sábado, 30 de setembro de 2023

Aumentou o número de adolescentes com sintomas depressivos em Portugal

O número de adolescentes em Portugal com sintomas depressivos aumentou para 45% no último ano letivo (2022-2023), revelam os resultados do programa de promoção da saúde mental e prevenção de comportamentos suicidários em meio escolar "Mais Contigo".

Quase metade (45,4%) de uma amostra de 13 mil adolescentes no país apresentou sintomatologia depressiva, representando um aumento face aos números de anos anteriores, referiu esta quinta-feira a Escola Superior de Enfermagem de Coimbra (ESEnfC), responsável pelo programa, em comunicado.

No ano letivo anterior, em que o "Mais Contigo" se estendeu a mais escolas do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, abrangendo o maior número de adolescentes desde o início do programa (em 2021-2022, a amostra foi de 5440 jovens), subiram também os adolescentes com indícios e manifestações de depressão moderados (14,8%) ou graves (15,3%).

"Uma vez mais, foram as raparigas a manifestar piores indicadores de saúde mental - maior sintomatologia depressiva, menor autoconceito e menor bem-estar", conclui o estudo feito pela equipa coordenadora do projeto, criado em 2009 pela ESEnfC e pela Administração Regional de Saúde do Centro (ARSC), com a cooperação do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC).

Segundo o comunicado, os resultados têm por base uma amostra de alunos com uma média etária de 13,4 anos (faixa compreendida entre os 11 e os 21 anos de idade) a frequentarem 153 agrupamentos de escolas, mais 197 escolas ou colégios, de norte a sul de Portugal (incluindo Açores e Madeira).

O coordenador nacional do "Mais Contigo" e professor de saúde mental e psiquiatria na ESEnfC, José Carlos Santos, salientou que o programa cumpriu a sua missão, embora haja ainda desafios pela frente. Citado no comunicado, o docente frisou que foram reforçadas as "dimensões protetoras para o comportamento suicidário, autoconceito e bem-estar, e reduzidas as de maior risco, o estigma e a sintomatologia depressiva, que passou de 30,1% [no início da intervenção] para 26%, mesmo assim um valor alto".

De acordo com o responsável, os resultados obtidos "apelam para a necessidade de acompanhamento e intervenção sistemática dos adolescentes em contextos comunitários, onde a escola emerge como contexto prioritário".

Segundo o docente, as razões da existência do programa "Mais Contigo" são cada ano "mais aprofundadas", já que "o impacto da pandemia, com mais procura de cuidados de saúde mental, com mais distúrbios de ansiedade, de sintomatologia depressiva e mais alterações comportamentais, reforçam a sua importância".

O coordenador nacional do programa considerou que as recentes alterações da legislação em torno da organização dos serviços de saúde mental, "com mais proximidade e recursos comunitários, são razão para ter esperança", embora "alguns desafios se mantenham".

Entre os desafios, José Carlos Santos salientou a necessidade de "conquista de um lugar para a saúde mental" na formação dos adolescentes, o diálogo entre instituições ou o anonimato dos questionários, que impede uma intervenção individualizada quando identificadas necessidades. (...)

Fonte: SIC Notícias por indicação de Livresco

Que efeito têm as salas de aula em plano aberto no desenvolvimento da leitura no ensino básico?

Uma investigação recente mostra que a configuração da sala de aula influencia o desenvolvimento da leitura no ensino básico. Este estudo explorou os efeitos potenciais do ambiente físico da sala de aula (comparando plano aberto e plano fechado) no progresso académico dos alunos; em concreto, o desenvolvimento da leitura nestas duas configurações. Os resultados obtidos sugerem um efeito negativo das salas de aula abertas nessa progressão.

