terça-feira, 27 de outubro de 2020

Com a pandemia e tantas adaptações imprevistas no trabalho das escolas, a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC) quis identificar necessidades e constrangimentos, para adequar políticas e ações, com um retrato dinâmico que observasse o que estava a acontecer em diferentes momentos e, dessa forma, identificar tendências ao longo do período de suspensão das atividades presenciais. Nesse sentido, avançou com o inquérito “Estamos On com as Escolas: conhecer para apoiar”. Em três fases, no final de março, no final de abril, e nas últimas semanas do final do ano letivo passado, as escolas foram convidadas a responder a várias perguntas, com o objetivo de traçar um retrato fiável e representativo da realidade escolar durante um período tão complexo e crítico.

Os dados devem ser lidos à luz das circunstâncias, ou seja, de um momento delicado de emergência sanitária e que levou ao encerramento de todas as escolas, ao avanço do ensino à distância, e a constantes readaptações. Seja como for, segundo a DGEEC, “o sistema educativo não entrou em rutura e conseguiu adaptar os seus procedimentos, de forma a continuar a dar uma resposta aos seus alunos, dentro de um quadro global de confinamento e de necessária suspensão das atividades presenciais, como salvaguarda da saúde pública”. Apesar do contexto, sustenta, “é inegável o caminho positivo percorrido num tão curto espaço de tempo”.

De que forma as escolas se foram adaptando à realidade e adequando estratégias perante uma realidade tão inesperada e imprevisível? Em 685 escolas da rede pública, 133 referiram que necessitaram de apoio na elaboração do plano de ensino à distância, 25% ao nível da avaliação das aprendizagens, 15% na diversificação do trabalho com os alunos e outros 15% nas intervenções específicas no âmbito da educação inclusiva. Verificou-se um progresso significativo e positivo das práticas escolares na organização das atividades letivas à distância com cronogramas semanais e definição de horários.

A articulação entre equipas educativas e professores nas dinâmicas de trabalho com os alunos também evoluiu positivamente. A partir do início de maio, o ensino à distância aconteceu em todas as turmas em cerca de 90% das escolas. A prática do ensino à distância não abrangeu sempre todas as disciplinas, contudo, o alargamento à totalidade das disciplinas é notório, se comparados os dados das três fases. “Na 1.ª fase, apenas uma minoria de escolas conseguiu assegurar que este trabalho envolvesse todas as turmas e todas as áreas disciplinares, revelando maiores dificuldades no 2.º e 3.º Ciclos do Ensino Básico, etapas em que a matriz curricular prevê um maior número de disciplinas a frequentar por todos os alunos.”

No final de abril, a diferença entre níveis de ensino esbateu-se. As práticas de ensino à distância envolveram todas as turmas e todas as disciplinas em mais de 80% das escolas, percentagem que subiu para quase 90% em junho. As restantes escolas, segundo o estudo, “conseguiram cobrir todas as áreas curriculares em mais de 50% das turmas, ou seja, os hiatos de oferta curricular foram pontuais”.

A maioria dos alunos acompanhou as atividades de forma regular, logo a partir do final do 2.º período, com uma taxa bastante superior no Ensino Secundário. A maior autonomia e a maior disponibilidade de meios digitais podem explicar este cenário.

As ferramentas usadas pelos professores
Quanto aos recursos educativos utilizados pelos professores, no ensino à distância, constata-se uma panóplia de estratégias e não houve diferenças significativas nos vários níveis de ensino. O uso de manuais escolares, em formato físico e virtual, foi bastante generalizado logo a partir do final de março. O mesmo aconteceu quanto às propostas das editoras online, recursos partilhados na internet e recursos construídos individualmente - embora nestes casos se observe algum incremento ao longo do 3.º período.

Relativamente à promoção de sessões de formação à distância e disponibilização de recursos para a autoaprendizagem dos professores, verificou-se que “o esforço das escolas na resposta às necessidades dos docentes de todas as turmas foi bastante significativo, logo no final de março (1.ª fase), com valores entre os 44% e os 48%, dependendo do nível de ensino, sendo que menos de 1/4 das escolas não disponibilizaram qualquer tipo de formação ou recursos aos seus docentes”. Este apoio cresceu durante o mês de abril.

“É muito interessante observar o crescimento do número de escolas que documentou a mobilização pedagógica de recursos construídos coletivamente, assim como o recurso aos conteúdos televisivos no âmbito da iniciativa #EstudoEmCasa ou ainda outros tipos de recursos”, salienta o estudo. As estratégias de comunicação com os alunos foram também diversificadas sem grandes oscilações nos diferentes níveis de ensino. “Foi generalizado, logo desde a 1.ª fase, o recurso ao correio eletrónico, tendo sido também muito recorrente o uso de serviços de mensagem por internet (WhatsApp) e por telefone (SMS), enquanto canais de comunicação mais adequados para atividades assíncronas”.

A utilização de plataformas de aprendizagem ou sistemas de videoconferência que permitem atividades letivas síncronas tiveram, na 1.ª fase, maior expressão no 3.º Ciclo e no Ensino Secundário. Os dados indicam uma tendência para um maior recurso a atividades síncronas por parte dos professores, o que sugere a aquisição de competências durante o último período do ano escolar. Por outro lado, a maioria das escolas programou trabalho específico com os alunos sem acesso a computadores e internet, além dos conteúdos televisivos disponibilizados pelo #EstudoEmCasa.

