sábado, 30 de abril de 2016

Dar palmadas ao filho ajuda a educá-lo?

A eterna questão que divide milhares de pais em todo o mundo: dar uma palmada ao filho ajuda a educá-lo? 

Um estudo realizado por investigadores da Universidade do Texas e do Michigan mostra que as crianças que sofrem castigos físicos são mais propensas a desafiar os pais, ter um comportamento antissocial, a ser mais agressivas, a ter dificuldades cognitivas e a desenvolver problemas de saúde mental.

"Descobrimos que a palmada foi associada a resultados negativos não intencionais. Não foi associada a obediência imediata nem de longo prazo", explica a principal autora do estudo.

A investigação, publicada na revista Journal of Family Psychology, teve como base a revisão de estudos desenvolvidos ao longo dos últimos 50 anos, que envolveram mais de 160 mil crianças.

Fonte: Jornal I por indicação de Livresco

Professor: um herói social

Vivemos uma época de mudanças e clivagens abruptas que acompanham a movimento de globalização e construção da sociedade do conhecimento. Profundas alterações nos saberes, na organização das forças produtivas e nas tecnologias da comunicação e da informação apresentam-nos o longe cada vez mais perto e obrigam-nos a uma partilha global das matérias-primas, dos bens de consumo, dos padrões culturais e das políticas, as boas e as más, enquadrantes da designada economia de mercado.

Passamos, rápido que nem vertigem, da aldeia rural à aldeia global e desta, àquilo que poderíamos designar por aldeia digital.

Neste acelerado rumar da história, a escola pública de massas passou a ser um elo frágil a quem o Estado, as famílias e as organizações sociais atribuem mais e mais competências, por reconhecerem ser incapazes de as assumir e monitorizar.

É o fim da "escola compensatória", um dos maiores mitos herdados das grandes convulsões sociais e culturais vividas na década de sessenta do passado século. A escola universalizou-se, promoveu o progresso e o bem-estar das populações, qualificou os cidadãos, tornou o mundo mais compreensivo e devolveu a dignidade da cidadania a muitas nações. Promoveu o progresso, combateu a ignorância e a opressão que vive na sua sombra. Pôs-nos mais perto de outros universos e ensinou-nos a odiar a palavra exclusão. Mas não conseguiu inverter a marcha de "compensar" ainda mais os já "compensados", permitindo que dentro das suas paredes se continuem a desenvolver mecanismos que reproduzem as desigualdades e as iliteracias, já que, à desigualdade no acesso, raramente corresponde uma promoção da igualdade no processo.

Temos referido que aquele aumento de tarefas e funções que a sociedade e o Estado aportam à escola tem resultado na desactualização permanente dos professores, das instituições e dos curricula em que estes são formados.

Neste quadro, os professores que resistem e recusam perder a sua profissionalidade, aqueles que estão presentes e aceitam os novos desafios, bem podem ser olhados como "heróis sociais" pelo modo como enfrentam o embate das mudanças, das pressões e das críticas injustas, por vezes acumuladas por mais de uma geração.

O que é, então, ser professor hoje? Como podemos definir a sua identidade e a sua profissionalidade?
É-se primeiro professor e, só depois, e por causa disso, é que se é professor de alguma coisa.
É-se primeiro professor porque se partilham uma identidade e uma cultura profissionais. Porque se comungam posturas e princípios éticos. Porque se lhes atribuem modos de acção e desempenhos normalizados…

Poderíamos definir, então, a profissionalidade dos docentes em torno de seis vetores que consideramos indispensáveis para a promoção de elevados níveis da profissionalidade docente:

Primeiro: frequência de uma formação formal, organizada e que configura a aprendizagem de um conjunto de saberes em diferentes momentos do percurso profissional (saberes de formação e saberes de experiência), formação essa que conduz ao domínio de determinadas competências instrumentais.

Segundo: A prática, num determinado espaço e durante um certo tempo, de um conjunto de tarefas socialmente validadas.

Terceiro: O exercício de uma profissão reconhecida e certificada pelo Estado.

Quarto: O direito a uma remuneração permanente e supostamente equitativa.

Quinto: A manutenção de um estatuto social de referência.

Sexto: A assunção de uma ética que deve configurar-se num código deontológico que determine e regule os direitos, obrigações, práticas e responsabilidades do exercício da profissão.

São seis indicadores de referência que, promovidos a um nível elevado de congruência, contribuem decisivamente para a melhoria da auto estima, da autoconfiança e do bem-estar docente, associados à eficácia do desempenho profissional.

João Ruivo

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Educação Inclusiva: um olhar “de fora”

Em 2006 as Nações Unidas aprovaram o texto de uma Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência. Esta Convenção foi ratificada por Portugal e vertida em Lei aquando da sua publicação em 2009 no Diário da República. Não estamos, pois, a falar de uma lei estrangeira, mas sim de uma lei que tem toda a legitimidade para ser considerada uma lei nacional.

Periodicamente a execução e cumprimento desta legislação é avaliada por comités de especialistas que, examinando o que os diferentes países foram concretizando, se pronunciam sobre o progresso que consideram que foi feito. Acaba de ser publicado o relatório que um grupo de especialistas internacionais produziu sobre os progressos que no nosso país foram feitos para que se cumprisse o que está determinado na Convenção.

Como muitas vezes sucede nestes casos a avaliação independente e internacional vem sublinhar e reforçar o que os atores mais atentos em cada país já vinham sentido, analisando e criticando. Sem dúvida que estas avaliações robustecem e apontam aspetos das políticas nacionais que, sem esta avaliação, poderiam ser desvalorizadas como simples “opiniões”. Cabe como ponto prévio dizer que a Convenção, no seu artigo 24º (1) reconhece explicitamente “o direito das pessoas com deficiência à educação. Com vista ao exercício deste direito sem discriminação e com base na igualdade de oportunidades, os Estados Partes asseguram um sistema de educação inclusiva a todos os níveis e uma aprendizagem ao longo da vida (…)”. Comentaremos muito brevemente cinco aspetos que são referidos no relatório de avaliação das Nações Unidas sobre a Educação Inclusiva em Portugal.

Antes de mais é feita uma referência que não deve ser esquecida que em Portugal uma grande maioria de estudantes com deficiência frequentam as escolas públicas. Os dados disponíveis apontam para cerca de 98% o que é uma das percentagens mais elevadas que se podem encontrar em países tanto europeus como fora da Europa. Obviamente que estes números não são por si só um critério de qualidade, mas é importante sublinhar um esforço continuado de décadas que nos conduziu a ter esta percentagem de alunos com deficiência a receberem a sua educação em escolas públicas.

Um segundo ponto relaciona-se com a observação que o Comité faz sobre os cortes que a austeridade fez nos recursos humanos e materiais que deveriam apoiar estes alunos. É muito clara a relação que é estabelecida no relatório entre a efetividade dos apoios e o sucesso da Educação Inclusiva. Ouvimos nos últimos anos afirmar que não tinha havido cortes nos recursos e logicamente nos apoios. Este relatório vem confirmar que estes cortes existiram, que a austeridade teve um papel importante nestes cortes e que é urgente que estes cortes sejam revertidos e proporcionados recursos às escolas para poderem desenvolver culturas e práticas inclusivas.

Esta avaliação refere-se ainda às escolas de referência e considera-as estruturas de segregação e de discriminação. Muitas vezes foi sugerido em Portugal que se fizesse um estudo e uma avaliação sobre a bondade da medida das “escolas de referência”. Só um trabalho bem situado nas práticas e funcionamento destas escolas nos poderá informar sobre as suas vantagens. As informações que se dispõem são casuísticas e necessitariam de uma maior sistematização e abrangência. Fica, no entanto, e desde já, este alerta que aponta para os perigos iminentes de discriminação e segregação.

Um quarto aspeto respeita à recomendação para que o Estado garanta condições de igualdade em todos os níveis de ensino e à formação profissional. Aqui temos também um longo caminho a percorrer. Lembramos algumas etapas deste caminho: a) o insuficiente apoio aos estudantes com deficiência até aos 18 anos, b) o lacunar apoio aos estudantes universitários, c) o funcionamento de estruturas que garantam a formação profissional. É indispensável inverter a triste e injusta situação de pessoas com deficiência que apresentam níveis de escolarização, de formação e de emprego claramente inferiores aos da população sem deficiência.

Um último aspeto refere-se à importância que o relatório dá à criação de uma cultura inclusiva e de confiança para todos os alunos. Ainda que este relatório se refira explicitamente aos estudantes com deficiência não é abusivo considerar que estas mudanças, adequações, adaptações que as escolas devem fazer para os alunos com deficiência se destinam não só a eles mas a considerar uma escola que seja recetiva e hospitaleira (nas palavras de Derrida) para todos os alunos.

