidades educativas especiais quando apresenta dificuldades de aprendizagem e participação decorrentes de alterações estruturais e funcionais, ou seja, quando as dificuldades resultam de limitações nas estruturas e ou funções do corpo.
Por outro lado, no enquadramento educativo atual, são apenas consideradas as necessidades educativas especiais de caráter permente. 

"Uma solução auditiva que permite desfrutar do mundo dos sons"

É um dos mais prestigiados otorrinolaringologistas portugueses, João Paço, em entrevista (...), considera os implantes cocleares uma maravilha da tecnologia para quem sofre de surdez.

Quais são as principais vantagens do implante coclear?
O Implante Coclear é um grande avanço da medicina e destina-se a tratar casos em que há perdas no ouvido interno entre 60 a 70 décibeis e já existe uma fraca discriminação dos sons.
Está indicado para casos em que nenhuma outra solução auditiva tem resultados ao nível da reabilitação (à exceção do implante de tronco). É portanto uma solução sem a qual muitas pessoas não teriam a possibilidade comunicar, ouvir música, ver televisão, falar ao telefone, de disfrutar do mundo dos sons.

O que é que esta tecnologia trouxe de novo? Como funciona?
Um implante coclear é um sistema auditivo constituído por uma componente interna, o implante, e outra externa, o processador da fala que poderá ter uma configuração retroauricular ou fora do ouvido (por baixo do cabelo, ainda mais impercetível). O implante, encapsulado em titânio e revestido por silicone, é colocado por baixo da pele, alojado na mastóide, sendo a espira de 22 elétrodos inserida na cóclea através do ouvido médio. O processador da fala capta o som e converte-o em código digital; O processador transmite a informação por radiofrequência através da antena para o implante; Por sua vez, o implante converte o código digital em sinais elétricos que são enviados para a espiral de elétrodos; Os elétrodos estimulam assim as fibras nervosas da cóclea que transmitem a informação ao córtex auditivo. Com este processo é restabelecida a sensação auditiva do indivíduo. Quando fizemos o primeiro implante coclear no Hospital CUF Infante Santo, em 1996, o implante era ligeiramente diferente dos de hoje em dia. Antes era um dispositivo que se utilizava à cintura. Agora, é só um pequeno equipamento atrás da orelha, com a vantagem de ter ainda um comando que permite ligar, desligar, ajustar a situações com mais e menos ruído, conectar a outros dispositivos wireless (telemóvel, rádio, computador, TV, etc).

Atualmente, os implantes apresentam também grandes diferenças na qualidade do som.
Um surdo profundo pode mesmo começar a ouvir?
Um surdo profundo e também um surdo severo começam a ouvir, sim. Mas não se trata apenas de ouvir. Depois de ouvir, é preciso compreender e associar os sons a determinadas palavras. Para isso, após a cirurgia é necessário um processo de reabilitação e programação com terapeutas da fala e audiologistas. Dependendo do tempo de atuação, por exemplo, as crianças surdas profundas implantadas podem ser perfeitamente integradas no ensino regular e ter um desempenho escolar que lhes permite condições de acesso escolar e profissional similar aos ouvintes. Quanto mais precoce for a intervenção, melhores serão os resultados esperados. Em adultos, os melhores casos de reabilitação com implante coclear são os de surdez surdez súbita ou surdez progressiva. Nos casos de adultos com surdez profunda congénita sem estimulação prévia com prótese auditiva, a performance auditiva não será tão satisfatória como nestes casos que acabei de referir.

De que forma é que um paciente passa a ouvir depois de um implante?
Grande parte dos doentes implantados consegue recuperar uma audição útil, dentro dos parâmetros "normais" exigidos pela sociedade (tanto a nível social, profissional, familiar e comunitário).

Quais as principais diferenças entre os aparelhos auditivos e o implante coclear?
Um aparelho auditivo vai estimular o ouvido acusticamente e pode ser utilizado com sucesso até à surdez de grau severo, dependendo sempre da capacidade de discriminação vocal do paciente. O implante coclear tem indicação para ser utilizado em casos de surdez severa a profunda quando o paciente já não tem discriminação vocal e quando o ganho com próteses auditivas convencionais já não é satisfatório, objectiva e subjectivamente.

