terça-feira, 1 de abril de 2014

Autismo obriga famílias a gastar o dobro do que recebem em apoios sociais

As famílias com crianças ou jovens autistas gastam em média, por mês, 371 euros em produtos e terapias, mas recebem apenas metade desse valor em apoios sociais, revela a Federação Portuguesa de Autismo. Este é um dos dados revelados por um estudo sobre a qualidade de vida das famílias com crianças e jovens com perturbações do espectro do autismo em Portugal: "Diagnóstico e impactos sociais e económicos", realizado entre Setembro e Dezembro de 2013.


As principais conclusões do estudo (...) mostram que as famílias inquiridas gastam em média por mês 371 euros em produtos e/ou recursos/terapias específicas para o autismo. “Cerca de metade dos inquiridos apresenta custos mensais totais inferiores a 200 euros e quase 80% não tem custos superiores a 500 euros por mês”, diz a Federação Portuguesa de Autismo (FPDA).

Segundo a FPDA, as terapias em geral representam o custo mais elevado face aos restantes produtos, fazendo com que as famílias despendam mensalmente um valor médio que ronda os 258 euros.

No entanto, “a média de valores mensais do conjunto das prestações sociais atribuídas e transferidas para o orçamento das famílias é de 129 euros, o que equivale a metade daquilo que as famílias inquiridas dizem em média gastar”.

Para a federação, é isto que explica que 90% das famílias que responderam ao inquérito digam que este é um valor "pouco" ou "muito pouco" adequado face às despesas que tem com a reabilitação da criança ou jovem.

Ainda ao nível dos custos económicos e do elevado peso nas despesas das famílias está o facto de as terapias não serem promovidas pelo Sistema Nacional de Saúde (SNS), nem serem, na sua maioria, comparticipadas.

Impacto na profissão e na vida social

Por outro lado, em matéria de custos sociais, as perturbações do espectro do autismo mostraram ter um impacto considerável ao nível do emprego, havendo 23% das famílias que optaram por trabalhar a tempo parcial para poderem cuidar dos filhos e outras 70% que admitiram que o nascimento e o diagnóstico do filho originou uma quebra na progressão na carreira.

O estudo revela igualmente que a patologia trouxe alterações nas dinâmicas familiares de lazer, já que as famílias revelaram raramente ir a espectáculos, optando por ficar mais em casa. Consequentemente visitam menos os amigos e frequentam menos espaços públicos.

O trabalho da FPDA veio também mostrar que o autismo incide maioritariamente nos homens, havendo uma rapariga para cada cinco rapazes. Raramente (3%) existem casos de mais do que uma criança com autismo na mesma família e uma em cada cinco crianças revela ter outras patologias associadas, sendo a mais comum a epilepsia.

De acordo com a federação, 56% das crianças ou jovens com autismo está a tomar medicação e 99% é acompanhado do ponto de vista médico. Em 40% dos casos, o diagnóstico foi feito por um pediatra do desenvolvimento, sendo que a maior parte dos diagnósticos foi feita no SNS.

Ao nível do ensino, o estudo mostra que 87% das crianças frequenta o ensino público, metade das quais num estabelecimento escolar que tem ensino estruturado, ou seja, uma reposta específica para o autismo.

O estudo foi realizado a partir de um inquérito feito a 301 famílias residentes em território nacional, entre as cerca de 2300 que a FPDA conseguiu detectar como tendo uma ou mais crianças ou jovens com autismo, confirmado através de diagnóstico clínico.

Estes e outros dados serão apresentados quarta-feira, num seminário na Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, no dia em que se assinala o Dia Mundial da Consciencialização do Autismo.

Guia de apoio

Também para assinalar a data, a Associação Dar Resposta lança no próximo sábado, 5 de Abril, o livro Perturbação do Espectro do Autismo: E agora? que tem como objetivo, segundo uma nota divulgada pela associação, apoiar as famílias que se veem “confrontadas com a falta de uma estrutura que lhes forneça a informação mais básica e que as oriente minimamente sobre os primeiros passos a dar” no pós-diagnóstico.

A Dar Resposta – movimento de pais, familiares e amigos de cidadãos com deficiência, vocacionada em particular para crianças e jovens com perturbações do espectro do autismo – considera que “ainda existe em Portugal pouca informação acerca das Perturbações do Espectro do Autismo e o seu diagnóstico ainda é muito deficiente”. Entende que “a sociedade não está consciencializada”, que as famílias sentem “falta de respostas” ao longo do processo de diagnóstico e que este “tende a ser demorado”, prolongando o “sofrimento e a angústia”. Alega que “em regra, as queixas dos pais tendem a ficar diluídas” no tempo, excepto nos casos mais graves e, por isso, “evidentes”. As respostas tardias, acrescenta o movimento em comunicado, comprometem uma “intervenção adequada” ao caso particular de cada criança.

De uma forma geral, o livro contém uma descrição acerca das perturbações do espectro do autismo, assim como os recursos e métodos terapêuticos e de intervenção disponíveis em Portugal. Com este guia, a associação quis, entre outros objetivos, reunir um conjunto de “respostas e estratégias” para apoiar famílias e equipas de profissionais e “aumentar a consciencialização” acerca dos sinais de alerta e sintomas das Perturbações do Espectro do Autismo, de forma a contribuir para um diagnóstico melhor e para uma “intervenção mais rápida e eficaz”.

A obra pretende não só partilhar e divulgar “informação, ideias e sugestões”, mas também “provocar a análise crítica, a reflexão e o debate, agitar mentalidades, quebrar estereótipos e preconceitos, fomentar a consciencialização social e potenciar a aceitação e inclusão das pessoas com Perturbação do Espectro do Autismo em todos os domínios da vida ativa”. O lançamento é às 15h30 no sábado, no Teatro da Trindade, em Lisboa.

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