quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Há mais 500 professores contratados nas escolas

A partir de quinta-feira, 1 de setembro, haverá mais 500 professores contratados nas escolas por comparação ao total dos que foram colocados durante o ano lectivo passado, anunciou nesta terça-feira o gabinete de comunicação do Ministério da Educação (ME).

Conhecidos os resultados do concurso de contratação inicial de professores, destinado a docentes que não pertencem ao quadro, as contas são estas: foram colocados 7306 professores contratados, o que corresponde a um acréscimo de cerca de 500 por comparação a 2015/2016. Esta é a informação dada pelo ME que, contudo, informa no seu comunicado que os resultados divulgados dizem também respeito ao concurso de mobilidade interna, que se destina apenas aos professores do quadro e cujo número não é especificado no documento enviado à comunicação inicial. 

Consultadas as listas publicadas na página electrónica da Direção-Geral da Administração Escolar conclui-se que houve cerca de 51 mil candidaturas. O número de candidaturas é superior ao de candidatos já que cada professor pode concorrer para leccionar mais do que uma disciplina. Os grupos de recrutamento com mais candidaturas foram os do 1.º ciclo e Educação Especial.

Como os mecanismos de contratação foram alterados, também existe esta contabilidade: por comparação ao que se registou no final de agosto de 2015 estão colocados nesta altura mais 3524 docentes contratados, indica o ME, que acrescenta o seguinte, para justificar este aumento: “Este ano todos os docentes foram colocados em simultâneo na contratação inicial, ao contrário do que aconteceu no ano passado quando os docentes foram colocados, progressivamente, em Bolsa de Contratação de Escola, entretanto extinta, arrastando-se o processo ao longo do ano lectivo."

No ano passado foram contratados 3782 professores em contratação inicial e 3030 em Bolsa de Contratação de Escolas (BCE), procedimento que ocorreu após a contratação inicial, e através do qual eram escolhidos os docentes para as cerca de 300 escolas com contrato de autonomia ou inseridas nos chamados Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP)

A eliminação da BCE foi uma das primeiras medidas do ministério de Tiago Brandão Rodrigues. Através da Bolsa de Contratação de Escola, criada pelo anterior ministro Nuno Crato, os docentes contratados eram colocados com base na sua graduação profissional (que junta a média de curso com os anos de serviço) e também em critérios próprios fixados pelas escolas. 

Logo no primeiro ano da implementação da BCE, em 2014, um erro na aplicação informática que geria este mecanismo levou a atrasos na colocação de centenas de professores. Atrasos que se prolongaram até ao final do 1.º período.

Em 2015, a situação melhorou, mas o tempo de colocação de professores através da BCE continuou a ser mais demorado do que pelo concurso nacional, já que os docentes podiam candidatar-se a centenas de escolas. No início do ano lectivo passado, a tutela tinha recebido 2,3 milhões de candidaturas na BCE para um total de 7573 concursos. A morosidade foi precisamente o argumento evocado pelo novo ministro da Educação Tiago Brandão Rodrigues para pôr fim à BCE.
(...)

Fonte: Público

terça-feira, 30 de agosto de 2016

Já nada é como em 1980? Na vida das pessoas com deficiência pouco mudou

Dois terços das pessoas com deficiência vivem de uma pequena reforma ou pensão — o valor do subsídio mensal vitalício, a principal forma de rendimento para quem tem mais de 24 anos, é de 176 euros. A maioria depende da família — estima-se que o custo de vida adicional para estes agregados vá de 5100 a 26.300 euros por ano. Os problemas de mobilidade persistem: na maior parte dos casos (60%) quem tem dificuldade em andar ou em subir escadas, não mora em prédios com elevador. O país mudou muito nas últimas décadas. Já a vida das pessoas com deficiência nem tanto. Um ensaio intitulado Pessoas com deficiência em Portugal, que acaba de ser publicado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, traça o cenário.

“Desde os anos 1980, as mudanças reais nas vidas das pessoas com deficiência em Portugal têm sido mínimas: os benefícios sociais são insuficientes para elevar a vida das pessoas acima da linha de pobreza, os problemas no acesso ao emprego mantêm-se e continuam a ser excluídas por um sistema de ensino que não considera as suas necessidades e por um mercado de trabalho que exclui a diferença”, escreve o autor, Fernando Fontes, investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra.

No ensaio de pouco mais de 100 páginas recorda os estudos mais recentes e os dados do Instituto Nacional de Estatística que estão disponíveis, olha para a evolução do movimento associativo e das políticas nesta área, em Portugal — tema, aliás, da sua tese de doutoramento pela Universidade de Leeds, no Reino Unido. E conclui: “É urgente uma revolução nas vidas das pessoas com deficiência em Portugal que permita a sua emancipação social.”

O que é que isto significa realmente? Foi este o tema de uma entrevista telefónica (...)

O papel do trabalho

Fernando Fontes começa por lembrar que as primeiras medidas políticas de deficiência em Portugal datam “do final da ditadura”, nomeadamente “com as primeiras experiências de integração de crianças com deficiência visual nas escolas públicas”.

Mas “isto são medidas muito pontuais e só a partir de 1974 é que elas começam a desenvolver-se” com a criação, por exemplo, de subsídios específicos, criados em grande medida por causa das reivindicações dos movimentos de defesa dos direitos dos deficientes das Forças Armadas.

Estes subsídios, bem como outros apoios, caso da tarifa reduzida em transportes públicos ou do tratamento hospitalar gratuito, foram sendo, no final dos anos 70, e nos anos 80, alargados progressivamente a outras pessoas com deficiência. E depois?

“Em Portugal o Estado-providência nunca atingiu níveis de redistribuição como noutros países”, nota. “O subsídio vitalício, que é a principal forma de rendimento para as pessoas com deficiência com mais de 24 anos... enfim, não queria dizer que é ridículo, mas quase. Quem é que neste país consegue viver com 176 euros por mês?” Mesmo sabendo que está previsto um complemento extraordinário de solidariedade de 17 euros para quem tem menos de 70 anos e de 35 euros para quem tem mais.

Em suma, as pessoas com deficiência "continuam dependentes" das famílias ou da solidariedade social, “não conseguem ter uma vida como qualquer outro cidadão”. E também não têm acesso ao mercado de trabalho. “Há a ideia de que têm menos rendimento no trabalho, que não conseguem exercer as atividades que lhes são pedidas. Ora o trabalho é algo absolutamente estrutural para nós, estrutura o nosso dia-a-dia, permite realizarmo-nos”, para além de garantir o sustento.

Mais alguns dados que constam do ensaio agora publicado: em 2011 a taxa de desemprego para a população em geral era de 13,18%; para as pessoas com 15 ou mais anos “com, pelo menos, uma dificuldade” era superior a 19%; “a grande maioria desta população inativa está reformada (79,73%), não obstante apenas 6,66% terem sido considerados incapazes para o trabalho pelas autoridades e de apenas 1,79% serem estudantes”.

Em suma: qualquer revolução tem que passar pelo mercado de trabalho, diz o investigador de Coimbra. “É absolutamente essencial.”

Vida Independente

Mas, para que os patrões e a sociedade em geral se abram a quem tem uma deficiência, a primeira “revolução” a fazer é mesmo “ao nível das mentalidades”, sublinha.

“Temos conceções de deficiência absolutamente incapacitantes”, apesar de há décadas se falar do chamado “modelo social da deficiência” — “Neste modelo, impera a ideia de que não é a deficiência que impede as pessoas de participar na vida em sociedade, mas sim a forma como a deficiência é socialmente construída e as barreiras sociais, políticas, físicas e psicológicas criadas pela sociedade que limitam e constrangem a vida das pessoas com deficiência”, explica. Ou seja, no “modelo social da deficiência”, de que é defensor, esta “não é vista como um problema individual da pessoa, mas como um problema da sociedade”.

“Creio que este Governo vai no sentido certo”, prossegue. “Está a decorrer um projeto-piloto de Vida Independente em Lisboa, e está a ser preparada legislação para criar mais projetos-piloto em todo o país”, concretiza. Aplicar o conceito de Vida Independente, como sublinha no seu livro, significa uma total revisão dos pressupostos estatais e princípios políticos na atribuição dos direitos sociais.

Em vez de o Estado pagar cerca de 900 euros mensais por cada utente num lar residencial, exemplifica Fontes, a pessoa pode antes solicitar a sua avaliação por um Centro de Vida Independente, que dirá qual o número de horas diárias de assistência pessoal de que ela precisa e ser-lhe-á entregue uma verba, diretamente, que lhe permita pagar esses serviços (apoio domiciliário ou outros). “Neste momento as pessoas estão em casa, sozinhas ou completamente dependentes da família, ou estão em instituições, em lares. Isto não é solução. A solução passa pelos pagamentos diretos às pessoas, como tem sido feito noutros países, que assim podem contratar um assistente pessoal, despedi-lo se não gostarem do serviço prestado, decidir onde vivem, com quem vivem, emanciparem-se.”

Nos Estados Unidos o primeiro Centro de Vida Independente nasceu em 1972. No Reino Unido “a luta pelo direito à Vida Independente afirmou-se na década de 1980”. Em Portugal, o primeiro Centro de Vida Independente foi criado em Lisboa em 2015.

