segunda-feira, 7 de julho de 2025

Os miúdos estão a chumbar mais. Saiba em que anos é que aumentou a taxa de retenção

As taxas de retenção voltaram a subir desde 2020, de acordo com o mais recente relatório da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC). Especialistas dizem que não é alarmante, mas vale a pena perceber o que se passa.

O relatório “Estatísticas da Educação”, publicado na última semana, revela que as retenções mais do que duplicaram no final do 3.º ciclo, particularmente no 9.º ano. A taxa, que em 2015 era de 10,7% e caiu para 2,2% em 2020, voltou a crescer nos últimos quatro anos, fixando-se agora nos 6,9%, refere o "Jornal de Notícias".

Também no 6.º ano a tendência é de subida desde 2021, quando a taxa era de 2,3%, atingindo os 4,2% em 2024. No 5.º ano, passou de 2,5% (2020) para 3,5% e, no 2.º ano, de 3,2% para 4%.

Em sentido contrário, o 12.º ano registou uma descida significativa na taxa de retenção, que caiu de 23,2% em 2020 para 10% em 2024, coincidindo com a alteração no modelo dos exames nacionais, que passaram a ser apenas para acesso ao ensino superior e não obrigatórios para concluir o ensino secundário.

“Não é uma catástrofe, mas evidentemente pode e deve fazer-se uma reflexão”, afirmou o presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Domingos Fernandes, ao "JN", apontando também para uma certa “estagnação” no percurso dos alunos ao longo dos 12 anos de escolaridade.

O responsável alerta para o impacto duradouro da pandemia, especialmente nos alunos que estavam a iniciar o 1.º ciclo durante o confinamento. “As crianças que hoje frequentam o 5.º ano passaram os dois primeiros anos escolares, cruciais para a aprendizagem da leitura e escrita, em regime de ensino à distância”, recorda, defendendo que as políticas públicas devem priorizar o investimento nos primeiros anos de ensino.

O presidente do Conselho das Escolas, António Castel-Branco, destaca a falta de professores como um dos principais fatores neste aumento das retenções. “Se não há professores para as aulas, muito menos para os apoios ou recuperação das aprendizagens”, afirma, sublinhando ainda as crescentes dificuldades no recrutamento e substituição de docentes, tal como escreve o mesmo jornal.

O especialista salientou também as disparidades regionais, com o norte a beneficiar de uma maior estabilidade no corpo docente face ao sul, o que se reflete nos resultados escolares. O aumento do número de alunos migrantes, nos últimos anos, é outro elemento que pode estar a contribuir para a subida das retenções, diz.

Fonte: MAGG por indicação de Livresco

sábado, 5 de julho de 2025

Pais de alunos com necessidades específicas exigem mais apoio

Um grupo de pais de alunos com necessidades educativas específicas manifestaram-se à porta do Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares do Norte (DGEstE Norte), por sentirem que os seus filhos não estão a receber o acompanhamento devido por parte das escolas.

A instituição garante que vai resolver os problemas com a maior brevidade possível.

Branca Célia Dias, representante da dezena de encarregados de educação que se juntaram para expor a situação, reuniu com o delegado regional de educação do Norte, Luís Carlos Lobo, mas revela que a esperança entre os seus representados não é muita. “A DGEstE Norte prometeu resolver os problemas dos alunos cujos pais estavam presentes no imediato. Pediram os contactos e garantiram que vão redigir um documento, que será enviado ao Ministério da Educação”, começou por explicar.

Branca é também professora e acredita que estas medidas só vão resolver os problemas a curto prazo. O próximo passo dos manifestantes poderá ser a Justiça.“Os pais estão cansados e não sabem a que porta bater a seguir. A próxima deverá ser a da Justiça, até porque as respostas que recebemos é que não há técnicos suficientes nas escolas com capacidades para lidar com este tipo de alunos”, salientou.

Uma das mães presentes na manifestação foi Sílvia Ramos, que relatou vários casos preocupantes com o seu filho de oito anos, que é autista. “Alguns professores insultaram o meu filho várias vezes, além de, enquanto sob os seus cuidados, o terem deixado numa arrecadação [da escola] que continha produtos tóxicos”.

Fonte: JN por indicação de Livresco

sexta-feira, 4 de julho de 2025

Compreender como aprendemos: entrevista a John Sweller

John Sweller é uma das figuras mais influentes da psicologia da educação. Um dos seus contributos mais célebres é a teoria da carga cognitiva e não há dúvida de que o seu trabalho veio alterar a forma como entendemos a aprendizagem. Numa recente viagem a Sydney, o presidente da Iniciativa Educação teve a oportunidade de conversar com este cientista e de explorar alguns pontos altos da sua carreira, cuja importância para as práticas educativas atuais é fundamental.

