quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

O que falta no ensino da escrita?

Nos Estados Unidos, a popularidade do ensino de estratégias gerais de compreensão de texto tem vindo a aumentar. Mas essa tendência tem sido criticada por muitos especialistas. Ainda assim, muitos estudantes precisam de ajuda para se tornarem leitores competentes e conseguirem aprender bem.

Ensinar estratégias de escrita tem as mesmas vantagens de ensinar técnicas de compreensão de leitura, e não só. Exercícios de escrita que trabalhem as frases e não apenas a ortografia ou outras componentes podem deixar os alunos mais à vontade com a sintaxe complexa da linguagem escrita, que sabemos ser um entrave relevante à compreensão da leitura. Além disso, os exercícios de escrita podem ajudar a fixar vocabulário e conceitos específicos na memória de longo prazo, o que facilita a compreensão e a aprendizagem em geral.

Estas são possíveis vantagens do ensino da escrita, mas temos amplas provas de que a maioria dos alunos não beneficia delas. Também sabemos que a maioria dos alunos tão-pouco aprende a escrever com propriedade.

O que falta no ensino da escrita?

A abordagem típica ao ensino da escrita comete dois erros fundamentais. Em primeiro lugar, subestima-se a dificuldade que a maioria dos alunos sente em aprender a escrever. Espera-se que as crianças adquiram a habilidade da escrita através de exercícios sucessivos de leitura e escrita, mas é evidente que muitas não o conseguem fazer.

Por outro lado, cometemos com a escrita o mesmo deslize que cometemos com a compreensão da leitura: acreditamos que a escrita pode e deve ser ensinada de forma abstrata, isolada de qualquer conteúdo específico. As escolas facultam muitas vezes um «momento de escrita» separado de tudo o resto, em que os alunos têm de escrever sobre vivências e opiniões suas, ou assuntos que pertencem apenas ao programa do ensino da escrita.

Acreditamos que podemos treinar os alunos na escrita de «artigos de opinião» ou de «textos argumentativos» sobre assuntos mais imediatos e prosaicos, tais como a possibilidade de receberem uma semanada maior, e que, no futuro, eles serão capazes de transferir essa habilidade para a criação de uma tese sobre as consequências da Segunda Guerra Mundial. É certo que as habilidades de escrita são transferíveis apenas até certo ponto, pois um aluno pode bem ser capaz de escrever um bom texto a defender um aumento da mesada e bloquear por completo no momento de discorrer sobre a Segunda Guerra.

Um programa do ensino da escrita pode falhar por dar aos alunos informação insuficiente. Conheci um professor que descreveu do seguinte modo esta abordagem: «Aqui tens três parágrafos sobre insetos. Agora é a tua vez de escrever um texto sobre o teu inseto preferido.» Mas é possível que três parágrafos não bastem para ajudar um aluno a escrever sobre um assunto. E mesmo que o plano curricular de escrita inclua informação adequada, as habilidades de escrita podem, como sabemos, não conseguir migrar para outros tópicos.

Além do mais, pedir aos alunos que escrevam com base na sua experiência ou sobre assuntos num programa de escrita separado ignora a descoberta de que, ao escrever sobre o que estão a aprender, os alunos compreendem e retêm melhor a informação — seja em que disciplina for. Se assim é, porque não usar a escrita para ajudarmos os alunos a compreender e a reter os conceitos que consideramos importantes? Dito por outras palavras, porque não se utiliza o conteúdo dos programas de Estudo do Meio e de Ciências a par dos temas que surgem nos textos de estudo da língua?

Incluir a escrita na instrução e na dinâmica da sala de aula

Mesmo quando a escrita está ligada ao conteúdo programático, esta surge muitas vezes isolada dos momentos de instrução e de debate. Numa turma do ensino básico que visitei, depois de terem terminado a momento expositivo e de diálogo acerca de um tema de Estudo do Meio, a professora pediu aos alunos que fossem buscar as redações que tinham começado no dia anterior — textos sobre uma vertente separada do mesmo assunto — e que prosseguissem com essa tarefa. Esta separação entre o assunto sobre o qual se fala e o tema acerca do qual se escreve é, por vezes, inevitável. No entanto, conseguir integrar as duas tarefas é uma oportunidade de ouro: a escrita pode e deve ser usada para acelerar e fortalecer a aprendizagem.

O ensino da escrita não nos permite apenas ensinar a escrever. Ensinar a escrever é, em si, uma forma de ensinar. É por isso que os professores devem fazê-lo regularmente em sala.

Doug Lemov, um especialista em educação, mostrou que, se os alunos anotarem as suas ideias antes de participarem num debate, não precisam de estar concentrados em recordar-se de tudo o que querem dizer. Isto dá-lhes mais capacidade mental para ouvir e responder aos argumentos dos colegas, o que aumenta a qualidade do debate.

Eu acrescentaria que conversar sobre determinado tópico com os alunos antes de lhes pedir que discorram sobre ele pode dar-lhes mais ideias sobre o que escrever, e como o fazer. Se aliviarmos a pesada carga cognitiva que a escrita impõe aos escritores com menos experiência, é provável que as ideias novas lhes surjam mais facilmente. Depois de os alunos terem escrito o seu texto, os professores podem voltar a moderar um debate entre todos com base no que escreveram.