Fonte: Público

segunda-feira, 29 de agosto de 2016

Atendimento prioritário às pessoas com deficiência ou incapacidade

O Decreto-Lei n.º 58/2016, de 29 de agosto, institui a obrigatoriedade de prestar atendimento prioritário às pessoas com deficiência ou incapacidade, pessoas idosas, grávidas e pessoas acompanhadas de crianças de colo, para todas as entidades públicas e privadas que prestem atendimento presencial ao público. 

Para estes efeitos, entende-se por «Pessoa com deficiência ou incapacidade», aquela que, por motivo de perda ou anomalia, congénita ou adquirida, de funções ou de estruturas do corpo, incluindo as funções psicológicas, apresente dificuldades específicas suscetíveis de, em conjugação com os fatores do meio, lhe limitar ou dificultar a atividade e a participação em condições de igualdade com as demais pessoas e que possua um grau de incapacidade igual ou superior a 60 % reconhecido em Atestado Multiúsos.

A pessoa a quem for recusado atendimento prioritário pode requerer a presença de autoridade policial a fim de remover essa recusa e para que essa autoridade tome nota da ocorrência e a faça chegar à entidade competente para receber a queixa.

A queixa pode ser apresentada junto: a) Do Instituto Nacional para a Reabilitação, I. P. (INR, I. P.); b) Da inspeção-geral, entidade reguladora, ou outra entidade a cujas competências inspetivas ou sancionatórias se encontre sujeita a entidade que praticou a infração. Quando a queixa for apresentada perante uma entidade que não tenha competência para a instrução do procedimento de contraordenação, a entidade que a rececionou remete oficiosamente a queixa à entidade competente para a instrução, disso dando conhecimento à queixosa ou queixoso.

Criação dos Centros Qualifica

Pela Portaria n.º 232/2016, de 29 de agosto, procede-se à regulação da criação e do regime de organização e funcionamento dos Centros Qualifica, extinguindo-se os Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional (CQEP).
À semelhança dos CQEP, trata-se de uma oportunidade e de uma possibilidade dos jovens e adultos com deficiência melhorarem ou adquirirem formação. A aplicação das normas previstas na presente portaria é efetuada, com as necessárias adaptações, aos candidatos com deficiência e incapacidade, designadamente, quanto à elaboração do plano estratégico de intervenção, às provas de certificação de competências e à definição do número de técnicos de orientação, reconhecimento e validação de competências que constituem a equipa, atendendo à integração de um técnico da área da reabilitação e da deficiência.
Para tal, compete ao diretor do Centro Qualifica, assegurar a efetiva operacionalização que garanta o apoio indispensável aos candidatos com deficiência e incapacidade no seu processo de certificação.
Compete, também, ao técnico de orientação, reconhecimento e validação de competências identificar as necessidades de formação dos candidatos, em articulação com os formadores, professores e outros técnicos especializados no domínio da deficiência e incapacidade, podendo proceder, após certificação parcial, ao encaminhamento para ofertas conducentes à conclusão de uma qualificação. Como tal, este técnico deve ser detentor de habilitação académica de nível superior e possuir experiência, designadamente, em metodologias de trabalho com dinâmicas adequadas a pessoas com deficiência e incapacidade.




sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Pais autoritários criam filhos mentirosos

"As crianças não mentem' é uma daquelas verdades que damos como absolutas se nos quisermos enganar a nós próprios. Claro que mentem, sobretudo quando fazem algum disparate e não querem ser descobertas. Mas há umas que mentem mais do que outras: as que recebem uma educação autoritária e inflexível na imposição de regras.

Esta é a grande novidade do mais recente estudo conduzido pela canadiana Victoria Talwar, uma especialista na matéria que coleciona inúmeras investigações na área do desenvolvimento cognitivo das crianças. Já se sabia que elas mentem desde os dois anos e por vários motivos, como aponta o psicólogo infantil Mário Cordeiro neste artigo, mas a professora da Universidade McGill, em Montreal, veio agora relacionar a frequência das mentiras com o ambiente mais ou menos rígido em que são educadas. Em casa ou na escola, quanto mais regras os pais e os professores definirem e mais punições impuserem a filhos e alunos quando eles não as cumprem, maior é a tendência para criarem um mentiroso.

Um novo método da equipa de investigadores de Talwar para medir a honestidade das crianças consiste em fazê-las adivinhar qual o objeto que faz determinado som sem olharem para ele. Após duas ou três tentativas de resposta fácil, o teste chega a um ponto em que é impossível associar um som mais estranho a qualquer objeto. Então os investigadores arranjam uma desculpa para saírem da sala e, ao regressarem, insistem na questão: "Qual é o objeto que faz este som?". E acrescentam outra: "Espreitaste?"

Victoria Talwar fez a experiência em duas escolas africanas, uma com um regime disciplinar mais autoritário e focado na obediência às regras, outra com menos obrigações e castigos. E os resultados do jogo da espreitadela, como lhe chamam, foram bastante conclusivos: enquanto na segunda escola a percentagem de crianças que mentiram, ao dizerem que não tinham espreitado o objeto, ficou em linha com a média de outros estudos do género, na primeira a quantidade de mentirosos disparou.

A explicação avançada é bem simples e lógica: as crianças mentem mais ao sentirem a ameaça de uma punição. É uma espécie de reação em legítima defesa.

Embora moralmente condenável, a habilidade para mentir também tem o seu lado positivo. As crianças que desenvolvem essa capacidade tendem a tornar-se mais inteligentes e bem-sucedidas. E, como ficou demonstrado neste estudo de Kang Lee, da Universidade de Toronto, quanto mais cedo começarem a fintar a verdade, melhor.

Rui Antunes (Jornalista)

Fonte: Visão

Ano letivo arranca com mil funcionários a menos

João Dias da Silva diz que, a nível nacional, as escolas contam com 2.900 funcionários, um número aquém dos cerca de 4 mil que trabalhavam nas escolas quando estavam em vigor as 40 horas. O dirigente da FNE teme que esta lacuna afete o funcionamento das escolas.

"Havendo a garantia do Ministério da Educação de que há a prorrogação dos 2900 contratos de assistentes operacionais que tiveram contrato no ano anterior, ainda assim faltam não menos de mil assistentes. A verdade é que vai haver insuficiência nas escolas para garantir os buffets, papeleiras, as portarias, a vigilância nos recreios".

João Dias da Silva diz que ao contrário do que normalmente acontece, este ano o problema não será a colocação de professores, mas a de auxiliares.

O dirigente da FNE está preocupado. "Mais de 98% das colocações estão a ser feitas a tempo e horas, em relação aos assistentes operacionais estamos preocupados. Esperamos que os diretores de escolas estejam a ser contactados pelo Ministério da Educação, no sentido de verificarem quais as necessidades, para estas serem preenchidas antes do inicio do ano letivo".

Também o presidente da Associação Nacional de Dirigentes Escolares manifesta preocupação com a carência de funcionários das escolas. Ouvido pela TSF, Manuel Pereira afirma que este problema não é novo, mas tem que ser resolvido, porque afeta o funcionamento das instituições.

"Associado à tradicional falta de funcionários nas escolas e à redução do número de horas de trabalho dos funcionários públicos, as escolas estão muito limitadas. Os assistentes operacionais são fundamentais, é preciso tentar a todo o custo que as escolas tenham o número suficiente de funcionários".

À TSF, o Ministério da Educação sublinha em comunicado que "está a fazer um levantamento fino das necessidades, agrupamento a agrupamento". O gabinete de Tiago Brandão Rodrigues sublinha que os cerca de 2.900 contratos que terminam no fim do mês "serão renovados" e que nalgumas escolas a competência da colocação de funcionários não docentes, devido ao tipo de contrato, é dos executivos municipais.

"O Ministério da Educação e o Ministério das Finanças estão a estudar a possibilidade de integração de trabalhadores em situação de requalificação nos agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas", acrescenta ainda o comunicado.

Fonte: TSF por indicação de Livresco




quinta-feira, 25 de agosto de 2016

O AUMENTO DO NÚMERO DE ALUNOS COM NEE. SERÁ?

No Público de ontem o Professor Filinto Lima publicou um texto “Quo vadis, Educação Especial?” no qual alertava para um conjunto de problemas relativos à presença de alunos com necessidades educativas especiais nas escolas regulares.
O texto tinha como base o aumento do número de alunos com NEE em escolas de ensino regular verificado nos últimos anos.
Cito, “O número de alunos com necessidades educativas especiais (NEE) a frequentarem escolas regulares de ensino, aumenta ano após ano, parecendo existir relativo descontrolo quer por parte do ministério da Educação, quer por parte das escolas com dificuldades em suster esta evolução desmesurada.
Como tive oportunidade de já ter escrito em texto de opinião no Público esta afirmação deve ser produzida e interpretada com alguma prudência pois creio que podem estabelecer-se alguns equívocos.
O que sucessivos relatórios vão mostrando é que aumenta o número de alunos destinatários de dispositivos de apoio educativo o que na verdade não significa que tenham NEE e, por outro lado, em anos anteriores e por razões já muitas vezes abordadas existiam alunos com dificuldades e sem qualquer apoio, ou seja em anos anteriores não tínhamos menos alunos com NEE mas sim menos alunos apoiados em consequência das políticas educativas o que não é a mesma coisa.

