sábado, 30 de novembro de 2019

A problemática do rácio de alunos por docente de educação especial

Uma das questões recorrentes, sobretudo em encontros com docentes de educação especial, em que se abordam práticas e experiências pedagógicas, incide no rácio de alunos por professor. 

Posso testemunhar que esta questão já foi colocada, por escrito, à anterior Secretária de Estado Adjunta e da Educação, não tendo obtido qualquer resposta. De igual modo, foi colocada por telefone, tendo a resposta sido a mesma, ou seja, não existe.

No entanto, existem rácios por escolas, tal como comprova o exemplo real que passo a descrever. O quadro de agrupamento de escolas contempla quatro docentes de educação especial. Um lugar foi criado e preenchido no último concurso externo sem ter sido solicitado. No início do presente ano escolar, aquando da indicação de necessidades, foram solicitados dois docentes de educação especial para substituir dois ausentes: um por desempenhar outras funções e outro por ter sido colocado em mobilidade por doença num agrupamento de escolas diferente. Neste processo, o agrupamento de escolas foi contactado telefonicamente por serviços da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares para explicar o pedido de dois docentes quando, de acordo com as determinações internas da Secretária de Estado Adjunta e da Educação, esta unidade orgânica teria apenas direito a dois docentes de educação especial. 

Logo à partida, existe um contrassenso. O agrupamento de escolas possui quatro docentes de educação especial no seu quadro, cujas vagas foram criadas e preenchidas pelo Ministério da Educação, mas só tem direito efetivo a dois. Como é possível haver dois rácios diferentes, sendo um para o quadro de agrupamento e outro para o desempenho efetivo de funções docentes? Como são apurados estes rácios? Quais os critérios tidos em conta? Trata-se de questões ainda sem resposta divulgada. 

O rácio de alunos por docente de educação especial não pode ser apurado numa simples e fria equação matemática. Cada aluno tem a sua singularidade e, como tal, requer um tipo de apoio e ou acompanhamento específico. Existe um conjunto diversificado de variáveis que condicionam a distribuição de serviço destes docentes, como a título de exemplo: situação específica do aluno, designadamente, as suas necessidades; ciclo educativo que aluno frequenta, porque na educação pré-escolar e ou no primeiro ciclo do ensino básico, a prática e a organização docente são diferentes dos restantes ciclos e níveis educativos; distribuição geográfica dos alunos pelas diferentes escolas da área de abrangência do agrupamento; intervenção pedagógica individual ou em pequeno grupo;… Neste contexto, apregoar atrocidade que um docente de educação especial tem à sua responsabilidade três alunos e outro possui vinte pode ser uma falácia se não atendermos à devida contextualização. 

A Direção-Geral de Estatística da Educação e Ciência disponibiliza dados nacionais e por NUTS II (Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos) que fornecem uma perspetiva fria da situação sobre o rácio de alunos por docente de educação especial. Assim, tendo por referência os dados de 2015/2016, 2016/2017 e 2017/2018 sobre o número de docentes de educação especial nas escolas públicas com horário completo e o número de alunos com necessidades educativas especiais, o rácio médio destes três anos letivos é de aproximadamente 10,5 aluno por docente, mais precisamente 10,52159. 

Por curiosidade, existe alguma ligeira volatilidade entre as regiões do país. Assim, apresenta-se a média de alunos com necessidades educativas especiais por docente de educação especial no ano letivo de 2017/2018 e por NUT II: 

- Norte: 9,813 alunos por docente de educação especial; 

- Centro, 10,269 alunos por docente de educação especial; 

- Área Metropolitana de Lisboa, 11,555 alunos por docente de educação especial; 

- Alentejo, 10,573 alunos por docente de educação especial; 

- Algarve, 11,982 alunos por docente de educação especial. 

Os números, descontextualizados, valem o que valem!

sexta-feira, 29 de novembro de 2019

Funções do professor de educação especial... ou inclusiva

O texto que se segue é da autoria de Maria de Fátima Almeida e foi retirado do artigo Como avaliar a prática do professor de educação especial: articular o DL 54/2018, de 6 de julho, com os art.º 16.º e 19.º do Decreto Regulamentar n.º 26/2012, de 21 de fevereiro, publicado no revista Gestão E Desenvolvimento (27), páginas 229 a 255. PDF



O Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, um dos normativos que mereceu o louvor da Associação Australiana All Means All por ser considerado um dos marcos no caminho da escola e da sociedade para a Inclusão, dá ao professor de Educação Especial um grande protagonismo, muito na linha do previsto no Despacho Conjunto n.º 198/99, de 3 de março, e agora reforçado:

(i) Enquanto dinamizador, articulador (com os restantes intervenientes em todo o processo, papel mencionado, a título de exemplo, no art.º 11º) e especialista. 

(ii) É também no art.º 11.º que fica clara a importância deste professor na operacionalização do Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA), afirmando-se, no n.º 4, que “O docente de Educação Especial, no âmbito da sua especialidade, apoia, de modo colaborativo e numa lógica de corresponsabilização, os demais docentes do aluno na definição de estratégias de diferenciação pedagógica, no reforço das aprendizagens e na identificação de múltiplos meios de motivação, representação e expressão”. 

(iii) A legislação prevê para este docente um papel central na implementação de todas as medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão no geral (art.º 6.º). O art.º 8.º - medidas universais -, com a redação dada pela Lei n.º 116/2019, de 13 de setembro, prevê agora que “A aplicação das medidas universais é realizada pelo docente titular do grupo/turma e, sempre que necessário, em parceria com o docente de Educação Especial, enquanto dinamizador, articulador e especialista em diferenciação dos meios e materiais de aprendizagem e de avaliação.” Ou seja, fica agora claro que a participação do professor de Educação Especial também tem lugar no âmbito da implementação das medidas universais. 

(iv) Deve ser um dos principais intervenientes da medida seletiva Apoio Psicopedagógico (alínea c), art.º 9.º, no âmbito da qual – como defendemos – deverá trabalhar áreas causais das diversas problemáticas que obstam à conquista de sucesso escolar. 

(v) Na Equipa Multidisciplinar de Apoio à Educação Inclusiva (EMAEI), tem de estar obrigatoriamente um professor de Educação Especial (art.º 12.º); consideramos, contudo, que este número é muito reduzido para a importância que este professor assume no contexto deste desígnio de inclusão, pelo que, e aproveitando a abertura na Lei n.º 116/2019, de 13 de setembro, que prevê no n.º 4 do art.º 12.º que “Os elementos elencados no número anterior podem ser reforçados de acordo com as necessidades de cada escola”, faz sentido integrar mais professores de Educação Especial na EMAEI. 

(vi) O art.º 13.º refere-se explicitamente à presença do professor de Educação Especial no Centro de Apoio à Aprendizagem, um recurso organizacional que a Lei n.º 116/2019, de 13 de setembro, vem esclarecer que não se trata de um espaço previsto para todos os alunos – informação que foi veiculada nas diversas formações sobre este normativo legal -, mas que será voltado para alunos a quem é dada prioridade na matrícula, como referido no ponto 4 desta Lei. 

(vii) São ainda os professores especialistas nas escolas de referência no domínio da visão (art.º 14.º) e para a educação bilingue (art.º 15.º). 

(viii) Para além disso, é referido neste Decreto-Lei que a participação dos centros de recursos de tecnologias de informação e comunicação nas avaliações deve ser articulada, entre outros intervenientes, com o docente de Educação Especial (art.º 17.º). 

O Decreto-Lei n.º 54/2018, num ato de culpa ao qual é alheio, abriu uma dúvida incompreensível: como se subentende que o conceito de Educação Especial cessou agora, substituído pelo de Educação Inclusiva (como se este conceito fosse novo), a designação professor de «Educação Especial» foi substituída, talvez mais numa fase inicial, por professor de «Educação Inclusiva». Esta transferência advém da dificuldade em haver um distanciamento relativamente ao pressuposto anterior, o da Educação Especial versus Educação Regular. Cessando esta dicotomia com o Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, todos os professores são de Educação Inclusiva. Mantém-se, como sabemos, a designação do nome do grupo de recrutamento de cada professor (Professor de Português, etc.) e, consequentemente, a designação «professor de Educação Especial», até haver, se tal acontecer, necessidade de alterar este termo. 

O Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, não especifica o papel do professor de Educação Especial muito para além do supramencionado, e o manual de apoio à prática também deixa ao critério de cada escola esta operacionalização. 

Fica, apesar disso, clara a importância que é atribuída a este docente. Ficam, por outro lado, omissas respostas a questões de cariz mais prático, como, entre muitas outras, as seguintes: 

(i) Apesar de, para a aplicação de medidas seletivas (art.º 9.º) e adicionais (art.º 10.º), ser referido que o Diretor da Escola/Agrupamento de Escolas pode solicitar recursos adicionais, se os que existem não forem suficientes – entre eles, subentende-se professores de Educação Especial -, quais são os critérios que justificam esse pedido (número de alunos que estão em acompanhamento por parte deste docente?); 

(ii) Quando se advoga que a intervenção deste docente, e qualquer intervenção em geral, deve ter lugar preferencialmente dentro da sala de aula, está a incluir-se a intervenção especializada que compete a este professor? É que – e talvez, mais uma vez, numa culpa à qual a lei poderá ser alheia – as interpretações que têm sido veiculadas vão no sentido de toda e qualquer intervenção ter lugar em sala de aula. É esperado que o professor de Educação Especial ministre conteúdos curriculares? A resposta deverá ser «claro que não» e, nesse caso, questiona-se: em que momento da aula o professor de Educação Especial irá trabalhar as áreas causais em défice do aluno? 

(iii) O tempo para colaboração com os docentes do aluno é considerado na componente letiva ou não letiva? 