Pude observar uma turma do terceiro ano pôr isto em prática com o livro A Teia de Carlota, cuja leitura fazia parte do programa. A professora começou por escrever no quadro a pergunta a debater: «O que distingue o Abílio dos outros animais na quinta? O que o torna diferente?» Cheguei quando toda a turma estava a tentar responder a esta questão. Os alunos concluíram que o Abílio era o único porco, o único anão e o único animal que tinha sido tratado como um bebé humano.

A professora apresentou de seguida um exercício de escrita que utilizava três conjunções que a turma tinha vindo a trabalhar há vários meses: porque, mas e portanto. Pediu aos alunos que trabalhassem individualmente para usar essas conjunções de forma a terminar a oração «O Abílio é diferente dos outros animais…» e, depois de circular pela sala e observar as diferentes respostas autónomas, conversaram todos sobre as várias possibilidades de resposta à pergunta que estava no quadro e o uso de cada conjunção nos diferentes casos. A conjunção porque apresentava uma razão? A frase mudava de rumo graças à conjunção mas? E será que o portanto criava uma relação de causa-efeito?

Tal como no ensino da compreensão da leitura, este exercício pedia aos alunos que estabelecessem ligações entre diferentes partes da história enquanto procurava garantir que compreendiam o seu conteúdo e ainda aprendiam a usar conjunções. Este método é bem mais eficaz do que tentar ensinar a «determinar a causa e o efeito» de forma abstrata, lendo em voz alta um texto sobre um assunto e pedindo depois às crianças que pratiquem esta habilidade de forma isolada e em textos aleatórios sobre assuntos diferentes.

Uma vantagem de praticar assim o ensino da escrita é conseguir chegar a todos os alunos da turma — e não apenas aos que levantam a mão para responder. Isto pode revelar dificuldades que um professor poderia não ver de outra forma, ou não conseguir identificar atempadamente. A professora que observei reparou que muitas crianças estavam a ter dificuldade em usar o mas. Uma menina completou deste modo a sua frase: «O Abílio é diferente dos outros animais da quinta, mas é um animal diferente.»

Isto serviu de mote para lembrar os alunos de que, a seguir a um mas, temos sempre de apresentar informação contrastante. Sabemos que aprender a utilizar corretamente o mas permite aprender a usar uma construção subordinativa como apesar de, expressão que pode no futuro vir a fazer parte de um texto argumentativo. Quando os alunos aprendem a fazer este tipo de raciocínio em conteúdo que eles próprios criam, estão muito mais bem equipados para compreender construções deste género em textos que encontrem no futuro.
O ensino da escrita pode transformar a educação

Quem conhece o método The Writing Revolution reconhecerá este exercício do porque/mas/portanto como uma das atividades que o integra. Há outros exercícios que ensinam habilidades ou estratégias de compreensão. Por exemplo, ensinar os alunos a escrever uma frase de resumo é uma forma muito eficaz de os ajudar a encontrar a ideia principal de um texto. Para isso, não basta dizer aos alunos que identifiquem a informação mais importante. Muitos não o conseguirão fazer, principalmente se for um texto difícil. O método The Writing Revolution ensina os alunos a responder a uma série de perguntas-chave sobre um texto e a conjugar depois as respostas numa frase bem estruturada. As perguntas seguem o modelo quem (fez/fará) o quê, quando e onde?

Para reforçar efetivamente a aprendizagem, o ensino da escrita precisa de ser explícito e gerido de forma cuidadosa para não sobrecarregar os alunos. Às vezes basta pedir aos alunos que escrevam toda a informação que retiveram acerca de um texto que acabaram de ler. Este exercício de memória livre, a chamada abordagem free recall, mostrou ajudar alunos universitários a lembrar-se de 81% dos conceitos uma semana mais tarde. Mas quando se fez uma experiência igual com alunos do quarto ano, os resultados foram bastante diferentes: os alunos mais novos só se conseguiram recordar de cerca de 10% dos conceitos que tinham lido anteriormente.

Como se explica esta diferença? É provável que os alunos do quarto ano, ou outros escritores menos hábeis, fiquem tão concentrados no ato de escrever em si, que perdem a capacidade de se focar na informação sobre a qual estão a escrever. Quando os investigadores lhes deram mais apoio, ou aliviaram as tarefas de escrita, a capacidade de memorização dos alunos do quarto ano melhorou muito.

Exercícios de escrita bem pensados — a par de instrução explícita, atividades repetidas e feedback atempado — conseguem reduzir a carga cognitiva da escrita, para que os alunos possam beneficiar das vantagens de aprenderem a escrever. Pelo que tenho observado, podemos dizer que incluir estas atividades de escrita no ensino básico pode ajudar a transformar a educação.

Esta publicação é uma tradução e adaptação do artigo «To Boost Learning, Weave Writing Activities Into Regular Instruction», disponível aqui.


Natalie Wexler

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