A quem é que é recomendado? A surdos profundos?
Os implantes cocleares estão indicados para casos de surdez neurossensorial severa a profunda. São, hoje em dia, uma solução para os doentes que não beneficiam com as convencionais próteses auditivas, nem outro tipo de soluções implantáveis. São candidatos ao implante as crianças com surdez pré-lingual decorrente de situações congénitas e crianças e adultos com surdez pós-lingual progressiva ou adquirida. De forma transversal, as indicações têm sido cada vez mais alargadas, uma vez comprovados os benefícios e ganhos auditivos. Neste sentido, os implantes cocleares, que há uns anos apresentavam indicações muito mais restritas, estão neste momento indicados para casos de surdez unilateral, havendo já casos operados no hospital CUF Infante Santo em que os doentes apresentam elevados graus de satisfação.

É aconselhável para alguma faixa etária em especial?
A idade mínima de implantação, segundo as recomendações da FDA, é o ano de vida (12 meses). No entanto, em situações de quadros de meningite em que se tenha iniciado o processo de ossificação, a cirurgia deverá ser antecipada. No geral, quanto mais cedo for o diagnóstico e consequente implantação, melhores serão os prognósticos de reabilitação, havendo já cirurgias realizadas a partir dos 6 meses de idade. O paciente mais novo que implantamos no Hospital tinha 7 meses de idade. Nos adultos, não existe uma idade específica. Existem casos de surdez que são fruto de doença de Meniérè ou de Meningites, entre outras doenças, nomeadamente hereditárias e traumáticas, e nestes casos as pessoas têm de ser operadas rapidamente.

Em Portugal, qual o retrato da doença. Quantos surdos existem?
Mediante as estatísticas publicadas a nível mundial entre 1 a 3 em cada 1000 crianças apresentam surdez congénita ou desenvolverão surdez.

Quantos implantes já foram feitos?
No Hospital CUF Infante Santo já fizemos cerca de 100 implantes cocleares. O número tem vindo a crescer nos últimos anos.

O serviço Nacional de saúde faz este tipo de cirurgias?
No SNS, existem em Portugal três centros onde se realiza esta cirurgia: o Hospital dos Covões, em Coimbra, que tem maior volume, o Hospital Egas Moniz e o Hospital D. Estefânia, em Lisboa. Na CUF, quer o Hospital CUF Infante Santo, em Lisboa, quer o Hospital CUF Porto fazem esta cirurgia.

Qual é o custo da cirurgia?
O valor por implante coclear, mais a cirurgia, tem um custo que pode variar entre os 20 a 30 mil euro, de acordo com o tipo de implante. No entanto, esta cirurgia já é comparticipada por alguns seguros e subsistemas de saúde.

Fonte: DN

À descoberta dos sons. Quando o silêncio se converte em palavras

Há 60 anos foi colocado o primeiro implante coclear, que permite a um surdo ouvir. São perto de 400 mil no mundo, e cerca de 1500 em Portugal.

"Agora consigo ouvir o som da tecla do piano e da corda da guitarra". Para quem esteve 30 anos sem conseguir distinguir os sons, o ser capaz de usar o sentido que permite converter o silêncio em palavras ou melodias é um ganho incalculável, que justifica os cerca de 30 mil euros que custa um implante coclear, quando não há seguro nem Estado a comparticipar. Pelo menos esta é opinião de Leonor Napoleão, de 72 anos, que teve três anos com uma surdez profunda num dos ouvidos e com muitas dificuldade no outro.

(...) Em Portugal, o primeiro implantado coclear adulto, em Portugal, data de 1985. Atualmente existem em todo o mundo perto de 400 mil implantados, dos quais perto de 1500 em Portugal, pessoas que nunca ouviram ou perderam a audição e que encontraram nesta tecnologia a solução para ultrapassaram a surdez e descobrirem (ou redescobrirem) os sons.