Concretizando, segundo a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, entre 2010/2011 e 2014/2015, o número de alunos com NEE subiu 73,5%, de 45.395 para 78.763. Este nível de aumento não pode, evidentemente, significar o aumento de casos de NEE mas sim de alunos apoiados com a justificação de que apresentam NEE. Vejamos porquê.
De facto, por efeito de filtros de uma natureza discutível na disponibilização de apoios e recursos a alunos que evidenciam dificuldades, o número de alunos com apoio educativo era muito menor do que o número de alunos que dele necessitavam e das estimativas de necessidades com base em critérios internacionalmente aceites. Esta recorrente situação tem sido objeto de análise quer pela Inspeção-Geral de Educação, quer pelo Conselho Nacional de Educação
Neste cenário, por pressão dos professores e pais confrontados com muitos alunos a necessitar de ajuda começou a verificar-se progressivamente que, mesmo com os normativos desfavoráveis que filtravam o acesso a apoios, as escolas foram tentando com os recursos disponíveis providenciar algum tipo de ajuda o que contribui para esta subida fortíssima de alunos com NEE em apoio nas escolas portuguesas.
No entanto, este aumento não significa, não conheço estudos que o suportem, uma alteração com o mesmo grau de significado no padrão e quadros de necessidades dos alunos no que se refere, sublinho, a situações de NEE apesar da confusa e pouco sólida definição e conceitos que os normativos utilizam. A estranha diferença entre o caráter permanente ou “transitório(!)” das NEE que um aluno possa evidenciar é apenas um exemplo.
Por outro lado, um sistema educativo que tem vindo a tornar-se cada vez mais “normalizado” (currículos extensos, prescritivos, assentes em centenas de metas curriculares por disciplinas), competitivo, seletivo (“darwinista”), assente em filtros sucessivos, os exames, os rankings, os incentivos às escolas com sobrevalorização da avaliação externa dos alunos, etc. acaba, necessariamente, por se tornar incapaz de acomodar as diferenças entre os alunos, nem sequer estou a falar de NEE, e induz um aumento do número de alunos que podem sentir dificuldade em acompanhar o “ritmo” do trabalho.
Mais uma vez, por inexistência de recursos de outra natureza, muitas escolas providenciam alguns apoios a esta franja de alunos através dos dispositivos de educação especial o que também contribui para o aumento do número de alunos apoiados considerados como apresentando NEE.
Tudo isto considerado surge o que considero a questão central, que apoios e recursos estão a ser disponibilizados a alunos, professores e pais? Serão suficientes, quer em docentes (apesar do aumento verificado), técnicos (número de psicólogos baixou) ou assistentes operacionais? Serão adequados? Contribuem para o sucesso real dos alunos considerando todas as suas capacidades e competências? São informadas por princípios de educação inclusiva cujo critério fundamental é a participação, tanto quanto possível, nas atividades comuns das comunidades escolares?
Gostava de ser mais otimista até porque estão em preparação alterações nesta matéria a verdade é que apesar do esforço notável da generalidade das direções escolares, dos professores, técnicos e assistentes, da existência de práticas e experiências de excelente nível, a realidade está aquém do que seria desejável.
Assim, a inquietação de professores e pais é como responder de forma adequada e exigente, sim devemos ser exigentes, às necessidades e dificuldades educativas ou escolares de todos os alunos que em qualquer circunstância as possam evidenciar, independentemente da sua natureza. Aliás, a necessidade de uma avaliação educativa sólida e competente das reais necessidades ou dificuldades é o primeiro passo para uma resposta adequada.

José Morgado

Governo tira isenção do imposto automóvel a deficientes

A isenção do imposto único de circulação (IUC) que era até agora atribuída aos deficientes com grau de incapacidade superior a 60% foi cortada.

A isto acresce uma outra alteração que nalguns casos irá trazer um agravamento do IUC. É que, para continuar a ter isenção do imposto, é necessário que o carro possua um nível de emissão de CO2 até 180g/km. Na redação anterior, que vigorou até ao final de julho, não se colocavam quaisquer limitações ao nível das emissões. Este teto foi criado apenas para os veículos da categoria B (carros).

Ana, ou a mãe de Maria como prefere que lhe chamem, todos os anos solicita à Autoridade Tributária e Aduaneira isenção do "selo" do carro quando chega a altura de pagar o IUC, já que este benefício não é de atribuição automática. A matrícula do seu carro dita que o imposto seja pago em agosto e foi com surpresa que percebeu que, desta vez, não teria direito a este benefício fiscal - e que lhe é atribuído pelo facto de a filha ter uma incapacidade permanente de 97%. Perante as novas regras, a sua repartição de Finanças pediu-lhe o pagamento total, porque o IUC ultrapassa os 200 euros. Mas, ontem, Ana foi informada de que afinal apenas teria a pagar o valor que excede os 200 euros, pelo que o remanescente lhe será agora devolvido por cheque.

Em resposta (...), fonte oficial do Ministério das Finanças esclareceu que, quando o imposto ultrapassa os 200 euros, a isenção é parcial, devendo o IUC ser liquidado por excesso.

Ana denunciou esta situação no seu blogue (amaedemaria) e a limitação do benefício fiscal está já a fazer chegar queixas às associações. Isso mesmo confirmou (...) a Associação Portuguesa de Deficientes (APD), que salienta que basta um carro ter cilindrada superior a 1750 centímetros cúbicos (cc) para haver agravamento no IUC.

Questionando esta limitação do benefício, a APD lembra que a maioria dos carros de gama baixa ou média "não dispõe dos requisitos essenciais" que permitem a condução por parte de uma pessoa com mobilidade condicionada, "particularmente ao nível da caixa automática, nem de espaço para a colocação de cadeiras de rodas".

No seu blogue, Ana tem também estado a receber queixas de outras pessoas que estão a ser apanhadas de surpresa com o mesmo problema, já que a mudança entrou em vigor num mês em que a maioria das pessoas está de férias e surge numa densa legislação (Decreto-Lei n.º 41/2016), que procede também à mudança nalgumas das parcelas que integram a fórmula de cálculo do valor das casas para efeitos do imposto municipal sobre imóveis (IMI). Tendo entrado em vigor a 2 de agosto, este corte na isenção do IUC apanhou as pessoas com carros matriculados de agosto em diante.

Fonte: JN

Escolas querem dividir turmas para combater insucesso

A maioria dos agrupamentos escolares quer generalizar os projetos Turma Mais ou Fénix no próximo ano letivo, no âmbito do Plano Nacional de Promoção do Sucesso Escolar. Em causa estão dois projetos que partem as turmas em grupos mais pequenos permitindo um ensino mais individualizado.

Foi esta a proposta das escolas ao apelo lançado pelo Ministério da Educação. Os diretores só receiam a falta de recursos para a nova bandeira do Governo sair efetivamente da gaveta. Mais de 90% das escolas entregaram planos de ação.

Fonte: JN por indicação de Livresco


quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Perspetivas sobre o subsídio de educação especial

A questão da atribuição do subsídio de educação especial não deixa de ser polémica e, racionalmente, criticável. Esta postura pode fundamentar-se no simples desconhecimento do enquadramento normativo da realidade escolar por parte das tutelas, na singularidade das atribuições, por envolver dois ministérios, o da Educação e o do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e Economia, que tutela o Instituto da Segurança Social, e, decorrente desta situação, na separação de orçamentos, entre outros.
No entanto, existem algumas considerações que devem ser tecidas, para além de outras (Atenta Inquietude e Público) que entretanto já foram emitidas.
O subsídio de educação especial tem como uma das finalidades principais assegurar um apoio especializado que não está disponível nas escolas de ensino regular. Depreende-se, então, que as escolas não têm os recursos necessários para dar resposta ajustada e eficaz às necessidades educativas dos alunos. Não se trata de uma novidade. Pelo contrário, a tutela tem consciência da falta de recursos e, como tal, procura resolver a situação com a atribuição de um subsídio.
Por outro lado, o processo de atrbuição do subsídio de educação especial depende do parecer de um médico especialista que comprove o estado de redução permanente de capacidade da criança ou do jovem. Convém relembrar que, na maior parte dos processos de avaliação especializada e consequente categorização dos alunos com necessidades educativas especiais, não existe qualquer interferência de médicos especialistas. Os técnicos especializados mais intervencionistas têm sido os psicólogos. Logo, depreende-se que, apesar do processo educativo estar centrado na escola, a atribuição do subsídio de educação especial para a prestação de apoios especializados depende objetivamente de um diagnóstico clínico, e não pedagógico. Estamos perante uma subjugação descontextualizada e desarticulada em que a intervenção pedagógica depende de uma categorização médica. 
Acresce, ainda, que a atribuição do subsídio de educação especial fica muito mais dispendiosa para o erário público do que a contratação de técnicos especializados para as escolas, com todas as vantagens que daí adviriam. De acordo com as contas efetuadas há 2 ou 3 anos, relativamente a um caso concreto, o valor mensal pago a dois técnicos especializados, de valências diferentes, que, durante quatro tempos semanais, numa tarde, entre as 14.00h e as 17.15h, prestavam apoio a quatro alunos, dava para contratar um técnico a tempo inteiro e ainda sobrava dinheiro. Basta multiplicar estes valores pelos restantes horas e dias da semana para se apurar, ainda que por estimativa, da real dimensão dos gastos com a atribuição do subsídio de educação especial, independentemente do ministério que financia o serviço prestado.
Estes técnicos especializados não têm qualquer ligação formal com as escolas e raramente articulam com os docentes, limitando-se, quando acontece, a emitir alguns relatórios no final de período escolar e/ou ano letivo.
Em síntese, numa perspetiva de destaque do aspeto pedagógico, seria desejável que os técnicos especializados fossem colocados nas escolas, ainda que eventualmente partilhados com outra instituição escolar, numa gestão responsável e eficaz, ajustada às necessidades da população escolar e articulada com o projeto educativo.

