Representantes dos professores, dos diretores e dos pais e encarregados de educação dos alunos do básico e secundário reagiram nesta quinta-feira indignados ou preocupados à publicação do diploma legal que estabelece o regime de transferência de competências do Governo para os municípios. No caso da Educação, está previsto que o processo arranque no próximo ano letivo em cerca de dez concelhos, com base em projetos-piloto que também terão ficado desbloqueados nos últimos dias. Há quem anuncie que está aberto o caminho “a uma escola pública a várias velocidades” e “ao agravamento das desigualdades de oportunidade entre os alunos”. (...)
"Tudo isto acontece", criticou o presidente da Confederação Nacional das Associações de Pais (Confap), Jorge Ascenção, “sem garantir de qualquer forma que a transferência não é uma mera ‘deslocação de competências'” para as câmaras. Isto significa o quê? Que em vez de serem definidas por um bom ou mau ministro da Educação as políticas passam a ficar sujeitas à competência ou falta dela de centenas de presidentes das câmaras e de vereadores da Educação? Onde é que está garantido, na lei, o envolvimento da comunidade local?”, protestou Ascenção.
Em sintonia, Manuel Pereira (da Associação Nacional de Dirigentes Escolares) e António Parente (da Confederação Nacional Independente das Associações de Pais), (...) veem "aberto o caminho ao fim da escola pública igual para todos". “De repente, ficamos sujeitos à maior ou menor sensibilidade de um presidente da câmara para a área da Educação” diz o primeiro; “e à sua competência e até à sua personalidade”,acrescenta Parente, que pergunta: “Quem é que vai perguntar de que concelho veio cada aluno – e se a experiência da descentralização ali correu bem – quando chegar o momento de todos se candidatarem ao ensino superior?”.
Todas estas pessoas (...) criticam o “secretismo” de que foi rodeado o processo. Até “tudo estar decidido”, frisou Filinto Lima, da ANDAEP, “o MEC não ouviu ninguém. E, depois de decidir, limitou-se, como sempre, a fingir que ouvia”. “Quanto aos pais, nada, zero. Aparentemente, as famílias não têm nada a ver com um processo tão importante quanto este”, criticou igualmente Jorge Ascenção.
A maior parte manifesta-se expectante em relação aos termos finais das diferentes minutas de protocolo a celebrar entre o Governo e os “cerca de dez” (porque ainda ninguém revelou o número certo) municípios que vão arrancar com o projeto-piloto, que terá a duração de quatro anos.
Depois de meses de impasse parece certo que já não faltará muito para que minutas (diferentes de câmara para câmara) sejam abertamente divulgadas e assumidas. Nas últimas semanas, o acordo já estava preso apenas pelo envelope financeiro que acompanha a transferência de competências. E os serviços de imprensa da Câmara Municipal de Matosinhos confirmaram (...) que, no caso daquele município, esse problema ficou desbloqueado quarta-feira. Apesar de isso ainda não constar de uma proposta escrita, ali, o Governo terá aceitado não só financiar as despesas correntes, mas também a conclusão das obras interrompidas em duas escolas secundárias do concelho, a Augusto Gomes e a Padrão da Légua. (...)
O que em cada caso estiver escrito pode influenciar posições. O presidente do Conselho das Escolas (um órgão consultivo do Ministério da Educação) frisou que a legislação conhecida esta quinta-feira não traz nada de novo, pelo que terá de analisar as minutas; Jorge Ascensão mostrou esperança na probabilidade de as câmaras terem negociado, como já veio a público, o poder dos conselhos municipais da educação, por exemplo; Filinto Lima quer conhecer o que será aplicado, na prática, e diz querer “acreditar que os quatro anos servirão para ir limando arestas”.
Há semanas, o presidente da Câmara de Óbidos, Humberto Marques (outra das câmaras que aderiram ao projeto), disse não ter dúvidas de que “a intenção de todos os municípios é envolver todos os atores locais”. No seu município, especificou, uma comissão de que fazem parte a direção do agrupamento, representantes dos professores, dos pais, dos alunos e da autarquia estavam analisar e a melhorar a matriz de responsabilidades de cada uma das partes, atribuindo-as à câmara, à direção escolar ou ao Conselho Municipal de Educação.
Fonte: Público
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