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) revelam que a deficiência auditiva é incapacitante para cerca de 360 milhões de pessoas em todo o mundo. E segundo informação da Associação Portuguesa de Surdos, em Portugal, "estima-se que existam cerca de 120 mil pessoas com algum grau de perda auditiva, incluindo aqui os idosos, e cerca de 30 mil surdos falantes nativos de Língua Gestual Portuguesa, na sua maioria surdos severos e profundos".

O implante coclear é um aparelho, bem diferente das próteses auditivas, com capacidade para oferecer informação sonora a indivíduos com perda auditiva profunda bilateral. É um dispositivo eletrónico colocado através de uma cirurgia, que estimula o nervo auditivo.

"Fui operada em outubro, depois de ter sido avisada pelo médico de que em breve o cérebro já não iria reconhecer nada, nenhum som", explica Leonor, relatando a experiência que se seguiu: "Nos primeiros tempos, depois da cirurgia, só ouvia ruídos, depois ao fim de alguns dias, estes transformaram-se em palavras e depois passei a reconhecer a minha voz, a resdescobrir os sons. É todo um processo de adaptação e reaprendizagem. Agora, quatro meses após o implante já oiço quase tudo. Faço a minha vida normalmente, sem nenhuma limitação. O facto de me ter deixado de sentir isolada foi a maior conquista".

Hoje, dia mundial do implante coclear, sucedem-se os relatos sobre a forma como a tecnologia e a investigação nesta área provocou mudanças radicais na vida de pessoas com perda auditiva severa e/ou profunda. Natália Ventura, de 66 anos, também conta uma história de sucesso. Há dois anos sofreu uma meningite bacteriana bastante grande que a deixou em coma. Depois de um longo internamento percebeu que estava a perder a audição e em três meses ficou surda. A ex-auditora do Tribunal de Contas - beneficiária da ADSE, subsistema de saúde, que suportou grande arte das despesas - decidiu, em maio de 2016, submeter-se a um implante bilateral. "Estava completamente surda e agora já consigo ouvir os pássaros a cantar. É uma sensação maravilhosa. Tive uma vida profissional muito preenchida e ficar completamente surda de um momento para o outro, sem poder comunicar e numa idade já tardia para aprender linguagem gestual, é muito perturbador", comenta Natália, em conversa (...), momentos depois de fazer o "papel de avó" - ir buscar o neto ao futebol. "Voltei a ter a autonomia que perdi. De certa forma, é como se tivesse renascido", salienta.

Surdos pedem mais apoio

Esta técnica foi trazida para Portugal pelos médicos Manuel Filipe e o irmão Fernando Rodrigues, há uns 30 anos. Desde 2011 que se fazem em Portugal, nos hospitais privados, implantes coclear bilaterais simultâneos a surdos profundos, mas, nos hospitais públicos os doentes não podem ser operados aos dois ouvidos porque o Serviço Nacional de Saúde só comparticipa um implante.

Devido ao investimento inerente à colocação do IC, a verdade é que a cirurgia não está acessível a todas as carteiras. Aos 30 mil euros há que acrescentar outras parcelas: a mudança do processador de som do IC deve ser efetuada de 10 em 10 anos, e um processador novo custa uns 10 mil euros; cada avaria, por exemplo de um cabo, custa 200 euros.

Fonte: DN por indicação de Livresco

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Há quem ensine os pais e os filhos a brincarem para terem sucesso no futuro

Durante dez meses, duas vezes por semana, em sessões de duas horas, os bebés e as suas mães (ou pais, avós, amas… houve mesmo uma bisavó) saíam de casa e iam aprender a brincar, a socializar, a estar com outros bebés (até aos quatro anos e que não tivessem tido experiência de creche ou de pré-escolar). A experiência foi feita ao longo de dois anos e os resultados não podiam ser mais positivos. Por isso, o objectivo é dar continuidade a este projecto, embora ainda não se saiba como. (Continuação da notícia)

Fonte: Público

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2017

Professores de língua gestual vão ter grupo de recrutamento

O Ministério da Educação (ME) vai criar um grupo de recrutamento para os professores de Língua Gestual Portuguesa (LGP), enquadrando-os na carreira docente, criando para isso um grupo de trabalho que deve apresentar conclusões durante o próximo ano letivo.