Quo vadis, Educação Especial?

A Educação Especial (EE) destaca-se no panorama educativo nacional, atendendo ao número de alunos, professores, técnicos especializados e funcionários que envolve, bem como os recursos físicos e materiais associados.

O número de alunos com necessidades educativas especiais (NEE) a frequentarem escolas regulares de ensino, aumenta ano após ano, parecendo existir relativo descontrolo quer por parte do ministério da Educação, quer por parte das escolas com dificuldades em suster esta evolução desmesurada.

Em 2014/15 existiam nas escolas do Continente 75.193 alunos com NEE e, curiosamente, só 5% na Educação pré-escolar (EPE), aumentando exponencialmente esse valor no ensino básico, logo no 1.º Ciclo (30%).

A que se deve tamanha discrepância em idade tão nova?

Por um lado, a não frequência da EPE origina que só mais tarde sejam diagnosticadas situações merecedoras da atenção e acompanhamento da EE; pena é que a Intervenção Precoce - com falta de recursos - não consiga sinalizar, nem as equipas médicas especializadas nestas áreas, numa altura anterior, de modo a prevenir situações que verificadas mais tarde, dificilmente terão solução plausível.

Também o meio em que se inserem estes jovens dificulta o desenvolvimento das suas baixas capacidades intelectuais, não lhes tendo sido proporcionadas oportunidades e experiências enriquecedoras. O Estado, através do ministério da Educação e da Segurança Social, deve cuidar melhor desta franja da população, e colocar ao seu dispor meios e recursos suficientes para uma integração efetiva, por forma a que o seu percurso escolar seja o mais regular possível.

As famílias necessitam estar mais atentas e investir em atividades estimulantes na infância. Quantas vezes, estas situações são só detetadas na altura da entrada para a EPE, aos 4 ou 5 anos? A situação socioeconómica não ajuda em nada a prevenir estes casos; os pais devem proteger os seus filhos e exigir ao Estado aquilo que este pode e tem obrigação de dar.

Contudo, dos alunos com NEE, 23% frequentam o 2.º e 29% o 3.º Ciclo. Julgo que se trata de um número muito elevado, mas o certo é que a maioria destas crianças não é intervencionada precocemente e, logo que chegam à escola, num ciclo posterior, são sinalizadas.

É essencial trabalhar os precursores para a leitura e escrita formal com tempo e critério, pois são estes os alunos que chegam ao 1.º ano e não vão ser capazes de ler, nem de escrever, e essa situação continua ao longo do 1.º Ciclo. Quando começam a mecanizar o processo de leitura ainda não são competentes, uma vez que não compreendem o que leem (a leitura é mecânica e com muitos erros) e é uma bola de neve - nesta altura, se não foram elegíveis antes, são referenciados; o certo é que já se encontram tão distanciados do currículo normal logo no 1.º Ciclo que é quase inevitável a entrada na EE para trabalhar áreas específicas, até porque o apoio educativo é escasso, não há trabalho diferenciado efetivo, estruturado, devidamente fundamentado e específico com estes alunos, nem projetos ou programas que combatam esta realidade. A problemática adensa-se e parece a todos que se torna permanente... 

Existem alunos mal avaliados que entram para a EE por diversas pressões, pois não se dá tempo para ver progressos, os apoios são insuficientes…por muitas outras razões.

A legislação prevê diversas medidas de promoção de sucesso escolar que, se aplicadas rigorosamente, poderiam evitar a entrada na EE destes jovens. Contudo, a falta de recursos humanos para colocar em prática as medidas preconizadas, e neste caso concreto, de forma mais individualizadas possível, origina que todos os anos o número de alunos com NEE não pare de crescer. No ano escolar que agora termina, existiu mais 5% de alunos, relativamente ao ano anterior, situando-se em termos absolutos em cerca de 79.000 alunos. Estamos contentes com esta estatística?

Filinto Lima

Fonte: Público

terça-feira, 23 de agosto de 2016

Regime de subsídio por frequência de estabelecimentos de educação especial

O Decreto Regulamentar n.º 3/2016, hoje publicado, estabelece o regime do subsídio por frequência de estabelecimentos de educação especial, revogando os diplomas anteriores.

O subsídio de educação especial destina-se a assegurar a compensação de encargos resultantes da aplicação de formas específicas de apoio a crianças e jovens com deficiência, designadamente a frequência de estabelecimentos adequados.

Têm direito ao subsídio de educação especial as crianças e jovens de idade não superior a 24 anos que possuam comprovada redução permanente de capacidade física, motora, orgânica, sensorial ou intelectual, doravante designados por «criança ou jovem com deficiência», desde que por motivo dessa deficiência se encontrem em qualquer das seguintes situações: 
a) Frequentem estabelecimentos de educação especial que impliquem o pagamento de mensalidade; 
b) Careçam de ingressar em estabelecimento particular ou cooperativo de ensino regular, após a frequência de ensino especial, por não poderem ou deverem transitar para estabelecimentos públicos de ensino ou, tendo transitado, necessitem de apoio individual por técnico especializado; 
c) Tenham uma deficiência que, embora não exigindo, por si, ensino especial, requeira apoio individual por técnico especializado; 
d) Frequentem creche ou jardim-de-infância regular como meio específico necessário de superar a deficiência e obter mais rapidamente a integração social.

O reconhecimento do direito à prestação, nas situações em que os descendentes com deficiência necessitem de apoio individual por técnico especializado e frequentem estabelecimentos de ensino regular, depende ainda da confirmação, pela estrutura competente no âmbito do Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) que acompanha o aluno, quando aplicável, e pelos estabelecimentos de ensino que os alunos frequentam, de que esse apoio não lhes é garantido pelos mesmos.

Para efeitos de atribuição do subsídio de educação especial são considerados «técnicos especializados» os profissionais habilitados com formação específica adequada no apoio a ministrar, tendo em vista o desenvolvimento da criança ou jovem com deficiência.

A redução permanente da capacidade física, motora, orgânica, sensorial ou intelectual é determinada por declaração de médico especialista, comprovativa desse estado, indicando, com a conveniente e inequívoca fundamentação, a natureza da deficiência e o apoio necessário à criança ou jovem.

segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Especialistas sem explicações para descida a pique de jovens em centros educativos

Há dois anos, faziam-se títulos de jornais com a sobrelotação nos centros educativos destinados ao acolhimento de menores (12 e os 16 anos) que tinham cometido atos qualificados como crimes. Atualmente, e apesar de terem fechado dois destes centros (em Vila do Conde e na Madeira) sobram vagas. Porquê? “Há aqui uma aparente contradição, porque as ocorrências policiais, que estão na base desta pirâmide, até aumentaram”, estranha Maria João Leote, investigadora do Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais da Universidade Nova de Lisboa.

A perplexidade é comum aos diferentes especialistas ouvidos (...) e que trabalham neste setor há décadas. Nenhum arrisca uma explicação definitiva. Mas a socióloga Maria João Leote admite algumas hipóteses para ajudar a compreender esta descida a pique dos jovens sujeitos a medidas de internamento. “É possível que haja aqui algum efeito da reforma do mapa judiciário e de algum atraso na gestão dos processos tutelares educativos e também é possível – e, se assim for, é positivo – que os juízes estejam a aplicar a medida de internamento apenas aos casos mais graves, optando mais frequentemente por medidas como o acompanhamento educativo”, diz.

No Tribunal de Família e Menores do Barreiro, o juiz António José Fialho confirma que “há mais de um ano” que não aplica uma medida de internamento. “Têm-me chegado menos casos de criminalidade praticada por menores entre os 12 e os 16 anos. Não consigo encontrar razões para isso, mas é possível que os mecanismos de atuação preventiva deste tipo de criminalidade estejam mais eficazes”.

Pode ser. Mas as estatísticas presentes no último relatório de Segurança Interna, relativas a 2015, mostram que, naquele ano, foram aplicadas 414 medidas de internamento em centro educativo (em 2014, tinham sido 609). “Os dados não batem certo”, constata Maria João Leote, para quem “falta informação que permita perceber esta realidade”, nomeadamente quanto aos jovens que aguardam indicação de um centro para cumprirem a medida de internamento.

As estatísticas mensais da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais mostram que, em abril de 2013, havia 265 vagas nos centros educativos e 280 menores internados. Um ano depois, a situação não se tinha alterado muito: 233 vagas e 253 menores internados. Na altura, a DGRSP chegou, aliás, a alertar os tribunais para a inexistência de vagas nos centros e a avisar que só seriam admitidos os casos urgentes dos jovens que ficassem sob medida cautelar de internamento até julgamento. Dois anos depois, mais concretamente em abril, apesar de os lugares disponíveis se terem reduzido entretanto para os 198 (por causa do encerramento do centro educativo da Madeira e do de Santa Clara, em Vila do Conde), estavam internados apenas 146 jovens, ou seja, havia 52 lugares por preencher.