(iv) Para quando a indicação de um número aproximado recomendado de alunos por docente de Educação Especial em apoio direto? É que há escolas em que os professores de Educação Especial acompanham 5 alunos ou menos e há outras em que existe um rácio de 20 e até 30 alunos por professor de Educação Especial. Ou o professor de Educação Especial ficará afeto a turmas, como já está a ser prática em algumas escolas, olvidando-se ou reduzindo-se o seu papel na intervenção de áreas específicas (causais)? 

O professor de Educação Especial é um recurso humano escasso nas escolas. Se este recurso for canalizado para a sala de aula, num papel que, frequentemente, não se distancia do que um assistente operacional/tarefeiro faria (ver se o aluno passa o que está no quadro, se comporta, compreende o que está a ser dado), não haverá ninguém na escola, para além de, em alguns casos, o Psicólogo Escolar – um recurso ainda mais escasso - que trabalhe as áreas causais em défice que justificam as dificuldades que os alunos estão a revelar (se essas áreas causais não estiverem diretamente relacionadas com conteúdos curriculares) – e tal engrossará os gabinetes privados de apoio especializado, no caso dos alunos cujas famílias tenham sustentação económica para tal. Mas saber isto implica não proferir afirmações como as que também se têm ouvido, segundo as quais o diagnóstico não é importante com a nova legislação. Mais do que afirmar-se que não é importante, apela-se a que se ignore o diagnóstico. Atenção: afirmar-se que, com esta legislação, não é necessário haver um diagnóstico para se iniciar uma intervenção é verdade (ou seja, não é necessário esperar pelo diagnóstico para que um aluno possa usufruir de medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão). Contudo, afirmar-se que o diagnóstico não é necessário nem importante é ignorar-se referências como, entre muitas outras, Allal (2001). O diagnóstico – encontrar as causas – é fundamental. Por exemplo, nas dificuldades de leitura e escrita, as causas podem ser diversas (pode, entre muitas outras, tratar-se de uma dislexia e disortografia). E só sabendo as causas se pode perceber como intervir (nos diversos contextos). As causas poderão ser défices em pré-requisitos curriculares, mas também poderão ser défices em áreas como a atenção, a consciência fonológica, a memória (vários tipos de memória) e muitíssimas mais. Se se souber isto, percebe-se a importância de um trabalho centrado nas áreas causais, da competência, entre outros professores e técnicos especializados, do professor de Educação Especial, sendo que muito desse trabalho, o grosso desse trabalho, não poderá ter lugar em contexto de sala de aula.

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

2018: cimentar o compromisso com a Educação Inclusiva

O Conselho Nacional de Educação acabou de lançar o documento "Estado da Educação 2018" (edição de 2019) que configura uma organização distinta da de relatórios anteriores, estruturada em três partes, todas em torno da ideia de mudança na Educação. Deste documento, retirou-se e republica-se abaixo o texto "2018: cimentar o compromisso com a Educação Inclusiva", da autoria de David Rodrigues, conselheiro deste organismo, patente nas páginas 290-295.

Introdução 

A ideia de que os alunos com dificuldades e/ou condições de deficiência deveriam ser educados conjuntamente com os seus pares é uma ideia bem consistente e consolidada em Portugal. Ainda no tempo da Ditadura se iniciaram as primeiras “experiências” de integração de alunos com deficiências em escolas do ensino regular. A Revolução, de 25 de abril de 1974, proporcionou um terreno fértil para se pensar e levar à prática inovações no campo pedagógico. Entre estas inovações e mudanças inspiradas pelo ambiente de renovação, a integração de alunos com deficiências e dificuldades assistiu a um período de florescimento em que, de forma acelerada, se verificaram significativos progressos. 

Quando em junho de 1994 foi proclamada a Declaração de Salamanca pela UNESCO, Portugal foi um dos signatários deste documento e, pode-se afirmar, que os valores e as práticas prescritas nesta Declaração tinham tido já, em grande parte, a sua consagração na legislação que tinha sido publicada em Portugal três anos antes (no Decreto-Lei nº 319/91, de 23 de agosto). A Declaração de Salamanca veio potenciar e encorajar em Portugal a continuação de reformas necessárias para prosseguir estas políticas a um nível diferente: o da inclusão. A Declaração de Salamanca consagrava as escolas regulares como os ambientes mais indicados para a educação de todos os alunos, incluindo alunos com condições de deficiência. Para que esta “universalidade” de acesso e adequação fosse possível, eram preconizadas alterações nas estruturas educativas. Assim, não seria só o aluno que arcaria com o ónus de ter de se adaptar às regras e funcionamento da escola, mas a escola teria também a obrigação de se modificar de forma a poder prover as respostas educativas que cada aluno precisava e tinha direito. 

Em 2008 foi publicado o Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de janeiro, que explicitamente afirma no seu preâmbulo que “Um aspeto determinante dessa qualidade é a promoção de uma escola democrática e inclusiva, orientada para o sucesso educativo de todas as crianças e jovens. Nessa medida importa planear um sistema de educação flexível, pautado por uma política global integrada, que permita responder à diversidade de características e necessidades de todos os alunos que implicam a inclusão das crianças e jovens com necessidades educativas especiais no quadro de uma política de qualidade orientada para o sucesso educativo de todos os alunos.” Esta lei permitiu às escolas encontrar um enquadramento para os alunos com necessidades educativas especiais (NEE). Este enquadramento era maioritariamente feito através do apoio à frequência destes alunos no contexto da sala de aula e, para casos considerados mais complexos, o estabelecimento de “Unidades de Apoio” e de “Currículos Específicos Individuais”. Era também prestada uma atenção particular ao processo de transição da escola para outros contextos, através dos Planos Individuais de Transição. Consideramos que esta legislação, juntamente com outras medidas legislativas (entre as quais a criação de grupos de recrutamento para Professores de Educação Especial, em 2006) permitiu um considerável avanço nos processos de inclusão e consagrou, de forma inequívoca, que a escola regular, ao recrutar múltiplas possibilidades de resposta podia efetivamente cumprir o desiderato de Salamanca tornando-se o ambiente mais adequado para a educação de todos os alunos. 

O XXI Governo Constitucional encarou como uma prioridade a reforma desta lei. Na verdade, o impulso para a sua modificação tinha já sido dado pelo Governo anterior que criou um grupo de trabalho para estudar as reformas que eram sentidas como necessárias na lei. Várias reflexões apontavam para a necessidade desta reforma, nomeadamente o estatuto dos alunos com Currículos Específicos Individuais e a certificação dos estudos dos alunos que usufruíam de medidas de Educação Especial. 

A 5 de julho de 2017, o Governo colocou em discussão pública um texto que serviria de base para a redação de uma futura lei. Esta discussão pública foi inicialmente programada para um mês, mas por pedido de diferentes entidades e, sobretudo, considerando o período de férias nas escolas, foi alargada para três meses. Este texto foi abundantemente discutido em todo o país, tanto em iniciativas do próprio Governo como de associações profissionais, sindicatos, agrupamentos de escolas e muitas instituições da sociedade civil. 

No âmbito desta consulta pública foi pedido pelo Governo um parecer ao Conselho Nacional de Educação, parecer este que foi elaborado e aprovado em sessão plenária do Conselho a 4 de abril de 2018. Este parecer, tal como os outros pareceres do Conselho, é do domínio público. Passado um ano sobre a sua colocação em discussão pública – a 6 de julho de 2018 – foi publicado o Decreto-Lei nº 54/2018 – Regime Jurídico da Educação Inclusiva no âmbito da Educação Pré-Escolar e do Ensino Básico e Secundário – entrando imediatamente em vigor

O que traz de novo o Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho 

O Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho, é um diploma que assume um caráter bem distinto da legislação que veio substituir. São notórias as influências de documentos internacionais, bem como as referências à reflexão sobre a já dilatada experiência disponível no país sobre a Educação de alunos com deficiências ou dificuldades em meios regulares. Os documentos internacionais (nomeadamente os emitidos pela UNESCO, pela OCDE, pela OEI, etc.) apontavam há muito para a necessidade de esbater as fronteiras artificiais que eram estabelecidas entre alunos “com NEE” e “sem NEE”, entre a “Educação Especial” e a “Educação Regular”. Encorajava-se a emergência de modelos pedagógicos flexíveis permitindo que a aprendizagem e a educação de todos os alunos se pudesse passar em conjunto, valorizando as suas capacidades e minimizando as suas dificuldades. Procurava-se acabar com a barreira entre os “bons” e os “maus” alunos, realçando que a adoção de modelos flexíveis de currículo poderia beneficiar todos os alunos para progredirem segundo as suas capacidades e interesses. A experiência nacional apontava também para a necessidade de não tornar as “Unidades” em “escolas especiais” dentro da escola regular e dar maior visibilidade e importância às experiências pedagógicas que realçavam a importância de encarar a educação de todos os alunos sem uma separação – e por vezes mesmo hipertrofia – da chamada Educação Especial. 