Para este estudo, os seus autores — Gary Rance, Richard C. Dowell e Dani Tomlin, da Universidade de Melbourne, na Austrália — monitorizaram, ao longo de um ano, um grupo de alunos dos 7 aos 10 anos enquanto alternavam entre os períodos escolares passados em salas de aula abertas (com várias turmas presentes num mesmo espaço físico) e em salas de aula fechadas (com uma turma por espaço). Mantiveram-se durante o estudo todas as condições de aprendizagem (como a turma e os professores), ao passo que o ambiente físico foi alternando, período a período, com uma parede divisória portátil e tratada acusticamente. Cada aluno, matriculado no 3.º ou no 4.º ano de escolaridade, foi considerado pelo respetivo professor como tendo um desenvolvimento típico para a idade. Estes alunos também eram audiometricamente normais e não tinham dificuldades cognitivas. Submeteram-se 196 alunos a uma avaliação inicial com determinadas componentes académicas, cognitivas e auditivas, dos quais 146 completaram o protocolo longitudinal — desenvolvido ao longo de três períodos escolares —, o que lhes permitiu serem sujeitos a uma avaliação repetida, para comparar o desenvolvimento dos alunos nas fases de estudo de plano aberto e de plano fechado. Destes 146, metade estava em turmas de plano aberto/fechado/aberto, a outra metade em turmas de plano fechado/aberto/fechado.

Os resultados mostram que a configuração da sala de aula teve um efeito significativo na taxa de desenvolvimento da fluência de leitura. Dos 146 participantes, 94 (64,4%) apresentaram uma taxa mais alta de desenvolvimento nas fases de estudo em plano fechado. As pontuações de leitura em sala de aula fechada foram significativamente maiores do que em sala de aula aberta, durante todo o estudo. A pontuação média obtida no teste de fluência de leitura foi 6,8 palavras por minuto mais baixa para cada período escolar passado na condição de plano aberto.

Este estudo também sugere que o aumento do ruído, em fases de plano aberto, é uma explicação possível para os resultados obtidos. Este ruído inclui quer o ruído de fundo, quer o ruído das vozes de professores e de alunos de outras turmas, característicos da configuração de sala de aula de plano aberto, porque limitaria quão bem uma criança conseguiria ouvir o professor. Além disso, acredita-se que a distração visual do movimento nas turmas adjacentes, no ambiente de plano aberto, também afetaria a capacidade de perceção da fala pela criança.

À luz destas evidências, a sala de aula é muito mais do que um mero espaço físico. Pode ser um ambiente auditivo desafiador, sobretudo para alunos mais jovens, e com mais dificuldades em distinguir a fala de outros ruídos. Impõe-se assim uma atenção redobrada a esta importante variável para uma aprendizagem da leitura que seja o mais efetiva possível.

Referência bibliográfica

Rance, G., Dowell, R. C., & Tomlin, D. (2023). The effect of classroom environment on literacy development. Npj Science of Learning, 8(1). https://doi.org/10.1038/s41539-023-00157-y

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

Recuperação das aprendizagens: dois terços dos alunos do 2.º ano tinham dificuldades na leitura

Dois terços dos alunos (66%) que no último ano lectivo frequentavam o 2.º ano de escolaridade tiveram um desempenho na leitura muito baixo ou abaixo da média. É disso que dão conta os resultados preliminares que foram apresentados esta terça-feira em conferência do Grupo de Trabalho de acompanhamento do Plano de Recuperação das Aprendizagens (https://www.publico.pt/2023/07/19/sociedade/noticia/escolas-pedem-reforco-professores-garantir-condicoes-proximo-ano-lectivo-2057329) (Plano 21/23 Escola +), no Parlamento.

De acordo com o coordenador do Programa Lexplore +Leitura (uma ferramenta de rastreamento e avaliação de leitura que conjuga a Inteligência Artificial com a tecnologia de rastreio ocular), Alexandre Homem Cristo, no caso do 2.º ano, 19% dos alunos, que participaram no programa, ou não sabiam ler ou tinham muitas dificuldades em leitura. Outros 47% tiveram um desempenho na leitura abaixo da média. No caso das crianças com melhores desempenhos, ou seja, com resultados acima da média ou elevados, a percentagem reduz-se a 13% do total.

A ferramenta de rastreamento de leitura utilizada permite avaliar indicadores como o tempo de fixação, a amplitude sacádica, a frequência de regressão, o número de palavras por minuto e o número de caracteres por minuto.