Uma vida dedicada à memória e à aprendizagem

John Sweller não chegou à psicologia de uma forma tão linear como se poderá pensar. Iniciou o seu percurso universitário em medicina dentária, mas rapidamente se apercebeu de que o seu destino era outro. À medida que ia descobrindo os seus verdadeiros interesses, afastava-se cada vez mais da sua primeira escolha. «A Faculdade de Medicina Dentária não gostou nada de mim», afirma em tom de brincadeira.

O jovem Sweller começou desde então a dedicar-se à teoria da aprendizagem. Sweller passou grande parte da sua carreira na Universidade de Nova Gales do Sul, onde conduz uma investigação experimental rigorosa com base em experiências aleatórias e controladas para testar métodos educativos. A sua investigação explorou desde sempre a forma como as pessoas adquirem conhecimentos e culminou no seu trabalho científico mais conhecido: a teoria da carga cognitiva.

A separação entre a ciência cognitiva e as práticas educativas é uma das suas principais preocupações. Esta separação ocorre também num exemplo semântico que, embora pareça menor, é bastante revelador: a divisão forçada entre memória e aprendizagem. Ancorado na recolha de provas que efetuou ao longo de vários anos, Sweller critica o facto de educação subestimar tantas vezes o papel da memória. Elogiamos a aprendizagem, mas vemos a memorização como algo negativo e que se deve evitar. Sweller argumenta que «a aprendizagem e a memória são de facto idênticas. Não se pode distinguir entre memorizar e aprender».

Conhecimento primário e secundário

A memória não é apenas um sistema de armazenamento passivo, constitui a base da inteligência e do raciocínio. Sweller explica que, «sem a nossa memória de longo prazo, não conseguimos atuar de forma inteligente». E defende que, para o desenvolvimento cognitivo e a aprendizagem, é fundamental sedimentar conhecimentos. Realidade que é também bastante depreciada em algumas correntes educativas, segundo explica.

Com base no trabalho de David Geary, um outro conhecido psicólogo, Sweller apresenta uma distinção fundamental entre dois tipos de conhecimento:
  • Conhecimento biologicamente primário, que inclui capacidades inatas, tais como a fala, a resolução de problemas imediatos, a comunicação ou a interação com os outros. Estas capacidades desenvolvem-se naturalmente e não requerem um ensino formal, embora, claro, beneficiem dele.
  • Conhecimento biologicamente secundário, que inclui as habilidades ou destrezas que têm de ser aprendidas, tais como a leitura, a escrita e a matemática. Estas têm de ser ensinadas de forma explícita porque não se adquirem naturalmente.
Esta distinção explica por que razão os seres humanos conseguem aprender a falar sem grande esforço, mas têm mais dificuldades com a literacia e a numeracia. «Até há cerca de 150 anos, não havia quase ninguém que fosse capaz de ler e escrever, em todas as sociedades. Não se aprendia apenas a olhar para os livros», sublinha Sweller.

As escolas existem precisamente para ensinar conhecimentos biologicamente secundários, e um ensino eficaz deve refletir essa realidade. Sweller alerta contra o risco de se partir do princípio de que os alunos «descobrem» o conhecimento naturalmente, como sugerem alguns modelos educativos. «Os estudantes são as únicas pessoas na Terra a quem aplicaríamos essa regra…», observa. Qualquer engenheiro que está pela primeira vez a construir uma torre de telecomunicações começa por estudar o que os outros fizeram e explicaram.

No entanto, apesar da convicção com que defende as suas afirmações, Sweller reconhece que ainda há perguntas sem resposta — particularmente no que diz respeito à transição da instrução guiada para a resolução independente de problemas escolares. Determinar o momento ideal para esta mudança continua a ser um grande desafio da investigação. Quando devemos passar de um procedimento para o outro? Como podemos encontrar a melhor maneira de o fazer? É para o investigar que servem as experiências, observações e provas empíricas.

A revolução cognitiva e o papel da memória na aprendizagem

O famoso artigo de George Miller sobre a memória de trabalho («The magical number seven, plus or minus two», publicado em 1956) delineou a psicologia moderna e foi crucial para o desenvolvimento daquilo a que mais tarde se chamou «a revolução cognitiva». Este artigo aponta alguns limites da capacidade humana em processar informação — algo que tem sido amplamente ignorado pelos educadores. «Embora esse trabalho fosse muito relevante para a educação, foi ignorado pela educação», lamenta Sweller.

A maioria dos educadores atuais ignora conceitos tão fundamentais como as limitações da memória de trabalho. Muitas teorias educativas partem do princípio de que os alunos têm uma capacidade cognitiva ilimitada, descurando barreiras que podem ter impacto na aprendizagem. Esta neglicência, explica Sweller, leva à adoção de abordagens pedagógicas ineficazes que sobrecarregam os alunos em vez de os apoiarem na aprendizagem.