Estas “tomadas de vista” do exterior são usadas para engrossar argumentários políticos frequentemente de opiniões opostas. O importante, agora como antes, é ler tudo o que este relatório diz, entender a importância da opinião de pessoas que olharam para a nossa realidade de uma forma desassombrada e construtiva e sobretudo considerar e aprender com brio e humildade o que é dito. Pensar na Educação Inclusiva em Portugal como uma catástrofe em que está tudo por fazer, ou pensar na Educação Inclusiva como um feito extraordinário e em que tudo está resolvido são certamente dois pontos extremos que não nos ajudam a entender, a discutir e a melhorar o que é preciso e urgente ser melhorado.

O caminho é certamente o de reforçar meios, incentivar culturas, estabelecer políticas, encorajar práticas que nos aproximem mais e mais de uma escola que não pense só nos que os alunos devem ser mas também naquilo que eles são.

David Rodrigues

Presidente da Pró-Inclusão / Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, Conselheiro Nacional de Educação

Fonte: Público por indicação de Livresco

Um videojogo que ajuda crianças na matemática

Duas ex-alunas da Universidade Portucalense criaram uma aplicação móvel para auxiliar alunos do 1.º ciclo no estudo damatemática, através de um jogo que inclui mais de 250 desafios que abrangem conteúdos da referida disciplina.

A aplicação Play Kachi "consiste na aventura de Kachi e seu amigo Doei que, perdidos na galáxia do fogo, danificam o reator da sua nave tendo de percorrer cinco planetas para conseguirem voltar a casa", explicaram as responsáveis pelo projeto.

Nos diferentes desafios, em cada planeta, é abordado um tópico do programa de matemática, incluindo matérias como a geometria, a estatística, os números naturais, racionais, as medidas e as operações.

(...) Teresa Fernandes e Isabel Oliveira, antigas estudantes de Informática da UPT, explicaram que resolveram aproveitar a "apetência que as crianças demonstram pelas novas tecnologias e pelos videojogos" para combater as dificuldades no estudo da matemática. (...)

Fonte: TVI24 por indicação de Livresco

"O divórcio precoce com a Matemática está a voltar"

Ainda se chumba muito em Portugal? 
Muito, porque não só se acredita que a retenção melhora as aprendizagens, como também é usada como medida corretiva. Porém, a melhoria da qualidade das aprendizagens é residual ou mesmo nula. No 2º ano de escolaridade quase 10% dos alunos ficam retidos. 

Qual é a explicação para isso? 
A aprendizagem da leitura e da escrita não é um processo natural e nem todas as crianças estão preparadas para essa exigência, mesmo que tenham sucesso noutras áreas. 

Considera que é uma falha da política educativa? 
É um problema cultural, mais do que político: não sabe, logo chumba. E o que deve ser feito é aplicarem-se as medidas certas para que o aluno passe a saber. A primeira e a mais importante é a intervenção precoce. Um pré-escolar de qualidade é fundamental. 

Que custos tem a retenção para a aprendizagem? 
Um aluno retido fica imediatamente desfasado daquilo que é a sua faixa etária, o que aumenta o nível de desmotivação. Algumas destas crianças conhecem o estigma do falhanço logo aos 7 anos. 

Acontece muito? 
Aos 15 anos, 35% dos alunos já tiveram uma retenção, um número de que nos devemos envergonhar. 

Mas acabar com a retenção não seria promover o facilitismo? 
A retenção é um sistema facilitista porque não exige mais nada de ninguém, é tudo repetido. Já a transição responsável pressupõe que o aluno, no ano seguinte, acompanhe os seus colegas além de ser obrigado a recuperar as aprendizagens passadas. Ou através de trabalho adicional durante o período escolar ou de trabalho adicional na escola no período de férias - o que também iria dissuadir aqueles que não aprendem porque não querem. 

Existe o culto da nota em Portugal? 
Sem dúvida. Hoje, o grande foco das pessoas não é o que sabe, mas a nota que teve. Os professores têm transformado a avaliação formativa como exclusivamente sumativa. 

Cabe às escolas ajudar a mudar esta visão da sociedade? 
Primeiro, deve mudar a sua própria visão. A formação não está preparada para lidar com alunos com necessidades de aprendizagem - é neste capítulo que é preciso investir. Temos de ser transparentes. Deve dizer-se que as notas são importantes, mas não o mais importante. 

Não é difícil quando existem médias de entrada no Ensino Superior altíssimas? 
Esse processo não devia estar centrado exclusivamente nas notas do ensino secundário e dos exames. Até porque tenho algumas dúvidas de que todos os alunos academicamente competentes possam ser médicos, enfermeiros ou professores competentes. 

Perdem-se competências com este sistema avaliativo? 
Não se perdem, mas não se treinam. É preciso preparar os alunos para apresentar ideias, apresentá-las publicamente; para fazerem investigação e análise crítica... 

E há tempo para tudo isso? 
Esse é outro problema: a extensão dos programas é uma ditadura. Tal como a antecipação de conteúdos. Hoje, os programas exigem uma capacidade de abstração que a larga maioria dos alunos não consegue atingir. 

Como é que essas dificuldades se fazem sentir? 
O divórcio precoce com a Matemática está a voltar. Os alunos, no segundo ano, dão o conceito de fração e muitos deles ainda não apreenderam o conceito de quantidade, por exemplo. É preciso ver com atenção os resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA, em inglês) e perceber que se tivemos uma melhoria de 2003 para 2012 é porque se fez alguma coisa bem. 

Que situações positivas foram essas? 
Houve um grande investimento em três áreas: formação de professores, criação de condições materiais e dar tempo para a apropriação de programas. Agora, isso mudou e é fundamental que se faça algo. 

Que medidas devem ser tomadas? 
É preciso ouvir os professores que estão a trabalhar nas escolas: quais as suas dificuldades, as suas opiniões e sugestões. O que sinto é que estes profissionais - não os sindicatos - sentem que não são ouvidos e já desistiram. 

É diretora de Agrupamento de Escolas de Constância. Como procura combater o insucesso escolar? 
Há seis anos que os nossos alunos do 5º ao 9º ano a Português, Matemática e Inglês estão agregados em nichos. O castanho (a semente na terra), quando os alunos estão a fazer aprendizagens básicas, o verde (a planta começa a florescer) e o azul (o céu é o limite). Temos três professores por ano que dão a mesma matéria, mas com abordagens diferentes. Assim, alunos dão saltos qualitativos no seu ritmo e podem mudar de grupo. 

Foi fácil implementar esse sistema? 
Foi um investimento muito grande do ponto de vista da formação dos professores, da consciencialização dos alunos e das famílias. Temos tido resultados muito positivos, tanto ao nível das notas, como da motivação. 

Já criticou os modelos avaliativos. Como é no seu agrupamento? 
Este ano, descentrámos a avaliação dos testes. Desde o primeiro ciclo, e em todas as disciplinas, tem de haver, por período, quatro instrumentos de avaliação. Um deles é uma apresentação oral, mas também se fazem fichas, resumos de aulas. Depende das disciplinas. O plano foi apresentado aos pais e foi bem aceite. 

Quando era professora nunca sentiu que havia alunos que não podiam mesmo passar? 
Era professora de Inglês, ainda não tinha feito este percurso, mas a ideia de impossibilidade sempre me assustou muito. As escolas devem ser lugares de oportunidade. "Tu não és capaz" ou "ainda não és capaz" têm uma diferença: a oportunidade. Uma escola só pode ser um lugar de esperança. 

Mantém a proximidade com os alunos? 
Dou aulas de substituição, mas não é a mesma coisa. Além disso, por exemplo, vou ouvir todos os miúdos do 1º ciclo a ler, no fim do ano, para perceber o que é preciso fazer. Temos uma professora apenas para ajudar os alunos do 1º e do 2º ano com dificuldades de leitura. 

Tem filhos em idade escolar? Alguma vez chumbaram? 
Tenho três - um rapaz de 13 e duas raparigas de 15 e 16 anos - e nunca nenhum chumbou. Mais importante para mim do que as notas é perceber porque é que algo falhou. "Não tiveste atenção? Malandro!", "Não percebeste mas já percebes? Óptimo!", "Não és capaz de fazer? Alerta!" E aí é preciso ver o que é preciso corrigir. 

Acabaram os exames do 6º ano, voltam as provas de aferição. O que pensa desta decisão? O presidente do CNE, David Justino, foi muito crítico… 
A avaliação externa das aprendizagens é justa, permite saber o que é preciso melhorar. No nosso agrupamento, por exemplo, corrigimos as provas todas novamente para podermos preparar o ano seguinte. 

Tiveram melhorias em algum campo? 
Há uns anos, o nosso calcanhar de Aquiles era a produção escrita. Hoje, é o mais forte e estamos acima da média nacional. 

Então, os exames e as provas de aferição são positivos? 
É preciso perceber que a prova de aferição, como era feita até agora, ou o exame escrito são muito limitados na aferição de competências, que é o que sublinha o CNE. Este conceito que foi agora introduzido é diferente: as provas de aferição são no meio dos ciclos, para poder corrigir algumas falhas. O único aspeto que podia ter sido melhorado é que, mais uma vez, os professores que estão nas salas de aula não foram ouvidos. 