Na avaliação, escolas e docentes garantiram alguma diversificação e foi muito residual o número de estabelecimentos de ensino que, na 1.ª fase, não avaliaram os alunos. Na 2.ª e 3.ª fases, todas as escolas mobilizaram instrumentos para avaliar em contexto de ensino à distância. Verificou-se um aumento, entre os três momentos de inquirição, do recurso a outros instrumentos de avaliação, nomeadamente as aulas e os testes online que, aliás, têm uma utilização significativa no 3.º Ciclo e no Secundário, o que reflete um incremento progressivo das competências dos docentes e uma diversificação de estratégias, no contexto do ensino à distância. Além disso, houve uma preocupação sistemática de providenciar aos alunos feedback sobre o trabalho desenvolvido, nos vários níveis de ensino. “A abrangência dessa prática de retroalimentação aumentou ao longo do período em análise, tendo alcançado, em junho, todas as turmas em cerca de 85% das escolas”.

A preocupação de fornecer informação aos encarregados de educação, sobre o trabalho desenvolvido pelos seus educandos, também foi evidente, sobretudo no 1.º Ciclo. Da 1.ª para a 2.ª fase de inquirição e, posteriormente, na 3.ª fase, a percentagem de escolas que deu esse retorno em todas as turmas aumentou significativamente.

Respostas transversais, contactos regulares
A iniciativa #EstudoEmCasa, como recurso complementar de apoio à aprendizagem, foi especialmente orientada para alunos do Ensino Básico com dificuldades no acesso a conteúdos por meios digitais. Foram identificados alunos nesta situação em mais de um terço das escolas, ou seja, em 38% das escolas com 1.º Ciclo e 2.º Ciclos e em 36% das escolas com 3.º. Um aspeto que sobressaiu no estudo é que entre abril e junho, a percentagem de escolas que reportou alunos que exclusivamente acederam a conteúdos pedagógicos através deste formato decaiu de forma muito significativa, o que, sustenta a pesquisa, “aponta para um impacto muito considerável das estratégias de disponibilização de equipamentos tecnológicos e acesso à internet aos alunos sem esses recursos, bem como de outras soluções alternativas que foram, entretanto, encontradas”.

“Apesar de abranger uma proporção considerável de escolas, é reduzido o número de alunos que, já em abril, foi identificado pelas escolas na situação de apenas ter acesso aos conteúdos educativos através do #EstudoEmCasa (cerca de 10 000 alunos). É também importante assinalar o decréscimo significativo do número de alunos nestas circunstâncias (para menos de 6 000), nos três ciclos, entre o segundo (abril) e o terceiro (junho) momentos de inquirição, revelador de uma progressiva construção de soluções educativas mais diversificadas e robustas para estes alunos”, lê-se no estudo.

A 18 de maio, as atividades letivas presenciais foram retomadas no Ensino Secundário, nas disciplinas sujeitas a exame. A maioria das escolas optou por distribuir as atividades das turmas por dia, ou períodos do dia, distintos de forma a reduzir a concentração de alunos e minimizar riscos de contágio. A maioria optou também pelo desdobramento das turmas para reduzir o número de alunos em cada sala de aula, em simultâneo, embora cerca de 40% das escolas não tenham seguido esta opção, enquanto 10% das escolas adotaram-na apenas num número minoritário de turmas. Cerca de 2/3 das escolas atribuíram uma única sala a cada turma e o recurso a outros espaços, que não as salas de aula, foi uma solução frequente.

A resposta pedagógica às crianças da educação pré-escolar conheceu um crescimento muito significativo. A partir do início de maio, 80% das escolas facultaram, por meio digital, atividades a todos os grupos de crianças deste nível de ensino, quando na 1.ª fase eram apenas 54%. Os dados mostram uma crescente preocupação das escolas em responder a todas as crianças e alunos, no âmbito dos planos para o ensino à distância que envolveram respostas transversais às respetivas comunidades educativas. A periodicidade de contacto com os encarregados de educação foi semanal, em cerca de 1/3 das escolas foi diário.

O estudo procurou também compreender de que forma os princípios, apoios e recursos específicos da educação inclusiva foram assegurados, num contexto de substituição temporária das atividades letivas e não letivas presenciais por uma oferta de ensino à distância. Procurou-se, mais concretamente, conhecer, nas sucessivas fases de inquirição, a situação dos 11 919 alunos que, nos diversos estabelecimentos da rede pública, foram acompanhados regularmente em unidades especializadas de Centros de Apoio à Aprendizagem. As respostas demonstram que esses centros garantiram apoio aos alunos na modalidade não presencial, na maioria das escolas inquiridas.

Segundo a DGEEC, estes dados demonstram, portanto, “que à medida que o tempo foi avançando, um número cada vez maior de escolas reconheceu essa necessidade e desenvolveu a capacidade de garantir um apoio à distância aos seus alunos, de acordo com metodologias adaptadas para cumprir os objetivos da educação inclusiva”. O impacto da interrupção de apoios e terapias na aprendizagem desses alunos foi uma preocupação constante.

Fonte: Educare

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