As suas infâncias não foram fáceis porque não é fácil ser diferente. Há sempre quem fique a olhar, a cochichar ou a dizer mal mesmo à frente, a achincalhar, a gozar, a chamar nomes, a dar alcunhas, a fazer sofrer. E há que crescer com esse sofrimento.
No seminário Inclusão-Educação e Autodeterminação, que decorreu no sábado, 28 de Setembro, em Coimbra, promovido pela Associação de Paralisia Cerebral de Coimbra (APCC), ouviu-se toda a gente: os técnicos, os decisores políticos, os pais e os filhos, aqueles que sofrem as lesões cerebrais que os impossibilitam de ser como os outros.
E eles contaram as suas histórias. "As crianças são cruéis", dizem com o rosto de quem lembra o que se passou mas que não conta porque todos imaginamos e sabemos como as crianças podem ser. "Os recreios passava-os ao lado da 'contina'", revela Susana Ferreira. Só João Vieira, o único rapaz do grupo de cinco é que diz, satisfeito, que também ele levava puxões de orelhas como os colegas e jogava com os outros.
Alda Matos, doutorada e professora do ensino superior, conta que quando estudava, os colegas do curso de psicologia chegaram a perguntar-lhe se a paralisia cerebral não era ter o cérebro parado. "Se assim fosse eu estava morta!". Não a paralisia cerebral é uma lesão no cérebro e não faz destas pessoas estúpidas ou atrasadas, apenas mais lentas, a fazer as coisas com mais dificuldade, mas fazem, contam Teresa Melo, Paula Matos e Susana Ferreira.
A crueldade das crianças ajudou-os a serem quem são: pessoas fortes. "Eu sou teimosa", diz Paula Matos que faz o mestrado em gerontologia, participou na tuna académica e gosta de ajudar o próximo. "Eu consigo, demoro mais um bocadinho mas faço", afirma Susana Ferreira, que trabalha na área dos seguros. "Eu sou capaz", declara Teresa Melo, formada em História de Arte.
A autodeterminação. Demoram mais tempo a subir para o autocarro, mas sobem sozinhos. Têm dificuldade em cortar uma folha de papel, mas cortam. Custa-lhes verbalizar uma ideia mas fazem-no. "Ainda existe discriminação mas só nós é que podemos mudar as mentalidades. Os nossos exemplos é que nos podem tornar inclusivos", defende Teresa Melo.
Tiveram pais protectores, que os controlavam, que tinham medo de lhes dar liberdade, que os protegiam na tentativa de os proteger, de não os fazer sofrer. Por isso, Alda Matos lembra aos pais que "os filhos têm potencialidades. Se os estiverem sempre a proteger, podem impedir que desenvolvam as suas potencialidades", alerta.
Teresa Melo tem a experiência da maternidade e por isso diz aos pais: "Devem deixá-los lutar, prosseguir o seu percurso, deixá-los ter uma palavra a dizer, a terem autodeterminação".
Uma mensagem que não é só para os pais dos filhos com paralisia cerebral, mas para todos nós.
Bárbara Wong
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