2. Alguns leitores escreveram-me a apoiar a iniciativa ministerial sobre a constituição das turmas com alunos com necessidades educativas especiais, por mim repudiada no meu último artigo. Descreveram mesmo, como fundamento, “abusos” que conhecem. Permitam-me, pois, que clarifique o que penso.
Integrar uma criança deficiente (eu sei que há quem evite o termo, mas os problemas não se resolvem mudando os nomes) supõe, sempre, tentar superar-lhe as dificuldades para que a integração seja possível. Há casos onde será sempre impossível, por melhores que sejam as ajudas específicas, conseguir que essa criança fique capaz de acompanhar os outros em todas as atividades. Sem rodeios, nesses casos, a integração será, simplesmente, uma falácia.
Na relação de uma turma regular com um aluno deficiente, o equilíbrio que uma sociedade avançada (e humanizada) deve procurar é proporcionar ao deficiente as vantagens, muitas, que para ele resultam da relação com os outros. Mas, para os outros (que também devem beneficiar do contacto com o colega, particularmente nos planos afetivo, moral e cívico) o equilíbrio citado significa que tudo se faça sem prejudicar o direito de progredirem ao seu ritmo. Ora isto só se consegue com medidas especiais de apoio durante as fases de integração, de que a redução do número de alunos é parte fundamental.
Poderá ser questionável o modo como se conjugam as duas coisas. Certamente que haverá erros, relaxamentos e, eventualmente, abusos. Mas qualquer iniciativa que reduza situações, sempre particulares, a quotas gerais só pode vir de quem não tem a mínima noção do que significa “ensino integrado”, muito menos dos problemas que se colocam a um professor do ensino regular, quando tem em sala alunos com necessidades educativas especiais. Dizer que quotas cegas forçam a integração é ignorância. Se não for ignorância, é sadismo. Ambas as hipóteses são inaceitáveis num ministro da Educação. Aliás, o recurso a quotas impróprias começa a fazer escola no ministério de Tiago Brandão Rodrigues. Também a mobilidade por doença está agora sujeita a rácios vergonhosos, que nem sequer consideram a dimensão dos agrupamentos.
3. Sob o título “O que faz uma boa escola”, veio a público mais um estudo sobre a educação dos nossos jovens. O estudo foi produzido no âmbito do projecto “aQueduto”, uma iniciativa conjunta da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do Conselho Nacional de Educação (CNE). O estudo analisa o que mudou entre nós, com base nos resultados e inquéritos do PISA, e conclui que a dimensão das turmas não influencia o desempenho dos alunos. Curiosamente, o CNE, num outro estudo, exatamente sobre a dimensão das turmas, concluiu haver uma relação entre essa dimensão e o tempo dedicado só ao ensino, o que, obviamente, tem forte impacto no desempenho dos alunos.
Cada vez há mais estudos a estabelecer relações entre as diversas variáveis presentes no processo de ensino e os respetivos resultados. A credibilidade desses estudos é grosseiramente ferida pelos mesmos erros (estabelecimento de conclusões ilegítimas, confundindo hipóteses com conclusões) e pelas mesmas estranhas coincidências (aparecem sempre por altura da vinda a público de teses politicamente apresentadas como corretas). Quando os analisamos em detalhe é fácil verificar que outras variáveis possíveis (conceção e desenvolvimento curricular, recursos disponíveis, autonomia e gestão das escolas, por exemplo), que não interessam a uma conclusão preordenada para sustentar determinada tese, não são consideradas.
Santana Castilho
Professor do ensino superior (s.castilho@netcabo.pt)
Fonte: Extrato da crónica publicada no Público
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