sexta-feira, 26 de junho de 2020

Bendita telescola!

Sim..."bendita"!

Imagino que esteja, neste momento, a supor que me enganei no título. Ou que, como se desse uma pirueta, surgisse a defender os ecrãs como salas de aula. Ou que, depois de repensar, não deixasse de elogiar horários de telescola de muitas escolas que funcionam das 9h às 4h, todos os dias, seguidos de trabalhos de casa, com recurso a mais ecrãs. Ou que fizesse de conta que uma escola solitária, sem recreios nem algazarra, onde se pode estar em "teletrabalho" sem se sair do quarto fosse uma coisa "normal". Ou imagino que suponha que eu tenha deixado de lembrar que não, as crianças não estão em aulas. Que elas não podem, saudavelmente, dedicar a mesma atenção com que jogam Fortnite a uma teleaula de matemática. Que o terceiro período é, sobretudo, uma versão XXL de trabalhos de casa. Que há milhares de crianças com "absentismo de escola" (que devia merecer o mesmo alarme que existe quando há crianças com absentismo escolar) por falta de um computador pessoal ou de recursos de comunicação. Ou, finalmente, que tenha deixado de acentuar que as consequências da pandemia para a relação das crianças com a escola são do domínio da calamidade pública.
Mas numa coisa a telescola tornou-se "bendita": fez com que os pais conhecessem os filhos melhor do que nunca. Fez com que passassem a reconhecer as dificuldades deles como, antes, não as conseguiam perceber. Fez com que os pais "descessem" até ao pensamento dos filhos e pensassem as várias disciplinas a quatro ou a seis mãos. E fez com que eles, como nunca, dessem conta das duas versões de um mesmo filho, quer quando ele está encolhido nas "aulas" quer quando se agiganta por casa.
As crianças saem do "terceiro período" com melhores pais! E saem melhores! A telescola deu mais pais à escola. E deu "mais escola" aos pais. Pena é que muitas crianças estejam a sair da quarentena com o ensino à distância. O que faz com que a sua educação precise de passar pelos "cuidados intensivos" para que a sua relação com a escola não adoeça. Para sempre.

Eduardo Sá

Fonte: Eduardosa por indicação de Luísa Leitão

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