1. Quem conheça minimamente o que se passa no nosso sistema de ensino, e tenha lido o que a Direcção-Geral da Educação publicou (Relatório de Acompanhamento, Monitorização e Avaliação da Autonomia e Flexibilidade Curricular), só pode sentir repulsa pelo descaramento do discurso oficial. A avaliação séria é feita por instâncias independentes, que se pronunciam com base na análise de processos, documentos e resultados. Uma narrativa bajulatória, em que os juízes são os promotores do que é avaliado, é uma fraude.
Aquele relatório é uma infeliz exaltação das pessoas e das políticas que estão a destruir o sistema de ensino. Enquanto nas escolas, 2.º período já adiantado, cerca de 30 mil alunos estão sem professor, pelo menos a uma disciplina, a propaganda oficial tortura os números e manipula os factos, para enganar os portugueses. Entendamo-nos: a inovação que o relatório incensa é tão-só a retomada de pedagogias datadas, que falharam quando há décadas foram usadas; a flexibilidade curricular que o relatório elogia é a metáfora oficial para promover a degradação do currículo coerente, com a intencionalidade de conseguir resultados falsos; a autonomia que o relatório glorifica é um disfarce sem vergonha para a pulsão controladora dos dois últimos governos do PS. Daquele relatório não se retira qualquer contributo para resolver os desafios que se colocam ao futuro da Educação.
3. De proveniências diversas, foram muitas as loas tecidas a propósito de mais uma vitória nacional: a nossa taxa de abandono escolar precoce fixou-se em 5,9%, quando na União Europeia está estabilizada em torno de 10%. Acontece que esta taxa não mede o que quem rapidamente a elogiou terá pensado. Esta taxa é calculada a partir do Inquérito ao Emprego, que não a partir das bases de dados do Ministério da Educação e dos percursos dos alunos. Dito de outro modo: só ficam sob o radar dos cálculos os jovens entre os 18 e os 24 anos que procuram oficialmente trabalho, sem terem concluído o ensino obrigatório. Não contam para os cálculos os que não se alistem oficialmente ou os que, não tendo concluído os estudos, estejam a frequentar uma qualquer formação, das muitíssimas que existem e mascaram a realidade. Isso mesmo reconheceu uma auditoria do Tribunal de Contas (Junho de 2020), particularmente crítica em relação às metodologias utilizadas para medir o abandono escolar, onde se lê que “não existem, no sistema educativo nacional, indicadores para medir este fenómeno”. No mesmo sentido se pronunciou o Conselho Nacional de Educação (CNE), quando afirmou que os “número reais” do abandono “devem ser superiores aos valores oficiais”.
Santana Castilho
Fonte: Público por indicação de Livresco
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