Esta anulação dos exames alterou o que estava programado nas escolas do agrupamento? 
Na minha escola, zero! Nunca tivemos cultura de preparação de exames - o que não quer dizer que os professores não vão promovendo exercícios dos exames para os alunos não serem apanhados de surpresa. (...)

É fácil manter a paixão? 
Todos os dias temos motivos que nos orgulham e garanto que não são os resultados do ranking: é olharmos para um aluno e imaginarmos o percurso que ele iria fazer se não estivesse integrado na escola. Nós acreditamos mesmo que é possível criar um raio de luz no meio do cinzento. 


Fonte: Sábado por indicação de Livresco

quinta-feira, 28 de abril de 2016

E-book "O Direito à Autodeterminação das Pessoas com Deficiência

Partilho o e-book "O Direito à Autodeterminação das Pessoas com Deficiência", da autoria de Cristina Simões. 


Trata-se de uma temática interessante, atual e que, por isso, pode ser útil.

Zonas do cérebro associadas às palavras e aos seus significados

Com as palavras, os humanos puderam dar nomes às coisas, facilitando muito a comunicação. Mas ainda não se sabe como o cérebro associa o som “caneca” ao conceito de um recipiente cilíndrico, mais alto do que baixo, com uma asa, e que se enche de líquidos para se beber. Ou seja, como se atinge o significado das palavras – a semântica. Os cientistas deram agora um passo nessa direção, ligando as palavras à anatomia do cérebro. Para isso, pediram a voluntários para ouvir um podcast enquanto uma máquina que obtém imagens por ressonância magnética ia medindo a sua actividade cerebral, visualizando as áreas do cérebro que se ativavam para cada palavra. Os resultados, publicados nesta quinta-feira na edição da revista científica Nature, permitiram criar o primeiro atlas semântico do cérebro.

“Uma das descobertas mais importantes foi que cada conceito semântico está representado em múltiplas áreas do cérebro, e que cada área do cérebro representa múltiplos conceitos semânticos”, diz (...) Jack Gallant, líder da equipa, da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos Estados Unidos. “Uma das razões para que cada conceito seja representado em vários locais poderá ser que esses locais estão ligados a diferentes tipos de memórias.”

Veja-se “carro”: uma das áreas do cérebro ativadas por esta palavra também se ativava com as palavras “passageiro”, “milhas”, “parqueamento”, “horas” e “estrada”, conceitos ligados diretamente ao universo da condução. Mas outra parte do cérebro ativada pela palavra “carro” estava associada ao universo da segurança – onde este veículo pode ser um elemento importante –, sendo ativada por palavras como “xerife”, “polícia”, “homens”, “prisão”, “detido” e “posto”. Uma terceira área, também ativada por “carro”, estava associada às palavras “parque”, “lar”, “motel”, “hotel”, “apartamento”, “garagem”, “estrada”, “centro da cidade”, remetendo-nos para uma geografia urbana de lugares onde se chega de carro.

Não se sabe como é que este tipo de organização de conceitos surgiu no cérebro. “Terá de haver uma associação muito estreita na forma como as redes [de neurónios] se formam e a função do cérebro. Por isso, é provável que estes mapas funcionais reflitam a complexidade das redes subjacentes e da forma como a informação está organizada”, diz-nos Jack Gallant. De qualquer forma, não se pode tomar o atlas como universal. “Os mapas que vimos são incrivelmente consistentes entre os voluntários. Mas estes eram todos nativos na língua inglesa. Os mapas poderão ser diferentes para outras linguagens, ou para diferentes culturas.”

Um universo de 985 palavras

Para se chegar a este mapa, cada um dos sete voluntários ouviu um segmento de mais de duas horas do podcast The Moth Radio Hour. O programa tinha entre 3000 e 4000 palavras diferentes, mas os cientistas trabalharam com um universo mais pequeno de 985 palavras, constituído maioritariamente por substantivos e verbos.

“Usámos um estímulo de uma história porque queríamos mapear a escala completa dos conceitos semânticos num único estudo”, explicam os cientistas, num texto de perguntas e respostas disponibilizado aos jornalistas. Ao mesmo tempo que ouviam as histórias, o aparelho que obtém imagens por ressonância magnética ia medindo o aumento na oxigenação do sangue, no fluxo sanguíneo e no volume do sangue nas várias áreas do cérebro. Estas alterações estão associadas a uma maior actividade cerebral.

Depois, os cientistas associaram sons de palavras com a atividade específica de áreas do cérebro, e fizeram um modelo desta ligação. Com este modelo, a equipa tentou antecipar como iria o cérebro dos voluntários reagir quando ouvissem uma nova história com as mesmas palavras. E foram bem-sucedidos, mostrando que o modelo antecipou corretamente os lugares ativados no cérebro ao longo da nova história.

Ao contrário do que se pensava, tanto o hemisfério esquerdo como o hemisfério direito do cérebro estão envolvidos na atividade de atribuir significado às palavras. Até agora, os cientistas associavam a linguagem ao hemisfério esquerdo, num processo chamado de lateralização.

Para Jack Gallant, a lateralização poderá ser importante no que diz respeito à produção de linguagem, que envolve regras específicas que a sintaxe estuda. Mas quando se está a avaliar a compreensão das palavras no cérebro, então tudo aponta para que os dois hemisférios trabalhem em conjunto.

Apesar de haver diferenças entre as respostas dos voluntários, as semelhanças entre eles eram tantas que os cientistas puderam produzir o tal mapa semântico do cérebro, usando técnicas estatísticas para simplificar os milhares de dados obtidos. O atlas pode ser consultado na página virtual http://gallantlab.org/huth2016.

Agora, além de testar se o mapa é universal para pessoas de outras línguas e de outras culturas, há outras questões que precisam de resposta. Será que se obteria o mesmo mapa semântico se os voluntários estivessem a ler as histórias em vez de as ouvir? E se ouvissem a mesma história mas noutra língua?

A equipa antecipa que esta linha de investigação poderá vir a ser usada para descodificar, a partir de imagens de ressonância magnética, o que uma pessoa está a ver, a ouvir, a ler ou até a pensar. Os avanços poderão também ser importantes na medicina, defendem os cientistas: “Um descodificador de linguagem pode ter um valor incalculável para indivíduos com problemas de comunicação como na esclerose lateral amiotrófica e na síndrome do encarceramento [em que os doentes só conseguem piscar os olhos].”

Fonte: Público

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Alunos do Sardoal vão ter aulas de hipoterapia

Os alunos com necessidades educativas especiais das unidades de ensino estruturado e apoio especializado do Agrupamento de Escolas do Sardoal vão ter aulas de equitação terapêutica e hipoterapia em Abrantes.

O projeto chama-se “Da Escola para o Cavalo…com Afeto” e vai concretizar-se através de um protocolo de colaboração entre o agrupamento e o Núcleo Preparatório do Regimento de Apoio Militar de Emergência (NP/RAME) do Exército, e que permite o uso das instalações militares para as aulas.

O protocolo foi assinado numa cerimónia que decorreu no salão nobre da Câmara Municipal do Sardoal, que é também parceira neste projeto, cabendo-lhe assegurar o transporte dos alunos para as instalações do NP/RAME, em Abrantes.

Fonte: Rede Regional por indicação de Livresco

Torres Vedras aposta na identificação precoce do daltonismo

As escolas do 1º ciclo do concelho de Torres Vedras podem, desde o ano passado, ser alvo de uma acão de sensibilização e formação que visa identificar casos de daltonismo entre os mais pequenos, bem como ajudar à integração de quem é daltónico. A parceria entre a Câmara Municipal de Torres Vedras e o ColorAdd – projeto que, através de um código universal, faz com que os daltónicos consigam identificar as cores – fez com fossem identificados cinco casos de daltonismo na EB1 de Torres Vedras, na semana passada, e quatro no Centro Educativo da Ventosa, no ano passado. (...)

“Os professores poderão trabalhar de uma forma diferente no seu dia-a-dia e ajudar as crianças a lidar melhor com a dificuldade na identificação das cores” aponta a vereadora da Educação. Isto porque o projeto engloba uma ação de sensibilização junto dos professores das instituições. “Quanto mais ferramentas tiverem para, de uma forma precoce, detetarem qualquer situação de daltonismo, melhor” avança, falando num aspeto “extremamente importante” para quem lida todos os dias com crianças e que, desta forma, poderá transmitir informação a colegas e familiares dos mais pequenos.

Em cima da mesa está ainda um projecto inédito que visa introduzir este código universal nas praias do concelho, de modo a que os daltónicos possam identificar a cor da bandeira hasteada. A parceria entre o concelho e o ColorAdd é algo que a Câmara Municipal quer que “continue a dar frutos, por um lado porque é necessário chegar às crianças do concelho, permitindo que tenham acesso a este diagnóstico, por outro porque se pretende que a simbologia criada pelo ColorAdd seja difundida o mais rapidamente possível” avança Laura Rodrigues, sublinhando a possível implementação deste código em espaços como escolas, bibliotecas e na sinalética das ruas.