No caso dos alunos de 4.º ano – os que à data de encerramento das escolas, em 2020, estariam a iniciar o ensino básico –, não se registou um melhor desempenho do que nos de 3.º ano, o que era comum antes da pandemia. "Serão os alunos que foram mais atingidos na capacidade de leitura", explicou Alexandre Homem Cristo. A amostra incluiu 4540 alunos dos 2.º ao 4.º anos escolares de 13 agrupamentos de escolas públicas em Mafra e Cascais.

Com o objectivo de mitigar os eventuais efeitos negativos da suspensão de aulas durante a pandemia de covid-19 em Portugal, que em Março de 2020 levou o Governo a declarar o encerramento das escolas, a tutela lançou, em 2021, o Plano de Recuperação das Aprendizagens (https://www.publico.pt/2023/07/19/sociedade/noticia/recuperacao-aprendizagens-prolongada-reforco-professores-2057447). O ministro da Educação, João Costa, prolongou-o, em Abril, até 2024. Uma das mudanças implementadas neste prolongamento, na sequência do fim do programa de fundos comunitários que financiava a operação, foi acabar com a possibilidade de as escolas alargarem os créditos horários (https://www.publico.pt/2023/07/21/sociedade/noticia/escolas-vao-perder-tres-mil-professoresrecuperacao-aprendizagens-2057679) (uma espécie de banco de horas que permite às escolas contratar recursos humanos).

Que aprendizagens foram perdidas? "Ninguém sabe ao certo"

Quanto ao trabalho dos últimos três anos, depois de uma auditoria, o Tribunal de Contas (TdC) publicou em Julho último um relatório no qual dava conta de que o plano de recuperação das aprendizagens contou com poucos recursos (https://www.publico.pt/2023/07/27/sociedade/noticia/recuperacao-aprendizagens-recursos-monitorizacao-insuficiente-2058384) e a avaliação e monitorização feitas são insuficientes. No documento, o TdC reconhece o reforço de recursos associados ao plano, mas identifica, ainda assim, um conjunto de insuficiências relacionadas com os objectivos, monitorização e financiamento.

E, de facto, sabe-se "pouco sobre os impactos do plano" de recuperação das aprendizagens, defendeu José Matias Alves, da Universidade Católica do Porto. "Que aprendizagens foram perdidas e que aprendizagens ainda estão a ser perdidas? Ninguém sabe ao certo."

"Há evidências com exames e provas de aferição. Creio que estes dados pouco nos dizem, as médias de exames não sofreram alterações significativas, em alguns casos até subiram (https://www.publico.pt/2022/07/19/sociedade/noticia/medias-matematica-fisica-quimica-sobem-so-duas-disciplinas-media-negativa-2014215). Precisamos de saber mais", justificou o especialista.

No painel Resultado e impacto das medidas nas várias áreas, dificuldades e desafios sentidos participaram José Matias Alves, Universidade Católica do Porto; Pedro Freitas, Nova School of Business and Economics; Alexandre Homem Cristo, QIPP / coordenador do Programa Lexplore +Leitura; e Paulo Jorge da Encarnação Silva Bacelar de Macedo, director do Agrupamento de Escolas Templários de Tomar. Já para falar sobre a escola inclusiva no contexto de recuperação de aprendizagens estiveram presentes Joana Rato, Universidade Católica Portuguesa; Sofia Mendes, Universidade Lusíada do Porto; e Marisa Simões Carvalho, Universidade Católica Portuguesa.

Já Pedro Freitas, da Nova School of Business and Economics, referiu a literatura internacional já existente na medição destes impactos, como é o caso do estudo Progress in International Reading Literacy Study (https://www.publico.pt/2023/05/16/sociedade/noticia/portugal-sobe-ranking-internacional-avaliacao-mostra-alunos-4-ano-pioraram-leitura-2049761) (PIRLS), divulgado em Maio deste ano. "O impacto foi de um ano de perdas nas aprendizagens dos alunos", elucidou o especialista e adiantou que "um em cada cinco alunos portugueses têm dificuldades de leitura no 4.º ano".