Apontaríamos sucintamente quatro aspetos que se destacam no Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho 

Antes de mais o próprio âmbito. A designação do diploma é de “Regime Jurídico da Educação Inclusiva”, o que o distingue claramente das legislações anteriores que consideravam a “Educação Especial”. Considera-se assim que não existem alunos de “Educação Especial” e alunos de “Educação Regular”, sendo que todos os alunos são considerados como tendo necessidades diferentes, mas todos pertencentes à mesma escola. No artigo 3º do Decreto-Lei são explicitamente citados como princípios orientadores a: a) Educabilidade universal, isto é, a assunção de que todas as crianças e alunos têm capacidade de aprendizagem e de desenvolvimento educativo; b) Equidade, a garantia de que todas as crianças e alunos têm acesso aos apoios necessários de modo a concretizar o seu potencial de aprendizagem e desenvolvimento; c) Inclusão, o direito de todas as crianças e alunos ao acesso e participação, de modo pleno (…). Seria o que poderíamos chamar uma educação para todos e com todos. Surgiram algumas críticas sobre a incoerência desta posição dado que, ainda que não houvesse formalmente “Educação Especial”, continuavam a ser citados os “Professores de Educação Especial”. Esta é certamente uma questão que precisaria de mais debate, mas algumas posições ao nível internacional (cf: Lani Florian no International Journal of Inclusive Education, 2017) chamam a atenção para o facto de o processo de inclusão ser muito mais lato na escola, não abrangendo só os alunos com condições de dificuldades ou deficiência. Estes alunos poderiam ser especificamente apoiados por professores com a designação de “Professores de Educação Especial” ou de “Necessidades Educativas Especiais”. 

Em segundo lugar, este diploma propõe uma pirâmide de serviços que inclui medidas universais, medidas seletivas e medidas adicionais. No número 1 do artº 6º aponta-se que: as medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão têm como finalidade a adequação às necessidades e potencialidades de cada aluno e a garantia das condições da sua realização plena, promovendo a equidade e a igualdade de oportunidades no acesso ao currículo, na frequência e na progressão ao longo da escolaridade obrigatória. Os alunos com dificuldades devem usufruir das medidas que são necessárias – e de complexidade crescente – em função das suas dificuldades. As medidas universais são recrutadas fundamentalmente entre as respostas diversificadas e flexíveis que estão no âmbito da escola, enquanto que as medidas seletivas e adicionais são somente acionadas quando a especificidade e complexidade das respostas exige um nível mais aprofundado e personalizado de provisão. É de prever que a grande maioria de medidas implementadas no âmbito deste Decreto-Lei sejam as medidas universais. Numa pesquisa realizada por nós, em dois agrupamentos, encontramos que, de todos os alunos que precisavam de apoio, existiam mais de 90% de alunos com medidas universais. 

Em terceiro lugar esta lei propõe a criação de “Equipas Multidisciplinares de Apoio à Educação Inclusiva” (EMAEI). Estas equipas são efetivamente o órgão de coordenação de todas as iniciativas e trabalho inclusivo na escola. Compete a estas equipas – maioritariamente constituídas por elementos da escola – caracterizar as dificuldades que os alunos possam apresentar, delinear as respostas necessárias e acompanhar e apoiar a execução destes planos. O Decreto-Lei atribui a estas equipas as seguintes competências: a) Sensibilizar a comunidade educativa para a educação inclusiva; b) Propor as medidas de suporte à aprendizagem a mobilizar; c) Acompanhar e monitorizar a aplicação de medidas de suporte à aprendizagem; d) Prestar aconselhamento aos docentes na implementação de práticas pedagógicas inclusivas; e) Elaborar o relatório técnico-pedagógico previsto no artigo 21º e, se aplicável, o programa educativo individual e o plano individual de transição previstos, respetivamente, nos artigos 24º e 25º; f) Acompanhar o funcionamento do centro de apoio à aprendizagem. Ainda que de forma muito inicial, é possível desde já encontrar diferenças muito significativas no funcionamento destas equipas. Deste funcionamento depende – e decisivamente – o sucesso dos esforços de Inclusão na escola, dado que pela sua constituição e pelas suas atribuições estas EMAEI são um verdadeiro centro nevrálgico de todos os processos que podem conduzir à participação e sucesso de alunos com dificuldades ou deficiências. 

Em quarto lugar, o Decreto-Lei considera a criação de “Centros de Apoio à Aprendizagem” (CAA). Só mais tempo de experiência e reflexão poderá aquilatar da efetiva pertinência destes Centros que, na redação do diploma, têm as seguintes atribuições: a) Apoiar a inclusão das crianças e jovens no grupo/turma e nas rotinas e atividades da escola, designadamente através da diversificação de estratégias de acesso ao currículo; b) Promover e apoiar o acesso à formação, ao ensino superior e à integração na vida pós-escolar; c) Promover e apoiar o acesso ao lazer, à participação social e à vida autónoma. Na letra da lei podemos encontrar uma grande liberdade para a mobilização dos meios que podem integrar estes CAA. Existem escolas que consideram que toda a escola, isto é, todos os meios da escola podem e devem ser mobilizados no âmbito dos CAA. Numa escola da zona do Porto foi-nos dito que a biblioteca e o refeitório são partes deste CAA, dado que é em toda a escola que se processam as aprendizagens significativas para a vida dos estudantes. Outras escolas há que mantiveram os modelos de “Unidades” e que, mesmo tendo eventualmente alargado um pouco o seu âmbito, funcionam como uma estrutura de atendimento e apoio específico destinada aos alunos com dificuldades mais complexas. 

Desafios 

É certamente precoce a fixação de áreas, que constituem desafios à organização da escola e da pedagogia que esta legislação implica, no próprio ano em que a legislação é publicada. Para melhor poder prever o impacto que se sente e que se irá desenvolver nas escolas, realizámos entrevistas a dois diretores de escolas (DE1 e DE2) e a dois coordenadores de EMAEI (EM1 e EM2). Ir-nos-emos servir de transcrições destas opiniões “de terreno” para ilustrar os desafios que esta legislação implica. 

Encontramos cinco áreas em que os desafios parecem ser mais relevantes na opinião dos entrevistados: 

1. As atitudes dos professores face a uma escola que não estabelece mais diferença entre os alunos de “Educação Especial” e torna todos os professores – e toda a escola – responsáveis pela educação de todos os alunos, é vista como uma dificuldade. “Os professores dizem que não sabem o que fazer com os alunos, porque não tiveram formação para isso. Se os alunos forem à sala de aula, eles não têm disponibilidade nem conhecimento para trabalhar com eles” (DE1). “Há professores que só aceitam alunos na sala se eles vieram acompanhados de alguém, ou professores de educação especial ou uma auxiliar” (EM2). 

Por outro lado, há escolas em que a EMAEI decidiu empreender trabalho com os professores que vão receber alunos que tenham sido identificados para receber medidas de apoio: “Sensibilizamos e apoiamos alguns professores sobretudo para que eles possam encontrar trabalhos que os alunos possam fazer na aula” (EM1). “Felizmente há professores que estão mais habituados a trabalhar de forma mais personalizada e isso facilita e muito a participação de alunos com dificuldades na aula. Serve mesmo de exemplo e inspiração para os colegas” (EM1). Encontramos assim, uma preocupação generalizada com a capacidade de mudança da escola e dos professores, mas também experiências que procuram romper com algum fatalismo conservador da escola e dos professores. 

2. Possibilidade de realizar trabalho pedagógico diversificado. A inclusão de alunos nas atividades da escola implica necessariamente a diversificação de atividades. Entender o trabalho pedagógico como uma tarefa homogénea que tem por destinatários grupos homogéneos é um forte obstáculo à inclusão. Em várias escolas o corpo docente mostra dificuldades em mudar formas de ensinar e suscitar novas formas de aprender. “O problema é que os professores têm dificuldade em mudar. Mas a verdade também é que existe pouco apoio cada vez que alguém quer fazer algo de diferente. Por vezes há até uma atitude de desincentivo à inovação” (DE2). “Temos procurado que as mudanças na sala de aula não sejam só para os alunos que são identificados como tendo dificuldades, mas que sejam para todos os alunos. Quando isto acontece todos os alunos lucram” (DE2). “Falta formação que ajude os professores a ensinar grupos heterogéneos. Muitas vezes eles nem sabem como se trabalha com grupos e para que é que isso serve”(EM1). 

Torna-se claro que há muito trabalho a fazer para que a interação pedagógica seja feita de forma a chegar e a ser útil a todos os alunos sem deixar nenhum para trás. Ressalta-se a importância que tem a formação e a criação de modelos cooperativos que apoiem a inovação e permitam sustentar um trabalho pedagógico diversificado. 

3. Apoios exteriores à escola. A criação de Centros de Recursos para a Inclusão (CRI) pelo Decreto-Lei nº 3/2008, de 7 de janeiro, teve por objetivo providenciar apoio de técnicos exteriores à escola, mas essenciais para a habilitação e educação de alunos com condições de deficiência ou dificuldade. Os CRI ficaram responsáveis por providenciar os técnicos necessários para que áreas tão importantes como as terapias pudessem ser enquadradas num contexto educacional. Há algum tempo que se sente a necessidade de rever e re-conceptualizar esta parceria entre os CRI e as escolas. “Estivemos uma parte do ano sem CRI e quando eles vieram tinham um número de horas para nos dar muito inferior àquele que nós achávamos que era essencial”. “Não existe um modelo que permita articular o trabalho dos técnicos do CRI com a escola. É como se fossem entidades completamente distintas” (EM1). “Os técnicos dos CRI são insuficientes e na verdade têm um impacto diminuto na educação das nossas crianças. Para além disso são muito mal pagos, o que não ajuda à sua motivação” (EM2). “O que preferíamos era que a escola pudesse contratar ela mesma os técnicos de que precisa, mas temos encontrado muitos obstáculos” (DE2). 

Vemos que a provisão dos meios que as escolas (e as EMAEI) consideram essenciais para apoiar a educação de alunos com dificuldades ou deficiências é, regra geral, muito insuficiente: chega tarde e em quantidade bem inferior ao que tinha sido determinado. É certamente um desafio a enfrentar tornar estes apoios mais efetivos e pensar mesmo em novos modelos de fazer chegar de forma mais expedita e adequada estes meios às escolas. 