“Em termos sociais acaba por ser extraordinariamente importante. Se pensarmos nas crianças”, exemplifica, “é a diferença entre uma criança ser rotulada com dificuldades de aprendizagem, e ser uma criança que sabe identificar que tem uma limitação de identificação das cores mas que sabe como ultrapassar essa situação.”

Fonte: Torres Vedras Web por indicação de Livresco

Governo promete mais apoio para a educação especial

Para assinalar o Dia Mundial da Consciencialização do Autismo, Ana Sofia Antunes, Secretária de Estado da Inclusão das Pessoas com Deficiência, deslocou-se (...) à EB 2,3 de Arganil, onde participou num conjunto de atividades promovidas pelo Agrupamento de Escolas, sob o tema “Descobrindo o Autismo”. 
A governante começou por se congratular pelo facto de «após o 25 de Abril de 74 termos ganho a possibilidade de sermos pessoas incluídas na sociedade». Invisual, a governante lembrou que «até ao início da década de 80, a maioria das crianças com deficiência era remetida a escolas segregadas, onde apenas conviviam com os seus pares. Faltava o principal, a convivência, o estar com os nossos pares sem deficiência e conhecer a realidade como um todo», disse, revelando que, com as alterações legislativas, «as crianças com deficiência passaram a estar integradas, quase totalmente, nas escolas regulares». Sofia Antunes disse que, neste ano letivo, «98% das crianças com necessidades educativas especiais frequenta o ensino regular».

Fonte: Diário de Leiria por indicação de Livresco

Escolas de referência sensibilizam para a inclusão dos surdos

Mais de três centenas de alunos surdos, professores e técnicos mostraram ontem as competências adquiridas graças ao trabalho desenvolvido por oito agrupamentos e escolas de referência na educação e ensino bilingue dos alunos surdos, como é o caso do Agrupamento de Escolas D. Maria II, em Braga, em cuja escola-sede decorreram várias atividades.

O objectivo foi celebrar o Dia Nacional da Educação de Surdos e o Dia da Juventude Surda e, ao mesmo tempo, sensibilizar a comunidade para a inclusão de pessoas surdas.

Falando à margem do Dia Nacional da Educação de Surdos, a coordenadora do Departamento de Educação Especial do Agrupamento D. Maria II, Luísa Campos, sustenta que “a sociedade precisa de perceber melhor a surdez, perceber e saber comunicar com as pessoas surdas”, apontando que “há muitos mitos associados a este problema”.

Reconhecendo que “ainda há muitos preconceitos e muita barreira a derrubar”, Luísa Campos afirma: “não esperamos que, de repente, toda a gente aprenda a língua gestual, mas saber que é importante falar de frente, que não se pode exigir a um surdo que fale ao telefone”.

Como agrupamento de referência e com atividades como as de ontem “procuramos ser mais um alerta para que as pessoas surdas tenham direito à educação, ao trabalho e direito à vida tão normal quanto é possível” reforça a coordenadora do Departamento de Educação Especial.

“No dia-a-dia, procuramos que eles se identifiquem como comunidade, que assumam o seu estatuto de pessoas surdas dentro da comunidade mais alargada e, além da identidade cultural dar-lhes a melhor educação possível, porque nós somos escolas e queremos que eles prossigam estudos e que cheguem tão longe quanto as suas capacidades lhes permitam, que não seja a surdez que os vai impedir de chegar a um curso que queiram, em qualquer área” descreve Luísa Campos.

No ensino superior, ainda há trabalho a fazer, refere a coordenadora de Educação Especial do Agrupamento D. Maria II que salvaguarda, no entanto, que “a maior parte das universidades já tem intérpretes, mas não todas, sem as famílias terem que pagar do seu bolso”. (...)

Fonte: Correio do Minho por indicação de Livresco

A VERDADE SOBRE A DESATENÇÃO DAS CRIANÇAS NA ESCOLA

Não estamos sempre a ver a mesma coisa quando olhamos para comportamentos hiperativos. Por detrás da hiperatividade está muitas vezes a desatenção. E é esta que é preciso cuidar.

«Se não para quieto, como pode estar atento?» Esta é a queixa frequente de professores e pais ao fim do dia ou à volta dos trabalhos para casa. Mas o universo de perguntas não respondidas é muito maior: por que razão é tão atenta ou atento para as coisas que lhe interessam e tão pouco ou nada para outras? E por que razão tem «brancas» nos testes, quando tudo sabia na véspera? E por que é tão difícil memorizar, embora se lembre de coisas que já ninguém recorda? E por que é que nem as coisas de que gosta consegue levar até ao fim? E por que é tão fácil fazer amizades e tão difícil mantê-las? E por que salta sempre de uma coisa para a outra?

Estas e outras questões, mais ou menos enigmáticas, fazem parte da rotina das inquietações de pais, professores e outros «grandes» que têm de lidar com os mais pequenos e adolescentes que muitas vezes se distinguem por não conseguirem «parar quietos». Certo é: muitas vezes, mas nem sempre. O conceito de hiperatividade é porventura um mau serviço prestado à causa dessa perturbação do desenvolvimento que se chama «défice de atenção». Hiperatividade é apenas um aspeto ruidoso, mas pouco importante, da problemática da desatenção, que prejudica, além do aproveitamento na escola, o comportamento em casa, a interação no recreio e a autoestima. A hiperatividade varia ao longo do dia e das circunstâncias e que se vai atenuando com o crescimento. O problema na atenção é que veio para ficar.

Haverá basicamente dois tipos de distraídos: os que estão de tal forma concentrados numa coisa que não pensam em mais nada (como o guarda-redes à espera do penalty!) e os que prestam «atenção» a tudo, inclusive à mosca que passa, e não se concentram em nada!
É destes últimos, com ou sem a tal de hiperatividade, de que a «gente grande » se queixa. Na verdade, o que de facto os distingue é que os primeiros, os guarda-redes, estão como que muito acordados, em vigília, focados apenas no que é importante e ignorando o que se passa à volta, ao passo que os segundos estão como que menos acordados, passeando pelos seus pensamentos e reagindo por vezes de forma sobressaltada, «hiperativa», aos estímulos que aparecem, quase, metaforicamente falando, quando um telefone toca no momento que estamos quase a adormecer!

Todos passamos diariamente por estes dois estados, ora bem ora mal acordados. A diferença é que nestas crianças e adolescentes é como se o estado «menos bem acordado» entrasse pelas horas da escola e dos TPC prejudicando a sua capacidade para aprender e usar o que sabe. Todas as medidas usadas até hoje para aumentar a concentração – desde as reguadas, agora proibidas por lei, ao levantar a voz, ao sentar na primeira fila, ao trabalhar com pouca gente e coisas à volta, ao desporto, ao café, até aos medicamentos estimulantes – não farão outra coisa se não aumentar o grau de vigília.

A causa principal desta desatenção, hoje tão «diagnosticada» como hiperatividade, estará nos genes, numa tendência herdada e transmitida nos cromossomas, que limita o tempo de prestar atenção a determinado assunto. O estar «menos bem acordado» durante uma aula penaliza a capacidade de bloquear o acesso à paisagem cerebral do que não é importante naquele momento: alguém que riu lá atrás, a mensagem no telemóvel, a preocupação sobre os problemas no recreio ou em casa, a sensação de bexiga cheia… O resultado é o mesmo, com ou sem externalização ou movimento que é no fundo a dita hiperatividade.

Com esta tendência – como com tudo o que queremos reter quando estamos cansados e com sono – as matérias não passam da memória RAM para o disco rígido. E mesmo tendo sido percebidas, não ficaram estáveis para o dia do teste. Não temos nenhum motivo sério para acreditar que haja agora mais gente desatenta do que no passado. O que de facto mudou foi a estrutura familiar e como esta se interrelaciona: as famílias são mais pequenas, os pais estão menos disponíveis, muitas crianças não têm irmãos com quem aprender a partilhar a atenção e os objetos, com quem aprender a esperar, e estão rodeadas de ecrãs e de aparelhos que dão acesso a tudo e no tempo de um clique. Para além destes novos dados, sucede que este comportamento irrequieto poderá até ter sido reforçado em casa, quando adultos, embevecidos pela «personalidade forte» da criança, acham graça a ser interrompidos e ignoram até quando lhes levantam a mão.

A escola passou a ser para todos, indiferente a perfis desiguais no que diz respeito à capacidade para focar. Esta escola democrática não consegue responder com a sua nova pedagogia de tolerância e trabalhos feitos na net que levaram a uma menor interiorização de conteúdos e regras, e maior volatilidade do que se aprende.

Neste cenário, professores, médicos e técnicos contabilizam a quantidade de movimentos e de asneiras das crianças e fazem, literalmente, diagnósticos a partir de escalas e tabelas.
Tudo isto conduz naturalmente a esquecer a obrigação clínica de despistar questões emocionais que podem estar na base de comportamentos desatentos ou irrequietos e de tirar o retrato atualizado ao ambiente em que se movem.

