Os cálculos e a contextualização são do Sindicato Nacional dos Psicólogos (SNP) (...). Dos mais de 400 Serviços de Psicologia e Orientação (SPO) criados até 1997, o Ministério da Educação (ME) nunca informou quantos fecharam, quantos perderam os técnicos. “É certo que serão dezenas, talvez uma centena, os SPO que só existem no papel e em versões desatualizadas dos regulamentos internos das escolas”. Das mais de 400 vagas criadas entre 2007 e 2009, com a contratação de escola, 220 foram extintas em 2010, “sem justificação nem aviso prévio”. Resultado: mais de duas centenas de psicólogos ficaram sem trabalho, foram para o desemprego.
De 2011 até agora, terão sido criados cerca de 40 novos postos de trabalho. O SNP diz que não se trata verdadeiramente da criação de postos de trabalho, “mas antes a divisão de um horário completo de 40 horas em dois meios horários”. Estariam prometidos mais 200 postos de trabalho em janeiro deste ano, “novamente precários e com recurso ao Fundo Social Europeu”, mas ainda não se sabe se a medida vai, de facto, avançar. Existem dezenas, ou talvez uma centena, de profissionais diretamente associados a funções públicas – à Segurança Social ou a câmaras municipais, por exemplo - que trabalham em uma ou mais escolas, sem vínculo ou relação efetiva com a comunidade como um todo.
De cenário a cenário, qual a conclusão? “Ninguém sabe quantos somos, quantos deveríamos ser e quem o pode dizer recusa-se a fazer cálculos realistas, porque sabem, é certo, que os números estão muito aquém daquilo que se espera num país desenvolvido. Nas melhores estimativas, trabalharão 700 profissionais nas escolas portuguesas. Deveriam ser o dobro, pelo menos”, refere João Freire, do SNP. Na sua opinião, é indiscutível que a vida de uma escola já não passa sem serviços de psicologia e tudo o que isso implica. “O psicólogo escolar não é um luxo, é uma necessidade, indispensável como o professor de Educação Especial ou o professor de Português”, sublinha.
O dia 13 de novembro de 2014 foi um momento histórico para a classe. O Caderno Reivindicativo dos Psicólogos Escolares era entregue a quem de direito. Todavia, recorda o SNP, “não se fez acompanhar da disponibilidade merecida pela parte do ME da altura”. No início deste ano, o SNP reuniu-se com os grupos parlamentares e todos reconheceram a importância dos psicólogos no sistema educativo. A abertura de um concurso nacional com vista à efetivação, o ponto em que o sindicato mais insistiu, foi considerada necessária e importante. O aumento do número de profissionais nas escolas também. “Todos reconheceram que a instabilidade do vínculo profissional resulta em perdas para o sistema educativo como um todo, para os alunos e suas famílias e também para os profissionais.”
O SNP está satisfeito com a disponibilidade e recetividade para o diálogo manifestada por todos os partidos. “A nossa expectativa é que o sistema político, o atual governo, a atual conjuntura e a sociedade civil como um todo consigam não só reconhecer – somos por de mais reconhecidos – mas também efetivar com contratações os psicólogos nas escolas”, diz João Freire, que reconhece que o atual momento é politicamente histórico.
Nenhuma resposta chegou desde 13 de novembro de 2014 e o SNP aguarda para ver o que vai acontecer. “Todos os governos têm prometido mudanças. As promessas nunca se cumprem. Prometem porque sabem que quando uma turma já tem 30 alunos, a solução não é aumentá-la até 60 alunos. Não se duplica o número de alunos só porque não há recursos. Porque é que isto pode, então, acontecer com psicólogos? Porque é que se torna irrelevante se se trabalha com 500 ou com 5000 crianças e jovens?”, questiona o psicólogo.
Os tempos atuais exigem respostas. “Não queremos contratos, dependentes de Bruxelas e das variações políticas ou de troikas. Queremos postos de trabalho efetivos.” Exige-se, portanto, a efetivação do número necessário de profissionais nas escolas. Para quando? “Já”. “Um psicólogo numa escola, de forma permanente, tem um impacto semelhante ao de qualquer outro trabalhador que seja único. O psicólogo tem funções que lhe são exclusivas. Avalia, forma, orienta, acompanha, apoia e chega até a salvar a sua comunidade. Ser precário ou ter estabilidade perante estas competências não é um pormenor de somenos importância.”
