Na escola, o filho porta-se mal. Não sabe estar em sala, queixam-se os professores. A culpa é dos pais? António Estanqueiro, que tem a experiência das aulas de Filosofia do ensino secundário, lançou um livro dirigido aos encarregados de educação. Pede-lhes que invistam mais na comunicação em casa, que escutem e recomenda-lhes que amem incondicionalmente, mesmo quando os filhos não querem falar.
Enquanto professor, sente que os alunos chegam pior à escola, daí a necessidade de escrever este livro?
Nas escolas, verifica-se que muitos alunos, crianças e adolescentes, não têm o devido acompanhamento em casa, passam demasiado tempo ligados ao computador, à televisão ou à Internet, sem qualquer supervisão dos adultos. Isso é preocupante. Na maioria dos casos, não há desinteresse dos pais, mas apenas falta de disponibilidade para dar atenção aos filhos. Escrevi este livro para ajudar os pais interessados, que querem investir mais na comunicação com os filhos, acompanhar a sua vida escolar e transmitir regras e valores. Apresento orientações simples, sem a pretensão de dar receitas. Os pais são insubstituíveis na educação dos filhos.
Acredita que o problema maior entre pais e filhos é a falta de comunicação? Porquê?
Acredito que a chave da relação educativa está na qualidade da comunicação. Os pais terão dificuldade em cumprir a sua missão de primeiros educadores se comunicarem pouco ou mal. Quem quer educar os filhos, deve escutar com atenção, falar sem tabus, dialogar com abertura de espírito, elogiar com sinceridade, repreender de forma construtiva e amar incondicionalmente. Qualquer educador tem de ser um bom comunicador, usar o melhor possível a linguagem verbal e não verbal.
Este é um problema só das famílias ou também da escola? Até que ponto a comunicação não funciona entre os alunos e os professores? Até que ponto essa falta de comunicação não é a principal responsável pelo mau comportamento dos alunos?
O mau comportamento ou a indisciplina dos alunos é um fenómeno complexo. Há diversos factores condicionantes da indisciplina, uns mais ligados à origem familiar e social dos alunos, outros mais relacionados com a escola e os professores. Em primeiro lugar, a indisciplina depende da experiência relacional que o aluno vive na família, desde a infância. Pais demasiado autoritários, excessivamente permissivos ou ausentes não promovem o desenvolvimento equilibrado dos filhos. Tudo piora quando os pais desvalorizam a escola e criticam os professores, na presença dos filhos. Evidentemente, a indisciplina pode depender também das práticas pedagógicas dos professores. Os bons professores revelam competência científica, pedagógica e relacional. São modelos de comunicação. Sabem falar e escutar. Mostram compreensão e respeito pelos alunos. Tentam prevenir ou resolver conflitos, através do diálogo e da negociação.
No seu livro sublinha a importância da comunicação entre pais e filhos porque tem a percepção de que estes não comunicam?
Em geral, os pais procuram comunicar bem com os filhos. Acredito que muitos podem e devem comunicar melhor. O primeiro segredo da comunicação está na arte de escutar os filhos com disponibilidade e atenção. Escutar os filhos até ao fim, sem interromper o seu discurso, não implica concordar com tudo o que eles dizem. Implica tentar compreender, antes de falar. Quem escuta, tem mais hipótese de ser escutado.
E o que se faz quando os filhos não querem comunicar? Quando os pais estão disponíveis mas eles não o querem fazer?
Os filhos, sobretudo os adolescentes, só dizem o que querem, quando querem. Os pais ficam preocupados quando sentem que, apesar de todos os seus esforços, os filhos evitam conversas, não partilham a sua vida, não contam os seus problemas, não pedem conselhos. Por mais que custe, os pais devem ter paciência, respeitar o silêncio dos filhos, mantendo disponibilidade para o diálogo. O mais importante é que os pais estejam atentos, para prevenir comportamentos de risco ou para ajudar os filhos quando eles mais precisam, por exemplo quando são vítimas de bullying.
O que fazer quando os pais fazem as perguntas e os filhos não respondem? Castiga-se? Como?
Fazer perguntas pode promover a qualidade da comunicação. Por isso, os pais sensatos cuidam o que perguntam e o modo de perguntar. É natural que os pais queiram saber se os seus filhos adolescentes andam em más companhias, se fumam, se bebem demais nas festas, se experimentam drogas ou se têm relações sexuais desprotegidas. Mas eles não gostam de responder a perguntas indiscretas sobre assuntos mais íntimos. Preferem falar com os colegas e os amigos ou guardar silêncio. Se os pais exigem respostas, sob a ameaça de castigos, é provável que os filhos se defendam com mentiras. O autoritarismo corta a comunicação. Parece-me mais prudente ser compreensivo. Só a atitude de compreensão garante que os filhos poderão confiar nos pais e fazer-lhes confidências no futuro.
Educa-se pelo exemplo. E quando o exemplo é bom e eles não o seguem? Porque se educa pelo exemplo não só em casa como na escola.
Os filhos aprendem por observação e imitação dos comportamentos de pais, professores, colegas, amigos e figuras públicas. Como se vê, os pais são os primeiros educadores, mas não são os únicos. Não podem proteger sempre os filhos das más companhias, nem das influências negativas dos meios de comunicação (sobretudo televisão e Internet). A melhor atitude dos pais é ajudar os filhos a reflectir criticamente sobre os modelos de comportamento que a sociedade de consumo oferece e dar bom exemplo na sua vida pessoal e social. Também os professores devem assumir-se como bons modelos para os seus alunos. O segredo da educação está na coerência entre o que se diz e o que se faz. Os actos educam mais que as palavras.
O que fazer quando os pais falam com o DT e este tem como única resposta a defesa dos colegas e da escola? Até que ponto a escola não está aberta aos pais?
Considero que a relação entre a escola e a família tem vindo a melhorar, embora persistam ainda obstáculos à comunicação. Actualmente, muitos pais responsáveis acompanham os filhos em casa e comunicam regularmente com os directores de turma. Por sua vez, os bons directores de turma valorizam a participação dos pais na escola, não os chamam apenas para dar “más notícias” sobre o comportamento ou o aproveitamento dos filhos. A prática habitual dos directores de turma é prevenir ou resolver os problemas dos alunos, através do diálogo com os pais. Quando os pais fazem críticas precipitadas e injustas aos professores, é natural que os directores de turma tenham uma atitude mais defensiva. A cooperação entre pais e professores, num clima de diálogo e respeito mútuo, contribui para a formação integral dos alunos.
In: Público
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