A medicação, que não tem problemas de habituação ou dependência – ao contrário do que consta na internet e até na bula – surge como uma solução fácil e milagrosa, modulando o comportamento de crianças e jovens por os deixar mais quietos. O que é um efeito indesejado – ou mesmo tóxico – quando o que se pretende é deixá-los mais atentos.

Hoje, há um excesso de diagnósticos e de medicação em muitos casos, bem como de práticas erróneas que têm em conta indicadores pouco fiáveis, como o controlo da atividade. Estas práticas podem estar a ignorar a necessidade de outras importantes intervenções, como a psicológica ou psiquiátrica, nos jovens, nos seus hábitos e nos adultos de quem dependem.
Quem medica com estimulantes deve ter em conta que o importante é cuidar, não da hiperatividade ou das notas mas sim da atenção e das questões emocionais. A desatenção pode de facto prejudicar, de forma encadeada, todo o quotidiano destas crianças e adolescentes no seio familiar, no aproveitamento escolar, no recreio, no comportamento social e na autoestima. Tudo isto não é bom para quem está a crescer.

Pedro Cabral  
Neurologista pediátrico e diretor clínico do CADIn

terça-feira, 26 de abril de 2016

Portugal é o país que tem na Europa mais horas de aulas de Matemática

Portugal foi, na Europa, o país que “mais investiu no aumento do número de horas do ensino de Matemática” entre 2003 e 2012, tendo passado de cerca de três para cinco horas semanais. Nos outros países europeus, a carga horária nesta disciplina manteve-se em cerca de três horas por semana. 

Para os autores do estudo O que faz uma boa escola, do projeto aQeduto, que será apresentado nesta terça-feira, o aumento registado em Portugal “pode estar associado à melhoria de desempenho” dos alunos portugueses de 15 anos a Matemática, registada nos testes internacionais PISA, cujo resultado médio passou de 466 pontos, em 2003, para 487 em 2012, numa escala de 0 a 1000, em que a média geral ronda os 500.

Estes testes são realizados de três em três anos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) com vista a avaliar a literacia dos alunos de 15 anos a Matemática, Ciências e Leitura. É com base nos seus resultados e nos inquéritos promovidos no âmbito do PISA a alunos, professores e diretores de escolas que o projeto aQeduto tem vindo a analisar o que mudou nos alunos, nas escolas e no país. Este projeto é desenvolvido em conjunto pela Fundação Francisco Manuel dos Santos e o Conselho Nacional de Educação (CNE).

O estudo que será apresentado nesta terça-feira constata que “não se verifica qualquer relação entre o número médio de alunos por turma e os resultados obtidos no PISA”. Dois exemplos: a Holanda, com turmas médias de cerca de 25 alunos, obteve 523 pontos nestes testes em 2012, enquanto o Luxemburgo, que tinha turmas de 21 alunos, se ficou pelos 490.

Em geral, o número médio de alunos por turma nos países europeus é de 18 a 27 alunos, estando no primeiro caso a Finlândia e no segundo a França. A média em Portugal é de 22 alunos, embora a legislação permita chegar a um máximo de 30 por turma. Um estudo recente do CNE veio confirmar que esta variável tem um peso significativo no modo como se processam as aulas: quanto maiores as turmas, mais são os registos de indisciplina e menor é, por isso, o tempo consagrado pelos professores ao ensino propriamente dito.

O peso do meio

Mas, apesar desta constatação, também o CNE referiu então que não existe uma relação entre o número de alunos por turma e o seu desempenho. No seu programa, o Governo comprometeu-se a reduzir “gradualmente” o número de alunos por turma. No Parlamento estão atualmente em discussão vários projetos de resolução nesse sentido, apresentados pelo PS, BE, PCP e CDS/PP.

O estudo O que faz uma boa escola vem, por outro lado, confirmar que o estatuto socioeconómico dos alunos continua a influenciar o seu desempenho escolar. No conjunto das escolas com 3.º ciclo e secundário, em 20% a origem socioeconómica dos alunos era superior à média na OCDE, sendo que a maioria obteve resultados no PISA acima dos 500 pontos. Só 3% tiveram um desempenho abaixo do esperado. Já nas escolas com características socioeconómicas abaixo da média da OCDE, que são a maioria (80%), apenas 34% conseguiram resultados acima valor de referência do PISA (500 pontos).

“Dentro deste grupo, há escolas que conseguiram um score médio a Matemática na ordem dos 550 pontos”, destacam os autores do estudo, frisando que “importa compreender quais as estratégias que adotaram para potenciar o sucesso dos seus alunos, enfrentando condições adversas do meio envolvente”.

Já no que respeita às escolas que tiveram fracos resultados (46%), afirma-se que “estes dados sugerem que estas se moldaram à sua envolvente e não estimularam os seus alunos a ser melhores que o esperado”.

O que faz então a diferença entre elas? Segundo as perceções dos seus diretores, recompiladas para este estudo, “as práticas que distinguem as escolas que se classificaram acima de 500, mas que servem populações de recursos abaixo da média, são uma combinação de professores motivados e valorizados pela direção e a oferta de atividades extracurriculares”. 

As escolas com resultados abaixo dos 500, e que servem também o mesmo tipo de populações, tendem “a chumbar mais alunos, criar turmas de nível a Matemática” (agrupando os alunos pelos seus desempenhos), embora invistam também na “formação de professores e na divulgação dos objetivos da escola”. Segundo os autores do estudo, esta situação “abre espaço para a discussão sobre a qualidade e formas de implementação” destas últimas estratégias.

Faltam novas tecnologias

Por outro lado, os diretores de cerca de metade das escolas com resultados baixos deram conta da “falta de instalações, de material pedagógico e de salas”, mas não se queixaram da falta de professores. Sobre os recursos existentes nas escolas, existem vários pontos em comum entre as escolas com bons e maus resultados. Uma das carências transversais prende-se com “a falta de computadores, Internet e software nas salas de aula”.

A principal diferença, neste domínio, entre as escolas respeita à falta de instalações: 27% das que têm bons resultados referiram esta carência, contra 59% das que obtêm maus resultados. “As escolas com melhores resultados parecem ter mais equipamento de laboratório e materiais de biblioteca”, adiantam os autores do estudo.

A nível europeu, Portugal estava, em 2012, no grupo dos países “com maior disponibilidade de recursos tecnológicos nas escolas, embora estes não estivessem ainda a ser utilizados da melhor forma”. Constatou-se ainda que “três dos países que melhor utilizavam a tecnologia eram os que tinham menos horas semanais de Matemática: Suécia, Holanda e Finlândia”.

Fonte: Público

segunda-feira, 25 de abril de 2016

Para que a escola não seja uma “catedral do tédio” é preciso que os alunos contem

Missão impossível? “Se outros países já o fizeram, nós também podemos, embora isso signifique uma grande transformação do ensino em Portugal”, responde Manuel Magalhães, 20 anos, que está a estudar no Instituto Politécnico de Leiria. É um dos seis jovens, entre os 16 e os 20 anos, a quem (...) perguntou: o que pode ser mudado nas escolas para que estas (e o processo de aprendizagem) se tornem mais atrativos para os alunos. A mesma questão foi também colocada a pais e professores.

Na base deste desafio estão os resultados do último estudo internacional sobre a adolescência, da Organização Mundial de Saúde, divulgados no mês passado, que tem na base inquéritos realizados a mais de 220 mil adolescentes, dos quais cerca de seis mil são portugueses. Não será decerto, por acaso, que estes aparecem entre os que gostam menos da escola, colocando Portugal na 33.ª pior posição entre os 42 países e regiões analisados.

Nem sempre foi assim. Em 1997/98 o país ocupava a segunda posição neste indicador, mas em 2014/2015, ano do último estudo, apenas 25% dos alunos portugueses com 15 anos disseram que gostavam muito da escola. Mais concretamente, põem em causa as aulas, que consideram aborrecidas, e a matéria que ali é dada, descrita por eles como sendo excessiva. 

“Estou um pouco desanimada”, desabafa Daniela Guilherme a propósito da sua experiência escolar. “Não temos voz nas aulas e devíamos ter. É uma das formas de expressão mais importantes, mas nós só escrevemos. Existe muito pouco diálogo entre alunos e professores e a confiança é assim quase nula”, descreve a aluna de 18 anos, que frequenta o 12.º ano numa escola de Angra do Heroísmo, Açores.

À semelhança dos outros jovens (...), Daniela faz parte do projeto Dream Teens, criado em 2014 pela associação nacional de promoção da saúde dos jovens, Aventura Social, responsável pelo estudo da OMS em Portugal, e que tem precisamente, entre os seus objetivos principais “ouvir a voz” dos mais novos e dá-la a conhecer. A escola é dos temas sempre presentes.