“Esta descida causa-me perplexidade, porque vai muito além do que era expectável”, admira-se o procurador Norberto Martins, que durante mais de dez anos integrou a comissão fiscalizadora dos centros educativos. “Dantes, podia-se sempre pensar que as medidas de internamento não eram aplicadas porque não havia vagas, mas agora esse problema não se põe. E, mesmo admitindo que haja medidas de internamento que não são aplicadas porque os jovens estão em situação de fuga, a diferença entre as medidas aplicadas e os jovens internados nunca poderia ser tão exorbitante”, acrescenta.

Da Direção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), as explicações não abundam. O diretor-geral, Celso Manata, adianta apenas que as razões “poderão ser de vária ordem”. “Há quem diga que isto tem que ver com as alterações introduzidas pela Lei Tutelar Educativa e que os senhores magistrados ainda não estão habituados a esta nova realidade”, sugere, para afiançar apenas que não há, da parte da DGRSP, qualquer indicação aos tribunais no sentido da redução da aplicação da medida de internamento. “Quem aplica as penas são os juízes que são independentes”.

Fonte: Público

sábado, 20 de agosto de 2016

A importância da escola pública

(...)
Nem tudo o que tem sido esta destruição da Escola pública passa pela política de subsídios. Foi claro ao longo dos últimos 15 anos uma aposta na destruturação da carreira docente e no ataque à dignidade profissional dos professores, a obsessão até na humilhação de uma classe laboral. Recorde-se o que foi a campanha de descredibilização pública dos professores levada a cabo nos governos de José Sócrates, que foi prosseguida com igual afã no executivo liderado por Pedro Passos Coelho. Não é assim por acaso que os novos licenciados têm fugido de integrarem a carreira docente pública. Tanto isso é verdade que é sabido que são menos de meio milhar os professores que têm menos de 30 anos e lecionam no sistema público

É aos professores que compete dar alma, dar substância ao sistema de ensino. Sem professores que se sintam dignificados e respeitados no desempenho da sua profissão não há ensino que funcione e que seja um investimento no futuro. Ora, um país que não investe no ensino público e que não investe nos seus professores, é um país que não aposta no futuro. Um país sem um sistema de ensino público sólido não tem futuro, nem crescimento económico, nem desenvolvimento social. Pode até ser considerada uma visão romântica e antiquada, perante os que cantam hossanas à mercantilização da vida, mas sem um sistema de ensino público digno e estruturado não haverá investimento no futuro, nem aposta em ter cidadãos capazes de assegurarem o futuro.

São José Almeida

Nota: Extrato da crónica do jornal Público

sexta-feira, 19 de agosto de 2016

V Jornadas Deficiência Visual & Intervenção Precoce

A Associação Nacional de Intervenção Precoce (ANIP), em colaboração com a Consulta de Baixa Visão do Hospital Pediátrico de Coimbra, promove as V Jornadas Deficiência Visual & Intervenção Precoce subordinada ao tema "Literacia Emergente para a Cegueira".

A iniciativa terá lugar no dia 28 de outubro, no auditório do Hospital Pediátrico de Coimbra e dirige-se a Famílias, Profissionais de Intervenção Precoce, Educadores de Infância, Profissionais a trabalhar na área da Deficiência Visual e Terapeutas.

Para inscrições e mais informação, consulte:

Programa - PDF - 1.104 kb

Fonte: INR

quinta-feira, 18 de agosto de 2016

Deficiência dissolvida nas águas do Azibo

Mal vislumbra uma nesga da albufeira da barragem do Azibo, Gonçalo fica elétrico. Tem 19 anos e uma incapacidade quase total. Mas não é fácil controlar o entusiasmo que lhe desperta um espelho de água como aquele, em tarde quente de agosto.

João, 16 anos, com 70% de incapacidade, tem uma reação semelhante. Curiosamente, colocado o primeiro numa boia e o segundo num caiaque, entram em relaxe total. Até chegam a adormecer.

Estes rapazes de Lisboa e de Vila Nova de Gaia, respetivamente, integram o grupo de 24 pessoas de vários pontos do país, com autismo, paralisia cerebral e incapacidade física, que durante 15 dias ficam ao cuidado da Leque, Associação de Pais e Amigos de Pessoas com Necessidades Especiais, numa colónia de férias inclusiva no Eco Parque do Azibo, em Macedo de Cavaleiros.

É um programa que também possibilita aos pais terem uns dias para descansar. É o caso dos da Liliana, emigrantes em França há muitos anos e que "já não vinham a Portugal passar férias devido à dificuldade em garantir cuidados constantes à filha durante esse período", explica Celmira Macedo, fundadora e presidente da Leque. Desde que tomaram conhecimento do centro de turismo rural e terapêutico, voltaram a poder vir visitar os familiares.

Enquanto fazem férias, os pais deixam aqueles 24 jovens em boas mãos e, ao mesmo tempo, a desfrutar de um espaço diferente do habitual. "A maior parte deles vem de centro urbanos, estão em instituições ou em casa todo o ano, e esta é a única altura que têm para usufruir deste tipo de ambiente", nota a responsável.

Odete, 35 anos, de Mogadouro, estás sempre a rir. Mas reclama quando vê o Gonçalo e o João entrar na água, enquanto ela fica à sombra de uma árvore. Não tardará a ir andar de barco, com o bónus de que vai entrar pela albufeira dentro, na companhia de Glória, 30 anos, que é de Alfândega da Fé. Esta, a mais autónoma de todos. O Hugo, do Porto, entrega-se às mãos de António, o mestre de Reiki que quase o faz adormecer em cima de uma prancha. Os elementos com maior dependência ficam a cargo de outros cuidadores no centro de acolhimento do Eco Parque.

As atividades na albufeira ocupam uma grande parte do tempo desta colónia de férias, pois é a preferida de todos. "Mostrar-lhes a água e não os levar lá é quase criminoso", considera Celmira, que sorri ao lembrar a parte mais difícil: "Ficam muito zangados quando os tiramos de lá!" É claro que no dia seguinte voltam, mas nem todos têm essa consciência.

Do programa fazem parte outras atividades, como a ida à praia fluvial, a estimulação sensorial, a terapia com patos e coelhos, o ioga, entre outras. Este ano não foram, mas até costumam ir a uma festa de aldeia. Não admira que cheguem ao fim do dia "completamente estourados".

Os frequentadores deste tipo de iniciativas são normalmente crianças e jovens, mas a Leque está aberta a todas as idades e a qualquer tipo de incapacidade. Celmira Macedo acentua que "existem milhares de cuidadores informais em todo o país à beira da exaustão, por não terem respostas para cuidar dos filhos enquanto tiram uns dias de férias descansadas".

É neste sentido que a Leque espera, em colaboração com o Eco Parque do Azibo, tornar esta resposta, que por enquanto ainda é sazonal, numa atividade que possa "acontecer várias vezes por ano", nomeadamente no Natal, Carnaval, Páscoa, verão, etc. Funcionar todo o ano "é o grande objetivo", mas esse pode demorar mais tempo a alcançar.

A colónia de férias deste ano findou no domingo. No final, houve lágrimas. Dos que ficaram e dos que foram embora. "A Odete não chora!", protestou, arrancando uma enorme gargalhada a Celmira. "Não só choram as meninas como também os rapazes de barba feita", brincou. Para o ano há mais.

Fonte: JN

quarta-feira, 17 de agosto de 2016

Concurso de fotografia visa "desmistificar a deficiência"

O prazo de candidaturas ao concurso de fotografia "A Inclusão na diversidade", iniciativa que visa "captar através de imagem o verdadeiro sentido da inclusão ou que denuncie a falta dela" decorre até 15 de outubro, indicou a organização esta quarta-feira.

Trata-se da terceira edição de um concurso organizado pela Plural&Singular, portal digital que se dedica à área da deficiência, em parceria com o Centro Português de Fotografia (CPF), local que acolherá a 3 de dezembro, Dia Internacional das Pessoas com Deficiência, a cerimónia de divulgação de resultados e premiados.

As candidaturas podem ser apresentadas via correio postal ou eletrónico, conforme refere o regulamento que pode ser consultado em www.pluralesingular.pt, e o grande objetivo da organização este ano é ultrapassar a centena de participantes, depois de uma edição de arranque que contou com 61 imagens a concurso, número que evoluiu para 85 no ano seguinte.

"Pretendemos com este concurso estimular o olhar atento das pessoas ao verdadeiro sentido de inclusão e à presença ou ausência dela no meio que as rodeia. E pretendemos fazer com que reflitam sobre o que é uma sociedade caracterizada pela diversidade", explica Sofia Pires, da Plural&Singular.

Nesta terceira edição, entre outras, é novidade o cartaz da iniciativa, inspirado no jogo eletrónico Tetris e desenvolvido pelo designer Nuno Pires que partiu das diferentes cores, formas e tamanhos das peças para ilustrar o tema do concurso "A Inclusão na diversidade".

Podem concorrer fotógrafos, amadores e profissionais, de todas as nacionalidades, a título individual ou em representação de alguma entidade. Como elementos do júri constam o fotojornalista do jornal PÚBLICO Paulo Pimenta, o presidente do Conselho Geral da Universidade do Minho Álvaro Laborinho Lúcio, bem um representante do CPF.

Ainda a propósito desta iniciativa, a organização também destaca que foram criadas no site da Plural&Singular galerias dedicadas às edições anteriores deste concurso. A ideia é que, e "indo ao encontro do conceito base desta iniciativa", conforme refere Sofia Pires, "num concurso dedicado a todos, seja dado protagonismo a todos e não apenas aos vencedores".