Sweller dedicou grande parte da sua carreira a defender precisamente a importância de reduzir a carga cognitiva desnecessária no ensino, garantindo que os alunos conseguem efetivamente processar e reter informação nova.

A teoria da carga cognitiva na prática

A teoria da carga cognitiva tem por base a existência de limitações de capacidade e duração na memória de trabalho, o que torna crucial a instrução estruturada. A investigação de Sweller identificou vários princípios de instrução que otimizam a aprendizagem:
  • O efeito do exemplo trabalhadoOs principiantes aprendem melhor seguindo exemplos trabalhados antes de tentarem resolver os problemas sozinhos. «Não se dá [aos alunos] um ou dois exemplos. Devemos dar-lhes uma grande quantidade de exemplos que mostram na prática aquilo que lhes foi ensinado.»
  • O efeito da redundância: Fornecer informação desnecessária pode sobrecarregar a memória de trabalho em vez de facilitar a compreensão. «Se dermos um exemplo trabalhado a alguém que já compreende bem o tema, as consequências podem ser negativas. Esse exemplo adicional já não lhe faz falta.»
  • O efeito da inversão de perícia: À medida que os alunos progridem, a instrução direta torna-se menos necessária e a resolução independente de problemas torna-se cada vez mais benéfica. «Os alunos principiantes ganham mais em estudar exemplos trabalhados do que em resolver sozinhos problemas equivalentes. Com o aumento da perícia, essa diferença vai diminuindo, depois desaparece e por fim inverte-se.»
  • O efeito da informação transitória: É mais difícil reter informação oral ou animada do que aquela que se recebe em formato escrito. «Aprender através de vídeos é o mesmo que aprender através de informação oral. É um conhecimento efémero. É muitas vezes preferível apresentar uma série de imagens fixas a passar um vídeo.»
Uma das principais vantagens da teoria da carga cognitiva é o facto de esta não ser apenas uma teoria — é comprovada através de ensaios controlados. John Sweller não deixa de salientar a importância da validação experimental na educação.

Ao comparar diferentes abordagens de ensino de forma sistemática, os investigadores conseguiram confirmar a eficácia de estratégias como os exemplos trabalhados e a instrução estruturada. Sweller reconhece que a realização de experiências no domínio da educação é um desafio, mas insiste que estas são necessárias para o desenvolvimento de melhores práticas pedagógicas.

O desafio da transição de principiante para especialista

Uma das principais questões que a psicologia da educação gostaria de resolver é determinar quando é que os alunos devem abandonar a instrução guiada e transitar para a resolução autónoma de problemas. Sweller insiste que os principiantes precisam de uma orientação estruturada: «Um principiante precisa de orientação. Deixar um principiante numa situação em que tem de resolver as coisas sozinho… não há absolutamente nada na literatura que indique que isso seja boa ideia.»

Ainda assim, numa determinada fase, a prática da resolução de problemas desafiantes torna-se necessária. O difícil é identificar o momento certo para essa transição. Mesmo que os professores mais experientes desenvolvam muitas vezes uma intuição que os ajude a perceber se os alunos estão prontos, Sweller defende a necessidade de uma abordagem mais sistemática. «Não dispomos atualmente de nenhum teste simples que nos indique quando um aluno sabe o suficiente para conseguir trabalhar de forma autónoma. Essa decisão depende da opinião do professor.» Sweller defende que a investigação nesta área é essencial para melhorar os métodos de ensino.

Conclusões
  1. A memória é fundamental para a aprendizagem: O conhecimento sedimentado na memória de longo prazo permite um raciocínio inteligente.
  2. A instrução explícita é fundamental para os principiantes: A aprendizagem não pode basear-se apenas em métodos de descoberta, muito menos numa fase inicial de abordagem de cada tema.
  3. É fundamental gerir a carga cognitiva: A instrução deve estar alinhada com os processos cognitivos para facilitar a aprendizagem.
  4. A independência deve ser progressiva: À medida que os alunos adquirem conhecimentos, o ensino deve incluir mais e mais tarefas de resolução de problemas desafiantes.
Este artigo é baseado na entrevista que Nuno Crato fez a John Sweller em Sydney em julho de 2024. A entrevista completa está disponível aqui.

quinta-feira, 3 de julho de 2025

Escolas sem telemóveis podem gerar "contrabando" e impedir "progresso": privado "sem medo de proibir", público prefere "regulação"

O anúncio do Ministério da Educação sobre a proibição do uso do telemóvel aplicada aos alunos do primeiro e segundo ciclo tem dividido opiniões: o setor público, que defende a "regulação" da utilização destes dispositivos, lembra que este é, acima de tudo, um "desafio da sociedade"; já o setor privado mostra-se favorável à medida, afirmando que em muitos estabelecimentos escolares esta já era uma realidade.

O presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, ouvido no Fórum TSF desta terça-feira, começa por defender que esta decisão deveria ficar ao critério de cada escola, referindo, aliás, que a proibição dos telemóveis é um tema anualmente debatido pelos agrupamentos. E salienta que este é um "desafio da sociedade" e não um problema que está "circunscrito à escola".

Quantas vezes não vemos nos restaurantes os pais entregarem aos filhos o telemóvel para eles estarem sossegadinhos, caladinhos e sentadinhos para que o almoço ou o jantar corra da melhor maneira? Quantas vezes os nossos alunos vão para a cama, até se deitam cedo, mas estão até altas horas da madrugada, agarrados aos telemóveis?

Foi precisamente por "votação popular" o Agrupamento de Escolas General Serpa Pinto de Cinfães decidiu proibir a utilização dos telemóveis nos espaços públicos das escolas, em 2022. Os alunos estão, contudo, autorizados a levar os dispositivos para o recinto escolar.

"Na sala de aula, se os professores, porventura, precisaram da sua utilização, se os alunos o tiverem, não há nenhum problema. O que nós tentamos foi regular a utilização", esclarece Manuel Pereira, diretor do agrupamento e presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, que destaca os resultados positivos da iniciativa.

A Confederação Nacional das Associações de Pais dá igualmente conta que a medida imposta pelo Ministério é "um pau de dois bicos": "Queremos a digitalização, queremos ter mais um instrumento de trabalho — que é isso que deve ser a digitalização —, mas depois queremos proibir", lamenta.

Já o diretor-executivo da Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo, Rodrigo Queiroz e Melo, confessa alguma "estranheza" pelo facto de terem existido dúvidas sobre se esta iniciativa se aplicava também às escolas privadas. "O ensino particular e cooperativo está sujeito à lei da nação", vinca, acrescentando que a utilização excessiva de telemóveis "não é um problema" no ensino privado, porque a sua restrição já está em vigor há muito tempo.

Entende também que este é um "problema social" e defende que nas escolas os alunos estão "mais protegidos", até porque têm "supervisão" dos professores durante sete horas por dia, enquanto que passam 17 horas fora das aulas, oito das quais acordados. E aí, sim, existe a possibilidade de um uso "desregrado".

"Não conheço nenhum colégio onde os alunos do primeiro ciclo possam usar livremente um smartphone e, no segundo ciclo, a mesma coisa. A proibição de uso dos telemóveis já existe numa quantidade de estabelecimentos de ensino. Aqui não há nenhum medo à palavra proibição", garante.

Indo mais longe, Rodrigo Queiroz e Melo sugere que é preciso pensar se esta não deverá ser "uma lei geral do país". "Ou seja, crianças abaixo de determinada idade não podem utilizar smartphones. Isto não é um problema só da escola", insiste.

E a psicologia, o que diz?

Margarida Gaspar de Matos, psicóloga e professora catedrática da Universidade de Lisboa, alerta que a nova diretiva do ministério tutelado por Fernando Alexandre é um "empurrar com a barriga" que "fecha uma das portas ao progresso". Argumenta que esta é uma atividade que tem de ser incorporada e regulada, porque é uma realidade à qual não se pode fechar os olhos.

"Como é que dos cinco aos 11 anos têm uma proibição e aos 12 começam a ter uma regulação e entre a proibição e a regulação não há um processo educativo?", questiona, mencionando o contributo positivo das tecnologias para a sala de aula, quando o seu uso é feito de forma responsável.

A também coordenadora do Observatório da Saúde Psicológica e do Bem Estar alerta mesmo para a "confusão" nas escolas e para um inevitável "contrabando de telemóveis".

O senhor ministro já deve ter pensado nisso tudo e deve ter uma solução para isso, mas vai ser um caos e um caos escusado, se, em vez de uma medida de proibição, houvesse uma medida séria e educativa, participada pelos miúdos em que os próprios jovens gerassem soluções para a utilização. (...) Há jovens que têm muitos telemóveis e podem deixar um na entrada da escola e ainda lhes sobram outros dois. Isto vai ser uma luta e escusava de ser assim.

A solução, reforça, deveria nascer de uma sinergia entre alunos, pais e educadores. E lembra que vários estudos também aponta que os estudantes estão "cheios de tédio pelas matérias da escola e cheios de stress pelo processo avaliativo" e nem por isso são tomadas medidas a este nível.

