Como
podem as escolas e os professores enfrentar com êxito o desafio de incorporar
na escola e na sala de aula as Tic, enquanto meios auxiliares do ensino e da
aprendizagem? Como devem reagir a resultados tão opostos, quando estudados os
efeitos da utilização das Tic na promoção do sucesso escolar e educativo dos
nossos alunos? Como evitar este jogo da cabra cega com que, volta e não volta,
nos encontramos cercados?
Iniciada
a segunda década do século XXI, temos já a bater-nos à porta uma terceira vaga
dessa revolução digital. E ela aí está, mais enérgica que qualquer das outras,
a deixar-nos cada vez mais interdependentes, a mudar tudo à nossa volta, a
mergulhar-nos num mundo de ficção, de perplexidade e de imaginário.
A
primeira vaga foi sustentada pela popularização e democratização dos
computadores pessoais e dos telemóveis; a segunda, pela massificação do acesso
à Internet e da oferta low cost da banda larga; a terceira está a ser protagonizada
pela redução de todas as fontes da cultura, do saber e do lazer ao formato
digital, acompanhada pela vulgarização do comércio electrónico de bens e
serviços, também eles em formato digital. A tendência é apetecível, as novas
gerações de consumidores já lhe deram o seu consentimento, logo, o caminho
anuncia-se irreversível. Sem ilusões: nada mais vai ser como dantes…
Metaforicamente,
poderíamos afirmar que, no futuro próximo, as grandes “fontes de poder” vão
estar ancoradas nas “fontes de água” e nas “fontes de saber”. As primeiras vão
rarear, as segundas, pelo contrário, irão proliferar. O que resultar desta
antinomia, deste confronto dialéctico entre o “saber” da natureza e o “saber”
do Homem, converter-se-á no futuro, futuro esse onde iremos passar o resto das
nossas vidas.
Mais
depressa, e de forma mais eficaz e definitiva, do que os CDs substituíram os discos de vinil, a música em formato digital
fará desaparecer, num curtíssimo espaço de tempo, o suporte musical em formato
de CD. Hoje, quem entrar num quarto
de um adolescente já não vê caixas de CDs,
nem livros espalhados por todo o lado. A música e os textos circulam em
suportes digitais, configurados em leitores Mp3,
em Pen Flash Drives, discos rígidos
externos, em smartphones ou em
leitores tipo Kindle. E os filmes
também. Não se vai à loja, à discoteca ou à livraria formais. Vai-se à Net e faz-se um download,
legal ou ilegal, tanto faz, desde que cumprido o objectivo. Permutam-se discos,
filmes e textos à velocidade de um clic, toma lá, dá cá. Uma parte das revistas
e livros em suporte de papel têm os dias contados. As bases de dados digitais
constituirão uma fonte inesgotável de conhecimento ao alcance dos dedos de uma
das mãos. Devido a isso, o crescimento do conhecimento vai evoluir de uma forma
exponencial. A humanidade poderá combater melhor as desigualdades, as doenças,
a fome, a miséria, o nepotismo e todas as formas de degradação do Homem. A
humanidade poderá, ainda, ser una e mais solidária, face ao desenvolvimento
social e ao progresso científico proporcionado por esta revolução digital.
A
Amazon divulgou que mais de cinquenta
por cento dos livros vendidos o foram já em formato digital (e-books). Ao preço
de um telemóvel pode-se comprar um gadget
(Kindle, Kobo…) armazenador e leitor de revistas e livros com capacidade
para guardar uma biblioteca de mais de quatro mil volumes. Estes livros e
revistas podem ser adquiridos on-line,
por wireless, ou através de uma
ligação 3G a preços populares, devido à óbvia diminuição de custos, em
livrarias virtuais. Pouco faltará para que se possa trazer no bolso a
biblioteca de Oxford, com possibilidade de aceder aos textos através de um
motor de busca à base de palavras-chave. Mais de cinquenta mil filmes são
alugados ou comprados no iTunes todos
os dias. A publicidade na Net já
alcançou mais de metade do valor investido nos meios tradicionais de
comunicação social…
Aviso:
não se trata do fim dos livros, jornais e revistas em suporte de papel. Como
não o foi o anunciado fim dos discos de vinil. Mas é um novo renascer dos
modelos de divulgação da cultura, da informação e da ciência, só comparável ao
renascimento proporcionado, nos finais da época de quatrocentos, pela prensa de
Gutenberg. Um novo renascimento que possibilitará crescimentos culturais e
científicos em ordem geométrica, dada a possibilidade de divulgação da
informação de forma generalizada e em poucos segundos.
E
a escola? E os professores e educadores? Já o afirmámos variadíssimas vezes:
vivemos um tempo que pretende reconfigurar a sociedade e a escola,
atribuindo-lhe um novo formato, centrado em renovadas formas de receber e
transmitir a informação. Isto implica uma busca permanente do conhecimento
disponível e das suas fontes de informação. Para alcançar tal objectivo,
imputa-se à escola mais uma responsabilidade: a de contribuir
significativamente para que se atinja o que se convencionou designar por analfabetismo
digital zero.
Para
tal, a educação para a utilização das novas tecnologias digitais precisa ser
planeada, com base no conhecimento pedagógico, desde o jardim-de-infância. Sem
preconceitos ou desnecessárias coacções, sem substituir atabalhoadamente o
analógico pelo digital, mas sim reforçando a capacidade cognitiva dos alunos e
guiando a descoberta de novos horizontes. Formando os professores e equipando
as escolas. Este movimento deve ser capaz de preparar os jovens para serem
leitores críticos e escritores aptos a desenvolver essas competências em
qualquer dos meios suportados pelas diferentes tecnologias.
É
que nem tudo parece ser um mar de rosas… Por exemplo, as escolas que viram a
sua média descer ou subir menos do que a média global nos exames do 9.º ano de
escolaridade, são as que mais usaram a Internet", como referiu Rodrigo
Belo, co-autor do estudo "The Effects of Broadband in Schools: Evidence
from Portugal", realizado em parceria com Pedro Ferreira e Rahul Telang.
Estes investigadores do Instituto Superior Técnico, Universidade Católica
e Carnegie Mellon University, sublinham que o estudo não mede os eventuais
impactos positivos do acesso generalizado aos computadores e à Internet na vida
futura dos alunos e apenas alerta para o facto de o acesso às novas tecnologias
não garantir, por si só, uma melhoria dos desempenhos.
Os
professores da designada geração digital
também já estão a chegar às escolas. E, com eles, as mudanças pedagógicas vão
ser mais rápidas, porque baseadas no domínio de novas competências, na
experiência e na forte motivação para o uso das novas tecnologias. A escola
tradicional vai mudar. Desde logo necessitará de menos espaços físicos. Através
da comunicação on-line, o contacto com o mundo exterior e com as outras escolas
da aldeia global será permanente.
Desta “conexão” de escolas globais – as connecting
classrooms - resultarão aprendizagens, também elas globais, e em
simultâneo, proporcionadas pelos vários docentes globalizantes, porque
globalizadores do conhecimento e da tutoria dos aprendentes.
O
que vamos fazer do “pátio dos recreios” quando, nos intervalos, os jovens já só
se confinarem à manipulação dos smartphones
ou das tablets? A resposta depende de
acreditarmos, ou não, de que a escola nunca deixará de ser a Escola e de que
nós nunca deixaremos de ser Professores.
João Ruivo
ruivo@rvj.pt
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