A Escola Rafael Bordalo Pinheiro, nas Caldas da Rainha, acolheu [26 de março] o “Dia Paralímpico na Escola”, uma iniciativa promovida pelo Comité Paralímpico de Portugal (CPP) e que contou com o total apoio na organização da Câmara Municipal das Caldas da Rainha.
Dinamizar e desenvolver actividades que coloquem os participantes em contacto com a realidade paralímpica e com os princípios do “Movimento Paralímpico”, promovendo a inclusão através do desporto, é o objectivo desta iniciativa que vai passando por diferentes escolas do País ao longo de cada ano lectivo.
Nas Caldas da Rainha, o Dia Paralímpico foi um êxito.
Além da excelente adesão e envolvimento dos alunos dos vários agrupamentos de escolas participantes nas várias modalidades paralímpicas, todos concordam – alunos e organizadores – que o caminho para uma sociedade inclusiva começa a ser trilhado na Escola.
Humberto Santos, presidente do CPP, começou por registar o “significativo entusiasmo” dos alunos enquanto experimentavam as várias modalidades. Mas também a surpresa com o nível de desafios que as pessoas com deficiência enfrentam a vários níveis.
Humberto Santos exemplifica: “os miúdos que estão habituados a jogar basquetball em pé, onde a impulsão é fundamental, quando jogam em cadeira de rodas têm muito mais dificuldade em conseguir chegar aos cestos. Ou seja, aquilo que acham fácil fazer quando veem os jogadores de cadeira de rodas, quando têm de fazer a dupla coordenação de manejar a cadeira de rodas, mais a diferença de altura, é de facto um momento distintivo”.
E este confronto com as dificuldades, esta consciencialização, é absolutamente determinante na formação de uma ética pessoal e social pautada pela inclusão. Neste capítulo, o desporto pode desempenhar um papel fundamental.
“Aquilo que o Comité Paralímpico pretende com estas iniciativas é sensibilizar estes jovens – que irão ser os homens de amanhã, que terão as organizações do País nas suas mãos – para que tenham então uma sensibilidade diferente. Isto é, que quando olham para o desporto de pessoas com deficiência passem a olhar de uma forma mais atenta e que a diferença não tem de significar menos valia”, nota o presidente do CPP, que prossegue dizendo: “Cada um de nós, independentemente das nossas capacidades físicas e intelectuais, temos competências que devem relevadas e consideradas.
Para o CPP, o desporto pode ser o melhor instrumento de sensibilização e consciencialização para uma cultura de igualdade e diversidade, em que todos somos, de facto, diferentes, mas que para todos deve haver um espaço”.
Segundo o Comité Paralímpico Nacional, e a exemplo do internacional, o desporto é uma forma de inclusão social das pessoas com deficiência e essa inclusão tem de se fazer com todos, sem excepção.
Humberto Santos explicou ainda que o CPP organiza um “Dia Paralímpico na Escola” por cada período lectivo, sendo que esta organização está essencialmente vocacionada para o universo escolar.
Para além deste evento, realiza-se anualmente o “Dia do Desporto Paralímpico”, destinado à comunidade em geral e que este ano irá realizar-se na cidade de Évora.
O presidente da Câmara Municipal das Caldas da Rainha, Tinta Ferreira e o vereador do Desporto e Educação, Alberto Pereira, estiveram na Bordalo Pinheiro para assistir às actividades.
Os autarcas estão em sintonia com os objectivos deste evento e com a pertinência que tem na formação dos jovens.
“Através da prática desportiva, os [nossos] jovens têm contacto com a realidade das pessoas que têm alguns handicaps e perceber o que sentem”, ilustra Tinta Ferreira. “ Isso contribui muito para a sua formação, para o conhecimento que têm do mundo que os envolve e quando forem os profissionais do futuro, nas mais diversas áreas, para além da riqueza e do conhecimento que lhes é transmitida nas escolas, têm também interiorizado que existe um conjunto de aspectos que devem ter em conta quando desenvolvem uma determinada actividade e passa por criar condições para uma sociedade efectivamente inclusiva”.
