domingo, 13 de setembro de 2020

Regresso às aulas. Como está a correr noutros países? Que lições há a tirar?

Alemanha, Dinamarca, Noruega, França, Escócia e Israel: seis países que podem servir de oráculo para o regresso às aulas em Portugal. Há soluções a copiar, lições a tirar e erros que é preciso evitar. O teste nacional arranca na próxima semana.


Olhar para a Alemanha, Dinamarca, Noruega, França, Escócia e Israel, por estes dias, é tentar adivinhar o futuro da pandemia. Nestes seis países, o regresso às aulas – que em quase todas as escolas de Portugal está marcado para o início da próxima semana – já aconteceu. Dos múltiplos relatos que chegam, há soluções que talvez valha a pena implementar. Mas há também alertas que não se podem ignorar.
De acordo com um relatório do Centro Europeu de Controlo e Prevenção das Doenças (ECDC), de 6 de agosto, menos de 5% dos doentes infetados com Covid-19 têm menos de 18 anos; e a larga maioria que contrai a doença não apresenta sintomas.
“Se o distanciamento físico e as medidas de higiene apropriadas forem implementadas, é pouco provável que as escolas sejam um ambiente de propagação que outros espaços de lazer com densidade populacional semelhante”, lê-se. As palavras do ECDC, contudo, não amenizam a preocupação a poucos dias da retomada das aulas presenciais em Portugal.

Em que países é que as aulas já arrancaram e o que pdoemos aprender com eles? A Renascença analisa seis casos, cinco deles na Europa. E levanta o véu sobre Israel: as escolas reabriram sem uso de máscara obrigatória e sem distanciamento mínimo entre alunos. O resultado? Face ao aumento de infeções, o Governo está agora a ponderar voltar a encerrar todas as escolas e serviços.

Alemanha

Um dos países que melhor pode servir de oráculo para o futuro é a Alemanha. A 7 de agosto, já há mais de um mês, cerca de 152 mil estudantes voltaram à escola.

Em solo germânico, os estudantes são obrigados a utilizar máscaras nos corredores, durante os intervalos, e quando entram nas salas de aula. Podem, contudo, tirá-las assim que se sentem nos seus lugares. Os professores têm acesso gratuito ilimitado a testes de despiste para o novo coronavírus. É recomendado evitar tocar em corrimões e que se desinfetem as mãos frequentemente.

Em vez de turmas, os alunos, em contexto escolar, foram reorganizados por grupos compostos por centenas de estudantes.

Cada grupo é aconselhado a não interagir com os restantes; os agregados têm áreas próprias para circular no campus, salas de convívio e cantina. Este sistema foi criado na expectativa de que, caso ocorra um surto, apenas o respetivo grupo entrará em quarentena, não a escola inteira.

Tal como em Portugal, a decisão de fechar ou não a escola será responsabilidade das autoridades de saúde locais, não da direção do estabelecimento de ensino.

Uma vantagem que Portugal não tem: os 16 estados federais não têm calendários escolares síncronos, logo o início das aulas ocorreu de forma faseada.

Telescola: segundo o Ministério da Educação alemão, tutelado por Anja Karliczek, o ensino à distância é um recurso para casos excecionais, como a falta de docentes. Cerca de 13 mil professores foram sinalizados como pertencentes ao grupo de risco.

Um indicador preocupante: 15 dias depois da reabertura dos 825 estabelecimentos de ensino de Berlim, foram anunciados casos positivos de Covid-19 em 42 escolas; centenas de alunos e professores foram então obrigados a fazer quarentena.

Noruega

Ainda Portugal estava em estado de emergência, já a Noruega reabria as escolas. No país nórdico, os estabelecimentos de ensino fecharam a 12 de março, mas a 20 de abril reabriram as creches; sete dias depois, as escolas primárias.

Em maio, já todos os estudantes tinham voltado aos seus lugares. Entretanto, decorreram as férias de verão e a 17 de agosto deu-se o segundo regresso às aulas. Tudo decorreu sem distanciamento social obrigatório.

De acordo com vários relatos, até ao momento a reabertura das escolas não levou ao surgimento de um número significativo de casos de Covid-19.