De acordo com os resultados do PIRLS, os alunos portugueses do 4.º ano de escolaridade estão pior na literacia de leitura. Na avaliação internacional, que em 2021 introduziu pela primeira vez provas em formato digital, Portugal registou uma quebra na leitura nesse domínio (520 pontos) em relação a 2016 (528). Apesar disso, os resultados das provas em papel (531) melhoraram e houve mesmo uma subida no ranking internacional geral — apesar de o número de países contabilizados não ser o mesmo que na última avaliação (43 em 2021 vs. 50 em 2016).

Perante as dificuldades demonstradas, Pedro Freitas defendeu a necessidade de estabilidade nos recursos (https://www.publico.pt/2023/04/26/sociedade/noticia/falta-professores-recuperacao-aprendizagens-2047547): "na recuperação de aprendizagens estamos numa maratona, que precisa de recursos estáveis ao longo do tempo".

Uma das críticas dos directores escolares com a mudança para o Plano 23/24 Escola + é precisamente a quebra no reforço dos créditos horários, aplicado nos últimos dois anos. "Percebemos que, no próximo ano lectivo, o plano de aprendizagens vai ter menos recursos, ao nível dos professores. Ou seja, os 3200 professores que foram afectos às escolas públicas nestes últimos dois anos, claro que não vão, se assim posso dizer, continuar no próximo ano de recuperação", criticou ainda em Julho Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Directores de Agrupamentos e Escolas Públicas (Andaep). Mas o Ministério da Educação (https://www.publico.pt/2023/07/19/sociedade/noticia/recuperacao-aprendizagens-prolongada-reforco-professores-2057447) (ME) preferiu privilegiar as medidas que mostraram "maior eficácia" nos últimos dois anos, justificou então o ministro João Costa ao PÚBLICO.

No encerramento da conferência, a coordenadora do Grupo de Trabalho, deputada Cláudia André (PSD), frisou a necessidade de prolongar o plano de recuperação de aprendizagens no tempo, além de o adaptar para o futuro e reforçar os recursos humanos nas escolas. "A recuperação das aprendizagens não está resolvida", rematou.

Fonte: Público de acesso livre

Quatro federações acusam o Governo de apoio insuficiente à Escola Inclusiva

Quatro federações que apoiam pessoas com deficiência intelectual, paralisia cerebral e autismo acusam o Ministério da Educação de reiterada insuficiência de apoios à escola inclusiva, que se traduz num parco financiamento dos Centros de Recursos para a Inclusão (CRI).

As entidades em causa são: a Federação das Associações Portuguesas de Paralisia Cerebral (FAPPC), a Federação Portuguesa de Autismo (FPDA), a HUMANITAS (Federação Portuguesa para a Deficiência Mental) e a União dos Centros de Recuperação Infantil do Distrito de Santarém (Unicrisano).

Em comunicado, referem que os CRI são equipas formadas por técnicos subsidiados pelo Ministério da Educação para “apoiar a inclusão das crianças e alunos com necessidade de mobilização de medidas adicionais de suporte à aprendizagem e à inclusão”.

“O reforço de 25% que o Ministério da Educação deu a conhecer [a 11 de agosto] destinar-se-á, quase na sua totalidade, a financiar novas equipas de CRI que já eram acreditadas, mas não eram ainda financiadas”, lê-se ainda no comunicado em que alertam que “o aumento residual preconizado para todas as outras equipas (que já eram financiadas), nem sequer vai permitir-lhes aumentar o número de horas de apoio nas escolas (…) porque ‘só’ os aumentos salariais dos técnicos vão absorver, na sua totalidade, muito mais do que este valor”.

Em resposta à Lusa, o ministério vincou que a Resolução do Conselho de Ministros publicada no Diário da República em 21 de agosto, “autorizou a Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares a realizar a despesa relativa aos apoios financeiros aos Centros de Recursos para a Inclusão, decorrentes da celebração de contratos de cooperação para o ano letivo de 2023/2024, até ao montante global de 13 112 500,00€, o que corresponde a um aumento de 25%”.