"Os professores que estão pela proibição estão todos em desespero. Os miúdos vão para a escola com o nariz no ecrã e saem da escola com o nariz no ecrã e não há uma aulinha no meio que lhe dê algum interesse maior. É por aí que nós temos de começar: é regular a utilização, potenciar a utilização para efeitos educativos e provavelmente também com carácter de urgência. Não é proibir o tédio e o stress nas aulas das escolas portuguesas", urge.

Fonte: TSF por indicação de Livresco

A questão do telemóvel na escola vista por um professor que não o dispensa nas aulas

Decorreu na semana passada o exame nacional de Física e Química A (FQA), a minha disciplina. Cada estudante que se apresentou a exame teve de passar por mais de 400 aulas distribuídas por dois anos letivos, estudou assuntos tratados em quatro manuais escolares, para cima de mil páginas de papel impresso, participou em duas dúzias de atividades laboratoriais obrigatórias e lidou com centenas de exercícios de aplicação. Nos dias que correm, aprender é uma obra grande. É uma empreitada, concluir a escolaridade obrigatória.

Talvez seja suficiente estar atento na maioria das aulas para conseguir obter 10 valores no exame nacional de FQA, quiçá 11. Com esforço, incluindo o esforço das famílias que pagam explicações extra, é possível chegar ao 12, 13, vá lá, 14. Falo, evidentemente, de situações que não fogem à norma e uso a minha experiência de 27 anos de ensino e o contacto com milhares de alunos que se apresentaram a exame. Daí para cima, tem de ser sem esforço, com fluidez, com gosto e ânimo.

Falar em estudar sem esforço pode soar estranho, mas é justamente esse o objetivo da utilização do digital em contexto de sala de aula. Como sucede em todas as atividades humanas, a tecnologia só se torna relevante se permitir produzir muito mais trabalho com menos esforço. É uma situação paradoxal porque, contrariamente àquilo que muitas vezes somos levados a pensar, não foi inventada nenhuma poção mágica que permita aprender sem treino e persistência e, nesse sentido, continuaremos a ter de estudar como sempre se estudou. O que sim foi inventado é um equipamento que permite trazer o treino em tempo real para dentro da sala de aula, acelerando a criação de rotinas e a consolidação de aprendizagens. Esse equipamento é o telemóvel dos alunos.

Já muito investimento foi feito para equipar as escolas com ferramentas digitais facilitadoras da aprendizagem. Infelizmente, o impacto de todas essas iniciativas foi sempre reduzido e há um fator que explica esse insucesso. A sala de aula obedece a uma dinâmica especial. Os professores têm de gerir o tempo de uma forma criteriosa e é muito fácil perder o ritmo, destruindo um plano de aula, se aquilo que pretendemos fazer não funcionar à primeira. Não é possível numa aula usar equipamentos que tenham curvas de aprendizagem pronunciadas ou que apresentem riscos de um comportamento pouco fiável. É esse o principal motivo que explica por que tantos professores evitam utilizar o digital: não é aversão, mas estratégia de sobrevivência.

É aqui que entra o telemóvel dos alunos. Passei 15 anos de carreira sem usar telemóvel e depois o resto a usá-lo e a diferença é que agora posso aumentar a autonomia, proporcionar aulas mais envolventes, dar-lhes mais liberdade, disponibilizar atividades de consolidação em tempo real, enfim utilizar todo o potencial da internet. E posso fazê-lo sem o receio de criar entropia nas aulas. O telemóvel dos alunos é a única ferramenta digital com valor acrescentado para todos os alunos e é o instrumento que mais perto nos coloca de aprender sem esforço.

Bem sei que o recurso ao telemóvel dos alunos em contexto de ensino-aprendizagem está abaixo da sua utilização fora da escola. É preciso disseminar as práticas que o tornam tão útil, ao mesmo tempo que promovemos uma diversificação das atividades lúdicas. E também não ignoro que a internet tem riscos que aconselham criar regras de moderação – fi-lo com os meus alunos, e em casa com a minha filha. Mas o telemóvel está para a aprendizagem como a retroescavadora está para as empreitadas. A escolaridade obrigatória é uma empreitada e é difícil conceber que, apesar de todos os desafios que se colocam, se opte por voltarmos à pá e picareta.

David Ferreira

Fonte: Observador por envio de Livresco

quarta-feira, 2 de julho de 2025

Integração de pessoas com dificuldades inteletuais e desenvolvimentais no ensino superior

As pessoas com trissomia 21 e outras dificuldades intelectuais também têm direito a aceder ao ensino superior, e pode ser que esta possibilidade esteja mais próxima do que pensam. Este é o corolário do evento que teve lugar na sexta-feira, dia 20 de junho, no Centro de Transferência de Tecnologia e Valorização do Conhecimento da Universidade de Lisboa (ULisboa). O evento, intitulado “Ensino Superior para Estudantes com Dificuldades Inteletuais e desenvolvimentais”, foi organizado pela Associação Pais 21, em colaboração com dois professores da Faculdade de Ciências da ULisboa (CIÊNCIAS), Manuela Pereira e Federico Herrera. Foi financiado pelo Prémio de Sustentabilidade de CIÊNCIAS, de 2023, contando ainda com o patrocínio da FeelsLikeHome para o alojamento e da Reitoria da Universidade de Lisboa para a disponibilização do espaço.

