O que se faz atualmente na Estónia para identificar, motivar e celebrar alunos com capacidades acima da média?
O que dizer dos alunos acima da média, os chamados sobredotados? Onde é que o sistema educativo os encaixa? Serão estes alunos campeões que se automotivam? Saberão estes jovens o que querem, sendo capazes de seguir a sua vocação de forma autónoma? Como podemos identificá-los e onde é que os encontramos?
A Estónia participou no PISA pela primeira vez em 2006. De temperamento modesto, os estónios ficaram surpreendidos com os resultados e a posição elevada que obtiveram nesta classificação internacional. Uma das conclusões que os legisladores retiraram desta estreia foi a de que a Estónia devia ter mais alunos de topo. A análise de dados indicava a existência de talento que deveríamos conseguir identificar e o nosso sistema educativo devia fazer mais para desenvolver o potencial escondido no meio da curva de distribuição. Doze anos depois, os resultados do PISA 2018 mostraram algum progresso: a percentagem de alunos com desempenho elevado aumentou em todos os parâmetros avaliados.
Porque importa valorizar e procurar os alunos sobredotados? Infelizmente, os sobredotados causam muitas vezes perturbações na aula, porque fazem perguntas incómodas, ou tendem a passar despercebidos, por se sentirem aborrecidos. Se um professor seguir os manuais e o programa regular, o aluno sobredotado conseguirá «ir na maré» aula após aula, cumprindo o seu percurso escolar sem grande esforço nem motivação. O próprio Albert Einstein teve dificuldades na escola. «É muitas vezes difícil de perceber que uma criança [destas] tem necessidades especiais. Uma criança sobredotada é como um frágil rebento de uma planta: precisamos de a cuidar e de a alimentar bem para que se torne uma bela árvore», disse uma psicóloga que é mãe de uma criança sobredotada na Estónia. O seu filho começou a ler aos três anos, mas assim que entrou para a escola, a família começou a receber queixas e o menino a adoecer e a ter dificuldades. Sentia-se desmotivado. Quando a mãe conversou com a professora e lhe disse que ele podia (devia) ter problemas mais difíceis para resolver, a professora respondeu que o menino tinha uma caligrafia muito má, e que seria preferível trabalhar nisso. Os pais mudaram o filho de escola e a situação alterou-se. Alguns anos mais tarde, era o melhor aluno da escola e participou nas Olimpíadas Internacionais de Ciências.
O tema das crianças sobredotadas chegou ao governo na Estónia. O documento que delineia a estratégia da educação até 2035 descreve os alunos sobredotados como crianças com necessidades educativas especiais e defende a necessidade de seguir uma abordagem integrada na sua educação. Importa reconhecer que os alunos de topo são as mentes brilhantes do nosso futuro. A sociedade tem muito a ganhar se os identificar e os ajudar a desenvolver o seu potencial máximo.
Se as crianças sobredotadas são vistas como crianças com necessidades educativas especiais, o que é que está a ser feito na prática para as ajudar?
Desde 2016 que uma organização sem fins lucrativos chamada Centro de Talento da Estónia promove ativamente diferentes formações, palestras e conferências sobre este assunto. Pais de crianças sobredotadas, professores e psicólogos são convidados a integrar uma rede que se preocupa com o desenvolvimento destes jovens e que compreende que o seu talento é muito valioso para a sociedade. Este centro é gerido por professores da Universidade de Tartu, umas das mais antigas e mais prestigiadas universidades do país. A própria universidade contribui para estimular estes jovens de mentes inquietas e brilhantes, oferecendo aulas sobre diferentes disciplinas a alunos que queiram aprender mais e ter contacto com outras realidades, além das que a sua escola oferece. Estas aulas são oferecidas pela Escola de Ciências de Tartu, que tem como objetivo desafiar os alunos de acordo com aquilo que eles mais precisam. Também há programas e diretrizes de aprendizagem que podem ser seguidos à escala nacional: o centro disponibiliza conteúdos online sobre diversos temas e ainda organiza academias de ciência durante as férias escolares.