O que aconteceu no Parlamento
O assunto está na agenda política. No dia 6 de janeiro, o SNP esteve com todos os partidos com assento parlamentar. O PS sublinhou que o problema da precariedade dos psicólogos é transversal ao setor público e privado, que se trata de uma questão mais global, e reconheceu a dificuldade em resolver esta realidade. Prometeu atenção ao tema que integra no combate à precariedade de uma forma mais geral. O PSD, por seu turno, lembrou algumas medidas tomadas nos últimos anos, como o aumento de vagas e a entrada mais cedo no ano letivo, mas admitiu a insuficiência de lugares no quadro das necessidades dos psicólogos escolares. Mostrou-se disponível para manter o diálogo.
O BE percebe as reivindicações do SNP e concorda com elas. Prometeu integrar a discussão dos procedimentos concursais no âmbito do fim da Bolsa de Contratação de Escola, com vista à regulamentação da profissão e fim do trabalho precário dos psicólogos contratados. O PCP, que tem defendido a contratação de um maior número de psicólogos, concorda com o conteúdo do caderno reinvidicativo dos psicólogos escolares e garantiu que vai promover iniciativas parlamentares ou legislativas que permitam lutar contra a precariedade, pela carreira e pela efetivação - medida que contemplaria também a possibilidade de mobilidade dos psicólogos já efetivos.
O CDS-PP pediu uma proposta sobre o número de psicólogos necessários nas escolas, de forma a incluir essa pretensão no Orçamento do Estado. O SNP respondeu afirmativamente, mas sublinhou que, mais do que apenas o número de profissionais contratados, a modalidade de contratação é o ponto central das suas reivindicações. O Partido Ecologista Os Verdes manifestou a total solidariedade com os pedidos dos psicólogos, considerando que esses técnicos são fundamentais na escola pública. “Lutaremos pelo lugar do psicólogo escolar, acreditando que ele é nas escolas portuguesas, em paridade com os restantes agentes educativos, uma peça fundamental da educação das nossas crianças e jovens”, garante o sindicato, que dedica esta etapa a todos os psicólogos escolares, em especial aos que participaram na resposta, elaboração e entrega do caderno reivindicativo.
Último concurso em 1997
A psicologia nas escolas tem uma história no nosso país. Tem muitas batalhas durante o percurso e um problema de implementação, comum a outras classes profissionais, sobretudo as que fazem parte do setor social. “Com os primeiros licenciados em Psicologia e com o vigor do pós-25 de abril, logo no início dos anos 80 começaram a abrir-se portas para a constituição dos gabinetes de psicologia nas escolas. Durante essa década, o trabalho foi ganhando implementação, contando até com a relação por vezes agridoce da função de professor conselheiro (professores requalificados pelo Instituto de Orientação Profissional – IOP) que conduziu os Serviços de Psicologia a, em 1991, ganharem um regimento jurídico”, recorda João Freire. Os Serviços de Psicologia e Orientação (SPO) nasciam assim em 1991.
Com luta e persistência dos profissionais que estavam no terreno, de professores universitários, entre outros, os serviços de psicologia nas escolas cresceram na década de 90 do século. Em 1997, é aberto o concurso para quadros de psicólogos escolares no SPO. Foi o último. “Após isto, começam os longos anos de subsidiodependência destes serviços e de outros pelo país. Logo a partir de 1998, entre PRODEP e outros programas, a colocação de profissionais de psicologia em escolas ganhou este traço de trabalho à jorna, sempre associado aos fundos comunitários.”
Dez anos depois, o ME volta a contratar em massa mas, segundo João Freire, “de forma precária e em formato de presente envenenado, com a contratação de escola”. “Não é raro que muitas destas contratações, que persistem até agora, nove anos volvidos, sejam também elas dependentes de fundos comunitários, como é o caso dos contratos de psicólogos para as escolas de Territórios Educativos de Intervenção Prioritária”, refere.
Fonte: Educare
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