"Desmistificar a deficiência junto das pessoas sem deficiência e combater os atos discriminatórios associados às diferenças" são outros propósitos deste concurso de fotografia que é "promovido em prol de uma sociedade verdadeiramente inclusiva na diversidade".

Fonte: Público

terça-feira, 16 de agosto de 2016

Estudo revela que professores do 1.º ciclo estão pouco preparados para lidar com crianças adotadas

Um estudo desenvolvido pela Universidade do Porto (UP) mostra que os professores primários têm falta de conhecimentos sobre a adoção e pouca preparação para ajustar a prática pedagógica nas respostas às necessidades das crianças adotadas.

Este é um dos resultados obtidos pelo Grupo de Investigação e Intervenção em Acolhimento e Adoção (GIIAA) da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da UP (FPCEUP) no âmbito de um projeto onde foram entrevistados cerca de 600 professores de 150 escolas do Porto e de Coimbra.

De acordo com a coordenadora da investigação, Maria Barbosa-Ducharne, pretendia-se perceber como a escola e a comunidade escolar se posicionam face à adoção, centrando-se na figura do professor, "significativa no seio das relações que as crianças desta idade estabelecem".

"As questões relativas à legislação da adoção constituem-se, para grande parte dos professores, um campo ainda desconhecido, visto que as respostas às perguntas dessa natureza foram sinalizadas de forma incorreta ou pela opção 'não sei'", explicou a investigadora.

Outro dos resultados indica que as professoras têm mais conhecimento sobre adoção do que os professores e que os profissionais mais velhos e mais experientes são mais conhecedores de alguns aspectos específicos desta matéria.

Verificou-se também que não havia diferenças ao nível do conhecimento sobre a adoção entre professores que já tiveram contacto com crianças adotadas e aqueles que não tiveram, havendo, porém, diferenças quanto às práticas pedagógicas utilizadas.

Apesar de estes profissionais terem, para os investigadores, "um papel muito importante na facilitação da criança adoptada na escola", os dados indicam que "não estão mais informados sobre adopção do que o público em geral", o que pode ser explicado pelo facto de não haver formação específica nesta área.

Confrontados com uma situação deste género "os professores são levados a procurar estratégias alternativas que possam ir ao encontro das suas necessidades", ajustamento baseado na sensibilidade e na experiência do profissional.

No âmbito de outro estudo desenvolvido pelo GIIAA, 125 crianças, com idades compreendidas entre os oito e os dez anos, foram questionadas (em casa) sobre o ambiente escolar e a forma como aí viviam o facto de terem sido adotadas.

"Os resultados mostram que a experiência de ser adotado, vivida na escola, é caracterizada tanto pelos sentimentos envolvidos como pelo conforto na comunicação acerca da adoção", referiu Maria Barbosa-Ducharne.

Segundo a investigadora, quando o contexto escolar é percebido pela criança adotada como mais discriminatório em relação à adoção, falar abertamente com os outros contribui para que ela se sinta menos triste, com menos raiva, menos diferente e menos confusa sobre quem é.

O estudo comprova ainda que as habilidades sociais da criança são um importante fator de proteção desta vivência na escola. No entanto, e apesar de os investigadores partirem do princípio de que uma "comunicação aberta, sensível e flexível" em torno da adoção em contexto escolar seja positivo para o bem-estar da criança, "isso não acontece sempre da mesma forma para todas", optando algumas por não o revelar.

"É fundamental uma mudança de atitudes", defendeu a coordenadora, de forma a facilitar a integração e a aceitação e criar um espaço para discutir, "em termos mais rigorosos", as questões da adoção.

Fonte: Público

Centros para formação de adultos vão aumentar

Segundo notícias recentes, os centros para formação de adultos vão aumentar. Trata-se de um mecanismo formativo ao dispor de todos os adolescentes e adultos com mais de 18 anos de idade que pretendam melhorar as suas qualificações académicas e formativas.
Neste domínio, incluem-se também os adolescentes e os adultos com necessidades educativas especiais, havendo um regime específico e centros adequados para a definição e implementação de respostas educativas ajustadas a cada um. Trata-se de uma possibilidade a explorar no âmbito da transição para a via pós-escolar.

segunda-feira, 15 de agosto de 2016

Reiki e Yoga utilizados de foram terapêutica para ajudar crianças com necessidades especiais

A Associação de Pais e Amigos de Pessoas com Necessidades Especiais - Leque, com sede em Alfândega da Fé, está utilizar o Reiki e o Yoga, em contexto aquático, para ajudar de forma terapêutica, crianças e jovens com necessidades especiais.

Segundo os promotores de uma colónia de férias inclusiva, frequentada por cerca de 26 crianças, jovens e adultos de todos o país, e de França, foi utilizado um método considerado "inovador", neste tipo de ajuda.

"Está comprovado cientificamente que o Reiki e o Yoga têm efeitos terapêuticos no alívio da dor, em pessoas com patologias graves, e nós estamos a utilizar esta terapia em contexto aquático, o qual já tinha sido ensaiado em sala, e verificamos que tem um efeito calmante em pessoas com autismo", explicou (...) a fundadora da associação Leque, Celmira Macedo.

Fonte: CM por indicação de Livresco

domingo, 14 de agosto de 2016

Nas escolas, a matemática é a dos manuais escolares

Hung-Hsi Wu é professor emérito da Universidade da Califórnia em Berkeley. Numa conversa com o matemático português Jorge Buescu, diz que o essencial no ensino da matemática é melhorar os conhecimentos dos professores. É isso que tem feito nos EUA desde os anos 90.

Diz que a coisa mais importante que fez na vida foi começar a mudar a forma como é ensinada a matemática para professores. Dessa forma, considera Hung-Hsi Wu, a matemática pode chegar às crianças e aos jovens. “O essencial é melhorar o conhecimento matemático dos professores”, resume este matemático que tem uma carreira científica ligada à geometria diferencial e que a partir dos anos 90 virou as agulhas para o ensino da matemática nos níveis básico e secundário.Tem vários livros publicados sobre estas questões – o último, de 2016, Compreender os Números na Matemática Escolar – Álgebra, será editado em breve em Portugal. O matemático português Jorge Buescu, da Universidade de Lisboa e novo presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática, autor de livros de divulgação científica como O Mistério do Bilhete de Identidade e Outras Histórias e Primos Gémeos, Triângulos Curvos (Gradiva), entrevistou Hung-Hsi Wu quando da sua passagem recente por Portugal. Esta é uma conversa de matemáticos sobre o ensino da matemática e o que pode ser feito para o melhorar.

O que leva um matemático de primeira linha a nível mundial a enveredar pelos caminhos do ensino da matemática a nível básico e secundário?
A principal razão é que gosto de me envolver com as pessoas. Sentia profundamente o sofrimento dos alunos devido ao mau ensino da matemática, e a certo ponto – por volta de 1998 – senti que era necessário arregaçar as mangas e agir. E sabia que estava numa posição para fazer algo pelo ensino da matemática que quase mais ninguém estaria.

E hoje em dia dedica-se a questões de ensino da matemática a tempo inteiro?
É um trabalho a tempo inteiro! Mas eu não sou um “educador” no sentido clássico do termo. Dedico-me de corpo e alma a melhorar o ensino da matemática naquilo que é mais crítico: construindo melhores programas, contribuindo para melhorar os manuais escolares e, acima de tudo, na tarefa que descobri ser a essencial: melhorar os conhecimentos matemáticos dos professores.

Qual desses fatores é o mais importante?
Não tenho quaisquer dúvidas: o essencial é melhorar o conhecimento matemático dos professores. Os professores dos Estados Unidos aprendem pedagogia, psicologia, etc. O que acho escandaloso é que, nos últimos cem anos, ninguém se tenha preocupado seriamente com a forma como os professores estão a aprender a matemática que mais tarde têm de ensinar. Quando dei por isto, fiquei incrédulo. Nem queria acreditar! Os especialistas em educação gostam muito de citar a obra pedagógica de Felix Klein [matemático do século XIX]. Mas a verdade dos factos é que nada do que ele escreveu tem relevância para o que os professores têm hoje de aprender para ensinar.

E onde estão hoje os maiores obstáculos?
Os mais graves começam logo nos níveis mais elementares. Por exemplo, as frações. É um erro tremendo ensiná-las ab initio como fatias de piza. Por exemplo, imagine que a um miúdo treinado a pensar em frações como fatias de piza é colocado o seguinte problema: se um carro anda 50 quilómetros em 45 minutos, qual a distância que percorre em duas horas e meia? E agora, onde estão as pizas? No meio da autoestrada? E como é que se multiplicam ou dividem frações? Como é que se multiplicam pizas?

Isso é muito estranho.
Muito estranho mesmo. Compreendi que, se queria mudar a forma como a matemática para professores é ensinada, tinha de começar logo do início. Pela maneira como são entendidas e ensinadas as frações. É isso o que faço no meu livro [Compreender os Números na Matemática Escolar, a editar em breve em Portugal].

Ficou satisfeito com o resultado?
Foi a coisa mais importante que fiz na vida. Para chegar aos alunos, às crianças, a única forma que tenho é através dos seus professores. E sei, por experiência, que estou a chegar a estes. E, assim, a influenciar positivamente milhões de crianças e jovens. Isto é fundamental, porque se conseguir fazer isto com o objeto mais básico da matemática – números e frações –, então sei que posso fazê-lo com tópicos mais avançados, como álgebra e geometria. E é essencial modernizar a forma e o conteúdo no ensino destes tópicos. Hoje em dia começam a levantar-se obstáculos aos alunos desde o início, muitas vezes, porque se ensina mal. Eu apelido a forma estruturalmente errada como a matemática é tratada nas escolas, de uma forma vaga, fluida e opaca como “matemática dos manuais escolares”. É preciso ultrapassá-la!