4. Um outro desafio é a formação contínua. Foram levantados vários temas a ser tratados: a) o âmbito da formação; b) a quantidade da formação, c) os conteúdos da formação e d) certificação da formação. Várias opiniões: relativamente à alínea a) “A formação devia ser para toda a escola. Muitos assistentes operacionais que lidam mais tempo com os alunos com dificuldades, não têm formação nenhuma e deviam ter” (EM1). “Precisávamos que algumas famílias fossem mais comprometidas, de forma a saberem o que estamos a fazer e porquê” (DE1); em relação à alínea b): “Precisamos de mais formação. Muitos centros de formação não oferecem cursos sobre inclusão e deviam, porque todos lidamos com ela” (EM1). “Não sei o que se passa, mas há pessoas que já fizeram três e mais cursos sobre o “54” e dizem que ainda não se sentem preparadas” (EM2); sobre a alínea c) “Muitos conteúdos de formação são muito teóricos. Já que a formação é aqui na escola, então que fosse sobre casos da escola” (EM1). “Era preciso que a formação trabalhasse com as pessoas, de forma a elas conseguirem construir materiais para ajudar a flexibilização do currículo e dos conteúdos” (EM1) e sobre a alínea d) “Não se entende porque é que as ações de formação sobre inclusão não são consideradas para todos os docentes. Se forem só consideradas para os Professores de Educação Especial está a passar-se a mensagem que a Inclusão é só da responsabilidade deles” (DE2). 

A melhoria destes aspetos da formação parece configurar um importante desafio no sentido em que é reconhecida a sua importância para a mudança de atitudes e práticas. Trata-se talvez de reforçar o financiamento e direcionar o esforço que tem sido feito na formação contínua para a tornar mais eficaz. 

5. Um último desafio que permanece é a avaliação. A avaliação é frequentemente vista como o grande obstáculo à adoção de práticas inclusivas. Encontra-se ainda muito presente a ideia de que para haver justiça na avaliação o processo deve ser exatamente igual para todos, para permitir que sobressaiam as diferenças de mérito entre os alunos. Esta preocupação com a avaliação é comum e chega até a influenciar as práticas e os valores na educação pré-escolar quando ainda se encontram bem longe as provas aferidas e nacionais de avaliação. O facto do Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho, implicar a certificação de todos os alunos é um convite a pensar de novo qual a finalidade e quais os modelos de avaliação que se podem usar. Encontramos já, em muitas escolas, modelos de avaliação com referência a critério e avaliação formativa em detrimento dos tradicionais modelos de avaliação sumativa e normativa. Em termos metodológicos encontramos escolas que têm procurado realizar avaliações com modelos diversos (Ex: portfólios, avaliações orais, avaliações grupais, etc.) que têm permitido “desdramatizar” a avaliação que tantas vezes é confundida com classificação e vista como uma estratégia de motivação, de medo ou mesmo de punição. Algumas opiniões: “Logo que se fala em alunos com NEE a primeira pergunta que os professores fazem é como é que os vão avaliar”(DE1), “Já há alguns anos que tivemos um grupo de professores que trabalhou em avaliação através de portfolios e resultou muito bem. O problema é que no ano seguinte já não se fez nada disso” (DE2). “Propomos aos professores que trabalhem com os colegas de forma a encontrar a melhor forma de avaliar o que os alunos efetivamente aprenderam”(EM1). “A avaliação que nos interessa é a que nos ajuda a melhorar os processos de aprendizagem, por isso é mais importante a avaliação que se faz ao longo do ano do que aquela que só se faz no fim. Muita da avaliação é inútil: por exemplo nunca sabemos o que a avaliação permitiu saber sobre o aluno no ano anterior” (EM2). 

A Inclusão como um “work in progress” 

Certamente um dos problemas maiores com que se defronta a Inclusão é a dificuldade de conseguir conjugar e harmonizar todos os meios, todas as competências e oportunidades que se consideram essenciais num determinado momento para o sucesso dos alunos. A Inclusão continua ainda muito conotada com modelos “clínicos” de intervenção. Modelos que advogavam que conhecendo o “diagnóstico” ou a caracterização de cada caso se poderia descortinar imediata e “cientificamente” os conteúdos, as estratégias, as formas de interação e até os gostos de cada aluno. Não seria prudente afirmar que o diagnóstico de uma determinada condição é inútil ou, melhor, que é sempre inútil. Na verdade, existem situações (daremos como exemplo as manifestações de certos tipos de doença mental) em que o conhecimento do diagnóstico pode ajudar e potenciar a eficácia dos modelos de intervenção educativa. Mas não são estes os casos mais prevalentes. A desvalorização do diagnóstico que podemos encontrar no preâmbulo do Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho (“afasta-se a conceção de que é necessário categorizar para intervir. Procura-se garantir que o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória seja atingido por todos, ainda que através de percursos diferenciados, os quais permitem a cada um progredir no currículo com vista ao seu sucesso educativo”) realça que a avaliação mais importante é aquela que todo o corpo docente, com a ajuda de técnicos e da família, deve realizar de forma a identificar os pontos de apoio em que se deve estribar a aprendizagem e a educação. Precisamos por isso de fortalecer o conhecimento, a autonomia e a competência pedagógica, porque é neste terreno que a educação se joga, se perde ou se ganha. Uma outra questão que encoraja as perspetivas clínicas em Educação é o facto de se desenrolarem num quadro de maior previsibilidade. Muitos dos modelos de intervenção, por exemplo, provenientes da neuropsicologia, apontam intervenções específicas para um determinado caso. Estas indicações poderão, sem dúvida, ter a sua utilidade e deverão, sempre que possível, ser tomadas em conta, mas a questão é que os alunos não são educados sozinhos, nem com um só professor. Em suma, precisamos de reforçar uma caracterização fundamentalmente pedagógica que, não podendo prescindir de toda uma informação, aconselhamento e cooperação, por parte de outros técnicos, deve ter como finalidade principal desembocar em práticas pedagógicas adequadas, mas que não esqueçam que o aluno não é um caso isolado, mas um sujeito em contexto. A intervenção educativa desenvolve-se num quadro sistematicamente aproximativo, sintetizado na frase do pedagogo Philipe Perrenoud, “Educar: decidir na dúvida e agir na incerteza”. 

Assim, a Inclusão é um “work in progress”, quer dizer um trabalho que raramente possui um quadro claro sobre o que é “correto” fazer ou não fazer, em que não se conhece e prevê o processo. Por este motivo é tão importante que este trabalho seja sempre desenvolvido com a máxima comunicação e cooperação dentro da escola. A Inclusão não é um fenómeno isolado, delimitado ou pessoalizado. Não é isolado porque não pode existir se só estiverem presentes alunos com condições de deficiência. Hoje em dia, é muito claro que a Inclusão é um valor transversal da escola e que se entrelaça com os valores da participação, dos Direitos Humanos, da equidade e da cidadania. Pensar em Inclusão só quando existem alunos com deficiência é uma grande pobreza, porque retira deste constructo as questões de etnia, de género, de identidade sexual, de nível socioeconómico ou sociocultural, que são absolutamente essenciais para entender uma sociedade complexa. A inclusão não é também um fenómeno delimitado, no sentido em que não tem um lugar. A Inclusão não são os professores de Educação Especial, não são as EMAEI, não são os CAA, não são os CRI, a inclusão é toda a escola e toda a comunidade em que ela existe. Delimitar a inclusão a pessoas ou serviços é um empobrecimento e uma desvalorização da riqueza da inclusão. Por fim, a Inclusão não pode ser pessoalizada. Todos os membros de uma escola têm responsabilidade de promover e defender os valores inclusivos. Encontramos até, e muitas vezes, protagonistas improváveis. Daremos um exemplo, que se passou numa escola na zona de Aveiro: um menino cigano levantou-se em defesa de um menino que não era cigano, verberando uma situação em que ele considerou que o seu colega tinha sido vítima de bullying. É o caso de um “protagonista improvável”, em que uma criança de quem se esperaria uma posição de indiferença ou defesa se dá à coragem de defender um colega seu. A Inclusão não é pois mais de uma pessoa ou de outra, é um património a ser defendido e promovido por todos. 

Inclusão, onde chegamos e onde queremos ir 

Como fica claro, nos números apresentados neste “Estado da Educação 2017”, editado pelo Conselho Nacional de Educação, Portugal desenvolveu ao longo das últimas décadas um trabalho sistemático e constante de promoção da Integração e da Inclusão de alunos com necessidades específicas no ensino regular. Este esforço continuado, que pode ser ilustrado com numerosos marcos legislativos, levou-nos a uma percentagem muito alta – mesmo a nível mundial – de alunos com necessidades específicas, educados em escolas regulares, 99%. Esta percentagem quando citada, suscita reações diversas: para algumas pessoas, trata-se da prova de que um pequeno país com meios muito limitados conseguiu atingir uma percentagem de inclusão rara e meritória; para outros, esta percentagem não passa de um número vácuo, dado que o que é importante considerar são as falhas que este número parece ocultar. Talvez neste caso – não em todos – o mérito esteja em considerar vantagens nas duas posições. Por um lado, Portugal é hoje citado ao nível de organizações internacionais como um caso de sucesso nas suas políticas educativas inclusivas, um país em que a legislação foi carreando um conjunto de medidas que permitiu avanços importantes na Intervenção Precoce e na Inclusão de Alunos no Ensino Regular. Por outro lado, cabe considerar que não interessam números por si só. Estes números têm de ser consistentes com o quotidiano das escolas. E aqui temos muito ainda que avançar se levarmos em consideração a grande carência de recursos, a sua distribuição assimétrica, a necessidade de potenciar a confiança que as famílias depositam no trabalho da escola, enfim, se considerarmos a grande mudança de inovação na organização que a escola for efetivamente capaz de pôr em prática para responder à diversidade. 