As especialistas Silvia Healy (Universidade de Dublin), Anabel Moriña (Universidade de Sevilha), Paula Santos, Mariana Dantas e Maria M. Carvalho (Universidade de Aveiro), Sofia Freire (Instituto de Educação da ULisboa) e Helena Gata (Instituto Superior de Economia e Gestão da ULisboa - ISEG) concordaram que a integração de pessoas com dificuldades intelectuais no contexto do ensino superior representa um grande desafio, mas que é possível, desejável e está de acordo com a legalidade nacional e internacional.

Assim o demonstra o sucesso dos programas em funcionamento nas universidades de Dublin, de Sevilha, de Aveiro e no ISEG. Estes programas têm em comum uma profunda reflexão sobre o papel que a universidade deve desempenhar na sociedade, que deve ter um âmbito de ação e influência maior, mais diverso, inclusivo e integrador do que a mera preparação de recursos humanos para o emprego. Todos os participantes concordaram que é necessária uma maior consciencialização dos poderes públicos, pois é preciso uma via de financiamento estável para manter estes programas em funcionamento regular.

Neste sentido, a Pró-Reitora para a Inclusão da ULisboa, Cristina Espadinha, em colaboração com Joana Soares, da Reitoria, apresentaram um programa ambicioso, denominado (Per)Cursos SingULares. O programa, com a duração de dois anos, tem como objetivo a integração de 16 pessoas com dificuldades intelectuais em qualquer uma das escolas da ULisboa, disponibilizando quase 120 unidades curriculares nas quais os estudantes com deficiência podem inscrever-se. As aulas decorrerão em plena integração e os estudantes contarão com apoio personalizado.

Fonte: Ciências - Universidade de Lisboa por indicação de Livresco

Relatório da OCDE - How's life for Children in the Digital Age?

Com base nos dados transnacionais mais recentes, o relatório How's life for Children in the Digital Age? apresenta uma visão geral do estado atual da vida das crianças, no ambiente digital, nos países da OCDE.

Atualmente, as crianças crescem numa era de rápida digitalização, o que influencia significativamente o seu quotidiano e o seu desenvolvimento.

Este relatório analisa as oportunidades e os riscos associados ao crescente envolvimento das crianças no mundo digital, fornecendo uma visão geral das experiências digitais nos países da OCDE. Explora estratégias para melhorar o bem-estar das crianças, garantindo a sua proteção e capacitando-as para usar os meios digitais de forma positiva, gerindo potenciais riscos.

É realçada a necessidade de uma abordagem política multissetorial que envolva toda a sociedade: prestadores de serviços digitais, profissionais de saúde, educadores, especialistas, pais e crianças, de forma a proteger, capacitar e apoiar as crianças, melhorando o seu bem-estar.

How's life for Children in the Digital Age? encontra-se disponível no sítio web da OCDE.

Fonte: DGE por indicação de Livresco

sexta-feira, 27 de junho de 2025

Instrumentos de inclusão

O Edulog - Fundação Belmiro de Azevedo apresentou o documento Balanço Anual da Educação 2025 que inclui uma secção sobre "Instrumentos de inclusão" (pp. 94 a 96).

O sistema educativo português tem reforçado a abrangência dos instrumentos de apoio a alunos com necessidades educativas específicas (NEE).

Existiu um esforço muito significativo durante a última década de aumentar a despesa com a educação inclusiva de crianças com necessidades especiais, com aumentos de despesa nominal de 50% nos últimos anos. O sistema educativo português tem assim vindo a alargar o alcance das medidas de apoio dirigidas a alunos com dificuldades de aprendizagem, num movimento que se intensificou entre 2020/21 e 2022/23. Este reforço decorre em parte da aplicação do Decreto-Lei n.º 54/2018, que introduziu uma nova abordagem centrada na identificação e superação de obstáculos à inclusão, independentemente da existência de diagnóstico formal. Como resultado, tem-se registado um aumento do número de alunos apoiados e uma subida da taxa de prevalência, sobretudo no ensino não superior.


