O escritor e ilustrador brasileiro Roger Mello, presente no Encontro de Literatura Infantojuvenil em Pombal, Leiria, defende que a promoção de leitura não deve ser feita com a mesma receita para todos.
"Não se deve dar a mesma receita a todos, de maneira nenhuma. As crianças são indivíduos e tentar trabalhar de maneira homogeneizada gera uma série de não leitores", disse à agência Lusa o autor Roger Mello, que ganhou em 2014 o prémio Hans Christian Andersen, tido como o Nobel da literatura infantil.
O escritor, que fala hoje em Pombal, para uma plateia composta por professores, educadores de infância, animadores e bibliotecários, considera que cada criança tem gostos particulares, sendo necessário "respeitar a diferença".
Para Roger Mello, nem toda a gente tem de gostar de Machado de Assis ou de Eça de Queirós (por muito que ache isso "um absurdo"), admitindo que as animosidades para com alguns autores podem ter origem nessa leitura imposta.
Um plano de leitura rígido "cria um pavor da leitura", disse à Lusa. "É horrível, porque, se uma criança tem de ler alguns autores muitos bons, estes parecem horríveis porque são obrigados [a lê-los]", e acaba por se criar "um trauma".
De acordo com Roger Mello, "a melhor coisa" para promover a leitura é garantir "uma biblioteca acessível", "bons promotores da leitura" e professores "que gostem de ler".
O escritor, natural de Brasília, tem mais de cem obras publicadas, mostrando um "fascínio" pelo diálogo "intenso", entre imagem, texto e design, que gosta de imprimir na sua obra, bem como pelo "universo infantil".
Apesar de trabalhar na área da literatura infantil, Roger Mello recusa-se a fazer uma divisão das obras por idades, considerando que a diferenciação de públicos "é coerciva". "O público é que vai eleger o que vai ler".
Por isso, quando escreve e desenha, fá-lo "egoisticamente", considerando que essa é "a melhor maneira de fazer para o outro".
"Não sendo eu mais uma criança, teria de me esforçar para não ser preconceituoso. O mal de muitas pessoas que trabalham nesta área é que tentam fazer para o outro, sendo que elas não são o outro", explica o autor formado em design industrial.
Um erro "muito comum" de autores que escrevem para o público infantil, passa por "usar todos os diminutivos e tornar [o livro] mais acessível e mais fácil". "Mas tornar mais acessível é tornar inacessível. É fazer para ninguém".
"Encantado" pela loucura das crianças, Roger Mello, apela para que o mundo seja mais infantil e mais louco, lamentando que a sociedade faça com que a criança "vá crescendo e vá-se afastando da loucura" e perdendo o seu lado experimental.
Numa sociedade "pragmática e meritocrática ao extremo", o autor encontra na criação e na arte, cuja "maior função é não ter função", uma forma de mostrar que o mundo "não precisa de ser pragmático" ou feito de "coisas como o mercado".
"A maturidade não nos tornou melhores. A maturidade não fez nem um pouco de bem às pessoas. Não nos tornou mais adultos. Temos todos de ser mais infantis", conclui.
Fonte: RTP por indicação de Livresco
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