sexta-feira, 23 de fevereiro de 2024

Cinco regras para criar testes que ajudam a aprender

Já sabemos que os testes ajudam a aprender mais e melhor, mas como maximizar os efeitos benéficos dos testes na aprendizagem? Um artigo muito recente revê o que a ciência cognitiva nos diz sobre o uso dos testes, de modo a tirar o máximo partido do seu valor como instrumentos de aprendizagem. Testar frequentemente, antes e depois de se apresentar a matéria, usar testes cumulativos com diversos tipos de perguntas — sem grande peso na nota final e, por isso, essencialmente formativos e não avaliativos — são algumas das estratégias para criar e aplicar testes que ajudam a aprender melhor.


Que os alunos não gostam de fazer testes não é novidade, e muitas vezes os professores também não gostam de os criar e corrigir. No entanto, os testes, se os entendermos como oportunidades de praticar a recuperação da informação a aprender, têm funções que vão muito além da avaliação. Vários estudos têm mostrado como potenciam a aprendizagem e melhoram o desempenho escolar em diversos domínios e níveis escolares. Como podem então os professores maximizar o valor dos testes como instrumentos de aprendizagem?

Num artigo recente, Dillon H. Murphy, Jeri L. Little e Elizabeth L. Bjork, investigadores da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e da Universidade do Estado da Califórnia, examinaram as características que tornam os testes as melhores ferramentas possíveis de aprendizagem. Podemos usar este artigo, publicado na Educational Psychology Review, como guia para professores, para planearem testes mais eficientes.

Testar com que frequência?

Deve-se incorporar os testes frequentemente durante as aulas, e não os utilizar como instrumentos mais raros de avaliação. Por exemplo, além de dois exames durante um trimestre, incluir um questionário no final de cada aula. Aumentar a frequência dos testes em aula ajuda a aprender melhor e diminui a ansiedade que muitos alunos sentem durante o teste. Estes testes múltiplos devem contribuir apenas uma pequena percentagem para a nota final, para que os alunos os vejam como instrumentos de aprendizagem, se sintam mais motivados a estudar e fiquem menos ansiosos quando os fizerem.

Que formato de teste utilizar?

Independentemente do tipo de teste, o professor deve garantir que cada questão exige a recuperação ativa de informação — por exemplo, são preferíveis testes sem consulta a testes com consulta. As questões de escolha múltipla podem ser uma boa alternativa, sobretudo em turmas grandes. Nesse caso, as alternativas incorretas devem ser suficientemente críveis e competitivas (i. e., baseadas em informação plausivelmente certa) para que o aluno tenha de recuperar ativamente a alternativa correta e não se limite a eliminar as restantes.

Por exemplo, se se perguntar a um aluno qual foi o primeiro imperador romano (Octaviano) não se deve dar como alternativas nomes imediatamente rejeitáveis, tais como George Washington e Dom Afonso Henriques, mas sim nomes como Nero ou Constantino. Alternativas como estas duas últimas forçam os alunos a reverem o que sabem sobre estes dois outros imperadores (ver exemplo 1).

Exemplo 1: Quem foi o primeiro imperador romano?


Ao apresentar o nome de outros imperadores romanos, a Opção A é preferível à Opção B, na medida em que exige a recuperação de conhecimentos e não conduz à resposta correta por mera exclusão de partes.

As questões que levam os alunos a utilizar processos de geração de conhecimentos para obterem respostas também aumentam o valor dos testes — por exemplo, questões de resposta curta ou completar espaços. Misturar formatos parece ser uma boa alternativa, mas, se não for possível, questões de múltipla escolha bem construídas parecem ser o melhor formato porque, apesar de demorarem tempo a ser construídas, são facilmente corrigidas e pode logo dar-se feedback, mesmo em turmas com muitos alunos.

E, por falar em turmas numerosas, uma possibilidade é também fazer testes colaborativos ou em grupo. A investigação não é clara quanto à eficácia dos testes colaborativos, mas os alunos parecem gostar deles e sentir-se menos ansiosos. Por isso, uma estratégia poderá ser aplicar um teste individual e reaplicar o mesmo teste coletivamente.

Quando testar?

Os testes ajudam a aprender melhor não só quando aplicados de maneira clássica — depois de se apresentar o material a aprender —, mas também antes de se apresentar esse material, na forma de pré-testes. Esse benefício ocorre mesmo que os alunos não consigam responder corretamente. No caso dos pré-testes, as questões de escolha múltipla parecem mesmo ser as mais eficazes.

Além de usar com frequência pré-testes e testes, é importante também espaçá-los e intervalar items semelhantes que aparecem em cada teste. Importa também referir que os testes devem ser cumulativos: a matéria não é testada apenas uma vez, logo depois de apresentada, mas várias, sendo incluída nos testes seguintes. Embora os alunos não costumem apreciar testes cumulativos, estes beneficiam a aprendizagem por facilitar a prática de recuperação e a técnica de espaçamento.

O que falta saber?

A investigação não é clara quanto à maneira ideal de corrigir os testes. Sabe-se que os testes formativos não devem contribuir uma grande percentagem da nota final, mas não qual a percentagem ideal (até pode ser 0%). Outro fator que pode interagir com as características dos testes aqui referidas e alterar a sua eficácia são certas diferenças individuais, incluindo o conhecimento prévio de um aluno, o seu estatuto socioeconómico, a sua cultura e até a forma como foi ensinado no passado. Nada parece sugerir que a repetição de testes tenha um efeito negativo na aprendizagem, mas é necessária mais investigação de maneira a avaliar, por exemplo, se o conhecimento prévio de um aluno pode alterar os benefícios dos pré-testes.



Ludmila Nunes

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