Talvez a questão central se jogue entre dois conceitos que são muitas vezes tidos como equivalentes ou mesmo sinónimos, mas que são estruturalmente distintos: a diferença e a desigualdade. 

A Inclusão lida com as diferenças, com todas as diferenças: as dos alunos, as das famílias, as dos professores, enfim… a inclusão assume o valor e a riqueza da diversidade e a complexidade das pessoas, dos grupos e das sociedades. Muito do trabalho “inclusivo” nas escolas é constituído por este esforço de trabalhar com as pessoas a partir de onde elas estão, do que sabem, do que pensam, que atitudes e motivações têm. Pessoas e instituições diferentes a trabalhar com as diferenças. É este certamente um desiderato fundamental da Inclusão. 

Mas não devemos confundir diferença com desigualdade. A desigualdade entre humanos é uma injustiça social. É por esta desigualdade que somos mais ou menos considerados, mais ou menos reconhecidos, onde temos mais ou menos acesso aos bens da sociedade. Por isso a desigualdade é socialmente injusta, porque nem sequer se pode arrogar a ser meritocrática: quem é desigual não o é por algo que tenha feito, mas sim por um conjunto de condições para as quais não fez nada ou quase nada. 

Pensar na Inclusão hoje, depois do Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho, é sobretudo termos a consciência de que temos de saber cada vez mais como trabalhar as diferenças. Trabalhar as diferenças a partir da humanidade, da compreensão, da proficiência de que cada um é capaz e que todos devemos ser capazes de encorajar e assumir. Se não aprendermos mais e melhor a trabalhar com as diferenças, inviabilizamos a inclusão. 

Mas trabalhamos as diferenças com um único objetivo: para que destas diferenças não nasça a desigualdade. Para que as pessoas que têm necessidade de um tratamento diferente do que é estandardizado (todas?), ao não o terem, não serem consideradas inferiores, descartáveis e “menos”. A Educação Inclusiva é, assim, o trabalho pedagógico que se faz para que as diferenças não se convertam em desigualdades

São estas as promessas para que esta nova legislação aponta. Estamos certos que muito trabalho há ainda para fazer de forma a calibrar estas medidas com a sua execução em contextos tão diversos. O Parecer emitido em 4 de abril, pelo Conselho Nacional de Educação, apontava já que a presente lei “espelha avanços conceptuais que têm sido divulgados sobre a Educação Inclusiva. Realçaríamos três destas conceções: i) o comprometimento de toda a escola na missão de educar todos os alunos, ii) a perspetiva de encorajar a diversidade de todas as componentes curriculares – nas quais se inclui a avaliação – de forma a fomentar a participação bem-sucedida de todos os alunos, iii) a ideia de criar na escola um sistema de apoio extensivo a qualquer aluno que, de forma episódica ou permanente, possa dele necessitar para o sucesso do seu percurso escolar”. 

De todos os agentes educativos e decisores políticos espera-se, face a esta legislação, uma atitude inclusiva que, neste contexto, significa acolher a diversidade, tirar o melhor partido dela de forma a podermos ter um sistema educativo alicerçado na equidade, na inclusão e nos Direitos Humanos – e particularmente nos direitos educacionais - de todos os nossos alunos. Direitos Humanos para todos os humanos.

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Trabalhar com um cromossoma a mais

Daniel, Henri, Inês, Luís e Noemi são cinco dos cerca de 15 mil portugueses com Trissomia 21. E são cinco exemplos de como a alteração genética com que nasceram não lhes roubou uma vida profissional.

A banca de trabalho de Daniel Rodrigues está imaculada. A louça chega do restaurante, ele passa-a por água, mete-a na máquina de lavar e não deixa acumular tarefas. "Tudo o que me pedem, eu faço logo. É uma segunda família que eu tenho aqui", garante o ajudante de cozinha, cuja alegria não deixa ninguém indiferente.

Daniel tem 26 anos e chegou ao Hotel Axis Porto, há cerca de dois anos, para fazer um estágio, no âmbito do projeto europeu "Valuable", criado para promover a inclusão profissional de trabalhadores com Perturbação do Desenvolvimento Intelectual (PDI). Há um ano, assinou contrato. Começou na copa, na limpeza de louças, e daí passou para a cafetaria, para fazer reposição nos pequenos-almoços. "Tem vindo sempre a evoluir. Até já faz bolachas, descasca frutas, prepara sobremesas, faz receção de mercadorias e o registo das temperaturas dos equipamentos de frio, por exemplo. Tudo o que outra pessoa faria nas funções em questão", atesta Simão Sá, diretor do hotel. Facto revelado: "O número de reclamações do pequeno-almoço baixou bastante".

Daniel é um dos cerca de 15 mil portugueses com Trissomia 21 (também designada Síndrome de Down). A alteração genética com que nasceu, que faz com que tenha três cromossomas 21, em vez de dois, pode diferenciá-lo na fisionomia e em algumas capacidades cognitivas, mas nem por isso o torna cidadão e trabalhador menos válido. Trabalha a sério, faz descontos, recebe um ordenado no final do mês. É feliz.

No Axis Porto, Daniel não é a única pessoa com Trissomia 21. Noemi Costa, também de 26 anos, é camareira. Está em estágio profissional, mas Simão Sá assegura que "a ideia é que fique com contrato, logo a seguir". "A verdade é que, inicialmente, não tínhamos ideia de contratar. Mas acabámos por sentir que eles os dois eram mais-valias para nós", recorda o diretor.

"As equipas funcionam melhor"

"Tiro a roupa suja, ponho lençóis lavados, reponho coisas no bar, aspiro e limpo o pó. Gosto do que faço", afirma Noemi, com uma inicial timidez que logo depois não a impede de destravar a língua e de ir dizendo, à medida que se lembra, que também já fez trabalhos como modelo, estagiou em Itália e pratica natação. Noemi conhece de cor o piso 4 do hotel e os 19 quartos que arruma, com dedicação e afinco, diariamente, na companhia de Mena Neves. Para Noemi, a colega de trabalho "é linda". "Mimi, e o que é que nós somos?", questiona Mena. "Uma equipa fantástica", atira Noemi, qual grito de guerra. E Simão Sá não deixa de sorrir ao ver a cumplicidade criada ali, no hotel que gere: "Quando o Daniel e a Noemi integraram as equipas, elas passaram, efetivamente, a funcionar melhor. As pessoas tinham muitas competências técnicas, mas faltava a parte emocional do trabalho em equipa".

Laura Bastos, psicóloga e técnica social da Associação Portuguesa de Portadores de Trissomia 21, instituição que integra o projeto "Valuable", confirma: "É um facto comprovado que estas pessoas melhoram o funcionamento das equipas de trabalho, desde logo porque passa a existir maior tolerância. Além disso, são muito dedicadas e minuciosas. Se as ensinam a fazer uma tarefa de determinada forma, vão sempre fazê-la com perfeição. Quando estão empregadas, passam a ver o trabalho como a sua vida".

Mas, para que as coisas corram bem, salienta a técnica, é imperativo "haver acompanhamento especializado" e que os jovens em questão não sejam "largados nas empresas". "No nosso projeto, conversamos com os empregadores antes e damos-lhe dicas sobre como, por exemplo, dividir as tarefas em micro tarefas, para que as pessoas com PDI as aprendam melhor. Na primeira semana, acompanhamos os jovens todos os dias. Depois, espaçamos as visitas, para que vão ganhando autonomia. Mas nunca cortamos o vínculo", explica a técnica.

"Olham-me de lado"

O acompanhamento personalizado é também a imagem de marca do programa de profissionalização de outra associação, a Pais 21 - Down Portugal. Foi através desse projeto que o sorridente Henri Turquin, de 29 anos, chegou à Starbucks, no El Corte Inglés de Lisboa, onde está empregado há um ano. É ali que Henri levanta e limpa mesas, trata dos lixos e das louças, entre outras tarefas. "Gosto daquilo que faço. Nunca tive uma equipa tão fantástica a trabalhar comigo", confessa Henri. Ele, que leva uma vida praticamente autónoma e que vai de Metro para o trabalho. "Ando de transportes públicos sozinho desde os 16 anos. A primeira vez perdi-me, mas depois consegui chegar onde queria", recorda, a rir. "É um cromo dos transportes públicos. Safa-se melhor do que eu", adiciona a mãe, Carmo Teixeira.

Nos tempos livres, Henri frequenta a companhia de teatro da Pais 21, pratica natação e namora com a Pilar há dois anos, altura em que os olhos, já de si iluminados, passaram a brilhar ainda mais. Tanto que até já fala em casamento. Na Starbucks, ganhou uma nova vida, depois de ter trabalhado como tratador de cavalos, sem remuneração, durante seis anos. Agora, ao final do mês, é pago pelo que faz. E aproveita para praticar o seu francês, já de si fluente - ou não fosse filho de pai francês -, com os turistas. Na normalidade dos seus dias, só tem um lamento: "Às vezes, há alguns clientes que olham para mim de lado, mas eu não ligo".

Carmo Teixeira, também vice-presidente da Pais 21, sublinha que "nem todos os jovens com Trissomia 21 têm capacidades para trabalhar, pois alguns têm outras patologias associadas". No entanto, frisa que há quem tenha capacidades, só que "os pais cortam-lhes as asas, com medo". "Sempre lutei para que o Henri fosse autónomo. Claro que fiquei de coração nas mãos das primeiras vezes que foi sozinho para algum lado, mas não podemos protegê-los de tudo. Temos é que lhes dar ferramentas e, sempre que possível, apoio técnico. E educá-los. Educar não custa dinheiro", constata.