O ensino como uma linha de montagem

Tal como estão, “as escolas tornam-se, para inúmeras crianças e adolescentes, verdadeiras catedrais do tédio”, alerta Ilídia Cabral, docente da Faculdade de Educação e Psicologia da Universidade Católica Portuguesa, com vários trabalhos realizados sobre o insucesso escolar no ensino básico e secundário. E isto acontece, frisa, porque se “ensina hoje como se ensinava há 200 anos”, seguindo uma estrutura construída com o advento da Revolução Industrial e que se traduz num “modelo de organização escolar padronizado, de inspiração fabril, do tipo linha de montagem, que permitiu às escolas darem o mesmo a todos”.

Porém, prossegue esta investigadora, os alunos de hoje são bem diferentes do que eram há dois séculos. “São alunos cada vez mais heterogéneos, com acesso quase imediato a inúmeras fontes de informação, nativos digitais para quem as metodologias de ensino tendencialmente expositivas e fragmentadoras do conhecimento se revelam, muitas vezes, totalmente desadequadas e muito pouco apelativas”, diz. E é assim que o tempo escolar se “torna, em muitos casos, um tempo vazio de significado para os alunos, por se encontrar completamente afastado da sua realidade, dos seus interesses e das suas necessidades”.

Usar a sério as novas tecnologias

Embora por outras palavras, Marta Martins, 20 anos, que está a estudar no Instituto Politécnico da Maia, aponta no mesmo sentido. “O ensino está a querer fazer de nós máquinas. Somos obrigados a estar mais horas na escola, a estudar mais matéria, o que só nos provoca mais stress”, diz, para acrescentar que “a falta de interesse dos jovens não é pela escola em si, mas sim pelas aulas e pelos conteúdos ali lecionados, que muitas vezes não vão ser precisos” no futuro.

Sabe isso, sobretudo, pelos seus colegas que frequentam o ensino regular: “Muitos não percebem metade do que estão a dar nas aulas, o que os leva a ficar desmotivados e até a desistir”, refere. Ela frequentou duas escolas profissionais, onde tirou um curso de animação digital. “Não tive professores a debitar a matéria. Mesmo a Português, tive uma professora que nos deu a matéria de forma tão apelativa, que ainda hoje a sei.”

Qual foi o segredo? “Primeiro de tudo deixava-nos à vontade e depois procurava sempre adaptar as aulas aos objetivos do curso, propondo-nos, por exemplo, que fizéssemos uma peça de teatro ou um vídeo a partir de excertos dos livros que são obrigatórios no 12.º ano.”

Já se sabe que os professores podem fazer a diferença e Marta tem uma proposta a fazer-lhes: usem, de facto, “as novas tecnologias nas aulas, porque assim vamos estar mais atentos”. Esta é também uma das sugestões apresentadas pelos professores do 3.º ciclo e secundário, Luísa Mantas e Ricardo Montes, que também é autor do blogue ProfLusos, um dos mais antigos na área da Educação.

“Aproximar, quando oportuno e possível, as metodologias de ensino à realidade dos alunos, nomeadamente na utilização das novas tecnologias, poderá ser um elemento motivador”, constata este último, para alertar de seguida: “Quando falo em novas tecnologias, não me refiro às já desgastadas apresentações multimédia, mas sim à utilização de aplicações virtuais e recorrendo aos melhores amigos tecnológicos dos nossos alunos — os tablets e smartphones”.

“Não se justifica que se o aluno pode adquirir um tablet com todos os manuais digitais e usá-lo em sala de aula e em casa, tenha que carregar com quilos de livros, com as implicações para a sua saúde e a carteira dos pais”, acrescenta Luísa Mantas, que ensina no Alentejo.

Professora há 23 anos, mãe de quatro filhos, esta docente foi também mediadora da associação Empresários para a Inclusão Social, onde trabalhou com alunos que têm percursos difíceis na escola e com as suas famílias. A estas experiências junta-se ainda a colaboração com Comissões de Proteção de Crianças e Jovens, onde, como diz, “a maioria das situações se prendem, de uma forma ou de outra, com o insucesso e o absentismo ou abandono escolar”.

À semelhança da aluna Marta Martins, defende ser “importante reconhecer que mais não é necessariamente melhor”. “Passar mais tempo na escola, assimilar maior quantidade de informação, permanecer na escola mais anos, não é sinónimo de garantir a aprendizagem, a motivação ou o sucesso futuro, pelo menos para muitos alunos”, alerta. Aliás, acrescenta, “para a maioria dos jovens a escola não tem nada para oferecer neste momento”. Para ela, é esta a questão de fundo que hoje se coloca.

Poder escolher as disciplinas

O que é preciso fazer então? “Há que repensar os currículos, as metas e os manuais escolares”, defende, para acrescentar de seguida: “Porque não diversificar os currículos, dando algumas opções aos jovens de acordo com os seus talentos, as suas competências, as suas aspirações futuras? Porque não promover e privilegiar a interdisciplinaridade e o relacionar de conhecimentos através de projetos e outras atividades?”

“Os currículos são demasiados rígidos. Cada aluno deveria ter um plano curricular [escolha de disciplinas] baseado nos seus interesses e talentos”, corrobora o aluno do Politécnico de Leiria, Manuel Magalhães. É o que acontece, por exemplo, no Reino Unido nos anos equivalentes ao 11.º e 12.º, em que os alunos apenas têm três cadeiras (menos de metade do que por cá), que são escolhidas por eles. Nelson Rebelo, 16 anos, que está no 10.º ano numa escola de Oeiras, lamenta que no ensino secundário não seja possível esta escolha e que tenha sido obrigado a prescindir de disciplinas de que gostava por ter optado pelo curso de Ciências e Tecnologias em vez de Ciências Socioeconómicas.

“Temos um sistema educativo muito formatado, que é excessivamente teórico e onde temos quase sempre de ouvir o professor, quando também deviam permitir que fossemos nós a pesquisar e a apresentar as matérias, o que só acontece muito raramente”, aponta Sara Fialho, 18 anos, que entrou este ano no curso de Bioquímica da Universidade Nova de Lisboa.

Nelson concorda. Defende que as aulas deveriam ter uma componente mais prática e sobretudo que os professores dessem mais autonomia aos alunos, para que estes “pudessem descobrir por si próprios” como se solucionam problemas ou se interpretam textos, em vez de se limitarem “a estar a ouvir “. Diz ainda que o sistema de ensino em Portugal “não abre portas a novas ideias, à discussão e ao debate”.

Para Carla Pereira, presidente da Associação de Pais da Escola Secundário Eça de Queirós, na Póvoa do Varzim, os tempos curriculares deveriam ser diminuídos também para permitir a realização de debates e tertúlias sobre temas vários, que fizessem da “escola um local de aprendizagem transversal, logo a começar no ensino básico”. Diz ainda a este respeito que “as escolas têm também de formar bons cidadãos”.

É disso também que fala Daniela Guimarães, quando propõe que se promova uma maior ligação da escola ao meio envolvente, incentivando os alunos a procurarem saber, por exemplo, que projetos existem nas autarquias e a apresentá-los periodicamente. “Deste modo os alunos vão sentir-se abraçados pela comunidade. É assim que se cresce como pessoa, o que não se consegue pela imposição de regras e pela pressão que nos é posta em cima, sobretudo por causa dos exames”, defende.

Falta de apoio dos professores

Os jovens ouvidos (...) lamentam ainda que a escola desvalorize ou mesmo ignore temas que para eles são fundamentais, como a família ou a educação sexual. Mas Teresa Carreira, 18 anos, que estuda em Salvaterra de Magos e vai este ano repetir os exames para melhorar a média e conseguir entrar em Medicina, aponta também o dedo aos alunos. “Pensei que ia haver troca de informações e debate entre Associações de Estudantes sobre o que podíamos fazer nas escolas, mas isso não acontece”, refere.

Queixa-se ainda “da falta de apoio dos professores fora da sala de aula”. “Só existe quando se aproximam os exames”, constata.

“Os professores estão transformados em burocratas do cumprimento de metas curriculares que parecem listas de compras mensais no hipermercado e não investem na relação interpessoal com os alunos por falta de condições, mas também por excesso de autocomiseração, desfiando sistematicamente queixas sobre tudo e todos, a começar pelos alunos”, critica Jorge Ferraz, que pertenceu à direção da Associação de Pais do Agrupamento de Escolas Baixa-Chiado, em Lisboa.

Uma das formas de aproximar professores e estudantes passará, segundo ele, por acabar com o atual Estatuto do Aluno, que “transforma os docentes em queixinhas e contribui para destruir a ligação imprescindível entre disciplina, aprendizagem e empatia interpessoal”.

Um novo papel para docentes e alunos

Para a investigadora da Universidade Católica Ilídia Cabral é “urgente” alterar não só a organização escolar, como também as práticas pedagógicas, o que passará, entre outras medidas, por atribuir um novo significado ao papel do professor e do aluno. Orientando o professor “para uma ação de mediação entre os alunos e o saber, tornando-o um facilitador das aprendizagens, um professor que responsabiliza, mas apoia e suporta e que fomenta a autonomia dos seus alunos”. Já o aluno, acrescenta, deve ser encarado como “o ator central das suas aprendizagens, envolvendo-o e comprometendo-o em torno de objetivos claros, que sejam delineados conjuntamente com os professores”.