“O Ministério da Educação vai avançar com a identificação e definição dos requisitos de habilitação e profissionalização para a docência da Língua Gestual Portuguesa (LGP) nas escolas públicas. Para tal, foi criado um grupo de trabalho que estudará o enquadramento e regime jurídico da habilitação profissional para a docência no ensino obrigatório”, anuncia um comunicado do ME divulgado nesta quinta-feira.

O novo grupo de recrutamento para os professores de LGP, atualmente contratados como técnicos especializados, não produzirá efeitos antes do ano letivo 2018-2019, uma vez que o grupo de trabalho pode apresentar o relatório até ao final do próximo ano letivo. Questionado (...), o ME não se comprometeu, no entanto, com a efetivação do grupo de recrutamento logo no arranque do ano de 2018-2019.

O comunicado explica que o grupo de trabalho será composto por representantes das secretarias de Estado da Educação; da Ciência Tecnologia e Ensino Superior; da Inclusão das Pessoas com Deficiência, sendo coordenado por um representante do gabinete da secretária de Estado Adjunta e da Educação.

O grupo de trabalho vai ainda envolver no trabalho as associações representativas do setor, e deve ainda, para além de definir os requisitos legais para lecionar LGP, “identificar e propor a regulamentação específica para outras situações que, neste âmbito, o justifiquem”.

“A definição dos requisitos de habilitação e profissionalização destes docentes poderá melhorar a qualidade de ensino de LGP nas escolas, garantindo a estes profissionais as condições necessárias para a valorização e estabilidade da sua função. Pretende assim o ME avaliar as condições necessárias com vista ao reforço da inclusão e promoção da igualdade nas escolas, não só através da valorização da classe docente, como também do reforço de qualidade da oferta aos alunos”, refere a tutela.

Em janeiro, a Federação Nacional dos Professores (Fenprof) convocou uma concentração de professores de LGP frente ao ME, na altura em que ainda se negociavam o novo diploma do regime de concursos de professores, com o objetivo de pressionar para a criação deste novo grupo de recrutamento na carreira docente, ainda no âmbito das negociações que decorriam.

Existem 150 professores de LGP em Portugal, mas apenas 87 estão neste momento a dar aulas aos mais de mil alunos surdos que existem no país, divididos por 23 escolas de referência, onde existe o ensino bilingue, e outras 10 escolas que acolhem alunos surdos em turmas de estudantes ouvintes, não tendo muitas vezes o apoio e os técnicos necessários para acompanhar as aulas nestas turmas, de acordo com dados da associação de docente da LGP.

Fonte: Público

Alargamento da Escolaridade Obrigatória: contextos e desafios

Encontra-se disponível a publicação do Conselho Nacional de Educação sobre o seminário "Alargamento da Escolaridade Obrigatória: contextos e desafios", que teve como objetivo primordial identificar e refletir sobre as várias dimensões da escolaridade obrigatória e assinalar problemas e desafios, nomeadamente, a equidade escolar, o sucesso e inclusão de crianças e jovens com necessidades educativas especiais, a diferenciação de percursos e aprendizagens, a mobilização social para o sucesso educativo e a organização escolar.
Fica o índice como indicação dos temas abordados:


quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

Lar para pessoas com deficiência criado em antiga escola prmária de Ponte de Lima

Uma antiga escola primária de Moreira do Lima, Ponte de Lima, vai reabrir até final do ano, transformada em lar residencial para acolher 17 pessoas com deficiência.

Segundo o presidente da direção da Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPACDM) de Viana do Castelo, Luiz Costa, o novo lar deverá entrar em funcionamento até final do ano.