Lembrando que o “valor não era atualizado há vários anos”, o Governo argumenta que permitirá “uma resposta mais robusta no apoio aos alunos com necessidades educativas específicas, permitindo ainda alargar o apoio financeiro a nove novas entidades que se encontram acreditadas há alguns anos, totalizando agora 98 entidades a financiar”.

Este reforço financeiro, prossegue a resposta, foi acordado com a Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade, Mutualidades, Misericórdias e Confederação Cooperativa Portuguesa e permitiu “a definição conjunta de um modelo de financiamento que corrija uma grande variabilidade detetada entre Centros de Recursos”.

Por seu lado, as federações contrapõem vincando que “a situação genérica tem vindo a piorar e, por tal, tem vindo a ser cada vez maior o número de alunos com deficiência que nas escolas procuram estes [nossos] serviços e ficam sem a adequada resposta”.

Acusando o ME de “falta de estratégia”, enfatizam que as respostas da tutela são “apenas de ano a ano”, continuando, à data desta segunda-feira, “as entidades responsáveis pelas equipas CRI sem qualquer informação do financiamento concreto que irão dispor”.

Assinalam ainda que esta situação “gera a grande instabilidade das equipas (provocada por contratos anuais que impedem a sua maturidade técnica e que prejudicam fortemente a qualidade do serviço prestado), acusando ainda a tutela de, assim, “fomentar o trabalho precário, não obstante a agenda de Trabalho Digno da qual o atual Governo tanto se orgulha”.

Para as federações, a prova de que a Escola Inclusiva não funciona como o desejado é “o número elevado de pedidos efetuados por familiares de alunos com deficiência para transitarem durante a escolaridade obrigatória para as Instituições de Ensino Especial. Estima-se (…) um aumento de 50% nos pedidos de encaminhamento da escola regular para as Escolas Especiais de associadas destas federações”.

Fonte: CNN Portugal por indicação de Livresco

terça-feira, 26 de setembro de 2023

Ministério da Educação assegura psicólogos nas escolas

Bastonário dos psicólogos tinha alertado para o risco de despedimento devido ao corte no financiamento do PRR, mas a tutela esclarece que a contratação dos profissionais é alheia a esse programa.

“A continuidade dos psicólogos que se encontram atualmente colocados nas escolas não está posta em causa. Por isso, nem se coloca a questão se o ME pretende renovar os contratos”.

O esclarecimento é do Ministério da Educação (ME), em informação enviada esta segunda-feira (...). Em causa, o alerta feito pelo bastonário da Ordem dos Psicólogos que, em declarações (...), afirmava estar em risco o despedimento de cerca de 500 psicólogos que tinham sido contratados ao abrigo do Programa de Recuperação e Resiliência (PRR). Francisco Rodrigues dizia ter informações que essa linha de financiamento iria terminar no final deste ano letivo. Mas, segundo esclareceu esta manhã o Ministério da Educação, “a referência ao financiamento via PRR não está correta, porquanto [as contratações desses psicólogos] não se encontram ao abrigo deste Programa”.

O esclarecimento do ME chegou esta manhã à (...) redação, embora tivesse sido pedido na sexta-feira durante a tarde.

A notícia em causa, publicada na edição em formato de papel, no sábado, com base em declarações do bastonário da Ordem dos Psicólogos, dava conta que cerca de 500 psicólogos, contratados pelo ME, através de um programa financiado pelo PRR, estavam risco de despedimento no final do ano letivos. Em causa, segundo Francisco Rodrigues, a informação de que o financiamento não iria ser renovado.

Nos últimos seis anos aumentou de 700 para cerca de 1800 o número de psicólogos nas escolas. Este aumento de profissionais colocou Portugal em termos de ratio psicólogo/aluno, ao nível dos melhores da Europa. Segundo o ME, os psicólogos vão continuar nas escolas sem o risco de despedimento, mantendo o apoio aos alunos e às famílias.