Esta centralidade do aluno é, aliás, uma das estratégias da Finlândia, geralmente apontada como modelo no campo do ensino, para adaptar a escola a um “mundo que está a mudar a grande velocidade”, segundo palavras da diretora do Conselho Nacional de Educação finlandês.

A reforma educativa, que entrará em vigor no próximo ano letivo, porá assim os estudantes a participar na elaboração dos currículos, na escolha dos temas que serão abordados nos novos módulos que vão ser oferecidos pelas escolas e onde, a propósito de cada tópico, serão mobilizados conhecimentos de várias disciplinas, sempre com aplicações práticas.

De regresso a solo português, Nelson Rebelo, o estudante de 16 anos de Oeiras, conta que não tem tido problemas com o seu desempenho escolar. Mas esta é só uma das faces da moeda. “Sei que cresceria mais se o meio da educação fosse diferente do que é”, remata.

Para conseguir essa diferença, Ilídia Cabral considera que se devem “criar condições para fazer emergir novas possibilidades de sucesso, o que significa equacionar novos modos de agrupar os alunos, segundo matrizes flexíveis”. E, por outro lado, apostar na “diversificação dos modos de trabalho pedagógico, porque os alunos aprendem de forma diferente e a forma de ensinar não pode continuar a assentar na forma escolar, que deixa de fora todos aqueles que não se encaixam no perfil (ficionado) do aluno médio”.

Já para Ricardo Montes, que lecciona em Trás-os-Montes, há uma condição prévia sem a qual não se conseguirá alterar a relação que os alunos têm com o ensino e que, segundo ele, não tem sido acautelada pelo poder político, bem pelo contrário: “A primeira forma de tornar mais atrativa a escola aos alunos passará por essa mesma escola conseguir motivar os professores. Sem professores motivados, dificilmente teremos alunos que o estejam.”

Embora considere que o sucesso do resto, que é muito, dependerá desta premissa, este docente tem mais sugestões a apresentar com vista a reforçar a atração dos alunos pela escola. Diz que a redução do número de alunos por turma, um tema que está agora a ser debatido no Parlamento, “poderá fomentar a motivação dos alunos” por permitir “um ensino mais individualizado”, o que nunca poderá suceder numa turma de 30 alunos.

Na sua experiência profissional, Ricardo Montes tem constatado que, geralmente, os alunos “não definem objetivos com vista a conseguirem uma vida melhor”, embora acredite que sintam essa necessidade, ou então “fazem-no de forma pouca clara”. Por outro lado, recorda, estes “mesmos alunos deparam-se com o insucesso profissional dos seus irmãos, amigos ou conhecidos mais velhos que conseguiram concluir cursos superiores”. Defende, por isso, que “estas duas situações poderiam ser trabalhadas na escola, por técnicos com formação para o efeito, e em articulação com os docentes, de modo a que os alunos definissem ou redefinissem objetivos tendo em vista a realidade nacional e europeia”.

Mas ainda há mais por fazer. A presidente da associação de pais da secundária Eça de Queirós considera indispensável que se tenha “um objetivo para a educação estável e duradouro, imune às alterações políticas”. “A escola deve ser um local de formação e não de autenticação de cunhos pessoais”, frisa Carla Pereira. Esta é também uma das propostas da aluna Daniela Guimarães com vista a tornar a escola um sítio melhor. “É muito complicado vivermos sempre na suspeita de que no próximo ano tudo vai ser diferente outra vez”, queixa-se.

E se nada mudar entretanto? Para Ilídia Cabral não subsistem dúvidas sobre o desfecho: “As escolas têm de aprender a ensinar no século XXI, sob pena de se tornarem dispensáveis.”

Fonte: Público

Comissões de menores paradas por falta de meios

Esta é uma denúncia feita pela procuradora geral distrital, num relatório relativo a 2014/2015, a que o Jornal de Noticias teve acesso.

A procuradora aponta graves deficiências no funcionamento de algumas comissões em particular.

É o caso de Vila Real há um único técnico da segurança social para várias comissões de proteção de menores.

Outro caso denunciado mas a Sul diz respeito a Sintra, onde 23 técnicos, nem todos a tempo inteiro a divididos por duas comissões que tiveram a seu cargo no ano passado 3 mil 248 processos. Feitas as contas, cada técnico é responsável por 150 processos.

O resultado é que são quase mil os processos que transitaram em para este ano, quase tantos como os que entraram de novo em 2015.

Estes são dois dos exemplos que levam a procuradora geral distrital do Porto a dizer que a falta de técnicos da segurança social atravessa todo o país.

Em maio e junho do ano passado, por exemplo, foram retirados mais de uma centena de técnicos que trabalhavam nas comissões de proteção de menores.

A falta de técnicos tem reflexos claros: diz o relatório da procuradora Maria Raquel Desterro que, por exemplo, em Vila Nova de Gaia há "uma generalizada falta de revisão atempada das medidas de proteção".

A par dos técnicos, o numero de magistrados também é considerado "manifestamente insuficiente" o mesmo acontece com o numero de oficiais de justiça. São dados como exemplo os casos de Porto Este, Braga ou Aveiro, com o pessoal de investigação criminal ou com os peritos.

Neste cenário há, inevitavelmente, atrasos e estrangulamentos com a necessidade de definir prioridades.

Ainda assim há comissões que conseguem resolver todos os dias a vida de dezenas de crianças como há casos, "quase caricatos": o de uma vereadora da câmara de Marco de Canavezes que durante 9 anos também presidiu à comissão de proteção de menores mas raramente foi a uma reunião. A autarca justifica que tinha delegado na sua secretária, que acabou, 9 anos depois, por assumir a presidência da comissão de proteção de crianças e jovens de Marco de Canavezes.

O relatório destaca ainda um "grande adormecimento", ou seja, inatividade de muitas comissões alargadas das comissões de proteção de menores. Elas deveriam reunir autoridades policiais, civis, ministérios, associações e cidadãos mas deixaram de reunir.

Fonte: TSF por indicação de Livresco

domingo, 24 de abril de 2016

"Prefiro mil vezes estes miúdos. São acessíveis"

A Secundária Azevedo Neves tem mais africanos do que qualquer outra no país. Inserida numa zona de famílias carenciadas, tornou-se um modelo positivo, com alta empregabilidade.

"É o meu primeiro ano aqui. Sou de Cascais e há um choque gigante de realidades, mas prefiro mil vezes estes miúdos. São mais acessíveis, conseguimos lidar com eles, entender os problemas, e fazer um trabalho excelente." Quem o diz é Ana Baltar, professora de Design de Moda, enquanto mostra as peças de vestuário feitas pelos alunos da Escola Secundária Dr. Azevedo Neves. "A minha família é da área têxtil e sei o que digo. Isto é já de um nível alto", comenta o diretor José Biscaia. Há mais de 20 anos que dirige uma das escolas que se tornou um modelo. Guia (...) pelos vários espaços, do recreio às salas de aula, enquanto cumprimenta os alunos. Todos o conhecem. Quando aqui chegou, a escola era das mais problemáticas. Agora é um exemplo. "Ou deixávamos andar ou atacávamos a raiz do problema."

O trabalho começa na base, nos polos onde funcionam o jardim-de-infância e o 1.º ciclo. Um dos segredos do sucesso é o trabalho social. "Os pais só eram chamados para levar na cabeça, quando os miúdos se portavam mal. Então abrimos a escola aos pais. Na quinta-feira até às 21.00, e ao sábado, temos os serviços administrativos, salas de estudo para os alunos, aulas gratuitas de Português para adultos, e ajudamos os pais em todo o tipo de problemas. Constataram que efetivamente o melhor lugar para eles era a escola, e vai-se criando em torno dela um núcleo de forças positivo."

Situada na Damaia, com maioria de alunos africanos e de famílias carenciadas, tinha muito para dar errado. Mas o cenário foi-se compondo com o trabalho de fundo, muito dele proveniente da elevada dedicação de professores e funcionários.

No secundário, a aposta é claramente nos cursos profissionais com uma elevada taxa de empregabilidade. Os jovens cedo têm o primeiro contacto com o mercado de trabalho. "Neste ano estou a tentar que eles vão para hotéis. A ideia é diversificar. Curiosamente tenho encontrado alguns dos meus primeiros alunos e dizem-me que estão a trabalhar na área, é giro", comenta Bernardete Marques, coordenadora do curso de Cozinha e Pastelaria.

Cristiana Castro, aluna do 11.º ano, conta que vai "estagiar dois meses no Penha Longa [hotel de luxo em Sintra]". "Estou nervosa." Já está na Azevedo Neves há sete anos, desde o 5.º. Faz parte da minoria portuguesa e não acha que a diversidade traga problemas ao quotidiano escolar: "Aprendemos uns com os outros, eles têm uma cultura diferente. Ensinam-nos coisas da deles e aprendem coisas da nossa, gosto de andar aqui. Como é uma mistura, aprendemos coisas que noutra escola não aprenderíamos."