Uma solução: a Noruega implementou um “sistema semáforo” para orientar os estabelecimentos de ensino. O “verde” indica que as escolas podem funcionar normalmente, tendo por base os mesmos horários pré-pandemia; o “amarelo” aponta que as escolas devem tomar medidas para reduzir o contacto físico entre estudantes, professores e funcionários, e implementar medidas de higiene mais restritivas; já o “vermelho” indica que as escolas devem limitar o tamanho das turmas e criar horários alternados, de forma a diminuir o número de pessoas nos edifícios.

Apesar de o número de infetados com o novo coronavírus ter vindo a subir nas últimas duas semanas, com 1,126 diagnósticos, desde 2 de junho o nível de alerta na Noruega tem-se mantido no “amarelo”.

Em caso de surtos localizados, o país não irá encerrar a totalidade das escolas. Em vez disso, o “sistema semáforo” passará a diferenciar a região em causa.

Uma ideia: A pandemia irá integrar a matéria a dar em sala de aula. “Os professores vão falar sobre higiene e a Covid-19. Vão existir discussões sobre a pandemia e as necessidades dos alunos. É importante manter um foco nas doenças transmissíveis e, ao mesmo tempo, assegurar que os estudantes se sentem seguros e estão a tomar cuidados”, disse Aslaug Reitan, vice-diretora da escola Nyplass, em Vigelande, em declarações ao jornal “The Local”.

Prioridade às crianças: ao nível dos transportes públicos, as autoridades de saúde estão a recomendar que adultos, cujas profissões não sejam prioritárias, saiam de autocarros que estejam cheios (ou próximos disso) para dar lugar a crianças que se desloquem para as escolas.

Um alerta: a reabertura das universidades está a provar-se um problema na Noruega. As festas de receção aos novos estudantes estão a acontecer em número muito acima do esperado; a polícia não tem tido capacidade para dar resposta e desfazer os ajuntamentos. “As festas são divertidas, mas não se as pessoas ficam doentes e perderem os seus trabalhos ou tivermos de fechar a sociedade novamente”, veio já avisar Henrik Asheim, ministro norueguês do Ensino Superior.

Dinamarca

A Dinamarca foi a primeira nação europeia a reabrir as escolas a 15 de abril. Foram então impostas uma série de regras – da circulação à higiene - e não foi registado nenhum aumento abrupto de casos.; o Rt manteve-se sempre abaixo de 1.0.

A 1 de agosto, as regras de distanciamento social entre turmas foram suspensas para permitir o regresso dos trabalhos de grupo e a normal rotina escolar. Contudo, o distanciamento entre adultos e crianças ainda se mantém.

Ao contrário da maioria dos países europeus, o uso de máscara não é (nem nunca foi) obrigatório – para crianças e professores. A entrada de pais em recinto escolar foi proibida, salvo situações excecionais.

No ensino básico, as turmas foram divididas e foram criados grupos de 10 a 12 alunos. Depois, foi-lhes atribuído um professor. “Esse grupo estava junto todo o dia durante as aulas e tempo de lazer. Também tivemos de dar aulas no exterior o máximo possível”, explicou Dorte Lange, vice-presidente do Sindicato dos professores dinamarqueses, em entrevista recente à NPR.

Uma solução: antes das férias do verão, os parques municipais foram utilizados como salas de aula. Entre as 8h e as 15h30, esses espaços passaram a estar reservados para uso escolar. Devido à falta de área útil em alguns estabelecimentos, hotéis, livrarias, museus e centros de conferência foram também convertidos em salas de aula.

Um alerta: no início da pandemia, os estudantes eram obrigados a lavar as mãos de 90 em 90 minutos. Esta regra foi eventualmente aligeirada porque algumas crianças começaram a desenvolver eczemas e feridas nas mãos.

Um mau sinal: O número de casos no grupo etário dos 10 aos 29 anos tem vindo a aumentar. Nas últimas duas semanas, por cada dez novos infetados, quatro pertenciam a essa faixa etária.

Israel

Israel é o exemplo a evitar na reabertura das escolas e o pior pesadelo para pais, alunos, professores e auxiliares de educação.

Ali, os estabelecimentos de ensino reabriram – de forma parcial – a 3 de maio sem uso de máscara obrigatório ou regras de distanciamento. As turmas continuaram a ter até 40 alunos, um número muito superior ao limite imposto por outros países. (Segundo alguns cientistas, o tamanho das turmas pode ser um fator decisivo na propagação do vírus.)

Até ao final de junho, antes das férias de verão, mais de 240 escolas foram encerradas, devido a surtos associados, e mais de 22 mil professores e estudantes ficaram de quarentena.

