Quando Anabela Meira e Rui Lopes, de Paredes, colocaram a filha Leonor num infantário, aos 18 meses, já estavam acostumados, em casa, a respostas desconcertantes por parte da criança. O que não sabiam, na altura, é que a perspicácia era já resultado de um nível de conhecimento acima da média. Descobriram que tinha um QI de 158 - um adulto normal tem 100 -, já quando tinha dois anos, depois de episódios de algum desinteresse em relação às atividades do colégio.
"Entrou na sala dos dois anos e, ao início, a adaptação foi normal. Entretanto, começou a haver alguma frustração. Transitou para a sala dos três anos, ainda com dois anos, mas chegou ao colégio e disse que não conseguia respirar", recorda a mãe, para explicar que foi nessa altura que pediu ajuda a especialistas, para perceber a crise de pânico, uma vez que, em casa, a filha nunca assumiu as suas capacidades.
"A psicóloga entendeu que a Leonor tinha precocidade intelectual e indicou-nos a ANEIS. Saiu-nos o jackpot", sublinha a mãe, dando conta que foi a parceria da associação com o colégio que permitiu um acompanhamento adequado da filha.
Leonor entrou na primeira classe com apenas quatro anos de idade, "o primeiro caso em Portugal", diz o pai. Quando ainda não tinha terminado o quinto ano, foi integrada numa turma de sexto ano. Assim, aos nove anos, vai entrar no sétimo ano de escolaridade. Entre este período, desdobrou-se quase sempre entre turmas do seu ano letivo com outras mais avançadas, para se manter motivada. "Estava numa turma de segundo ano e lia manuais do terceiro. Quando estava no terceiro ano, acompanhava as aulas do quarto. E no quarto ano ia a aulas do quinto. E fazia os testes de ambos os anos. Foi uma confusão", conta Rui Lopes, criticando a falta de atenção do Governo para com estas crianças.
Já mais integrada, é a própria Leonor que assume que a diferença já a levou a episódios de exclusão escolar. "Eles achavam que era estranha, porque sabia mais coisas", admite.
Nasceu em Braga mas ajuda sobredotados de todo o país
Há 22 anos, um conjunto de professores, psicólogos e estudantes fundaram a Associação Nacional para o Estudo e Intervenção na Sobredotação (ANEIS). Inicialmente sediada e centralizada em Braga, o projeto ganhou dimensão e instalou-se noutros pontos do país. Agora, é mentora do Observatório para a Sobredotação e Talento, uma plataforma que quer perceber como é que a maioria destas crianças e jovens estão a ser acompanhadas nas escolas.
Financiado pelo programa "Cidadãos Ativos" - gerido pela Fundação Gulbenkian e Fundação Bissaya Barreto -, durante cerca de dois anos, o projeto prevê formar técnicos, professores e educadores que lidam com estes menores. "Queremos fazer um levantamento de como estão a ser acompanhados, que medidas são implementadas nas escolas, se beneficiam de medidas de aceleração escolar, de enriquecimento ou diferenciação. Queremos saber as suas necessidades", elucida o presidente da ANEIS, Alberto Rocha.
O responsável adianta que o programa, que chegará a escolas de oito distritos, incluindo Açores e Madeira, prevê um "kit do sobredotado", que permitirá a sinalização de alunos que ainda não estarão diagnosticados.
Além disto, o projeto espera agregar organizações não-governamentais, associações e outras entidades ligadas ao tema. "Uma plataforma agregadora para se criarem sinergias, definir estratégias e criar pressão para que se façam alterações legislativas", explica Alberto Rocha, dando como exemplo a necessidade de se permitirem avanços de mais de dois anos de escolaridade no percurso destes alunos, até ao Ensino Secundário. "Mas o objetivo maior é combater as desigualdades", conclui.
Fonte: JN
Sem comentários:
Enviar um comentário