Há vários dados que sobressaem da investigação: mais de metade dos psicólogos escolares trabalham com quatro ou mais níveis de ensino em simultâneo, o rácio de um técnico para mil alunos não é cumprido à risca e ainda há profissionais no sistema de ensino público e privado em regime de prestação de serviços. O estudo Psicólogos Escolares em Portugal: Contributos para a Sua Caracterização Profissional, assinado por Sofia Mendes e Isabel Abreu-Lima, ambas da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação da Universidade do Porto, e Leandro Almeida, do Instituto da Educação da Universidade do Minho, foi publicado na revista Psicologia, Educação e Cultura, na edição de maio deste ano. Com um alerta no final do artigo: "A título de conclusão é ainda de referir que, com a recente reorganização da rede escolar em mega-agrupamentos, se prevê que a curto prazo os psicólogos escolares possam ver agravadas as suas condições de trabalho, sendo chamados para intervir junto de populações ainda mais numerosas e diversificadas que as encontradas neste estudo."
Durante o ano letivo de 2011/2012, os investigadores questionaram 477 psicólogos, com idades compreendidas entre os 24 e os 61 anos, colocados nos Serviços de Psicologia e Orientação (SPO) de escolas do ensino público e privado. Uma amostra de 88% mulheres, 80% do setor público, 37% do Norte, 22% do Centro, 29% do Sul e 12% das Ilhas. Sessenta e três por cento com licenciatura, 35% com mestrado, dois com doutoramento. O inquérito aplicado tinha 10 secções que abordavam várias questões, nomeadamente práticas profissionais, satisfação, desafios que se colocam no exercício da profissão, situação, experiência. Até porque o estudo insere-se num projeto de investigação que se pretende mais amplo, no sentido de caracterizar e analisar a implementação da psicologia escolar no nosso país.
Dos psicólogos inquiridos, 46% trabalham no ensino básico, 24% no secundário e 30% em contextos escolares que combinam estes dois níveis de ensino. O estudo revela que 62% dos profissionais trabalham em escolas que operam com quatro ou mais níveis de ensino em simultâneo. "No setor público, observa-se ainda o desafio dos SPO terem sob a sua área de influência um conjunto de escolas dispersas geograficamente, situação raramente encontrada no setor privado (7%). Assim no subsistema público, 30% dos psicólogos escolares referem ter sobre a sua área de influência apenas uma escola, 20% duas a cinco escolas, 20% seis a nove, 16% dez a quinze escolas e 14% dezasseis ou mais escolas dispersas geograficamente", sublinha a investigação.
Em termos de vínculo laboral, constata-se que no ensino público 57% dos psicólogos têm contrato a tempo indeterminado, 40% a tempo certo e 3% em prestação de serviços. No privado, 51% dos profissionais estão a tempo indeterminado, 42% a tempo certo e 7% em regime de prestação de serviços. "Tanto no setor público como privado predominam os contratos de trabalho por tempo indeterminado e a termo certo. Em ambos os setores, o elevado número de profissionais contratados a termo certo reflete a tendência atual por vínculos mais instáveis, ditos mais flexíveis, de trabalho". Modelos de contratação que, segundo os investigadores, refletem a instabilidade nas políticas de apoio aos alunos e à comunidade educativa, podendo prejudicar a atuação dos SPO.
A incerteza das modalidades de contrato aplicadas em cada ano letivo pode dificultar a intervenção dos técnicos dos SPO. "Por outro lado, e sobretudo ao nível do setor público de educação, o duplo regime de contratação dos psicólogos escolares, em vigor desde 2007, gera desequilíbrios de estatuto e de legitimidade dentro da profissão, não favorecendo a valorização e reconhecimento público deste grupo profissional."
O rácio recomendado de um psicólogo para mil alunos tende a não ser respeitado. "Observa-se como exceção a situação da região autónoma da Madeira e dos Açores, onde o rácio psicólogos-alunos apresenta valores médios mais adequados", adianta o estudo. Situação oposta é encontrada sobretudo em estabelecimentos de ensino suburbanos. "Note-se, porém, que os resultados obtidos apontam para uma grande variabilidade de situações, o que significa que se alguns profissionais estão a trabalhar com populações consideravelmente inferiores aos valores médios reportados, outros encontram-se a trabalhar com populações consideravelmente mais numerosas que chegam a ultrapassar os 3000 alunos". Recorde-se, a propósito, que no início deste ano letivo, o Sindicato Nacional dos Psicólogos alertou para a existência de psicólogos a trabalharem com 4000 alunos.
O estudo sublinha que, nos países mais desenvolvidos, os psicólogos estão integrados nas escolas, onde, em colaboração com os restantes profissionais, contribuem para a melhoria dos processos de ensino-aprendizagem, para a promoção da saúde mental, para o bem-estar psicológico e para o desenvolvimento de todos os elementos da comunidade educativa.
"Em Portugal, apesar da presença dos psicólogos nas escolas ter uma história de mais de 30 anos, a área da psicologia escolar continua a carecer de produção teórica e empírica, consistente e sistematizada, que possibilite caracterizar, de forma longitudinal, os psicólogos escolares e a sua prática profissional".
Os Serviços de Psicologia e Orientação têm, no nosso país, regulamentação própria desde o início da década de 90. O apoio psicopedagógico, o apoio ao desenvolvimento do sistema de relações da comunidade educativa e a orientação escolar e vocacional são as principais áreas de atuação definidas. Os psicólogos escolares têm um papel importante. Apoiam o desenvolvimento integral dos alunos e a construção da sua identidade; ajudam os alunos no processo de aprendizagem e de integração escolar; colaboram na deteção, avaliação e acompanhamento dos alunos com necessidades educativas especiais; contribuem para a identificação de interesses e aptidões dos estudantes; desenvolvem ações de aconselhamento psicossocial e vocacional; e ainda colaboram em experiências pedagógicas.
Por Sara R. Oliveira
In: Educare
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