É inegável a prioridade que deve ser dada aos alunos com Necessidades Educativas Especiais, NEE, na frequência de ensino presencial, constituindo um grupo vulnerável ao ensino à distância, com consequências no seu desenvolvimento e aprendizagem.
Não está em causa a necessidade de ensino presencial para estes alunos, nem que os professores de Educação Especial se demitam do seu papel determinante. Lá estaremos como sempre na linha da frente, mas em que condições de segurança e com que apoio das entidades responsáveis?
Nas orientações do Ministério da Educação, ME, a prioridade de ensino presencial para os grupos de risco e alunos mais vulneráveis está expressa, bem como a necessidade de manter presencialmente os apoios técnicos, apoios especializados e apoios no âmbito do Centro de Apoio à Aprendizagem e das Unidades Especializadas.
Não basta apenas afirmar que se trata de alunos prioritários, é também preciso agir em conformidade junto das escolas, com apoio técnico, com planeamento e com aumento de recursos.
Pede-se a docentes e funcionários que se coloquem em situação de risco, não havendo resposta cabal sobre como se prestam estes apoios em regime presencial, que regras de segurança específica devem implementar-se e que reforço de recursos pode existir. Quando se trata de concretizar, o ME remete para a Equipa Multidisciplinar de Apoio à Educação Inclusiva, EMAEI.
Fica assim nas mãos dos professores das escolas, definir medidas de proteção e aspetos técnicos de saúde tão sensíveis. Não houve a preocupação de envolver os professores e técnicos que trabalham com estes alunos, nem tão pouco as escolas, para planificar e organizar um conjunto de orientações e assegurar a afetação recursos próprios.
Existem 591 Unidades Especializadas em Portugal, onde recebem apoio específico quase 3 mil alunos com situações graves. A estes, somam-se, pelo menos, outros tantos que não beneficiam do apoio destas Unidades, mas têm ensino direto da Educação Especial.
Estamos a falar de milhares de alunos em risco com condições de saúde frágeis, cujo apoio técnico e o ensino se fazem com um contacto físico de grande proximidade, para além das tarefas de alimentação, higiene e autonomia pessoal, em particular. Há que equacionar como organizar os grupos dado que muitos não usarão máscara. Como organizar os transportes especiais, os momentos de permanência parcial nas turmas com acompanhamento, momentos de interação social com as outras crianças e um conjunto de situações específicas que não foram pensadas e que a escola terá de planificar do nada, numa base intuitiva e de bom senso, sem apoio de nenhuma outra entidade ou equipa ministerial, que até ao momento se tenha disponibilizado para tal.
A todas estas especificidades o ME responde com discurso genérico e sacode para as escolas, desresponsabilizando-se das suas competências técnicas nesta área a par da Direção-Geral de Saúde. Caso alguma situação grave aconteça, a responsabilidade será depois assacada aos professores, aos funcionários e às medidas que a escola desenvolveu.
Ao planificarmos todas estas situações, são muitas as questões que se levantam, por exemplo:
i) Caso estes alunos necessitem de estar com os colegas em turma, que distanciamento terão, dado que as turmas não o vão ter. Vamos isolá-los?
ii) Caso seja necessário dividir grupos para um maior afastamento ou um isolamento mais eficaz de alunos mais frágeis, que reforço de recursos está previsto?
iii) Caso sejam necessários fatos descartáveis, luvas, viseiras, máscaras transparentes, para o contato físico, quem vai fornecer?
iv) Serão com toda a certeza necessários mais assistentes operacionais e professores exclusivamente dedicados a acompanhar alunos e grupos, para evitar contacto entre turmas e entre profissionais. Que aumento de recursos se prevê, dado que as contratações previstas pelo ME estão muito aquém do que seria necessário e destinam-se a recuperação de aprendizagem?
v) Em que condições de segurança serão prestadas terapias e apoios diretos, com forte contacto físico, tendo em conta que os técnicos circulam de Agrupamento em Agrupamento?
vi) Haverá técnicos de saúde disponíveis para uma articulação direta com as escolas. Que equipas podem apoiar o planeamento dos serviços especializados das escolas?
Temo que esta situação seja mais uma, onde os alunos com necessidades específicas são diluídos num ambiente supostamente inclusivo que se apregoa, através da ideia que não há crianças com deficiência ou perturbações graves, que não se devem abrir mais Unidades, porque agora há uns Centros de Aprendizagem que são tudo e coisa nenhuma, ou que a Educação Especial agora é um serviço indireto, como se não continuassem a haver necessidade de recursos especializados humanos, técnicos e materiais.
Cria-se a ideia de que não há Departamentos de Educação Especial, esquecendo que é este Grupo Disciplinar com personalidade jurídica, que trabalha diretamente e fisicamente com estes alunos.
As respostas especializadas para estes alunos não acabaram, nem eles desapareceram só porque saiu uma lei bonita. Não se pode promover a inclusão sem a Educação Especial para atender às necessidades muito particulares de cada aluno para promoção de equidade.
Esta situação de pandemia vem mostrar o que pode acontecer quando a retórica inclusiva se torna num entrave à caracterização e planificação de respostas e meios diferenciados, com a necessária afetação de recursos particularmente específicos.
Jorge Humberto Nogueira
Fonte: Especial Educação
1 comentário:
Plenamente de acordo com esta opinião! Temo que, mais uma vez, nos fiquemos pelas bonitas intenções, que não passam disso mesmo e ficam muito bem na boca de quem as diz...mas sabemos que a realidade é outra!
A dita autonomia que cada Escola tem para interpretar e adequar a legislação à sua realidade aumenta as desigualdades em vez de as combater.
A falta de recursos humanos e a falta de condições para que os recursos humanos possam assegurar uma intervenção de qualidade são cada vez mais evidentes e estamos a hipotecar o futuro dos alunos, o futuro da sociedade!
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