Num dos mais recentes estudos realizados a nível mundial, com respondentes de 59 países, sobre os efeitos da pandemia covid-19 nas escolas, a OCDE traça um cenário bastante otimista sobre o modo como os sistemas educativos responderam de imediato aos problemas surgidos. No entanto, são referidas algumas dificuldades.
Uma das primeiras ideias com que se fica da leitura do relatório “Schooling disrupted, Schooling rethought” é que ainda estamos na 1.ª fase das mudanças operadas nas escolas, sendo necessário enfrentar com realismo a 2.ª fase, que já está entre nós, representando um período que exige medidas de distanciamento, tal como cuidados de higienização em larga escala. Aliás, o relatório é quase um guião para preparar essa 2.ª fase a todos os níveis da escola e da comunidade.
O relatório é otimista por várias razões. De várias, enuncio três:
As respostas dadas pelos diferentes sistemas educativos revelaram a existência de uma notável resiliência, flexibilidade e autonomia para que estratégias urgentes e de continuidade das atividades de aprendizagem fossem estabelecidas, de modo a enfrentar as consequências resultantes do encerramento da escola presencial.
Os professores e os alunos, bem como as famílias e outros agentes escolares adaptaram-se de forma inovadora aos desafios surgidos com a pandemia, sobretudo na realização de atividades escolares através do ensino à distância. Porém, os resultados indicam que os professores não têm uma ideia suficientemente positiva quanto à avaliação que fazem sobre a eficácia dessas atividades.
As estratégias de continuidade das atividades escolares promoveram o desenvolvimento profissional dos professores, pelo que o ensino à distância pode ser associado à melhoria das escolas e das aprendizagens, estando também ligado à promoção de uma aprendizagem mais autónoma e independente dos alunos. Aliás, conclui-se que as mudanças verificadas nas escolas revelaram o enorme potencial de inovação que estava adormecido em muitos dos sistemas educativos. Ou seja, a escola sai desta crise mais credibilizada socialmente.
Desta 1.ª fase, em que as escolas tiveram uma elevada capacidade de mobilização de sinergias, e ainda na perspetiva da OCDE, há duas lições a tirar. A primeira, mais negativamente, está relacionada com as desigualdades e as disparidades no acesso e no uso das tecnologias digitais, constituindo um sério problema quando são comparados alunos de diferentes grupos socioeconómicos. Ao invés, a outra lição reforça a convicção de que a pandemia está a contribuir para fomentar as competências indispensáveis para a educação do século XXI.
Com o retorno à escola, de modo faseado, conforme os níveis e os ciclos de escolaridade, os desafios são ainda mais significativos. Para além do investimento que é necessário fazer em educação — e o que mais é valorizado pelos respondentes é a criação de condições para uma escola digital, com a garantia de uma efetiva conetividade, cada vez mais segura, entre alunos e professores —, o ensino à distância combinar-se-á, pelo menos durante a 2.ª fase, com atividades de ensino presencial. É um retorno diluído no tempo e certamente que o digital passará a fazer parte do quotidiano das escolas, não substituindo jamais a relação pedagógica, como se tem pretendido com os sucessivos recursos introduzidos na escola.
Para isso, e uma vez garantidas as condições indispensáveis para uma escola diferente (mais digital nas suas atividades de ensino e aprendizagem, com mais comunicação ao nível da comunidade educativa e mais autónoma na gestão do currículo), é urgente refletir sobre o que é que a escola exige aos alunos, quer ao nível do conhecimento que é essencial, independentemente das possíveis formatações curriculares, quer ao nível das competências socioemocionais.
No relatório citado, é bem evidenciada a alteração que a pandemia provoca no modo de os alunos olharem para os problemas do mundo, a partir das aprendizagens realizadas na escola.
José Augusto Pacheco
Professor do Instituto de Educação da Universidade do Minho
Fonte: Público
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