Essa prevalência é mais elevada no 3.º ciclo, o que poderá sinalizar um momento de agravamento ou de maior visibilidade das dificuldades escolares, à medida que aumentam as exigências curriculares e de desempenho. Em alternativa, pode também sugerir que as intervenções aplicadas nos ciclos anteriores foram insuficientes ou perderam eficácia ao longo do tempo. Já o menor número de casos no ensino secundário poderá dever-se a uma multiplicidade de fatores, entre os quais se incluem o abandono escolar precoce ou a menor capacidade de resposta das escolas. Assim, embora os dados apontem para uma expansão dos mecanismos de apoio, importa continuar a interrogar a sua consistência, continuidade e impacto real nos percursos dos alunos. Neste contexto, poderá justificar-se uma atenção acrescida ao reforço das intervenções precoces, reconhecendo o potencial das primeiras aprendizagens na criação de condições para progressões mais sustentadas ao longo da escolaridade, numa lógica em que aprender facilita aprender.

No ensino superior também se observou um crescimento significativo do número de estudantes com NEE – mais do triplo em 5 anos, sobretudo nas instituições públicas e no subsistema politécnico. Este aumento poderá refletir uma conjugação de fatores, incluindo uma maior sensibilização institucional, o alargamento da definição de NEE e a crescente legitimação da solicitação de apoios por parte dos estudantes. A predominância nos politécnicos pode também estar relacionada com a sua maior diversidade sociológica e flexibilidade organizacional.


No que respeita ao universo de docentes dedicados ao ensino especial, verifica-se uma clara concentração nos principais centros populacionais do país. Em 2022/23, os dez concelhos com maior número destes docentes localizavam-se sobretudo nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto. Esta distribuição acompanhava a maior densidade populacional e a elevada procura por respostas educativas diferenciadas nestas regiões urbanas, onde se registam também níveis acrescidos de complexidade social e diversidade de necessidades educativas. Adicionalmente, a concentração destes profissionais nas grandes cidades pode refletir não só o volume de alunos abrangidos, mas também a maior capacidade das redes escolares urbanas para criar e manter ofertas especializadas, respondendo assim de forma mais adequada aos desafios colocados pela inclusão e pela qualificação dos jovens.

quarta-feira, 25 de junho de 2025

LEGO melhora a matemática e a capacidade espacial na sala de aula

Uma simples atividade na sala de aula que envolva um clássico da infância, o LEGO, pode melhorar as capacidades matemáticas e espaciais das crianças, levando os investigadores a pedir aos decisores políticos que alterem os currículos escolares e o desenvolvimento profissional dos professores.

Um novo estudo, conduzido pela Universidade de Surrey, testou a incorporação da construção LEGO no currículo de ensino diário, conduzindo a melhorias tangíveis e aumentando as capacidades dos alunos com idades entre os seis e os sete anos.

O estudo, que envolveu 409 crianças de escolas de Surrey e Portsmouth, demonstrou que o programa de seis semanas Spatial Cognition to Enhance mathematical learning (SPACE) - em que os professores conduziram atividades baseadas em LEGO - resultou em melhorias acentuadas nas capacidades de rotação mental das crianças (a capacidade de visualizar e manipular objetos na sua mente) e no desempenho em matemática.

A Professora Emily Farran, Professora de Desenvolvimento Cognitivo na Universidade de Surrey e principal autora do estudo, afirmou:

"Há já algum tempo que sabemos que o raciocínio espacial e a matemática estão intimamente ligados, mas a maior parte do treino espacial tem sido realizado em laboratórios. O nosso estudo mostra que o treino espacial ministrado pelos professores na sala de aula é eficaz, com resultados positivos para os seus alunos".

O programa SPACE envolveu a formação de professores sobre a importância do raciocínio espacial e, através de um folheto com instruções visuais, sobre como orientar os seus alunos através de exercícios estruturados de construção LEGO. Os professores foram encorajados a levar os alunos a pensar espacialmente, por exemplo, a visualizar e a manipular mentalmente os blocos, promovendo as suas competências espaciais.

A Professora Camilla Gilmore, Professora de Cognição Matemática na Universidade de Loughborough e coautora do estudo, comentou

"Abordar o insucesso escolar e reduzir as lacunas de desvantagem em matemática é um desafio permanente para os educadores e decisores políticos. Os resultados deste estudo foram claros - as crianças que participaram no programa SPACE revelaram melhorias significativas nas suas capacidades espaciais e matemáticas em comparação com as que receberam instrução normal. Isto sugere que atividades espaciais simples e práticas podem ter um impacto poderoso na aprendizagem e constituem uma via importante para melhorar os resultados das crianças e o seu gosto pela matemática.

O Professor Farran acrescentou:

"Esta investigação realça a importância do raciocínio espacial no ensino da matemática. Ao incorporar actividades espaciais no currículo, estaremos a equipar a próxima geração para responder às exigências acrescidas de pensamento crítico, resolução de problemas e utilização de dados decorrentes da evolução tecnológica e da IA."