!As obras de adaptação não são de grande dimensão. O projeto está praticamente concluído para ser enviado para apreciação das entidades competentes”, afirmou .

De acordo com aquele responsável, que falava a propósito do protocolo de cedência da antiga escola, que vai ser celebrado, na próxima terça-feira entre a Câmara de Ponte de Lima e a APPACD a nova estrutura, atualmente “inexistente” naquele concelho, “é um velho anseio dos pais e encarregados de educação de crianças e jovens com deficiência”.

“A APPACDM tem lares residenciais (que funcionam 365 dias por ano) e lares de apoio (apenas de segunda a sexta-feira) em sete dos dez concelhos do distrito de Viana do Castelo. A tendência será a de irmos dotando todos os concelhos com estas estruturas”, explicou Luiz Costa.

O presidente da APPACDM de Viana adiantou que “ainda este ano serão celebrados novos protocolos com outros concelhos do Alto Minho com vista à futura abertura de mais lares”.

O responsável disse ainda não poder avançar com o valor das obras de transformação da antiga escola primária em lar residencial, mas afirmou que “não será um investimento avultado”.

“Se conseguirmos financiamento de fundos comunitários, iremos candidatar o projeto mas não vamos fazer depender o avanço da empreitada desses apoios. A obra começará com fundos da associação”, referiu. (...)

Fonte: Rádio Alto Minho por indicação de Livresco

Filipe Santos bateu recorde do mundo em natação adaptada


Filipe Santos, atleta de natação adaptada do Futebol Clube (FC) Ferreiras, bateu, no passado dia 18 de Fevereiro, o recorde do mundo dos 25 metros livres, na classe S21 (Síndrome de Down), com a marca de 14,15 segundos.

O nadador superou, ainda, um recorde da Europa, que já lhe pertencia, ao nadar os 25 metros mariposa em 15,89 segundos.

O sul africano Sean O’Neil era o anterior detentor do recorde do mundo, que não era batido desde 2007. Na altura este nadador demorou 14,56 segundos a completar os 25 metros livres.

Quanto à recorde europeu, este tinha sido fixado por Filipe Santos nos 15,92 segundos.

O atleta algarvio garantiu, ainda, os mínimos para o Europeu DSISO, para atletas com Síndrome de Down, que se realizará em Paris, ao fazer os 100 metros estilos em 1:26.51 minutos, e os 50 livres em 32,588 minutos.

Além de Filipe Santos também José Vieira, Alexandre Silva e João Pedro Antunes participaram no Campeonato Nacional de Natação Adaptada, na Mealhada. E os resultados foram muito positivos para todos os atletas.

Filipe Santos sagrou-se campeão nacional absoluto (S21), nos 50 metros mariposa e livres, nos 100 metros estilos, 25 metros livres, 100 metros livres, 200 metros livres, 4×100 metros estilos e 4×100 metros livres, conquistando, no total, oito medalhas de ouro.

Por seu turno, José Vieira sagrou-se também campeão nacional absoluto (S21) nos 25 e 50 metros bruços, nos 4×100 metros estilos e nos 4×100 metros livres, ganhando quatro medalhas de ouro. Foi, ainda, vice-campeão nacional absoluto (S21) nos 200 metros bruços, 100 metros bruços e bateu o recorde nacional nos 25 metros bruços.

Alexandre Silva e João Pedro Antunes sagraram-se, por fim, campeões nacionais absolutos (S21) em 4×100 metros estilos e 4×100 metros livres.

A equipa de natação adaptada do FC Ferreiras foi a mais medalhada na classe S21 com oito medalhas de ouro individuais, duas em estafeta, e duas medalhas de prata.

A direção do clube já manifestou o seu contentamento por este título mundial e todos os recordes nacionais e europeus que os seus atletas acabam de conquistar. «Os resultados são fruto de um trabalho muito sério, nem sempre fácil, mas cheio de dedicação e respeito pelos nossos grandes atletas. Não é de todo fácil juntar quatro atletas numa só equipa de estafeta», refere.

