sábado, 8 de maio de 2021

Como lidar com o insucesso e o fracasso? Aceitando que “o erro faz parte da vida”

Numa entrevista de emprego, pediram-lhe que fizesse um pitch — uma curta apresentação oral — e Sofia bloqueou. É um dos seus maiores fracassos profissionais, mas também uma das maiores aprendizagens da sua vida. Como lidar com o fracasso e o insucesso? Não há uma resposta certa. A humorista Mariana Cabral — mais conhecida por Bumba na Fofinha — criou o podcast Reset, onde figuras públicas partilham o que lhes correu menos bem. (...), as especialistas asseguram que “o fracasso é o nosso maior mentor”.

Enquanto coach de carreira, a psicóloga clínica Sofia Andrade conta sempre a história do “fracasso mais bem-sucedido” da sua vida. No início da vida profissional foi a Lisboa a uma entrevista de emprego, onde lhe pediram que fizesse uma curta apresentação oral. “Não tive a capacidade de improvisar na hora e bloqueei”, recorda, entre risos, a psicóloga. Escusado será dizer que não conseguiu o emprego, mas entrou num “processo de autodescoberta”.

Perante um fracasso, o primeiro passo é “naturalizar os sentimentos” e “perceber que há um tempo e um espaço para tudo”, aconselha Sofia Andrade, especializada em coaching de carreira. A desilusão, a tristeza e a frustração devem ser emoções naturalizadas no primeiro impacto com o que de menos bom sucedeu. Mas depois, sublinha a psicóloga, é “preciso fazer um desapego emocional” do que aconteceu.

A forma como cada um lida com o insucesso — ou com qualquer outra experiência —, e o valor que lhe atribui, depende não só da inteligência emocional, como do contexto e momento de vida em que se encontra, propõe, por sua vez, a psicóloga clínica, Teresa Espassandim. Para analisar a resposta individual ao insucesso, a especialista evoca a psicóloga americana Carol Dweck, autora de Mindset: A Atitude Mental Para o Sucesso. Alguém com uma “mentalidade rígida” olhará para as suas capacidades como algo estático e, por isso, tem maior dificuldade em “superar obstáculos”, “ultrapassar momentos de autocrítica”, porque não acredita que pode mudar. “Essa mentalidade quando domina faz com que não seja possível retirar uma aprendizagem do erro”, observa Teresa Espassandim.

Por oposição, o growing mindset (atitude mental para o sucesso) acredita que “as nossas capacidades podem alterar-se por via dos esforços que fazemos” e da “nossa regulação emocional”, explica a psicóloga. “O tipo de mentalidade, em relação às capacidades de cada um, é muito importante para a forma como lidamos com as falhas”, completa.

Mas de quem é a culpa?

Perante um fracasso, “muitas pessoas tendem a assumir que a culpa é dos outros”, assinala a coach de carreira, Sofia Andrade. Noutro extremo, há quem carregue uma culpa interior pelo erro. Em psicologia fala-se do lócus de controlo interno — quando a culpa recai toda sobre o próprio — e do lócus de controlo externo, quando é o mundo o culpado por tudo o que aconteceu. “Se fico muito inundada na zanga comigo mesma, isso também me inibe de ver o que posso fazer para lidar com o erro”, explica também Teresa Espassandim.

Como em tudo, o segredo está no equilíbrio. “A auto implicação é necessária”, num equilíbrio entre os dois extremos, sugere Sofia Andrade. A culpa não é só dos outros, mas também não é só do próprio. O fracasso não deve ser lido como “uma legenda para as capacidades”, interpela a psicóloga Teresa Espassandim, mas muito menos deve ser ignorado. As especialistas alertam para que não se procure o refúgio nos mecanismos de defesa, porque quando evitamos sentir “é como se ficássemos cegos da vida”.

Aprender a lidar com o fracasso é uma coisa que se ensina desde a infância, explica Teresa Espassandim. Por exemplo, quando uma criança está a aprender a andar, é normal que se desequilibre e caia com frequência. Os pais mais ansiosos tendem a proteger e amparar cada queda, mas estar constantemente a evitar o erro não é saudável. A aversão ao erro faz com que se tenha medo de arriscar. “Não aceitar o erro, limita a qualidade do trabalho e a criatividade”, lamenta a psicóloga clínica.

“O fracasso é o nosso maior mentor”

Passado o período de “naturalizar os sentimentos”, é preciso começar “a construção de uma nova narrativa”, propõe Sofia Andrade. Primeiro, a psicóloga sugere que se descontraia e se adopte a atitude — ainda que cliché — ‘é porque não tinha de ser”. Só depois começa o trabalho “da aceitação dos acontecimentos” e autodescoberta. “Se isto tinha de me acontecer, o que posso aprender com esta situação?”, questiona.

É que Sofia Andrade acredita que “o fracasso é o nosso maior mentor”. É imperativo sair do estado de inércia e entrar em acção. Cada um saberá o que funciona melhor para si — se o fracasso foi a nível profissional, talvez seja boa ideia investir em novas formações, por exemplo. No fundo, importa descobrir o que se pode fazer para evitar que situações semelhantes voltem a acontecer.

Claro que nem sempre é fácil este processo de aprendizagem e, por vezes, pode ser preciso procurar ajuda, não só a nível profissional, como nas relações interpessoais de qualidade. No fundo, o que importa é aceitarmos que o erro “faz parte da vida”, conclui Teresa Espassandim, sem passar a vida a evitá-lo. E não esquecer: “São os acontecimentos traumáticos que muitas vezes nos dão as melhores lições, desde que estejamos predispostos a ter uma atitude”, termina Sofia Andrade.

Inês Duarte de Freitas

Fonte: Público

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