Proporcionalmente, há mais casos de paralisia cerebral nas maternidades que fazem poucos partos por ano, mas o risco também aumenta nos blocos de parto de grande dimensão.
Pela primeira vez em Portugal, um relatório, que é nesta quarta-feira apresentado em Lisboa, prova que existe uma associação entre a dimensão das maternidades (volume de partos que fazem) e o número de casos de paralisia cerebral. Em Portugal, surgem cerca de 200 novos casos por ano e 90% chegarão à idade adulta.
“Há uma amplitude crítica da qualidade de cuidados nas maternidades. Abaixo de determinada dimensão [menos de 1500 partos por ano] aumenta o risco porque não é rentável ter profissionais a tempo inteiro e com experiência suficiente. Acima de determinada dimensão [mais de dois mil partos] também começa a subir o risco. É preciso notar, porém, que isto não está associado a problemas ocorridos durante o parto, mas sobretudo ao atendimento ao recém-nascido e à grávida nos últimos dias de gravidez”, explica Daniel Virella, um dos coordenadores deste que é o segundo relatório do Programa Nacional de Vigilância Nacional da Paralisia Cerebral aos 5 anos de Idade.
Tomando como referência a taxa de incidência estimada para recém-nascidos em maternidades com 1500 a 1999 partos anuais, nascer em serviços acima ou abaixo [destes escalões] “aumentou em cerca de 50% o risco de sofrer de paralisia cerebral”, refere o relatório.
A avaliação, que vai ser apresentada na Fundação Gulbenkian, incidiu sobre as crianças nascidas entre 2001 e 2003 com paralisia cerebral e que foram notificadas ao programa: 576 no total. A paralisia cerebral deve-se a uma lesão cerebral, provoca perturbações do movimento e do controle, mas mais de 40% das pessoas com esta condição têm uma inteligência normal, nota o médico.
Dado que o principal fator de risco identificado é a grande e extrema prematuridade (menos de 32 semanas de gestação), compreende-se que as maternidades maiores, que recebem casos mais complicados e gravidezes de risco, tenham uma maior proporção de casos. Daniel Virella defende, a propósito, que a população deveria estar informada para os riscos inerentes a algumas técnicas de procriação medicamente assistida.
Outro problema destacado no relatório: quase um terço (33%) dos casos em que a asfixia perinatal é causa atribuível de paralisia cerebral ocorreram nas maternidades com menos de 1500 partos que, no total, foram responsáveis por pouco mais de um quinto dos nascimentos.
O plano de referenciação materno-infantil deve ser atualizado para se manter a qualidade dos cuidados em Portugal, recomenda o médico, que nota, porém, que “não se deve ser absolutista e entrar numa espiral de concentrações de blocos de parto”.
O relatório traça ainda o retrato das dificuldades que enfrentam as crianças com paralisia cerebral, que sofrem de patologias e défices múltiplos, alguns dos quais podem ser corrigidos. Mais de 30% estavam subnutridas por causa da dificuldade de se alimentarem e serem alimentadas e mais de metade sofriam de défices visuais. O médico lamenta também que a maior parte dos apoios que existem na infância desapareçam na idade adulta. “Não faz sentido andarmos a investir em alta tecnologia e tratamentos extremamente complexos para depois não haver resposta na comunidade”.
Por Alexandra Campos
In: Público
Nota: O destacado, por concordar em absoluto, é da minha responsabilidade.
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