Como se identificam desde cedo os alunos com maior potencial no sistema escolar?
Quando as crianças iniciam o seu percurso escolar, aos sete anos, há cerca de 24 crianças em cada sala de aula. Todas estas crianças têm conhecimentos, interesses e percursos diferentes. Pede-se à professora (na Estónia esta é por norma uma ocupação das mulheres) que tenha em conta as necessidades de cada criança. Na maioria das vezes, a professora irá dar mais atenção aos alunos com dificuldades, deixando os mais capazes trabalhar de forma autónoma.
Algumas escolas iniciam a busca pelo talento nos primeiros anos da escolaridade básica. Uma escola em Tartu lançou um programa conhecido por «programa de enriquecimento», que começou a procurar crianças com aptidão especial para a matemática no terceiro ano. No lançamento, selecionaram 17 alunos de um total de 110 e formaram um «clube de Matemática» de participação voluntária, com aulas semanais que duravam 90 minutos e seguiam um programa especial criado para estas crianças. Estes alunos dedicaram-se à resolução de problemas, à geometria, à robótica, à criação de modelos matemáticos, à programação e a outras tarefas. No fim do programa, tinham de escolher um tema para apresentar um trabalho final. Isto podia ser feito individualmente ou em grupo. O programa foi muito bem recebido: as crianças fizeram amigos com interesses semelhantes, gostaram dos desafios e sentiram-se motivadas.
Há muitas outras iniciativas, tais como clubes de diferentes disciplinas ou feiras de ciências. Algumas escolas apostam em alunos mais velhos, mas todas são unânimes: dar aos alunos oportunidade para explorar os seus interesses faz crescer a sua motivação e interesse pelo estudo.
Para conseguirmos implementar a nossa estratégia nacional de desenvolvimento de crianças sobredotadas, há vários aspetos que temos de assegurar: um programa curricular robusto que garanta flexibilidade às escolas e às suas prioridades, um orçamento adequado, professores motivados e competentes que sejam especialistas nas disciplinas que lecionam e apoio dos pais.
Outra tradição que faz parte do sistema educativo da Estónia são os concursos nacionais de escolas, ou Olimpíadas, que existem desde 1953. Os alunos que participam nestas Olimpíadas investem muito no estudo das suas disciplinas favoritas. Caso sejam apurados na sua escola, entram no campeonato regional e depois nacional, cujos vencedores participarão nas competições científicas internacionais. Elizaveta é uma estudante de Narva que participou nas Olimpíadas Internacionais de Ciência Climática em 2022 e conseguiu obter uma medalha de bronze entre 55 000 participantes. Os seus desafios foram encontrar soluções para a energia nuclear da Dinamarca e a escassez alimentar na Zâmbia e em Angola. Recebeu-os com muito entusiamo, mas afirmou que a sua parte preferida do evento foi a possibilidade de conhecer pessoas que também estão interessadas nas alterações climáticas. Em 2022, alunos oriundos da Estónia participaram em cerca de vinte Olimpíadas internacionais. Tal como no exemplo anterior, estes jovens referiram que a sua participação nestes concursos é uma forma muito motivadora de alargar o seu conhecimento e de conhecer outros participantes com os mesmos interesses.
Outros eventos de âmbito nacional para crianças com talento são os saraus e concursos de música, de dança e desportivos. Mais recentemente, tornaram-se também mais comuns e populares os concursos onde alunos de escolas profissionais mostram o seu talento nas profissões que adquiriram.
Em suma, os alunos sobredotados são um dom precioso em qualquer escola. São alunos especiais, que precisam de orientação, apoio e incentivo. «Eu não tenho nenhum talento especial. Sou apenas apaixonadamente curioso», disse uma vez Albert Einstein. O nosso papel enquanto educadores é preservar e nutrir a curiosidade do maior número de mentes curiosas possível.
Gunda Tire
Fonte: Iniciativa Educação
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