Da mesma opinião partilha Luis Ramos, um dos participantes neste Dia Paralímpico na Escola Bordalo Pinheiro.
Paraplégico há 12 anos, na sequência de um acidente de trabalho, conta que o desporto foi fundamental na adaptação à nova condição e na conquista da autonomia.
Enquanto deslizava rapidamente a cadeira de rodas pelo campo de basquete e roubava a bola aos adversários para a levar direitinha ao cesto, não consegue disfarçar o ar competitivo e a musculatura definida dos braços, que impulsionam a cadeira de forma precisa, deixam claro que em campo não há lugar a condescendências!
“[o desporto] Ajudou muito porque quando saí do hospital nem era capaz de andar numa cadeira. Não conseguia conduzir, meter a cadeira dentro do carro… e agora faço isso tudo, vou para qualquer lado sozinho se for preciso”, relata Luis Ramos que pratica basquete e andebol semanalmente. “gostei e nunca mais parei”!
Em relação às actividades do Dia Paralímpico, Luis Ramos afirma: “o que se está a fazer hoje já devia ter começado há 20 anos! É como uma árvore, que se planta hoje para colher os frutos daqui a uns anos: ajuda a criar uma nova consciência nas pessoas. Antigamente uma pessoa que ficasse de cadeira de rodas ficava confinada a casa e nunca mais dali saia e hoje não! Estes jovens, vão ser médicos, outros engenheiros, outros arquitectos… e nessa altura já vão pensar nas dificuldades das pessoas com deficiência, nas barreiras arquitectónicas… e começa tudo na escola”!
O desporto entra na vida de Luís Ramos, por convite de Manuel de Sousa, que também esteve presente neste evento na Escola Bordalo Pinheiro.
Manuel, 60 anos, paraplégico desde os 20. Vice-presidente da Associação Portuguesa de Deficientes (APO), delegação distrital de Leiria, tem viajado pelo mundo a praticar atletismo e paraquedismo. Pratica ainda karting e foi protagonista do primeiro salto de Paraquedas realizado em Portugal por um paraplégico. “Chamaram-me maluco quando eu saltei”, conta Manuel, “mas tinha esse sonho e para mostrar aos outros deficientes e à sociedade em geral que os deficientes não são os “coitadinhos” que muita gente pensa”, diz assertivo.
“Ainda há muito trabalho a fazer ao nível da mentalidade das pessoas mas não há dúvida que as coisas estão a mudar”, prossegue Manuel, referindo igualmente o que todos já haviam dito naquele dia: “e é na escola que começa tudo e se os alunos estiverem em contacto com pessoas como nós, isso vai reflectir-se mais tarde na sua vida adulta, nas suas atitudes e preocupações”.
Além da mudança de mentalidades, que todos os intervenientes neste dia reconhecem que está a evoluir no bom sentido, o grande problema das pessoas com deficiência são as barreiras arquitectónicas.
Manuel Sousa tem colaborado com diversas Câmaras e entidades no levantamento dos pontos problemáticos e na implementação das soluções adequadas. “Os engenheiros por muita boa vontade que tenham, há coisas que lhe escapam”, comenta aquele responsável da APO.
Nesse âmbito, não resistimos a perguntar-lhe o que acha das Caldas da Rainha e congratulámo-nos em ouvir que “não tem grandes problemas”.
O “Dia Paralímpico na Escola” nas Caldas da Rainha decorreu na Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro, entre as 9h00 e as 13h20, e contou com a participação de todos os agrupamentos escolares do concelho, do Centro de Educação Especial Rainha D. Leonor e Escola Técnica e Empresarial do Oeste (ETEO).
Judo, goalball, Boccia, Voleibol sentado, Basquetebol em cadeira de rodas e atletismo foram algumas das modalidades praticadas pelos alunos que “adoraram a experiência” e a consideraram “enriquecedora”.
Guadalupe Pereira, 18 anos, aluna da Bordalo Pinheiro, foi mais longe e afirma: “acho muito importante porque nunca sabemos o que nos pode acontecer por isso é uma experiência importante para todos nós!”
In: Local.pt por indicação de Livresco
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