Dos trimestres com dezenas de anos, aos semestres ainda com pouco tempo de vida, esta mudança de organização temporal do ano lectivo tem qual razão como pano de fundo? Qual é a intencionalidade desta mudança?
Há escolas com características muito próprias na sua população escolar, onde o desempenho a ser medido trimestralmente não é o tempo necessário para mostrar compreensão, apropriação e utilização apropriada das aprendizagens. É, pois benéfico esticar o tempo para que aquilo que pode ser designado por sucesso apareça e se multiplique.
Esta mudança justifica-se com uma intencionalidade e quando assim é a burocracia aligeira-se e dilui-se no tempo, ao mesmo tempo que o trabalho de acompanhamento e consolidação das aprendizagens se concretiza de forma muito positiva. E tudo isto para alcançar aquilo que cada escola, com a sua população e no seu contexto, pode chamar e chama de sucesso, o que não é obviamente igual para todos.
Também pode haver o recurso à semestralidade para que aquelas populações escolares acima da média possam ainda ser melhores, dentro do conceito de disciplinas anuais que o currículo do ensino básico acarreta. Há escolas particulares, com currículo próprio, que com a divisão das disciplinas pelos ciclos, podem promover a tal excelência perseguida desde sempre por este tipo de ensino, uma vez que as disciplinas ficam com maior incidência durante um tempo considerável e consequentemente maior possibilidade de sucesso, ou seja, de notas excelentes, pois o foco e atenção de todos, alunos e professores consegue estender-se no tempo.
O mesmo objectivo, aumentar o sucesso escolar, o que aqui significa, ter melhores notas, é utilizado por casos de excepção. Tanto por escolas que pretendem dar mais tempo para que o sucesso possa acontecer, como por escolas que querem exponenciar o sucesso que já alcançaram.
Quando nenhuma destas hipóteses, ou outra, está em questão, e não existe qualquer intencionalidade pedagógica para esta alteração temporal do calendário escolar e que interfere com todas as rotinas familiares e sociais, não há motivo para tal mudança.
Na maioria das escolas que funcionam em semestralidade, a intenção é dar um sinal de modernidade e inovação à comunidade educativa, escolar e à sociedade. Apenas essa é a ideia: “Vamos inovar e organizar o ano em dois semestres!” Quando este é o mote, habitualmente a burocracia continua igual à organização em trimestres. As avaliações, informações, reuniões, papéis para preencher, contas a prestar, a divisão e selecção das matérias continua a mesma e nada se altera a não ser as temporalidades do ano lectivo.
Este tipo de alterações de organização do ano lectivo disfarçadas de inovação, de inovação não tem nada, pois são vazias de intencionalidade que o estender do tempo pode trazer. Seja para facilitar o potenciar ou exponenciar do sucesso escolar ou outra que sirva este propósito, que pode ser, apenas e na verdade, diminuir a excessiva dimensão burocrática das actividades complementares à função docente.
As possíveis alterações, para que tenham o nome de inovação, devem ser feitas de acordo com o contexto, de modo que contribuam para a melhoria de algum aspecto em concreto, seja organizacional, pedagógico, burocrático, de recursos humanos ou outro; e não com a máscara da mudança para a modernidade a actualização das práticas.
Estas situações são facilmente percepcionadas pelos docentes que leccionam nestas escolas, pela não-alteração e falta de ajuste de práticas burocráticas, concretamente de avaliação dos alunos, e pelos alunos a quem continuam a ser solicitados os desafios de aprendizagem ao ritmo trimestral. A organização escolar carece de intencionalidade e esta deve ser analisada e cuidada. Para bem de todos os actores escolares em especial dos alunos e dos professores. A inovação é bem-vinda, com justificação e sem máscaras.
Margarida Marrucho Mota Amador
Fonte: Público de acesso livre
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