terça-feira, 24 de junho de 2014

Os (dis)miúdos

No universo complexo e fascinante da vida e da educação dos mais novos gostava de partilhar algo que de há uns tempos para cá tem vindo a verificar-se e que deixa com alguma inquietação, o número muito significativo de crianças e adolescentes que têm "ganho" uma espécie de prefixo na sua condição, o "dis".

Reparemos na diversidade de situações. Ao correr da lembrança e sem esgotar as possibilidades, temos os meninos que são disléxicos com uma tipologia bem variada, disgráficos, discalcúlicos, disortográficos ou até distraídos, só para citar alguns exemplos.

Temos também as crianças e adolescentes que têm (dis)túrbios. Estes (dis)túrbios também são das mais diferenciadas naturezas: distúrbios do comportamento, distúrbios da atenção e concentração, distúrbios da memória, distúrbios da cognição, distúrbios emocionais, distúrbios da personalidade, distúrbios da atividade, distúrbios da comunicação, distúrbios da audição e da visão, distúrbios da aprendizagem ou distúrbios alimentares.

O caso particular das crianças consideradas "hiperativas" e ou "com défice de atenção" é um exemplo do que se pode designar como "sobrediagnóstico" e que, frequentemente, implica o recurso a medicação, situação com evidentes riscos para os quais alguns especialistas mais prudentes e atentos, como o professor Mário Cordeiro, têm alertado.

Como é evidente existem ainda os que só fazem (dis)parates e aqueles cujo ambiente de vida é completamente (dis)funcional.

Pois é, há sempre um "dis" à espera de qualquer criança e se não, inventa-se, "ela tem que ter qualquer coisa".

Agora um pouco mais a sério, sabemos todos que existe um conjunto de problemas que pode afetar crianças e adolescentes mas, felizmente, não serão tantas as situações como por vezes parece e a quantidade de referências sugere.

Inquieta-me muito a facilidade com que frequentemente são produzidos "diagnósticos" e rótulos que se colam aos miúdos, dos quais eles dificilmente se libertarão. Temo que a banalização da sua utilização possa contribuir para instalar, sem nos darmos conta, uma perigosa indiferença sobre o que observa nos miúdos.

É ainda preocupante a ligeireza com que muitos miúdos aparecem medicados, chamo-lhes "ritalinizados", sem que as respetivas avaliações ou diagnósticos pareçam suportar seguramente o recurso à medicação.

Esta matéria, avaliar e explicar o que passa com os miúdos e adolescentes, exige um elevadíssimo padrão ético e deontológico além da óbvia competência técnica e científica. Só assim poderemos ajudar, de facto, as crianças e adolescentes que, na verdade, podem apresentar quadros específicos de dificuldades.

Não se pode aligeirar, é "dis"masiado grave.

José Morgado

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