Os empregadores do país ainda abrem poucas portas a quem tem Trissomia 21, criticam as associações. Mas teme-se que a lei que estabelece um sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência - que já está em vigor, mas em período de transição, até 2023 - faça aumentar as vagas pelos motivos errados. "Não podem empregar estas pessoas sem mais nem menos. É sempre necessário acompanhamento e um tutor interno, por exemplo, porque o maior problema destes jovens é a nível comportamental", adverte Laura Bastos.

Das poucas pessoas com Trissomia 21 que se encontram empregadas legalmente, a maior parte encontrou emprego com a ajuda de associações. Não foi o caso, contudo, de Inês Gomes, 22 anos, natural de Ílhavo. Independente e senhora do seu nariz, Inês é um exemplo de determinação, muito à conta dos pais, que sempre lutaram para que estivesse inserida na sociedade. Inês conta-nos, com um discurso fluente, como cumpriu a escolaridade obrigatória até ao 12.º ano e como é ser, hoje, funcionária dos quadros da Câmara de Ílhavo, onde exerce funções de assistente no Museu Marítimo. "Antes, estive na biblioteca [através de um Contrato Emprego-Inserção]. Foi quando recebi um ordenado pela primeira vez e fiquei espantada por receber. Passei a sentir-me igual a toda a gente", destaca a jovem, orgulhosa. É que, agora, pode comprar com o seu dinheiro aquilo de que mais gosta: livros e canetas. E admite outro prazer: "Sempre que recebo o salário, faço questão de pagar um jantar aos meus pais".

No museu, Inês faz vigilância e acompanha os visitantes do espaço. Tira dúvidas sobre a história da pesca do bacalhau quando a interpelam - "Uma colega ensinou-me e eu decorei as coisas" - e está sempre atenta, pois "é preciso ver se as pessoas têm bilhete, avisá-las para não tirarem fotografias com flash e ver se mexem em alguma coisa que não podem". E quando está a terminar de contar a sua rotina, brilham-lhe ainda mais os olhos, com uma quase vaidade sincera, quando revela: "Sou eu que apago as luzes do museu, ao final da tarde. Fui promovida nisso".

"O importante são as pessoas"

É no Hospital de Cascais que encontramos Luís Filipe Farrolas, auxiliar administrativo, nitidamente orgulhoso da farda que enverga. Tem 26 anos e foi também através da Pais 21 que ali chegou, depois de cinco anos a trabalhar, sem remuneração, numa padaria. "Saía de casa às sete de manhã e chegava às 20 horas. Foi bom para a autonomia dele, mas achei que já merecia um bocadinho mais de regalias. Agora, recebe o seu ordenado, tem o seu dinheiro e paga as suas contas, mesmo tendo eu que o ajudar, porque ele não tem muita noção do dinheiro", explica Fernanda Basílio, mãe de Luís.

Acarinhado por todos no hospital, Luís é exímio no trabalho como administrativo e basta vê-lo a trabalhar uns segundos para perceber o empenho que coloca, diariamente, nas funções que lhe foram atribuídas. "Distribuo o correio, tiro fotocópias, plastifico documentos, ajudo na copa e arrumo as salas de reuniões", especifica. Fernanda bem diz que Luís se "adapta às circunstâncias". Só que, mesmo sabendo disso, o coração de mãe fê-la temer, ainda o filho era criança, como é que ele seria aceite na sociedade. "Duvidava que o aceitassem", assume, transparente. Afinal, aceitaram. Ou não fosse Luís especial. Não porque tem Trissomia 21, não porque tem uma fisionomia diferente, mas porque é capaz de dar, numa constatação que esmaga, a mais simples e verdadeira das lições a quem o ouve: "Com ou sem Trissomia, o importante são as pessoas".

Fonte: JN

Os espanadores e o senso comum

1. Interpelado por Rui Rio no último debate quinzenal, António Costa meteu os pés pelas mãos no discurso, mas esclareceu as intenções: invocando argumentos não demonstrados, travestiu de progresso mais um retrocesso, qual seja o de acabar com as reprovações no ensino básico. Petulante, acusou Rui Rio de se guiar pelo “senso comum”, em lugar de seguir “decisões informadas”. O problema é que qualquer pavão que use as decisões do PS em matéria de Educação, “assentes nos estudos pedagógicos mais informados”, ficará reduzido a espanador pelo simples “senso comum”. 

Na altura, António Costa exibiu a primeira página de um estudo que não leu, sobre uma matéria que nunca lhe importou. O estudo, que não diz o que ele disse que diz, é teoricamente bem construído, mas deve ser confrontado com a realidade. E a realidade mostra que as reprovações estão associadas a alunos carenciados e à falta de recursos das famílias e das escolas. Eliminá-las passa por políticas sociais que combatam as desigualdades, que não por colocar ainda mais pressão sobre professores desmotivados, mal pagos, expostos à indisciplina e à violência que grassam nas escolas e escravizados por trabalho sem sentido e normativos manicomiais.

2. É enviesado o raciocínio de quantos afirmam que o “chumbo” não serve para nada. Como se o “chumbo” fosse um instrumento de ensino. O “chumbo” é apenas uma expressão classificativa, de último recurso, que introduz um limiar de exigência mínima numa escala classificativa (classificar é seriar). A taxa de reprovações em Portugal (13,6% no secundário e 5% no básico, dados de 2017/2018) tem vindo a diminuir ao longo dos anos e os resultados do nosso sistema de ensino têm vindo a melhorar nas avaliações internacionais, não sendo possível, contrariamente ao que afirmam os porta-vozes do regime, falar de consenso na produção científica sobre os malefícios das reprovações. Há matérias que requerem aprendizagens incrementais e acumulativas, sendo garantido o desastre quando se pula para um nível superior sem domínio do anterior.

3. Quando se retomou a atual polémica sobre a validade das reprovações, li e reli que a sua abolição significaria uma poupança de 250 milhões de euros por ano. É fácil perceber como os criadores da cifra a calcularam: multiplicaram o número de reprovados pelo custo médio anual por aluno. Só que as coisas não se passam assim, já que uma eventual passagem automática de todos não iria originar a redução de professores, de assistentes operacionais e técnicos e o encerramento de escolas, variáveis que determinam os custos.

4. Melhor seria que, logo no primeiro ciclo, detetássemos com rigor as dificuldades de acompanhamento do currículo (fragilidades familiares, cognitivas ou de outra natureza), caracterizando o potencial de desenvolvimento de cada aluno. Isto a partir da ideia de que não deve ser o currículo que se flexibiliza, mas os apoios que se reforçam. Isto que suporia, naturalmente, a existência nas escolas de equipas multidisciplinares estáveis. Do mesmo passo, parece-me importante um debate sério e profundo sobre a eventual alteração para os sete anos da idade de entrada no ensino básico e a eventual junção dos segundo e terceiro ciclos num só.

No que toca ao secundário, com o tempo decorrido sobre o prolongamento da escolaridade obrigatória de nove para 12 anos, o país ganharia em discutir, sem preconceitos, a continuidade ou a reversão da medida (na UE só seis países têm 12 anos obrigatórios), bem assim como repensar toda a lógica organizativa e curricular da via profissionalizante. 

Ao anterior acresce que as “aprendizagens essenciais” assentam na ideia equívoca de que o aluno é capaz de construir autonomamente o seu próprio conhecimento, através de “projetos” funcionais e imediatamente utilitários, desenvolvidos preferencialmente com metodologias lúdicas. Este conceito, que se foi impondo insidiosamente, vem originando uma organização avulsa e destruturada do currículo nacional. A ênfase dada às competências vem negligenciando o conhecimento, quando o conhecimento é nuclear para qualquer tipo de desempenho. Por outro lado, a interpretação que alguns fazem da autonomia curricular põe em perigo a garantia de que um conhecimento principal e nacional seja proporcionado a todos os estudantes, de modo equitativo e universal.

Santana Castilho

Fonte: Público

Tempo excessivo nas creches é prejudicial “para desenvolvimento das crianças”

O tempo que as crianças passam nas creches portuguesas é desadequado para o seu desenvolvimento, considera a Ordem dos Psicólogos, alertando para o perigo de estes espaços se transformarem num mero “depósito de crianças”.

Os bebés até aos dois anos deveriam passar apenas as manhãs na creche. O resto do dia deveria ser passado com a família — com os pais ou com os avós, explicou (...) Sofia Ramalho, vice-presidente da Ordem dos Psicólogos (OP). “Já entre os dois e os três anos o horário pode esticar um bocadinho, entre as quatro a seis horas por dia. Ou seja, o tempo vai aumentando progressivamente consoante vão crescendo”, acrescentou a especialista.

Mas, em Portugal a realidade é outra. Os bebés e crianças passam nas creches e infantários o tempo “equivalente a um dia de trabalho de um adulto”, ou seja, cerca de oito horas diárias.

Em média, as crianças mais pequenas, até aos três anos, passam 39,1 horas por semana nos infantários, creches ou com amas e as mais velhas (com pelo menos três anos) ficam 38,5 horas por semana fora de casa, segundo o relatório “Estado da Educação 2018”, publicado pelo Conselho Nacional de Educação (CNE), que fez um retrato do país atual e a evolução na última década.

As crianças em Portugal passam mais dez horas por semana nas creches quando comparadas com a média do resto da Europa. “Estes tempos não são os mais adequados para o desenvolvimento das crianças”, alertou a vice-presidente da OP.

Crianças deprimidas, com baixa autoestima e com sentimentos de abandono podem ser as consequências de ultrapassar em muitas horas os limites considerados normais para se estar longe da família.

Sofia Ramalho salientou a importância do equilíbrio do tempo passado na creche e do tempo em família, que acaba por ter impacto na vinculação das crianças com as figuras parentais: “É muito importante que possam passar tempo com os pais, sendo que a qualidade da vinculação implica sempre ter tempo, mas atualmente parece haver cada vez menos tempo para estar com as famílias”.