Para Carlos Silva e Sousa, presidente da Câmara de Albufeira, «os resultados do Filipe e de toda a sua equipa constituem um imenso orgulho e um grande exemplo para todos os jovens».

O autarca sublinha que «devemos apoiar e realçar todos os exemplos de excelência que existem no nosso concelho, no domínio desportivo, sem esquecer que a prática desportiva, além de produzir campeões como é o caso, deve contribuir para que tenhamos melhores cidadãos, mais tolerantes, mais fraternos e mais competentes».

Fonte: Sul Informação por indicação de Livresco

Responsáveis de escolas públicas e privadas querem alterar acesso à universidade

Escolas públicas e privadas defenderam esta terça-feira que o modelo de acesso ao ensino superior deve ser alterado, por forma a ficar menos dependente do ensino secundário, nomeadamente da avaliação interna feita pelos estabelecimentos de ensino. 
As notas atribuídas pelas escolas privadas em 2016 aos alunos do secundário foram mais altas em cerca de 0,67 valores do que as das escolas públicas, segundo um estudo que compara as classificações internas no ensino secundário publicado pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC). 
"Para nós, o mais importante é que temos um problema com a regra tradicional de acesso ao ensino superior", disse (...) o diretor executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (AEEP), Rodrigo Queiroz e Melo. 
De acordo com a DGEEC, a principal preocupação levantada pelo fenómeno dos desalinhamentos entre escolas nos critérios de avaliação interna é, porventura, a questão da equidade entre alunos no concurso nacional de acesso ao ensino superior. 
O responsável da AEEP desvalorizou a questão dos desalinhamentos, afirmando que são "pequenos desvios" e defendeu que seria útil estudar os modelos de acesso ao ensino superior de outros países. 
"A Inspeção-Geral da Educação teve oportunidade de ver o que se passa tanto no público, como no privado e concluiu que não havia nada, várias averiguações que fez deram em nada. Tudo foi investigado e arquivado", referiu. 
Para Rodrigo Queiroz e Melo, a avaliação interna não deve ter caráter seletivo para o ensino superior. "É um instrumento de gestão pedagógica das escolas e da aprendizagem dos alunos e é nisso que as escolas têm de estar focadas". 
O diretor da AEEP deu como exemplo que em alguns países o acesso ao ensino superior é livre e a triagem dos alunos faz-se na passagem do 1.º para o 2.º ano. "Outra possibilidade é serem as próprias faculdades a decidirem como querem contar o acesso e terem desde provas internas a avaliação curricular, que pode até usar componentes da avaliação do ensino secundário", exemplificou. 
"O que temos de discutir é como é que o ensino superior entende mais adequado (o acesso). Provavelmente até diferentes faculdades podem escolher diferentes modos de acesso", defendeu. 
Rodrigo Queiroz e Melo contestou ainda a leitura da DGEEC por pressupor que o ensino secundário serve para seriar alunos para o ensino superior. "O ensino secundário, quando foi alargado deixou de seriar alunos para o ensino superior", declarou. A proposta da AEEP é "desligar" o ensino secundário do acesso ao superior ou "dar-lhe um peso muito menor, não ser o principal". 
O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas (ANDAEP), Filinto Lima, concorda com esta visão. "Devíamos encontrar um modelo para que as escolas secundárias deixem de selecionar os alunos para o ensino superior", sublinhou, admitindo também a possibilidade de ser a própria faculdade a realizar o exame do futuro aluno. 
Filinto Lima considera que deveria ser retirado este "ónus" ao ensino secundário ou, pelo menos, diminuir o peso da avaliação interna no acesso ao ensino superior. (...) o diretor escolar criticou a altura escolhida para a publicação, em fase de pré-inscrições. "Parece que é publicidade gratuita aos colégios, todos sabemos que os pais querem a todo o custo que os filhos entrem para a faculdade". 
Questionou ainda a utilidade de se reproduzir ciclicamente este tipo de informação, sem que sejam conhecidos os resultados das inspeções ordenadas durante a tutela de Nuno Crato: "O que é aborrecido é que não temos informação alguma do resultado dessas inspeções".

