segunda-feira, 9 de janeiro de 2023

Index para a Inclusão - 20 anos depois: O que andamos a fazer?

Por solicitação de colegas, partilho a minha intervenção no Seminário 'Índex para a Inclusão - 20 anos depois: O que andamos a fazer?, realizado no dia 6 de janeiro, no Instituto da Educação da Universidade de Lisboa, numa organização conjunta deste instituto e da Pró-Inclusão.

Permitam algumas considerações sobre o impacto do Índex para a Inclusão.

1. Política educativa:

O atual Regime Jurídico da Educação Inclusiva, decorrente da publicação do Decreto-Lei n.º 54/2028, de 6 de julho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 116/2019, de 13 de setembro, está em perfeita harmonia com a visão refletida no Índex, passados 20 anos que medeiam a publicação dos documentos.

Dou o seguinte exemplo: no Índex, a inclusão diz respeito à educação de todas as crianças e jovens, assente numa filosofia de redução das barreiras à aprendizagem e à participação de todos os alunos, não somente aos que têm deficiências ou que são categorizados como tendo “necessidades educativas especiais”. Trata-se de um dos pilares do atual Regime Jurídico da Educação Inclusiva.

Entretanto, em 2008, foi publicado o Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro, que definia os apoios especializados a prestar na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, visando a criação de condições para a adequação do processo educativo às necessidades educativas especiais dos alunos com limitações significativas ao nível da atividade e da participação. Este normativo não incorpora os conceitos-chave do Índex.

No entanto, quer no preâmbulo dos dois normativos (Decreto-Lei n.º 54/2028, de 6 de julho, e Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro), não é feita qualquer referência ao Índex para a Inclusão.

Esta ausência de referência é também evidente nos documentos de apoio à implementação destes normativos. No documento “Educação Especial: Manual de Apoio à Prática” (Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de janeiro) não é feita qualquer referência. O recente documento “Para uma Educação Inclusiva: Manual de Apoio à Prática” (Decreto-Lei n.º 54/2018) introduz um questionário dirigido a professores e outros profissionais da escola, alunos e pais (anexo 1). No entanto, trata-se de um questionário relativamente curto e adaptado.

Apesar da visão sobre educação inclusiva subjacente ao Índex para a Inclusão, a definição de uma política nacional de educação inclusiva não teve, aparentemente, por ausência de referências, em consideração o contributo deste documento.

2. Academia (formação especializada):

Enquanto aluno do Curso de Especialização em Educação Especial, com especialidade em Domínio Cognitivo e Motor, em 2005/2006, durante a formação nunca foi efetuada qualquer referência ao Índex para a Inclusão.

Esta posição é reforçada pelas respostas informais dadas pelos colegas docentes de Educação Especial de agrupamentos de escolas da região. Questionados se conheciam o Índex para a Inclusão, a resposta quase unânime foi negativa ou, num caso, achava que já tinha ouvido falar.

No meu caso, a descoberta do Índex para a Inclusão ocorreu mais tarde, na década seguinte, durante a investigação no âmbito do doutoramento (Formação de professores para a educação especial: Motivações, expectativas e impacto profissional) quando pesquisava indicadores para a inclusão.

3. Na escola:

Pelo que acabei de referir, as escolas parecem desconhecer a existência do Índex para a Inclusão. Alguns diretores dos agrupamentos de escolas da zona, questionados informalmente, responderam que não conhecem ou nunca ouviram falar no Índex.

Em conclusão, sendo um documento aparentemente desconsiderado pelo Ministério da Educação e desconhecido, eventualmente, pela generalidade dos docentes de Educação especial, o seu impacto nas escolas é mínimo ou nulo.

(Des)Referenciação Institucional

O processo de (auto)avaliação, de intervenção e de monitorização preconizado pelo Índex para a Inclusão pode contribuir significativa e intencionalmente para a criação ou para o desenvolvimento de uma escola e de uma educação inclusivas.

No entanto, o Índex para a Inclusão parece, aparentemente, estar isolado e desarticulado com outras estratégias educativas.

O Ministério da Educação assumiu o compromisso de desenhar um sistema de monitorização para a avaliação da eficácia do Regime Jurídico da Educação Inclusiva (Decreto-Lei nº 54/2018, de 6 de julho). Para tal, requereu, em outubro de 2019, o apoio do Programa de Apoio às Reformas Estruturais (atualmente, a DG REFORM) da Comissão Europeia, sendo o trabalho conduzido pela Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva. Da análise do relatório final apresentado recentemente, DESENHO DE UM SISTEMA DE MONITORIZAÇÃO DA IMPLEMENTAÇÃO DO REGIME JURÍDICO DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA EM PORTUGAL (organizado em standers, indicadores e perguntas [inquéritos]), constata-se que não existe qualquer referência ao Índex para a Inclusão nem aos seus autores.

Ou seja, as escolas que queiram eventualmente pegar no Índex para a Inclusão e aplicá-lo ao seu contexto, fá-lo-ão por sua iniciativa, no âmbito da sua autonomia, mas de modo aparentemente desarticulado com os referentes da política educacional.

Reforça-se que “o Índex foi criado tendo em vista, também, a elaboração de documentos de política educativa de nível nacional e local”. (p. 17)

Potencialidades:

O Índex é um recurso de apoio ao desenvolvimento das escolas e oferece a todas as escolas um instrumento de autoavaliação e de desenvolvimento de verdadeiras escolas inclusivas e de práticas de educação inclusiva, contribuindo, necessariamente, para a melhoria das escolas.

De facto, o Índex é flexível na capacidade de adaptação à realidade contextualizada de cada escola e vem acompanhado de um manual de instruções contemplando três dimensões (criar culturas inclusivas, produzir políticas inclusivas e desenvolver práticas inclusivas), estando cada uma dividida em duas secções, complementados por indicadores e perguntas.

Por outro lado, consagra a participação e o envolvimento de todos os atores da comunidade educativa, quer na equipa educativa, quer no processo de implementação do Índex: docentes; alunos; pais e encarregados de educação; órgãos de gestão; outros. 

Há a destacar os conceitos-chave que se refletem integral e coerentemente no atual regime jurídico da educação inclusiva, designadamente os conceitos de “inclusão”, “barreiras à aprendizagem e à participação” e “apoio à diversidade”.

Em jeito de conclusão...

O Índex para a Inclusão tem 20 anos, atingiu a maioridade, mas, no contexto educativo português, talvez ainda esteja na fase infantil ou de berçário.

De facto, apesar desta idade, o Índex para a Inclusão ainda não é suficientemente conhecido nas escolas para que, efetivamente, possa cumprir os seus propósitos.

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