sexta-feira, 9 de abril de 2010

Projectos de vida em suspenso

Jovens e adultos com deficiência congénita ou adquirida encontram obstáculos à inserção ou regresso ao mercado de trabalho. O apoio a essa transição surge de instituições que constroem planos de acompanhamento individual.
Os números denunciam a realidade. A percentagem dos jovens com deficiências que frequentaram os cursos de formação profissional no Centro de Reabilitação Profissional de Gaia (CRPG), em Vila Nova de Gaia, e encontraram uma porta aberta no mercado de trabalho, tem vindo a diminuir. Em 2007, foram "absorvidos" 69% dos jovens, um ano depois 61% e no ano passado a percentagem caiu para 43%. As empresas disponíveis para receber trabalhadores com limitações são cada vez mais micro e a crise também ajuda a explicar a queda da receptividade por parte dos empregadores.
Jerónimo Sousa, director do CRPG, esclarece que há duas realidades distintas a que a instituição de Vila Nova de Gaia presta atenção e dá apoio. Utentes com deficiências congénitas, que precisam de ajuda na transição da escola para a vida activa; e utentes com deficiência adquirida por acidente ou doença que, de repente, interromperam o seu percurso profissional. "A integração e a reintegração não são tarefas fáceis", refere. E há estudos desenvolvidos que demonstram que, em Portugal, os mais jovens que padecem de uma deficiência encontram menos dificuldades em entrar no mundo laboral dos que adquiriram uma deficiência ao longo da vida e foram obrigados a interromperem a sua carreira por acidente ou doença.
O CRPG tem um conjunto de respostas diversificadas para a integração socioprofissional do público-alvo com quem trabalha. Jerónimo Sousa lembra, no entanto, que ainda hoje a cultura nacional tende a colocar o doente num canto, de lado. A entrada no mercado de trabalho esbarra, portanto, com alguns problemas. "Ainda há o preconceito de que a deficiência significa menos valor", comenta. E há ainda as dificuldades de mobilidade que podem condicionar a decisão dos empresários. Há, por isso, várias dificuldades para contornar.
O CRPG, fundado em 1992, tem várias respostas para pessoas com necessidades especiais. O centro de recursos para a inclusão tem as portas abertas para jovens com deficiência que pretendam transitar da escola para a vida activa. Fazem-se planos individuais, desenvolvem-se competências pessoais e profissionais, mobilizam-se empregadores, dá-se apoio à participação social e vida autónoma. A reabilitação profissional, por outro lado, destina-se a vítimas de acidentes de trabalho, doenças profissionais ou crónicas. Em todo o processo há um acompanhamento individualizado para recuperar, desenvolver e optimizar as capacidades funcionais. As necessidades específicas de cada um são tidas em conta e o projecto individual de reabilitação é também definido com as entidades empregadoras. Para que haja ajustes às necessidades e expectativas.
Quando um projecto profissional é interrompido por um acidente de trabalho ou doença profissional, o CRPG tenta garantir a continuidade da carreira através de uma intervenção organizada. Nesse sentido, identificam-se necessidades de intervenção, elabora-se um plano de trabalho, desenvolvem-se competências para tentar regressar ao mercado de trabalho.
Fisioterapia, terapia da fala, terapia ocupacional, intervenção psicológica e avaliação físico-funcional integram a parte de uma intervenção complementar que pretende recuperar e desenvolver capacidades funcionais. O CRPG trabalha ainda a reabilitação neuropsicológica para pessoas afectadas por lesão cerebral adquirida, na tentativa de recuperar capacidades perdidas. Um processo que inclui a intervenção psicológica e treino cognitivo, entre outras etapas.
Há 29 anos que o Centro de Educação e Formação Profissional Integrada, no Porto, que nasceu de um protocolo entre o Instituto de Emprego e Formação Profissional e o Movimento de Apoio ao Diminuído Intelectual, dá resposta na área da formação e emprego a pessoas com necessidades especiais. A integração social e profissional, a interacção com as famílias e ligação ao tecido empresarial e à comunidade têm sido vectores importantes na sua acção.
Olga Figueiredo, directora do centro, adianta que a realidade tem as suas barreiras. "Temos vindo a sentir uma maior dificuldade de integração no mercado de trabalho". O cenário mudou nos últimos anos. A responsável atribui essa situação ao ambiente de crise que se vive. As empresas estão a empregar menos gente e "as pessoas com deficiência são mais vulneráveis". Neste momento, a instituição tem cerca de 150 pessoas com deficiência na formação profissional e nem todos encontrarão lugar no mundo laboral.
O trabalho é pensado ao pormenor e a instituição procura ajudar pessoas com deficiências a construírem o seu projecto de vida, através da descoberta de competências e motivações pessoais, com os olhos postos numa futura realização pessoal e profissional. Na unidade de avaliação e orientação profissional, identificam-se motivações e interesses, definem-se as áreas a desenvolver e tomam-se decisões quanto ao percurso formativo. Por ano, cerca de 300 pessoas recorrem a este serviço.
Depois da avaliação inicial, há um estágio de avaliação e orientação profissional. A entrada no mercado de trabalho pode ser um processo bastante complicado e o Centro de Educação e Formação Profissional Integrada tem uma unidade de formação para preparar quem sonha ter um emprego ou iniciar uma ocupação. Uma equipa de técnicos ajuda os formandos a deixarem vir ao de cima o melhor que têm para dar. Melhorar as capacidades de adaptação às exigências e características do mundo do trabalho é um dos grandes objectivos.
Este centro tem ainda um enclave de produção que assegura o exercício de uma actividade remunerada, num ambiente de emprego protegido, a pessoas com deficiência intelectual. Construção e manutenção de jardins, embalagem e montagem de diversos produtos e confecção e distribuição de pão e produtos de pastelaria são as actividades possíveis para facilitar a transição para o mercado de trabalho. A autonomia pessoal e social também ganha com esta experiência. Há várias portas que se podem abrir: no mercado de trabalho, na formação profissional, nos centros de reabilitação.
Sara R. Oliveira

1 comentário:

Atena disse...

É isto que faz também muita falta... muita mesmo!
Abraço para si,
Cristina