Foi coordenador, entre 2001 e 2008, do National Mathematics Advisory Board [estudo nacional para melhorar o ensino da matemática escolar ordenado pelo Presidente dos EUA], e mais tarde esteve na criação dos Common Core Standards [conjunto de metas e programas a atingir em todos os estados dos EUA]. A adoção destas recomendações, programas e metas tem sido consensual?
De maneira nenhuma. Tem havido grandes resistências, e de setores inesperados. Em primeiro lugar, por estranho que possa parecer, os pais. Os pais querem ver as suas crianças aprender exatamente da mesma forma que eles aprenderam 30 anos antes. Dá ideia de que não integram a noção de que se construíram métodos melhores. De facto, já em 2010 nós tínhamos redigido um curriculum escolar completo, do jardim-escola ao 12.º ano, lógico, coerente, estruturado e integrado. Mal estaríamos se fosse igual ao de há 30 anos! O grande desafio foi elaborar metas e programas que as crianças compreendam bem e que, simultaneamente, sejam matematicamente corretos e rigorosos – como tínhamos anteriormente feito com as frações, que deixaram de ser pedaços de piza para serem pontos numa recta. Mas os pais reagem mal a isto: as crianças chegam a casa, fazem perguntas e... muitas vezes eles não sabem as respostas. E pensam: quando tinha esta idade não era isto o que aprendia.

Por que acha que houve esta reação?
Quando mudaram os programas e metas, teria sido necessário esclarecer pais e famílias sobre as mudanças que iam acontecer e, acima de tudo, por que razão eram necessárias. Era preciso explicar que não se estava a mudar só porque sim, mas porque as crianças vão aprender matemática melhor. Os processos de pensamento, sendo mais corretos, são mais transparentes, mais simples de aprender. As crianças vão conseguir ultrapassar a fobia da matemática. O problema, para retomar o exemplo das frações, em pensar em frações como fatias de piza é que, quando passamos a um outro contexto, as crianças deixam de reconhecer que se trata de um problema sobre números. Tudo fica opaco, e muitas vezes só é ultrapassável por memorização bruta, decorando técnicas para resolver problemas de contextos diferentes – pizas, distâncias percorridas por carros, temperaturas... – como se fossem problemas diferentes, quando o objetivo é precisamente o oposto: trata-se, com roupagens diferentes, do mesmo tipo de problemas, e os métodos de resolução são os mesmos. Trata-se apenas de números e frações. A forma opaca como a “matemática dos manuais escolares” trata as frações faz com que se perca esta mensagem simplificadora.

De que setor encontrou maior resistência às reformas?
De longe, da parte dos professores. E aqui o problema é bastante mais grave; creio mesmo que é este o ponto crucial. Para ser muito direto, o facto é que a maioria dos professores só conhece, infelizmente, matemática incorreta. E portanto, do ponto de vista de um professor, todas estas reformas parecem muito... assustadoras. Trata-se de uma reação muito humana e compreensível. Se sinto que alguma coisa me ameaça, resisto. Não quero abandonar a minha zona de conforto. E assim muitos professores começaram a atacar os programas utilizando argumentos sem qualquer sentido, quando no fundo o problema era apenas a sua própria resistência à mudança.

Mas houve também uma questão política: seria necessário realizar um investimento gigantesco na formação e reeducação dos professores para estas mudanças; e esse investimento não foi feito. Isto era absolutamente essencial, porque os professores nem tinham noção da razão pela qual era necessário reformar a forma de ensinar. Nunca tinham visto a forma correta de fazer as coisas.

Portanto, não houve apoio político à formação de professores?
Exatamente. Alertei veementemente para esta necessidade, mas os decisores não me deram ouvidos. Foi um tremendo erro. Passei eu a trabalhar diretamente com os professores. Ou melhor, continuei com redobrada intensidade, pois já faço formação de professores de matemática desde o ano 2000.

E qual é a sua experiência nesse particular?
Comecei por criar, em Berkeley, Escolas de Verão para Professores. Os professores eram divididos em três grupos: elementar (jardim-escola ao 5.º ano), intermédio (final do Básico) e secundário. Cada grupo tinha cursos intensivos de três semanas, onde era explicada em detalhe e com rigor a matemática que os professores precisam de ensinar. A experiência foi fantástica: a grande maioria saía desses cursos inspirados, com a sensação de pela primeira vez terem compreendido a fundo aquilo de que estavam a falar nas aulas.

Está a dizer que os professores não compreendem verdadeiramente aquilo do que falam?
Nos EUA, muitos não compreendem. O problema é este: as universidades não ensinam a matemática de que os professores vão falar. Ensinam matemática avançada – grupos, anéis ou funções holomorfas – na esperança, totalmente infundada, de que ao aprendê-la os futuros professores fiquem intelectualmente equipados para ensinar matemática elementar. Mas não ficam. E quando chegar a altura de ensinarem frações, para onde se vão virar? Vão pensar, “como é que me ensinaram estas coisas há 15 anos?”, e repete-se o ciclo. Repetem exatamente o que aprenderam na escola porque nunca viram outra forma de o fazer. É este círculo vicioso a origem da “matemática dos manuais escolares”.

E como se pode quebrá-lo?
Vou dizer-lhe a minha experiência pessoal. Tendo-me apercebido de que era necessária uma solução mais sistemática, acabei por criar, na Universidade de Berkeley, uma sequência de três semestres de disciplinas de Matemática para Professores. Este curso está a funcionar continuamente desde 2006. Escrevi livros de texto específicos para estas disciplinas, pois não existia em lado algum nada de semelhante. O objetivo foi, como disse no início da entrevista, colmatar a muito deficiente preparação científica dos professores nos fundamentos das matérias que vão ensinar.

Esses livros já existem?
Os livros já existem, são utilizados nos cursos e irão ser publicados autonomamente dentro de um ano e meio. Note que não foram uma imposição minha! Pelo contrário: estes materiais evoluíram de acordo com o feedback dos professores, que foi incrivelmente valioso. Eles próprios me iam dizendo aquilo com que valia a pena gastar mais tempo – e aquilo com que não valia. A colaboração dos professores foi essencial para a construção e o sucesso deste curso. A abertura de espírito é essencial em todo este processo. Se eu posso transmitir aos professores aquilo que eles não sabem, também eles sabem muito melhor do que eu aquilo que não sabem! Num certo sentido, foram os professores que me disseram o que ensinar. Curiosamente, o facto de este curso não ter financiamento federal acabou por ser uma vantagem: não tinha nenhuma comissão a dizer-me o que fazer. Tivemos toda a liberdade para construir as nossas próprias soluções. E o resultado foi excelente.

Quais são as variáveis fundamentais para quebrar o círculo vicioso de que falava há pouco?
Em primeiro lugar, como já disse, o fundamental é colmatar a deficiente formação dos professores nas matérias que vão ensinar. Neste ponto as universidades têm uma grande responsabilidade. Em segundo lugar, os manuais escolares. Estes têm uma importância muito maior do que poderia parecer. É que não são usados apenas pelos alunos: são usados pelos professores. Muitos professores não têm tempo, não têm informação, não têm recursos para pensar profundamente na forma como vão ensinar. E portanto limitam-se a seguir o que está no manual. Hoje em dia os manuais são o que são: maus. Ora nos EUA o Governo federal não pode intervir na educação. E portanto o que acontece é ditado apenas pelo mercado. Os editores não têm incentivo para fazer manuais melhores, porque vão vender menos. Portanto sobrevivem os piores, numa espécie de seleção natural invertida. É insano!

Isso funciona mesmo assim?
Deixe-me contar-lhe uma história verídica. Fui consultado por uma grande editora de manuais, que me perguntou quais as alterações que deveriam fazer para estarem de acordo com os novos programas. Fiz um relatório detalhado. Dali a umas semanas fui contactado pelo representante da editora, que me disse que não iam fazer nada do que eu recomendara. “Mas porquê?”, perguntei. Ao que ele me respondeu que se o fizessem iam vender muito menos, e “não podiam correr o risco de terem manuais com os quais os professores não se sentissem confortáveis”.

Espantoso.
É por isso que todo este equilíbrio perverso só pode ser quebrado pelo lado dos professores. Temos de formar melhor os professores, temos de ter melhores professores, para que sejam eles a dizer aos editores “como se atrevem a produzir este lixo?”, e a não adotar maus manuais. São os professores a chave do problema. É quase irónico: os políticos acham que os problemas da educação se podem resolver atirando mais dinheiro para os problemas, fazendo mais obras, pondo mais computadores nas escolas. Mas a chave dos problemas é humana: são os professores.