As intervenções espaciais, como o SPACE, também demonstraram apoiar a inclusão, em particular das crianças de meios desfavorecidos e das crianças com Necessidades Educativas Especiais e Deficiências (NEE). De facto, as crianças de meios desfavorecidos apresentam frequentemente maiores ganhos em termos de competências matemáticas em comparação com os seus pares, o que sugere que as oportunidades de pensar e trabalhar espacialmente podem contribuir para colmatar as lacunas de desempenho.

Traduzido com a versão gratuita do tradutor - DeepL.com

Fonte: EurekAlert por indicação de Livresco

quinta-feira, 19 de junho de 2025

Do virtual ao real: Ferramentas digitais para uma educação inclusiva

As salas de aula portuguesas espelham a diversidade da nossa sociedade, refletindo o aumento do número de imigrantes de múltiplas nacionalidades que Portugal tem acolhido.

Porém, para além do impacto produzido pelo aumento quantitativo, importa destacar a alteração do perfil de uma percentagem significativa dos migrantes, que são agora oriundos de países onde o português não é a língua nativa.

Este novo contexto gera desafios complexos nas nossas escolas, pois as dificuldades de comunicação e compreensão linguística limitam tanto a aprendizagem quanto a integração plena no meio escolar e social.

No entanto, a diversidade em sala de aula vai além das variações linguísticas. Qualquer turma é, por natureza, heterogénea, integrando alunos com ritmos de aprendizagem distintos, backgrounds educativos variados, diferentes estilos de aprendizagem e, em alguns casos, necessidades educativas específicas que requerem abordagens pedagógicas diferenciadas. Garantir que cada um destes perfis encontra respostas adequadas é crucial para o sucesso educativo de todos.

Como podemos, então, assegurar uma educação verdadeiramente inclusiva neste contexto multifacetado? A resposta não é simples, mas a tecnologia pode ser parte da solução.

Antes de apresentar propostas, a LeYa auscultou professores de todo o país, constatando que os maiores desafios enfrentados pelos docentes se relacionam com o desconhecimento da língua portuguesa por parte de um número significativo de alunos estrangeiros e com o trabalho de adaptação de recursos didáticos, por parte dos docentes, à diversidade de ritmos, estilos e necessidades específicas dos alunos.

Para apoiar os professores nestes desafios complexos, avançámos com a integração e o desenvolvimento de ferramentas e soluções digitais e, em simultâneo e de forma sinérgica, com a criação de novos componentes para os projetos escolares.

No que diz respeito à barreira linguística, disponibilizámos na Aula Digital (a Plataforma de Educação da LeYa) uma ferramenta de tradução instantânea que permite converter para mais de 120 idiomas os textos dos manuais, dos cadernos de atividades e dos recursos digitais que incluam texto, facilitando o processo de aprendizagem dos alunos que não dominam o português. Complementarmente, disponibilizámos legendas nos vídeos e animações de exposição de conteúdo (disponíveis em português e nas dez línguas estrangeiras mais faladas em Portugal).

Para responder aos diferentes perfis dos alunos, e para além da oferta digital “tradicional” que acompanha os projetos escolares, produzimos manuais e cadernos interativos que, para além das ferramentas de tradução já mencionadas, integram os recursos digitais (vídeos, animações, sínteses, etc.) junto ao respetivo conteúdo e apresentam versões interativas dos exercícios (com dicas orientadoras e correção automática).

Em sala de aula, este tipo de ferramenta dá ao professor a flexibilidade de poder selecionar exercícios ou recursos digitais específicos para determinados alunos (respondendo às áreas em que apresentam maior dificuldade ou selecionando tipologias que melhor se ajustam ao estilo de aprendizagem pretendido) – para além de apresentarem outras vantagens, como poupar tempo, por exemplo, na correção dos exercícios.

No estudo autónomo dos alunos, a diversidade de recursos multimédia é igualmente um complemento dinâmico do manual e ajustado a diferentes estilos de aprendizagem e de necessidades específicas.

Nesta dimensão, importa ainda referir a disponibilização, em formato físico e digital, de Manuais Inclusivos (versões simplificadas dos manuais, com diferentes níveis, adaptadas para alunos com necessidades educativas específicas) e Fichas de Trabalho Multinível, aumentando ainda mais o leque de recursos ao dispor dos docentes, permitindo-lhes construir percursos de aprendizagem personalizados para os alunos.

A inclusão não é uma utopia. É um desafio exigente, mas alcançável, em que as ferramentas digitais, se usadas com intenção e integradas numa visão pedagógica clara, são aliadas poderosas, com imenso potencial para ajudar a construir uma escola mais real, mais justa e mais preparada para acolher cada aluno.

Pedro Gentil

Fonte: Tek Notícias por indicação de Livresco