Um especialista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia denunciou, esta sexta-feira, que os oftalmologistas estão a receber nos consultórios cada vez mais crianças que usam óculos sem necessidade, por recomendação de empresas óticas que fazem rastreios nas escolas.
Em entrevista à agência Lusa, o oftalmologista pediátrico Augusto Magalhães alertou para as "técnicas agressivas de marketing" de alguns oculistas, que levam a que "muitas crianças cheguem às consultas com óculos prescritos sem terem necessidade de os usar".
O especialista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia diz que o risco para a saúde "é mínimo" porque costumam ser lentes com pouca graduação, mas representam "prejuízos" para as famílias, que gastam dinheiro injustificadamente.
"Não consigo entender como é que os diretores das escolas autorizam rastreios sem antes verificar a credibilidade da entidade que os faz. Qualquer ótica chega a uma escola e é autorizada a fazer um rastreio", denuncia Augusto Magalhães, garantindo que é "vulgaríssimo acontecer".
O especialista reconhece que também "existem bons exemplos", lembrando no entanto a importância de se ser posteriormente seguido por um oftalmologista, já que existem casos de crianças com patologias oftalmológicas cujos problemas "passam despercebidos aos optometristas" que trabalham nas lojas de ótica.
Nas óticas existem aparelhos automáticos que fazem a refração, mas "às vezes conseguem enganar os aparelhos". Resultado: "Muitas vezes os óculos não vêm certos".
Em declarações à Lusa, fonte da direção da União Profissional dos Ópticos Optometristas Portugueses (UPOOP) admite que muitos optometristas prestam serviços em óticas, garantindo, no entanto, que a sua ação "é totalmente separada da componente comercial de venda de dispositivos óticos e constitui uma componente básica e essencial dos cuidados visuais primários".
A associação diz desenvolver "frequentemente, normalmente sob pedido, ações de rastreio em escolas e em zonas carenciadas, de forma totalmente gratuita (...) e levadas a cabo por profissionais devidamente identificados e certificados".
A associação lembra que o facto de a profissão ainda não ter sido regulamentada pelo Estado cria um vazio legal que "permite que pretensos profissionais prestem serviços sem as devidas qualificações".
"Quando a associação recebe denúncias, instaura um processo de investigação. Caso os profissionais em causa sejam seus associados, a UPOOP pode prosseguir com processos disciplinares", explica, garantindo desconhecer casos concretos de fraude.
O especialista da Sociedade Portuguesa de Oftalmologia estima que em Portugal "mais de metade das crianças chegam à escola primária sem qualquer rastreio". No entanto, considera que a situação melhorou "substancialmente" nos últimos 20 anos e que "na última década houve um aumento enorme na procura de rastreios e uma preocupação maior por parte dos pais".
Atualmente, muitos pediatras e médicos de família encaminham as crianças para os rastreios visuais feitos por especialistas e alguns centros de saúde também já realizam testes na consulta pré-escolar.
"Estes rastreios têm uma certa fiabilidade mas não são 100% eficazes. Em todo o caso, é uma medida que aplaudimos fortemente", saúda Augusto Magalhães.
De acordo com a Sociedade Portuguesa de Oftalmologia, uma em cada cinco crianças portuguesas tem algum problema de visão durante a sua fase de crescimento. Por isso, Augusto Magalhães é defensor de um rastreio visual obrigatório a nível nacional, que garantisse que todas as crianças fossem vistas por um especialista.
"Na Suécia, por exemplo, o rastreio nacional conseguiu diminuir a percentagem das crianças com problemas de miopia, que passou de quatro por cento da população para apenas um por cento", exemplifica.
In: JN online
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