sexta-feira, 21 de julho de 2017

A inclusão não pode ser esmagada por interesses burocráticos e economicistas

Em 4 de julho, p.p., foi colocado em discussão pública o projeto de diploma legal que visa revogar o Decreto-lei n.º 3/2008 (regime de Educação Especial), sendo este novo documento identificado como regime legal de inclusão escolar.
É uma proposta que assenta numa base teórica completamente distinta da anterior, não se limitando a introduzir alterações, antes revogando o regime que vigora.
Este é um projeto que, como atrás se refere, por partir de uma filosofia de inclusão, abrange todos os alunos e não apenas os que apresentam Necessidades Educativas Especiais (NEE) de caráter permanente, logo, não se reduz às questões da Educação Especial. Como tal, poderia merecer um franco apoio da FENPROF.
Esse apoio poderia mesmo sair reforçado pelo facto de se prever, finalmente, o fim da aplicação da Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde (CIF), uma luta que a FENPROF nunca deixou cair, desde que, em 2008, esta foi imposta. Apesar dos esforços de anteriores equipas ministeriais para provar o contrário, a CIF não é um instrumento que possa ser aplicado em Educação. O projeto agora divulgado pelo ME prevê, finalmente, a eliminação desta classificação, afirmando não ser correto categorizar para intervir pedagogicamente.
Porém, basta que passemos do preâmbulo e dos princípios que diz defender para a sua operacionalização para percebermos que estamos perante um documento extremamente preocupante porque apresenta lacunas e aponta para soluções muito negativas, levando a que o interesse pedagógico seja, em múltiplos aspetos, passado para segundo plano, prevalecendo perspetivas burocráticas e economicistas. Esse é o motivo por que muitos recursos e instrumentos que prevê para a concretização da base teórica – que, reitera-se, é positiva – são inadequados, poderão ser insuficientes e, assim sendo, a pretendida e anunciada inclusão é posta em causa.
Como a FENPROF tem afirmado, para uma efetiva educação inclusiva são necessários recursos humanoscompetentes para responder às necessidades de todos os alunos. Uma competência que, em grande parte, decorre da sua especialização. É necessário, ainda, que as escolas tenham capacidade de organização, de forma a criarem contextos favoráveis à inclusão, para os quais contribuem, decisivamente, as condições de trabalho existentes.
Acontece que este projeto do ME, no que concerne aos docentes, prevê apenas a utilização dos recursos humanos disponíveis na escola, independentemente de estes serem, ou não, suficientes e os mais adequados face às necessidades dos alunos. Também se destaca negativamente a falta de clareza em relação ao conteúdo funcional dos docentes de grupo 910, designadamente da sua componente letiva
O possível esvaziamento do conteúdo funcional dos docentes do grupo 910, sendo-lhes atribuído, eminentemente, trabalho burocrático e atividade de assessoria aos titulares das turmas, poderá pôr em causa o apoio direto aos alunos que dele necessitam.
É, também, com muita preocupação que se assiste ao esvaziamento dos recursos humanos não docentes (profissionais como terapeutas, intérpretes de LGP, psicólogos, assistentes operacionais, entre outros), em sério contraste com a sobrevalorização dos Centros de Recursos para a Inclusão (CRI). A tal não será alheio o eventual retorno do acesso e frequência de alunos às instituições de Ensino Especial. Esta intenção de retirar às escolas recursos que hoje detêm, está igualmente presente no projeto de diploma legal sobre descentralização, que prevê a transferência de todos os recursos humanos não docentes da Educação Especial para a tutela das câmaras municipais, o que merece da FENPROF completo desacordo.
A FENPROF considera igualmente negativa a intenção expressa de impedir um eventual reforço de recursos humanos quando tal se revele necessário à incrementação de medidas que se consideram essenciais, como é o caso da redução do número de alunos em turmas que o justifiquem. Considera, igualmente, negativo que decisões pedagógicas importantíssimas, relativas a apoios a prestar a alunos que deles necessitem, passe a depender da decisão do diretor, órgão unipessoal, tantas vezes incompetente para decisões deste e de outro tipo, ou mesmo, como acontece em relação à redução do número de alunos por turma, de autorização superior da administração educativa. Será esta a autonomia de que tanto falam os responsáveis do Ministério da Educação? Já em relação à centralização das decisões no órgão unipessoal de direção das escolas, essa é, de facto, a consequência de um regime de gestão que o ME tarda em alterar, mas que se revela cada vez mais desajustado à organização de uma escola que se quer democrática, logo, inclusiva.
Assim, é bastante negativa a primeira apreciação que se faz deste projeto de diploma legal. Contudo, entende a FENPROF que, a partir dos pressupostos do regime proposto, é possível estabelecer uma alternativa positiva. Será nesse sentido que se deverá orientar a intervenção dos professores e educadores, e não apenas dos que integram os grupos de Educação Especial. Mas também outros profissionais das escolas, bem como os pais e encarregados de educação deverão intervir neste processo de discussão pública defendendo posições que levem à alteração dos aspetos mais negativos do projeto de diploma legal.
Até 31 de agosto todos os interessados em participar, poderão manifestar as suas posições junto do Ministério da Educação. Parece muito tempo, pois são quase dois meses de debate, no entanto, trata-se de um período que coincide com as férias da grande maioria dos membros da comunidade educativa, pelo que o ME deverá prolongar o período de discussão pública, pelo menos, até final de setembro.
Em setembro, independentemente de ainda decorrer, ou não, a discussão pública a FENPROF irá promover plenários em todo o país para debater, com os professores, este projeto. Com esta iniciativa e com toda a ação que vier a ser desenvolvida pelos professores, a FENPROF procurará contribuir para alterar os aspetos que, nesta proposta, parecem ter saído de uma qualquer gaveta em que a anterior equipa ministerial os havia guardado.

O Secretariado Nacional

Fonte: FENPROF

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