Tudo isto é muito interessante para Portugal. Entre nós, houve recentemente um redesenhar das metas e programas do básico e secundário num sentido muito semelhante ao que o professor Wu descreve para o caso americano. E, também como no caso americano, as grandes reações vieram precisamente de certas franjas de professores e de associações de professores, que os descrevem como contendo “matemática a mais e educação a menos”. Pode comentar?
Não conheço de perto o caso português, pelo que posso apenas fazer comentários genéricos. Por várias razões, sobretudo pelas que já apontei, uma tal reação é, num certo sentido, de esperar. Para o sucesso das reformas, é crítico apostar muito forte na formação de professores. Por outro lado, é absolutamente necessário ter muito cuidado com a qualidade dos manuais escolares. Se houver manuais de excelência que concretizem programas e metas, eles irão sem dúvida ajudar a conquistar os professores.

Um argumento que se ouve por vezes é que programas e metas teriam uma abordagem demasiado “formal”, entendendo-se por isso que se deixou de praticar uma abordagem quase exclusivamente intuitiva e informal, em que os conceitos fundamentais se deixam vagos e imprecisos.
É claro que o excesso de formalismo é pernicioso; basta recordar a malfadada experiência da Matemática Moderna nos anos 60. No entanto, se é nesse sentido que é utilizado o termo “formal”, essa crítica não faz sentido. É absolutamente impossível percorrer a matemática do básico e secundário apenas com ideias vagas e sem rigor. Quando se introduz um conceito, é necessário fazê-lo de forma clara, não ambígua e com rigor – até mesmo a propósito das frações, no ensino básico. Além disso, a matemática do jardim-escola ao 12.º ano não é um fim em si. É uma escadaria que tem de ser percorrida, também, tendo como objetivo o atingir a matemática superior. É claro que não se pode ensinar a matemática do básico e secundário da mesma forma que se ensina a matemática superior; mas não se pode nunca perder de vista que um dos objetivos é preparar os alunos para aprender a matemática superior. E não podemos estar a vender gato por lebre. É forçoso, a pouco e pouco, conduzir os alunos no sentido da abstração, porque a matemática sem abstração não é matemática. E isso deve fazer-se a todos os níveis. A abstração não é um fim em si; faz-se porque se revela muito útil. As frações não são pedaços de piza, são pontos numa reta numérica. Quando pensamos neles desta forma, conseguimos fazer coisas que não conseguimos com pizas. A abstração é útil!

Pode elaborar?
A questão da abstracção é a mais importante na minha luta com os “especialistas em educação”. Estes insistem em que a abstração é má porque sim. No entanto, eu trabalho diretamente com professores e vejo o que se passa na realidade, no terreno. Por exemplo, nós temos um programa em que damos formação intensiva a professores cinco vezes por ano, uma semana de cada vez. Temos portanto feedback mensal desses professores, e eu vejo que temos todos os anos mais professores, que estão cada vez mais ligados à nossa abordagem… Para retomar o exemplo das frações, nós trabalhamo-las desde o início da forma correta, esquecendo as pizas. Depois, quando chega a parte de somar frações, as coisas tornam-se muito mais claras e simples. Cada professor vai para a sua escola e ensina de acordo com os nossos métodos. Em geral, têm uma adesão total por parte dos alunos, cujas reações são do tipo: “Ah! Afinal era assim tão fácil? Isto consigo eu fazer!” É, além do mais, muito gratificante.

Os seus livros sobre ensino da matemática elementar vão ser publicados em Portugal no final deste ano, numa edição apoiada pela Sociedade Portuguesa de Matemática. Como foi o seu impacto nos EUA? Têm marcado a diferença?
Sim e não. Os meus livros inicialmente passaram despercebidos porque, na comunidade da educação, foram boicotados. Durante mais de um ano, não houve uma única recensão, nem positiva nem negativa. Ergueu-se um muro de absoluto silêncio. E o silêncio é a melhor forma de matar ideias... Há cerca de um ano, Deborah Ball, professora de matemática da Universidade do Michigan em Ann Arbor e diretora do Departamento de Educação, fez-me exatamente essa pergunta. Eu dei-lhe esta resposta. Ela achou “um escândalo”, e ofereceu-se imediatamente para fazer uma recensão aos livros. Então sim, saíram da obscuridade a que os educadores os queriam remeter e agora estão bastante difundidos entre os professores. Veremos se podem fazer a diferença. No próximo ano e meio publicarei mais dois para a matemática do 3.º ciclo e secundário.

Há alguma mensagem que queira deixar especificamente para Portugal no que se refere ao ensino da matemática?
Portugal tem muito maiores possibilidades de sucesso nestas reformas do que os EUA. É um país tão pequeno! Pense nisto: só o meu Estado, a Califórnia, tem quatro vezes a população de Portugal. Para lá de lidarem bem com os três problemas essenciais – preparação científica dos professores, programas e manuais escolares –, é fundamental que existam administradores esclarecidos e com conhecimento profundo dos problemas que saibam estabelecer o diálogo e uma ligação profícua com os professores. Uma decisão tomada no topo, que não tenha a colaboração dos professores, não vai funcionar. É por isso que estou sempre a mudar os meus cursos de formação para professores: não tenho a pretensão de saber tudo. Quando não concordo com uma ideia, digo “então explique-me lá porque pensa assim”. Talvez seja essa a origem das minhas lutas com os autoproclamados “especialistas em educação”: estão convencidos de que estão na posse de toda a verdade, são impermeáveis a argumentos e muitas vezes nem estão sequer abertos ao diálogo. Mas nas questões de educação é essencial manter o espírito aberto. Ninguém sabe tudo.

Fonte: Publico

sábado, 13 de agosto de 2016

Criação de perfil do aluno no 12.º ano de escolaridade

Guilherme d'Oliveira Martins lidera grupo criado pelo governo que vai traçar linhas do que devem os jovens aprender na escolaridade obrigatória.

Quando acabar o ensino obrigatório um jovem deve ter aprendido que a formação se faz ao longo da vida e deve ter aprendido "a ser um cidadão ativo, ter uma vida empenhada, socialmente consciente, cosmopolita, aberta, respeitadora, centrada nos direitos fundamentais da dignidade humana". Os traços gerais são dados por Guilherme d"Oliveira Martins, administrador da Fundação Gulbenkian e ex-ministro da Educação (entre outras pastas), que vai agora liderar um grupo de trabalho criado pelo governo para traçar o perfil de saída dos alunos no final do 12.º ano.

Mas avisa que deve ser dada estabilidade ao modelo que vai ser proposto. "A primeira preocupação que está subjacente à própria constituição do grupo é a de que estes objetivos, estes perfis têm que ser estáveis. Qualquer mudança na educação tem efeitos a não menos de uma geração, estamos a falar sempre de 20, 23 anos".

Depois de ter estado no primeiro perfil traçado "no final dos anos 1980, no âmbito da Lei de Bases do Sistema do Sistema Educativo", Guilherme d"Oliveira Martins considera que foi também por trazer essa ponte que foi convidado agora. Nessa época, "a fronteira do ensino obrigatório era o 9.º ano", mas de lá para cá mantêm-se algumas preocupações.

A estabilidade das metas é uma delas, mas também o conceito de que a educação deve abrir horizontes. Por exemplo, "as humanidades não são só as literaturas. É a compreensão que a educação, a cultura e a ciência estão intimamente ligadas". Além disso, "temos que motivar os jovens e simultaneamente garantir que eles estejam em formação ao longo da vida. Hoje já não se forma para uma profissão que envolva a vida inteira".

O trabalho para que foi desafiado pelo governo, juntamente com outros 10 especialistas - que vão desde professores do ensino básico, secundário e superior, a investigadores e membros de gabinetes do ME -, tem também como missão "dar um sinal para a sociedade, para as famílias e para os professores, que são os educadores profissionais". As conclusões devem ser conhecidas até 31 de dezembro de 2016, indica o despacho do governo. Até agora houve apenas uma reunião preparatória - o grupo foi constituído em julho - e o segundo encontro está previsto para setembro.

Porém como se estabelece um perfil dos saberes e competências dos jovens que concluem o 12.º ano, quando existem vias diferenciadas? "Temos que perceber que ao garantir uma educação para todos, nós temos que garantir uma educação diversa, exigente e uma educação que crie condições para termos uma cidadania ativa e responsável", defende Guilherme d"Oliveira Martins. Ainda assim este será sempre um perfil comum que não exclui as diferenças. "A igualdade é tratar diferente o que é diferente. Fala-se da cultura. Ora bem, hoje cultura é naturalmente articular a educação, a ciência e a cultura".

E o professor universitário dá três exemplos de como a educação obrigatória dá as ferramentas para três carreiras distintas. Um cientista deve ser formado "de modo a estar disponível, a trabalhar em equipa, a estar informado, atento", enquanto que um artista plástico ou escritor deve ser estimulado a " introduzir toda a sua capacidade criadora naquilo que é o suscitar da relação que se estabelece com a natureza". Já o artesão "naquele ato às vezes repetitivo, vai, no fundo, garantir que a criatividade seja enraizada, seja entendida. E o artesão tanto é o cozinheiro, como o artífice do barro ou da pedra".

As metas que vão ser propostas vão ter também como fio condutor a sua "realizabilidade". "Estamos a trabalhar para o largo prazo, atingiremos o nosso objetivo se daqui a uns anos se disser "aquele grupo apontou no caminho certo"", defende Guilherme d"Oliveira Martins. Por isso, lembra "estamos a trabalhar para as próximas gerações. Não é possível fazer depender a política educativa dos ciclos políticos ou eleitorais". Nesse sentido, este perfil deve ser "abrangente, corresponder a um denominador comum relativamente à sociedade portuguesa hoje, com toda a sua diversidade e complexidade".

Fonte: DN