Até 15 de julho, 1.335 estudantes e 691 membros das estruturas escolares (docentes, funcionários) foram diagnosticados com Covid-19.

Um mau sinal: de acordo com o jornal Haaretz na quarta-feira, Benjamin Netanyahu está a ponderar impor um estado de emergência até ao final do mês, encerrando todos os serviços e escolas, devido ao aumento recente de casos.

França

As escolas em França reabriram no dia 1 de setembro e as notícias não são as melhores. Quatro dias depois, já 22 estabelecimentos haviam sido encerrados (de um universo de 60 mil), o correspondente a cerca de 100 salas de aulas. Ao todo, 12 milhões de estudantes voltaram às salas de aula.

Os gauleses vivem, neste momento, o segundo momento de regresso às aulas durante a pandemia. Como aconteceu por cá, em maio as escolas reabriram ainda para o término do terceiro período. Cabia então aos pais escolher se deixavam ou não os filhos regressar; desta vez, contudo, a comparência é obrigatória. Aqueles que quiserem continuar num regime de telescola estão obrigados a submeter uma candidatura e respetiva justificação junto das autoridades locais.

Em França, mais de três casos de contaminação levam ao encerramento do estabelecimento de ensino; casos suspeitos são isolados de forma imediata, é-lhes pedido que fiquem em casa.

Regras: utilização obrigatória de máscara para professores e alunos com mais de 11 anos; os professores devem dar as aulas de máscara – mas há uma exceção para os educadores de infância que interajam com crianças com idades compreendidas entre os 3 e 5 anos; a utilização de máscara nos espaços exteriores das escolas é da responsabilidade das direções; arejamento das salas de aula por 15 minutos “o máximo de número de vezes possível”.

Distanciamento: à imagem de Portugal, há muitas escolas sem área suficiente para cumprir as regras de distanciamento social dentro das salas de aulas. Se inicialmente o governo francês ponderou impor um espaçamento mínimo de 4 metros quadrados, num segundo momento foi obrigado a deixar cair esse requisito para um metro de distância lateral, e, mais recente, abandonou mesmo a medida. Mais: França não está a aplicar medidas de distanciamento social nos espaços de exterior.

Refeições escolares: horários desfasados e grupos pequenos.

Desinfeção obrigatória de mãos em cinco momentos: 1) antes de entrar na escola; 2) antes de cada refeição; 3) antes e depois de cada intervalo; 4) depois de ir à casa de banho; 5) antes de sair da escola ou quando chegar a casa.

[O protocolo do regresso às aulas em França está disponível, em francês, aqui]

Escócia

O regresso às aulas na Escócia deu-se a 11 de agosto e, até ao momento, não houve um registo significativo de casos associados ao contexto escolar.

Na última semana de agosto (de 24 a 31), foram testados 17.500 menores, com idades compreendidas entre os 2 e os 17 anos, e houve apenas 49 diagnósticos positivos. Mesmo assim, o executivo liderado por Nicolas Sturgeon decidiu jogar pelo seguro e apostar na prevenção, pelo que decretou o uso obrigatório de máscara para maiores de 12 anos.

O Governo recomenda que as turmas tenham, no máximo, 20 alunos, mas, na maioria dos agrupamentos escolares, espelhando a realidade portuguesa, esta medida não é possível de implementar.

Regras: horários desfasados; aulas mais curtas, de modo a evitar “engarrafamento” nos portões das escolas; salas de aula reconfiguradas de forma a aumentar a ventilação e distanciamento entre alunos; a temperatura dos alunos é monitorizada à entrada do recinto escolar; os corredores têm apenas um sentido; os professores são obrigados a utilizar máscara permanentemente; aulas de educação física só se podem realizar no exterior.

Uma solução: bibliotecas, ginásios e espaços de convívio foram reconvertidos em salas de aula, de modo a cumprir o espaçamento entre alunos.

Recomendações: foi pedido aos alunos para evitarem dar abraços ou apertos de mão.

Investimento: o ministro da Educação escocês John Swinney conseguiu 70 milhões de libras para contratar 1400 professores e 50 milhões de libras para financiar modificações nos recintos escolares, contratar mais transportes e melhorar a higienização.

[O protocolo do regresso às aulas na Escócia está disponível, em inglês, aqui]

Fonte: RR por indicação de Livresco

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