quinta-feira, 4 de maio de 2023

Escola é hoje lugar «tenso», mas «das melhores instituições que temos»

A professora Mafalda Lapa, do agrupamento de Escolas da Cidadela, em Cascais, vê na realização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ) a oportunidade de os jovens pensarem “o que querem para o futuro do mundo” e contribuir para isso.

“Um encontro de jovens de tantos países só pode trazer muitas coisas boas. Esta é a oportunidade de se reunirem muitos jovens: ouvir e depois passar à ação. Só o ouvir, no momento atual, é pouco. O mundo precisa de ação. Precisamos de tempo para ouvir e refletir, mas precisamos depois de ação. A ação dá trabalho, mas em grupo custa menos”, indica a professora de Biologia à Agência ECCLESIA.

A docente reconhece a “capacidade” de hoje os jovens se inteirarem dos problemas do planeta e explica que importa envolvê-los: “O futuro faz-se agora e tu contribuis até quanto não estás a fazer nada. Os jovens que se vão encontrar – porque querem – têm a oportunidade de sentir o resto do mundo e perceberem o que se quer para o mundo – não para o meu umbigo, para a minha casa, concelho ou país – mas para o mundo. E nós somos tantos… se queremos fazer alguma coisa, vamos criar um espaço para isso”, acrescenta.

A proximidade e o reconhecimento com os jovens e adolescentes valeu a Mafalda Lapa a nomeação para o ‘Global Teacher Prize’, em 2019, tendo sido finalista nesse concurso.

A professora reconhece a sintonia com os jovens estudantes, com que se cruza nas suas aulas, mas reconhece ser procurada por muitos outros, tendo esta proximidade e, simultaneamente, preocupação em os acompanhar de forma devida, levado à criação do gabinete GUIA, no agrupamento de escolas, onde é docente.

“O GUIA – Gabinete de integração do aluno – quis ser um espaço de qualidade onde se consiga silêncio, privacidade – que é muito importante. Muitos alunos desabam quando lá chegam e o encontro é totalmente confidencial. Peço sempre que sejam eles a bater à porta. Podem querer trabalhar o seu futuro escolar, fazer algumas sessões de coaching, para ajudar os alunos a serem mais pró-ativos no seu processo de mudança, mas acabo ter por tenho acesso a muita informação e o que tem de ser feito, tem de ser. Já tive vítimas de violência doméstica, que acabaram retiradas à família e neste caso o meu papel não é manter sigilo”, explica.

Mafalda Lapa conta que assiduamente os alunos que batem à porta para “melhorar resultados escolas”, no entanto rapidamente se chega “a outras camadas da cebola”.

“Uma aluna, um dia disse-me no gabinete Guia, que ali ensinávamos a tirar as pedras no caminho ou a viver com elas, se não as pudermos tirar. Isto é resiliência. Há pedras que não conseguimos tirar e às vezes temos mesmo de viver com elas. Em especial, na adolescência, quando tudo é exacerbado, o bom e o mau, é importante cultivar a resiliência, seja pessoal como profissionalmente”, reconhece.

No ambiente escolar, e na sociedade em geral, a professora lamenta a falta de cultura em torno do “erro, da imperfeição”.

“Cultivamos pouco saber que é humano a pessoa sentir que não tem capacidade, sentir-se mal, estar triste – tudo isto faz parte, achar que a vida não vai mudar, ou que nos acontecer uma desgraça e que isso se vai arrastar negativamente para o resto da nossa vida – é humano pensar isto. Cultivamos muito o sucesso, mas muito pouco a imperfeição. Na escola, cultivamos pouco o erro, nós castramos o erro”, lamenta.

Para Mafalda Lapa a escola é um “barómetro da sociedade e das famílias” e a partir daquele espaço reconhece o quanto “os miúdos têm menos atenção dos pais”, sofrem “pressão das redes sociais”, confrontam-se com a “comparação e ideias de perfeição”.

“A escola hoje apresenta muitos problemas emocionais por resolver, muitos conflitos, é um lugar tenso, mas é também um lugar atento, como acho que nunca foi. A escola é das melhores instituições que temos, mesmo quando os alunos reprovam ou com situações de indisciplina, a escola não larga ninguém, não deixa ninguém para trás. No espaço escolar há muitas pessoas diferentes, muitas vezes fechados na mesma turma, e a escola está a ensinar a viver. Nós fazemos isto, por isso os professores devem ser bem tratados e reconhecidos”, indica. (...)

Fonte: Agência Ecclesia por indicação de Livresco

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