Fonte: CM por indicação de Livresco

terça-feira, 21 de fevereiro de 2017

Catherine L’Ecuyer: “A melhor preparação para o mundo digital é o mundo real"

Afinal, estamos a matar a infância?
Não estamos a matá-la, mas estamos a queimar ou adiantar etapas imprescindíveis. Queremos que as crianças aprendam muitas coisas antes de tempo, quando não poderiam aprendê-las. Quando transformamos a brincadeira numa etapa de educação formal, estamos a matar a capacidade que a criança tem de descobrir o mundo.

Porque é que a curiosidade é tão importante?
As crianças nascem com o desejo de conhecer, e isso é que é o motor de toda a aprendizagem. O que acontece é que a curiosidade nasce espontaneamente. Se forçamos a aprendizagem, se levamos a criança pela mão, essa curiosidade deixa de vir de dentro e desaparece e a criança não aprende, porque o desejo de aprender não nasceu dela, foi-lhe imposto.

Destruir a curiosidade é fatal para a aprendizagem?
Sim, mas não o fazemos por mal, porque os pais querem o melhor para os filhos. O que acontece é que temos muitos ‘neuro-mitos’, ou seja, pensamos que quanto mais estímulos, mais esperta vai ser a criança, e não é assim. Em vez de encher a criança de ipads e e brinquedos educativos, os pais têm de escolher brinquedos que precisem de ‘ser brincados’, não que puxem pela criança. A criança é que tem de brincar com eles. Então, quanto menos botões e pilhas, melhor. E há mil exemplos de brinquedos destes, como Legos ou bicicletas.

Se damos tudo às crianças, não nos arriscamos a criar filhos ‘aborrecidos’, que já não ‘vibram’ com nada?
Totalmente. Esse aborrecimento é a consequência da sobre-estimulação. Quando estão sobre-estimuladas, as crianças perdem o interesse em aprender, porque passam a depender dos estímulos. Quando estão sobre estimulados e regressam ao mundo real - a casa, a escola, o parque – tudo aí lhes parece lento e monótono. Portanto, o importante é voltar a ligá-los à realidade. Em vez da palavra ‘estimular’, prefiro a expressão ‘criar um ambiente’ em redor da criança, onde ela é que descobre a realidade. Quer dizer, pode haver um ‘maestro’ que esteja presente, que planeie esse ambiente, que brinque com a criança, mas não são precisas luzes nem programas nem filmes nem ipads.

Queremos que as crianças tenham todas essas coisas, mas a verdade é que não podemos prever o futuro…
Claro que não. Por exemplo, estamos a educar as crianças com tablets, mas o mais provável é que quando sejam adultos, os tablets já não existam. Então, estamos preocupados com equipamentos digitais que já não serão pertinentes no momento em que entrarem no mundo laborar. Além disso, não há nenhum estudo que ligue as competências tecnológicas das crianças com o seu êxito académico ou profissional.

As crianças não aprendem com dvs?
Não, porque uma criança pequena não tem pensamento abstracto. Um adulto pode aprender com um dvd. Uma criança pequena aprende com a realidade, com o toque, com o cheiro, com a voz, com a presença das pessoas. E com o silêncio, que é tão necessário à construção da sua interioridade. E um écran não lhe dá nada disto.

Então qual deve ser o papel das novas tecnologias na vida dos mais pequenos?
Educativo é que não. Se usarmos um tablet para ver um filme de vez em quando, tudo bem. Aliás, eu não sou contra o seu uso. O que quero é que se conheçam os estudos e o que dizem sobre cada idade. O que a Associação Americana de Pediatria recomenda é que as crianças até 2 anos não tenham acesso a absolutamente nenhum écran. E mais tarde, também não há nenhum estudo que relacione o seu uso com o sucesso escolar, ou outro.