Seria utópico pintar um cenário perfeito, mas tendo em conta o meio social envolvente, é óbvio que a Azevedo Neves soube crescer na adversidade. "Já estou cá há bastante tempo, e não a trocava por nenhuma outra. Não quer dizer que não possam ter um momento de indisciplina nas aulas... No ano letivo não podemos entrar a matar, senão perdemos. Se os soubermos levar, temos tudo deles", conclui Bernardete.

No fim do 9.º ano, 68% dos alunos optam pelos cursos profissionais em vez da via de ensino. "Têm saída imediata, uma empregabilidade muito grande, é normal essa escolha", explica José Biscaia. "Em Eletrotecnia temos uma empregabilidade superior a 100%, tal como em Cozinha e Serviço de Mesa. No 11.º ano, as empresas querem agarrar os alunos, oferecem 600 euros de ordenado e eles não querem voltar à escola."

A experiência de Keila Dias e Erine Tavares, do 10.º ano, ajuda a perceber outras motivações para optar pela via profissional. As cabo-verdianas escolheram Humanidades... mas arrependeram-se. "Aqui as pessoas têm de estudar muito e há palavras complicadas. O português de lá não é igual ao de cá e só o falamos na escola. Em casa é só crioulo, assim fica mais difícil", diz Erine. Por isso, no próximo ano vai mudar para o curso de Cozinha. "[A via de ensino] é mais difícil, temos de estudar muito e escrever muito, há palavras que não entendemos, isso não ajuda. Também vou mudar para Cozinha [risos]", complementa Keila. "Eu sou muito despachada, habituo-me depressa", adianta Erine, que sente o mesmo que a amiga: "Aqui é só computador, televisão, telemóvel. Nem as crianças brincam na rua."

"Entre, após o professor, em fila e em silêncio". Esta é apenas uma das "10 regras de ouro" afixadas por toda a escola. O ambiente é tranquilo, sente-se uma harmonia, quando todas as condicionantes pareciam apontar para o caos. A integração é palavra de ordem na escola. Keila diz que no recreio "só falam crioulo", mas os portugueses não parecem muito preocupados com isso. "Estrangeiros? Tentamos falar com eles, saber de onde vêm, para não terem vergonha, e depois integram-se", adianta Cristiana. Irineia Garcia e Emanuela Gomes são colegas de turma no 2.º ano (11.º) do curso de Cozinha e ambas fazem parte da maioria africana na escola. Também desvalorizam o facto de muitos virem de famílias carenciadas e de países diferentes. "Desde que estou aqui nunca tive problemas", diz Emanuela."O ambiente é normal, já estou aqui desde o 6.º ano", remata Irineia. "Todos têm problemas, mas são putos impecáveis. Em setembro nem tocam na máquina de costura, parece um bicho. Agora já fazem uma peça completa de raiz. É brutal a evolução, fico admirada. Mesmo nas férias da Páscoa estagiam, todas as abertas que temos no horário eles vão. E gostam. Supostamente deviam estar de férias, os outros estão na praia e eles a trabalhar", relata Ana Baltar. É o velho ditado: quem corre por gosto não cansa.

Fonte: DN

80% dos alunos africanos são empurrados para o ensino profissional

Mais de 80% dos alunos afrodescendentes acabam nesta vertente no secundário, o dobro da média da população branca.

As conclusões são controversas: um estudo realizado por Pedro Abrantes e Cristina Roldão, do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES), identifica sinais de "segregação" e até "racismo institucional" nas escolas portuguesas tendo por alvo a população afrodescendente. A tese dos investigadores do Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE) assenta em indicadores objetivos, retirados de dados oficiais do Ministério da Educação. Elementos que não figuram nas estatísticas oficiais publicadas pela tutela mas que os investigadores foram autorizados a recolher e tratar.

O primeiro sinal de alerta parte do chamado ensino vocacional e profissional, uma aposta de vários governos - em Portugal e não só. A ideia de construir percursos alternativos para garantir que cada vez mais alunos conseguem completar a sua escolaridade e obter alguma qualificação profissional tem sido consensual no país, mesmo com diferentes abordagens em função da cor política do partido ou partidos no governo. Mas as conclusões dos investigadores sugerem que, em relação aos alunos de ascendência africana, estas vias têm funcionado mais como um "gueto" criado no espaço escolar.

Cerca de 80% de todos os alunos neste grupo (6451 de um total de 7984, dados de 2013) acabam nos cursos profissionais assim que atingem o ensino secundário, bastante mais do dobro da população cujos ascendentes diretos (pais, avós) são portugueses. "Têm quase três vezes mais possibilidades de acabar nessas vias do que os "portugueses", conta (...) Pedro Abrantes, acrescentando que em certos grupos a diferença é ainda mais acentuada: "Alunos cabo-verdianos têm cinco vezes mais probabilidades", ilustra.

Outro dado difícil de explicar: enquanto entre 2001 e 2011, a percentagem de alunos "portugueses" dos 18 aos 22 anos que chegam ao ensino superior aumentou de 31% para 34%, entre os alunos afrodescendentes baixou dos 21% para os 16%.

Este é um indicador que, desde logo, abala aquela que seria a explicação mais óbvia para as expectativas mais baixas dos alunos de origem africana: a condição socioeconómica das suas famílias. Uma estagnação ou uma subida mais lenta da percentagem de alunos deste grupo que chega ao superior poderia ser explicada com dados de contexto. Mas para uma queda faltam as justificações. "Sabemos que, nestes anos de crise, as universidades aumentaram os valores das propinas e as famílias tinham menos meios. É natural que tenha havido alguma retração em relação ao ensino superior. Mas no grupo dos alunos afrodescendentes essa retração é muito maior do que aquela que seria expectável", diz o investigador.

O dado mais inquietante vem da análise dos resultados dos alunos em função da condição socioeconómica e habilitações literárias dos pais. Não é apenas entre os mais desfavorecidos que este fosso de resultados e expectativas entre alunos negros e brancos é acentuado. Por exemplo, mesmo quando um aluno afrodescendente tem pais com empregos qualificados, que lhes garantem rendimentos de nível médio a elevado, as suas probabilidades de contabilizar com pelo menos uma retenção no currículo são de 41%. Praticamente o dobro do outro grupo em análise.

"A segregação ocorre"

Para Pedro Abrantes, a soma destes dados não deixa dúvidas. "A segregação ocorre. Pode-se discutir se é de facto algo que é consciente ou se é uma consequência de vários mecanismos que não são muito conscientes, mas a verdade é que a segregação existe", considera.

Pedro Calado, Alto Comissário para as Migrações e Coordenador do Programa Escolhas (uma iniciativa do Conselho de Ministros que promove a inclusão dos grupos mais vulneráveis), admite que o estudo - por sinal apoiado pelo Alto Comissariado - "vem lançar novas pistas de reflexão face àquilo que haviam sido os estudos anteriores sobre a integração escolar dos descendentes de imigrantes em Portugal, nomeadamente por reforçar a possibilidade de existir algum tipo de orientação seletiva para alternativas educativas que se pode perfilar como segregadora".

"Este estudo lança, então, pistas que importa aprofundar para perceber se a estes fatores acresce alguma dimensão associada ao racismo, nomeadamente nos caminhos de acesso ao ensino superior".

Manuel António Pereira, presidente da Associação Nacional de Diretores Escolares, reage às conclusões com a mesma combinação de cautela e preocupação: "Sou contra qualquer tipo de discriminação na escola. As escolas, nomeadamente a escola pública, têm de fazer tudo o que está ao seu alcance para que os alunos, seja qual for a sua origem, não se sintam discriminados." E acrescenta, "se existem sinais encontrados nesse estudo, eles nunca são despicientes e devem ser interpretados e ouvidos com atenção".

Ainda assim, este diretor admite que "uma boa percentagem" dos alunos que contribuem para as estatísticas do estudo frequentem "escolas suburbanas, onde a realidade social, económica e política é diferente do resto do país".

Há vários fatores que podem ajudar a enquadrar os resultados do estudo. Mesmo o autor admite que, por exemplo em relação ao ensino superior, "pode haver algum impacto de uma menor procura por alunos dos países de língua portuguesa", ainda que esclareça que "esse impacto não chega de forma alguma" para explicar os números.

Refira-se que o número total de nacionais de países africanos de língua oficial portuguesa nos ensinos básico e secundário é de 18255.

Segundo os investigadores "no caso do secundário, 6451 alunos estão nos cursos profissionais e apenas 1533 nos cursos gerais".

Pedro Abrantes explicou (...) que "uma parte da análise foi baseada neste universo. Noutra parte da análise procurámos integrar também aqueles que já nasceram em Portugal, mas cujos pais são africanos. Nesse caso, o universo é bastante maior (cerca do dobro), mas aí não temos um número exato, pois o Ministério da Educação não recolhe informação sobre a nacionalidade e naturalidade dos pais no universo do sistema educativo e, portanto, trabalhamos com amostras".

Fonte: DN