A vice-presidente da OP critica a “inexistência de políticas públicas que permitam conciliar a vida profissional com a vida familiar”, alertando para o perigo de se estar a transformar as “creches num depósito de crianças”.

A especialista sublinha no entanto que, se forem garantidos os tempos ótimos e se existirem contextos educativos de qualidade, as creches e as amas são uma mais-valia para as crianças.

As crianças também “conseguem vincular-se a outras pessoas” e quando estão criadas as condições este acaba por ser um “contexto propício para o seu desenvolvimento”, sublinhou.

Quando se cumpre o “tempo ótimo”, a creche apresenta inúmeras vantagens, tais como permitir desenvolver múltiplas relações, desenvolver a linguagem ou o seu lado artístico. À socialização, responsabilização, autonomia e partilha junta-se a possibilidade de um melhor desenvolvimento psicomotor.

Além disso, estudos recentes revelam que frequentar a creche aumenta as possibilidades de sucesso académico no futuro e menos desequilíbrios entre crianças de meios socioeconómicos diferentes.

No entanto, lembrou a vice-presidente da OP, “ainda existe falta de equidade no acesso à educação para a primeira infância. Nem todos têm capacidade para colocar as crianças nas creches”.

Fonte: Público

Catedral de Leiria é a primeira do País a disponibilizar espaço litúrgico acessível a pessoas com necessidades específicas

A Catedral de Leiria será a primeira do País a contar com um guião multiformato impresso e com a identificação dos diferentes espaços litúrgicos que permitirá a todos os públicos “ler” e conhecer os diferentes espaços. O guião dos espaços litúrgicos e toda a sinalética da Catedral foram desenvolvidos pelo Centro de Recursos para a Inclusão Digital (CRID) do Politécnico de Leiria e ficará disponível nas comemorações do Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, 3 de dezembro, com três versões: braille com imagens em relevo, em escrita aumentada, e em sistema pictográfico para a comunicação, o que lhe permite ser lido por pessoas cegas, surdas e com incapacidade intelectual. Todos os espaços litúrgicos terão as respetivas sinaléticas também nestes formatos.

O projeto resulta de uma parceria entre o CRID do Politécnico de Leiria, e a Conferência Episcopal Portuguesa, promovido pelo Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência (SPPD), da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana. Depois da Catedral de Leiria, o projeto será alargado a outros espaços.

A parceria surgiu do desafio que o SPPD lançou ao CRID para colaborar no projeto “Comunicação Inclusiva no espaço litúrgico: identificação dos espaços”, que «surgiu após a intervenção da professora Célia Sousa no âmbito da ação de formação da Equipa Nacional e das Diocesanas do Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência, no Encontro inter-diocesano no Seminário de Santarém, em outubro de 2018», explica Isabel Mascarenhas Vale, responsável do SPPD.

O projeto será composto por uma fase de validação experimental, que vai decorrer na Catedral de Leiria, para a qual contou com o apoio de Sua Eminência, o Cardeal D. António Marto, e do Reverendo Senhor Padre Gonçalo Diniz. Depois desta validação, será implementado progressivamente em todo o País. «O CRID existe para trabalhar em prol de uma sociedade mais igualitária e inclusiva, e este é mais um passo para tornar todos espaços acessíveis», considera Célia Sousa, coordenadora do CRID.

O CRID do Politécnico de Leiria é considerado uma referência internacional na área da inclusão, detendo um know-how único e tendo trabalho feito a favor da sociedade, que é possível encontrar em poucos locais no mundo. Premiado nacional e internacionalmente, contribui ativamente para sagrar Leiria como a cidade mais inclusiva do País: criou a primeira biblioteca braille no ensino superior do país, adapta regularmente obras literárias para braille, criou o primeiro guião multiformato a nível mundial (para o Mosteiro da Batalha). Dotou todos os espaços de restauração da Praça Rodrigues Lobo, espaço histórico emblemático de Leiria, com ementas multiformato, e desenvolveu os folhetos inclusivos do Itinerário Jubilar de Fátima em 2017, trabalho reconhecido pelo Papa Francisco através de uma carta de agradecimento, pelo trabalho desenvolvido em prol das Pessoas com Deficiência.

Editou e coeditou livros infantis inclusivos, colmatando uma lacuna grave em Portugal de oferta de livros para crianças com necessidades específicas, como por exemplo “A Rainha das Rosas”, livro multiformato, que permite a leitura de todas as crianças: cegas, surdas, com incapacidade intelectual, e claro, sem deficiência, que recebeu em 2018 o Prémio Acesso Cultura. Lançou em 2007 uma iniciativa pioneira de recolha de brinquedos para adaptação e entrega a crianças com necessidades especiais, a campanha “Mil Brinquedos, Mil Sorrisos”, que já entregou 5.000 brinquedos, a 231 instituições de quatro continentes, e que neste momento está a ser replicada no Brasil.

Fonte: Comunicado recebido por correio eletrónico da Midlandcom – Consultores em Comunicação

terça-feira, 26 de novembro de 2019

Politécnico com tecnologias para crianças com necessidades especiais

O projeto "Tecnologias para a Educação Inclusiva - TEI@IPLeiria" permite personalizar as tecnologias de apoio a crianças com limitações neuromotoras e perturbações do espetro do autismo, no processo ensino-aprendizagem, refere uma nota (...).

Até ao momento, foram apoiadas duas crianças, cujas tecnologias foram desenvolvidas de acordo com as suas necessidades e potencialidades específicas, estando no momento o projeto a preparar o acompanhamento de uma terceira criança com problemas neuromotores e a implementar a tecnologia de apoio adequada às suas necessidades, acrescenta a mesma nota.

"O projeto evidencia a importância das tecnologias de apoio para os alunos com necessidades educativas especiais no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que facilitam o envolvimento ativo, o acesso, o desempenho e a participação nas atividades escolares, assim como na aquisição de competências, contribuindo para a inclusão escolar, cultural e social, refere o docente da licenciatura de Terapia Ocupacional da ESSLei, Jaime Ribeiro, citado no comunicado.

Para este professor, as tecnologias de apoio possibilitam às crianças "a participação nas atividades, coadjuvando na diminuição ou supressão dos obstáculos que surgem neste processo, fornecendo alternativas e estratégias que potenciam a sua inclusão", assumindo assim "um papel fulcral na adaptação do indivíduo ao meio".

O projeto, que está a ser desenvolvido em Vagos, no distrito de Aveiro, em conjunto com a Fundação Altice, que cedeu o equipamento, envolve estudantes da licenciatura em Terapia Ocupacional da ESSLei e resulta de um protocolo entre o Politécnico de Leiria e a Fundação Altice, para o desenvolvimento de investigação em prol da promoção da inclusão escolar por meio das tecnologias.

Está a ser desenvolvido no Agrupamento de Escolas de Vagos e conta com o apoio da Câmara Municipal de Vagos, que agilizou a alocação de quatro estudantes do 4.º ano da licenciatura em Terapia Ocupacional da ESSLei, assim como o docente das unidades curriculares Educação Clínica V e Produtos de Apoio I e II.

As tecnologias de apoio utilizadas em crianças com problemas neuromotores incluem um computador portátil 'Surface Pro', um periférico de acesso 'PC Eye Mini' e um braço articulado para posicionamento das tecnologias, assim como o 'software' de comunicação aumentativa 'GRID 3'.

Os estudantes da ESSLei conceberam ainda atividades e avaliações adaptadas dos conteúdos programáticos.

Para uma criança com perturbação do espetro de autismo não verbal está a ser usado um 'tablet' 'Android', apetrechado com o software de comunicação aumentativa 'PT Magic Contact', e elaborados materiais de comunicação adaptados.

Fonte: Notícia ao Minuto por indicação de Livresco

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

Óculos especiais ajudam rapaz daltónico a ver cores pela primeira vez

Para o pequeno norte-americano Jonathan Jones, de 12 anos, as cores não têm a dimensão que têm para qualquer outra pessoa com uma boa visão. Mas uns óculos podem mudar tudo. O vídeo do momento em que o jovem daltónico experimentou estes óculos especiais pela primeira vez, enquanto estava na sala de aula, foi partilhado no Twitter pelo seu irmão, Ben Jones, e está a correr a internet. Jonathan emociona-se assim que coloca os óculos.

"O meu irmão mais novo é daltónico e o diretor da escola dele também. Enquanto aprendiam sobre daltonismo na aula, o diretor trouxe-lhe uns óculos que lhe permitiam ver cores pela primeira vez", relata o irmão do rapaz. "São todos teus", disse este mesmo diretor a Jonathan, entregando-lhe o par de lentes que mudariam a forma como vê o mundo para sempre. De repente, Jonathan torna-se capaz de olhar toda a sala em cores vivas. Não hesita em esboçar um sorriso, rapidamente substituído por lágrimas de alegria. "Ele ficou muito emocionado", acrescenta Ben Jones, no Twitter.

No vídeo, é possível ouvir várias pessoas dentro da sala de aula a pedir que olhe para diferentes objetos dentro da sala de aula. Entre eles, uma tabela periódica, pela qual Jonathan se mostra surpreendido, apercebendo-se da diversidade de cores que contém.

O daltonismo caracteriza-se como uma perturbação visual que torna a pessoa incapaz de diferenciar todas ou algumas cores. E podem ser vários tipos de daltonismo, desde a dificuldade em distinguir um determinado espetro de cores (como o vermelho e o verde) à completa cegueira para as cores - um tipo considerado raro.