Mas tentar controlar o uso de tablets e afins não é uma batalha perdida?
A expressão ‘batalha perdida’ é o princípio de todos os desastres educativos (risos). Não podemos desistir, porque somos os principais cuidadores. O que acontece é que temos de dar alternativas e não controlar. Se damos a escolher entre ir à pesca com o pai ou passar o dia inteiro sozinho agarrado a uma consola, que acha que a criança prefere?

Bem, alguns preferem de certeza ficar na consola…
Os mais crescidos, sim. Por isso é que eu digo que não devemos perder o comboio enquanto são pequeninos. Mas como o cérebro é plástico, podemos sempre fazer marcha-atrás e há sempre oportunidade para mudar.

Também há pais que vão no sentido oposto e proíbem tudo…
Acho melhor que uma criança pequena não tenha écran nenhum do que termos de transformar-nos em polícias digitais e passar o dia a dizer ‘não’. E note: não se vai passar absolutamente nada se negar um tablet ao seu filho. Não vai ficar para trás, não vai ficar traumatizado, não vai ser ostracizado, não lhe vai acontecer nada de mal. O pior que pode acontecer: uma grande birra. É uma escravatura ter tantos écrans em casa, portanto simplifiquemos a educação. Os écrans são bons: mas tudo tem o seu tempo. E a melhor preparação para o mundo digital é o mundo real. Primeiro temos de educar a criança para o mundo real: sensatez, força interior, consciência de si próprio, auto-controle, tudo isto são qualidades que a criança tem de ter antes de ter um tablet, antes de entrar no mundo digital.

Se não fiz isto e o meu filho cresceu, é possível voltar atrás?
Sempre. Mas eu não gosto de dar conselhos, e cada pai e mãe fará o que achar melhor segundo a informação que tem. O que eu ensino é o que dizem os estudos. Mas não pode ser nem a indústria nem a escola nem a criança a mandar em casa. Quem manda em casa são os pais, e a sua sensibilidade em relação ao conhecimento que têm dos seus filhos.

Se quero ter uma criança esperta, que devo fazer?
Espertas já elas nascem. Não estrague isso. Mas se quer ter uma criança amorfa, então basta entupi-la de estímulos. Achamos que é essa a chave do êxito mas é o contrário: vamos adormecê-los. Resultado: criamos adolescentes cínicos, que já não se encantam com nada, que já viram tudo, que desprezam tudo. Uma criança pequena olha para a mãe e encanta-se porque pensa: ‘Que sorte que tenho porque tu existes’. Eles vêem o mundo com encantamento. E todos nós podemos fazer isso, encantar-nos com a realidade e com os seus mistérios e a sua beleza. Porque sem encantamento não há interesse, e sem interesse não há aprendizagem. Se queremos que as crianças sejam atentas, vamos rodeá-las de coisas belas, de coisas que fazem sentido.

Tem 4 filhos. Qual foi a parte mais difícil da ‘profissão’ de mãe?
Aprender a ser mãe, mesmo. Ou seja: dar-me conta da beleza e da importância da maternidade. Há tantas tarefas esgotantes a cumprir dia após dia que às vezes nos esquecemos da grandeza que é ter tanta influência na alma de outro ser humano. Ultrapassar o óbvio foi difícil, passar do como e do quê, para o porquê e para quê. Não percam a oportunidade maravilhosa de se encantarem com as crianças.

Que nos ensinam elas?
Ensinam-nos a ver tudo como se fosse a primeira vez. E são agradecidas por tudo.

CATHERINE L'ECUYER

Canadiana mas a viver em Espanha há 13 anos, é mãe de 4 filhos, investigadora de novas formas de aprender, e colabora com o grupo de investigação Mente-Cérebro da Universidade de Navarra. O seu blog (apegoasombro) tem meio milhão de seguidores. É autora do livro ‘Educar na Curiosidade ‘ (Planeta) e dá palestras por esse mundo fora, onde defende que estamos a destruir a capacidade de aprendizagem das crianças de tanto querermos que aprendam.

Fonte: Activa por indicação de Livresco