Nove meses de gravidez trazem a promessa de um relacionamento intuitivo com o bebé que nem sempre se cumpre. Como pegar-lhe ao colo? É normal que ele não olhe para a mãe? A que é que se brinca com um recém-nascido? Numa visita a Portugal, a pediatra Nadia Bruschweiler-Stern explica como método Brazelton pode ajudar famílias a lidar com estas e outras questões.
A busca de Nadia Bruschweiler-Stern do “bebé” começou na Medicina. Quando se especializou em Pediatria, sentiu que “se tratava o bebé como um organismo, com coração, pulmões, rins e tudo o resto, como um sistema onde tudo tinha que funcionar”, mas não era suficiente. Seguiu Pedopsiquiatria, onde trabalhou “a representação que a mãe faz do bebé, como ela o imagina e o que anseia para ele”. Mais uma vez não estava a olhar para o bebé. “Quando descobri o trabalho de Brazelton, encontrei finalmente o bebé”, conta-nos numa visita a Lisboa para participar na conferência internacional “Valuing Baby and Family Passion Towards a Science of Happiness”, a 7 e 8 de Maio, na Fundação Calouste Gulbenkian.
Nadia encontrou o método que procurava no trabalho iniciado por Berry Brazelton, que criou a Neonatal Behavioral Assessment Scale (NBAS), uma escala inovadora que funciona como instrumento de avaliação e permite aos médicos “ler” o bebé, o seu temperamento, vulnerabilidade e capacidade de relacionamento. É esta a orientação do Centro Brazelton, actualmente dirigido por Nadia Bruschweiler-Stern na Suíça, englobado numa rede internacional com mais de 15 centros pela América, Ásia e Europa. Em Portugal, o primeiro centro foi criado em 2000, tendo em 2010 sido incorporado na Fundação Brazelton/Gomes-Pedro para as Ciências do Bebé e da Família.
“Ao observar-se metodicamente um recém-nascido percebe-se que, tal como os adultos, todos os bebés são diferentes. Interrogamo-nos sempre: ‘Que tipo de bebé será e o que iremos descobrir sobre ele?’. Se analisarmos a criança no momento certo, descobrimos muito sobre o seu temperamento”, afirma Nadia que, regra geral, trabalha com bebés até aos dois meses de idade. Ao contrário do que se pensava quando a NBAS dava os primeiros passos, é impossível prever como será a criança uns anos mais tarde. “Uma questão essencial é que só conseguimos ver o bebé no contexto do ‘agora’, não conseguimos prever que tipo de pessoa será no futuro… E ainda bem. Isso seria assustador!”, desabafa.
Todos bebés, todos diferentes
Na impossibilidade de traçar um perfil psicológico a longo prazo, os pediatras interessados no método Brazelton ajudam as famílias a conectar-se com o bebé, chegando em muitas sessão a haver aquilo que designam por “momento de encontro”, a altura em que a mãe, por exemplo, percebe que o recém-nascido a reconhece como tal. Imagine-se uma mãe a olhar o filho recém-nascido no seu colo: “eu sei que sabes que sou tua mãe”. Depois deste encontro, que nem sempre acontece em ambientes de consulta, “o bebé é visto e compreendido como uma pessoa e a comunicação é totalmente diferente”, defende Nadia Bruschweiler-Stern.
Um dos exemplos práticos mais utilizados pela pediatra suíça é o caso do pequeno Lucas, um recém-nascido com uma deformação no pé. Os pais, em choque com a desfiguração, “congelaram”, como se “o processo de ligação tivesse sido interrompido”, e apresentavam dificuldades no relacionamento com o recém-nascido. Na consulta, conforme relembrou Nadia perante a plateia cheia da conferência na Gulbenkian, a mãe percebeu que o bebé lhe reconhecia a voz e descobriu finalmente “que apesar da deformação, havia um bebé ali que queria a sua atenção e amor. Foi um momento único e essencial para que a família ultrapassasse aquele problema”, recorda a médica.
Não há um “paciente-tipo” no consultório de Nadia, alojado na clínica privada Grangettes, em Genebra. “Os curiosos às vezes aparecem apenas porque sabem que há alguma coisa a acontecer com o bebé e não querem perder a oportunidade de descobrir o que é. Depois, há as razões psicológicas: pode ter havido uma perda na família e os pais não querem que a dor passe para o filho ou problemas no casamento. É possível que um bebé chore muito ou então que seja demasiado passivo e esteja sempre a dormir. Pode ser qualquer coisa…. Problemas de amamentação…é uma lista sem fim”, afirma a pediatra. Contudo, parece haver um padrão: “Nos dias de hoje muitos pais nunca tiveram um bebé nos braços e, como não sabem o que fazer, o que dizer ou como brincar acabam por lhes comprar demasiados brinquedos, em vez de se relacionarem.”
Uma das vertentes das consultas é orientar os pais, ensinando-os a ler os sinais e a interagir. “Ajudamo-los a sentir que controlam a situação. Como têm expectativas altas, alguns pais, sentem-se estúpidos e não querem fazer perguntas, porque acham que já deviam saber tudo. Isso pode gerar sentimentos de inadaptação e culpa”, afirma. O bebé que chora compulsivamente, deixando os pais mais tensos e menos compreensivos, é um exemplo clássico. “Quando não há relacionamento com o bebé é mais fácil culpá-lo. Depois de se estabelecer uma ligação, os pais percebem que não está a chorar só para os fazer acudir, mas sim porque não se sente bem. Aí entram em jogo as regas de sobrevivência e os pais acodem prontamente. É inato. É a natureza.”
In: Público
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