Nos últimos anos, a ciência tem procurado dar resposta a esta patologia e é daqui que nascem os óculos de Jonathan. Em 2016, o cientista Don McPherson fez chegar aos EUA uns óculos que permitem distinguir todas as variedades de cores. A descoberta foi feita quase por acaso, quando McPherson estava a realizar uns testes com óculos para cirurgia a laser. Com esta ferramenta, os daltónicos tornam-se capazes de visualizar cores mais intensas e, por isso, de as distinguir. Mas o investigador não pensou no seu fim imediato, até um amigo daltónico o ter alertado que conseguia atingir visualmente muitas mais cores do que até então tinha atingido.

Entretanto, McPherson ganhou uma bolsa de investigação do National Institute of Health e co-fundou a EnChroma, em 2010, que agora produz estes óculos especiais. Mas não são funcionais para todos os tipos de daltonismo. Apenas 80% consegue tirar partido do efeito destes óculos.Mas o preço destes óculos pode chegar perto dos 400 euros. E, por isso mesmo, Jonathan não tem como os manter, diz a Fox News. Neste sentido, a mãe da criança criou uma página de crowdfunding de forma a ajudar a arrecadar dinheiro para conseguir comprá-los.

"Depois de publicar um vídeo nas redes sociais em que Jonathan vê cores pela primeira vez, ficamos impressionados com quantas pessoas generosas queriam ajudá-lo a conseguir um par de óculos para daltónicos", confessava a mãe de Jonathan. Quaisquer fundos adicionais que cheguem a esta conta seriam doados a uma fundação que comprar óculos para quem não puder pagar", contava Carole Walter Jones. O objetivo já foi alcançado, em mais de 6700 euros.


O sexo masculino é o mais afetado por esta patologia visual. Em média, um em cada 12 homens é afetado por esta doença genética, quando apenas uma em cada 200 tem dificuldade em diferenciar as cores.

Fonte: DN

domingo, 24 de novembro de 2019

Uma sala, imensas possibilidades

Uma bola no ar ou no chão. Puzzles com peças à espera de ganhar forma. Livros repletos de desenhos prontos para o que a imaginação quiser. Folhas em branco disponíveis para figuras ou traços de encantar. Brincadeiras ao ar livre nos baloiços e escorregas. Meter as mãos nos misteriosos processos da bricolage. Plasticina de várias cores para moldar o que se quiser. Peças à disposição da inesgotável criatividade.

Uma sala de atividade do pré-escolar é construída e decorada como um pequeno mundo cheio de surpresas, cantos e recantos para espreitar, explorar, descobrir, absorver com tempo. Com objetos coloridos, brinquedos, materiais que despertam a atenção e a imaginação. Os espaços são como uma espécie de recreio de crianças ansiosas por usar todos os sentidos, a toda a hora, a todos os segundos do dia. As perguntas acontecem naturalmente, as aprendizagens também.

Brincar e jogar. Jogar e brincar. Jogos interativos. Jogos digitais. Jogos que abrem o apetite com áreas e conceitos feitos à medida do conhecimento do mundo e de tudo o que o rodeia. Brincar é desenvolver competências e a motricidade, solidificar laços que se constroem, resolver conflitos. É rir, usar a fantasia, e ser feliz.

Teresa Sarmento, doutorada em Estudos da Criança, professora do Instituto de Educação da Universidade do Minho, autora de diversos projetos e publicações na área da educação de infância, deixa um aviso. “É importante que os educadores percebam que a base da aprendizagem das crianças em idade pré-escolar é a ludicidade”. Ludicidade vem da palavra latina “ludus” que significa jogo e jogo é tanta coisa. “Tem de se apostar numa abordagem e numa dinâmica educativas que assentem muito no aspeto lúdico”, sustenta.

A ludicidade adapta as brincadeiras e os jogos à maneira como os mais novos assimilam o mundo. De uma forma natural e leve. Com prazer e com respeito pela individualidade para que as emoções se manifestem, para que a socialização aconteça. Teresa Sarmento realça várias ferramentas: jogos lúdicos, histórias para contar, ouvir, criar e dramatizar. “Jogos que viabilizem a interação, atividades em grupo. Materiais que não tenham finalidades demasiado limitadas. Jogos em que as crianças aprendam a respeitar a si e os outros, que convivam de forma respeitosa com as diferenças”. Diferenças físicas, sociais ou culturais.

É essencial trabalhar a autonomia e valorizar as evoluções dia após dia. “Nesta idade, as crianças adoram construir, é importante definir brincadeiras, adequadas à idade, que elas conseguem levar até ao fim para que não se sintam imediatamente frustradas, mas com a sensação que estão a evoluir”, refere Joana Laranjeiro (Mãe Catita), autora e coach parental. “É a altura ideal para escolher materiais que trabalham os diferentes sentidos, usar projeções em diferentes suportes, criar ambientes com diferentes experiências sensoriais, promovendo a exploração e a curiosidade”, acrescenta.

Começar a aula com uma música divertida, uma coreografia a condizer, capta a atenção e mexe o corpo. “Como estão numa idade de grande curiosidade, e cheios de perguntas, as questões que surgem podem ser usadas para inventar jogos exploratórios. Quando a pergunta parte deles todo o envolvimento no processo e na aprendizagem é significativamente maior, além de ser altamente benéfico para a autoestima”, sublinha Joana Laranjeiro. As possibilidades são infindáveis para que os mais pequenos absorvam tanto mundo que os rodeia.

Fonte: Educare.pt

sábado, 23 de novembro de 2019

Alunos com doença oncológica: enquadramento educacional

Algumas escolas são confrontadas com a situação de alunos com doença oncológica e que, consequentemente, têm de permanecer alguns períodos de tempo internados e ou impossibilitados de se deslocarem às instituições educativas.

Para estes alunos em concreto, existe um enquadramento normativo que visa criar condições para que possam prosseguir o seu percurso educativo, ainda que dentro de todas as condicionantes inerentes à doença. Desde logo, existe o Lei n.º 71/2009, de 6 de agosto, que cria o regime especial de proteção de crianças e jovens com doença oncológica. O diploma consagra um conjunto de medidas educativas especiais, salvaguardando, também, a aplicação, com as devidas adaptações, do disposto no Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho.

Este enquadramento prevê a publicação posterior de um diploma que aprove as medidas educativas especiais que tenham por objetivo beneficiar a frequência às aulas, contribuir para a aprendizagem e sucesso escolar e favorecer a plena integração das crianças e jovens com doença oncológica, nomeadamente: a) Condições especiais de avaliação e frequência escolar; b) Apoio educativo individual e ou no domicílio, sempre que necessário; c) Adaptação curricular; d) Utilização de equipamentos especiais de compensação.

Neste seguimento, é publicada a Portaria n.º 350-A/2017, de 14 de novembro, com o objetivo de promover o sucesso escolar destas crianças e a sua plena inclusão, tendo em conta as condições específicas de cada um.

O apoio educativo a conceder, em função das necessidades concretas de cada criança ou jovem, pode consistir nas seguintes medidas: a) Condições especiais de avaliação e de frequência escolar; b) Apoio educativo individual em contexto escolar, hospitalar ou no domicílio, presencial ou à distância, através da utilização de meios informáticos de comunicação; c) Adaptações curriculares e ao processo de avaliação, designadamente através da definição de um Programa Educativo Individual (PEI); d) Utilização de equipamentos especiais de compensação.

Estas medidas de apoio educativo são mobilizadas pelo agrupamento de escolas ou escola não agrupada em que o aluno está matriculado ou por um agrupamento ou escola não agrupada da proximidade do estabelecimento hospitalar em que o aluno se encontre, se tal for requerido pelo encarregado de educação, em articulação com os docentes em funções no estabelecimento hospitalar, e com o apoio dos serviços do Ministério da Educação, designadamente da Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares.

Os apoios educativos devem ser requeridos pelos pais ou encarregados de educação ao Diretor do agrupamento de escolas ou escola não agrupada onde o aluno esteja matriculado.

A mobilização dos apoios educativos depende da apresentação dos seguintes documentos: a) Documento comprovativo da doença; b) Declaração médica que ateste que a situação clínica é compatível com o apoio educativo a prestar; c) Declaração de assunção de responsabilidade por parte do Encarregado de Educação.

O processo de aplicação e de avaliação da eficácia das medidas de apoio educativo é da responsabilidade do professor de grupo ou turma ou diretor de turma, conforme o nível de educação ou ensino.

Na circunstância de os apoios a mobilizar no caso concreto não se encontrarem disponíveis no agrupamento de escolas ou escola não agrupada onde o aluno esteja matriculado, o pedido é remetido à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares no prazo máximo de 10 dias úteis.

Compete à Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares decidir da atribuição dos apoios previstos no número anterior, no prazo máximo de 10 dias úteis.

Mais recentemente, foi publicada a Portaria n.º 359/2019, de 8 de outubro, que procede à regulamentação da modalidade de ensino a distância, definindo as regras e os procedimentos relativos à organização e à operacionalização do currículo, bem como o regime de frequência. 

Este diploma determina que o ensino a distância se destina aos alunos dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico geral, dos cursos científico-humanísticos e dos cursos profissionais que, comprovadamente, se encontrem impossibilitados de frequentar presencialmente uma escola, designadamente, alunos que, por razões de saúde ou outras consideradas relevantes, não possam frequentar presencialmente a escola por um período superior a dois meses e tenham obtido parecer favorável da DGEstE, em articulação com a DGE e, no caso dos cursos profissionais, com a ANQEP, I. P.. Estes alunos mantêm-se na escola E@D [ensino à distância] até ao final do ano letivo, independentemente da alteração da situação que permitiu a frequência do ensino a distância.

Assim, cada caso deve ser analisado e enquadrado para que possam ser determinadas e mobilizadas as medidas educativas mais adaptadas e que melhor contribuam para promover o sucesso escolar destes alunos.