Fonte: Novo por indicação de Livresco

domingo, 24 de setembro de 2023

Para além do visível: desmistificar os sintomas da esclerose múltipla

À medida que o mundo evolui, as doenças neurodegenerativas tornaram-se uma preocupação constante e a necessidade de as compreender é cada vez mais imprescindível. A esclerose múltipla (EM) é uma dessas doenças, desafiando os médicos e investigadores a descobrir os seus mistérios e sintomas imprevisíveis.

Ao falarmos sobre esclerose múltipla (https://www.publico.pt/2022/04/04/ciencia/noticia/estudo-realizado-coimbra-permite-avanco-diagnostico-esclerose-multipla-2001294) a maioria das pessoas associa-a a sintomas físicos, como a dificuldade de locomoção. Contudo, há um aspeto muitas vezes invisível aos nossos olhos – o défice cognitivo.

Para aqueles que vivem este sintoma, as suas consequências são deveras impactantes. A capacidade de processar informação, a concentração e a memória ficam comprometidas, levando à perda precoce de emprego e afetando a qualidade de vida das pessoas com esclerose múltipla (https://www.publico.pt/2023/05/30/sociedade/noticia/atleta-estudante-enfermagem-diagnosticada-esclerose-multipla-doenca-fezme-vontade-2051382). É aqui que o trabalho liderado pela professora Adelaide Fernandes (https://www.publico.pt/2012/01/25/ciencia/noticia/premiados-projectos-sobre-cancro-da-mama-esclerose-multipla-e-colapso-pulmonar--1530565), da Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa, onde se insere o meu projeto de doutoramento, ganha relevância e se torna crucial para todos nós. O nosso principal objetivo é desvendar os mecanismos subjacentes a este sintoma impercetível, mas presente em mais de 50% dos doentes com esclerose múltipla.

Sabemos que o aparecimento de défices cognitivos está associado às componentes imunitária e inflamatória que ocorrem no sistema nervoso central. Estudos mostraram que doentes com esclerose múltipla têm redes neuronais danificadas, e que a presença de células imunitárias e da glia contribuem para o agravamento do dano neurológico. Daí a nossa curiosidade em perceber os possíveis mecanismos moleculares da interação entre estas células e a sua relevância na remoção excessiva de sinapses, cruciais para a cognição, num contexto de desmielinização.

Para atingir este objetivo, tivemos acesso a amostras post mortem da região do hipocampo de doentes com esclerose múltipla, com ou sem défice cognitivo, através do biobanco dos Países Baixos. Estes estudos iniciais confirmaram a presença das células da microglia e linfócitos T CD8 em áreas de desmielinização, nomeadamente em doentes que apresentam défice cognitivo.

Em paralelo com estes estudos, e em colaboração com outro instituto, estamos a implementar um modelo tridimensional de mini-esferas cerebrais. Este modelo será criado a partir de células pluripotentes induzidas provenientes de doentes com esclerose múltipla (https://www.publico.pt/2023/08/09/ciencia/noticia/nova-vacina-epsteinbarr-virus-quase-eficaz-ratinhos-2059633) para aproximar à biologia e tipologia de cada doente. Acreditamos que este modelo possa ser uma plataforma inovadora no sentido de uma medicina personalizada, abrindo portas para tratamentos mais direcionados.

Para além da investigação, este trabalho permitiu-me conhecer pessoas que vivem, diariamente, com a realidade da esclerose múltipla. Estas experiências motivaram-me a fazer mais e melhor, enquanto cientista, trabalhando para compreender a patologia da doença, bem como as reais necessidades destes doentes e, assim, transformar a vida das pessoas com esclerose múltipla. É essencial que a sociedade apoie e promova a investigação nesta área, pois só assim poderemos avançar na luta contra as doenças neurodegenerativas. Juntos, podemos fazer a diferença na vida de milhões de pessoas.

Catarina Barros

Fonte: Público

sábado, 23 de setembro de 2023

Telemóveis nas escolas. Sim ou não?

Já lá vão seis anos desde que a Escola EB 2/3 António Alves Amorim, em Lourosa, Santa Maria da Feira, proibiu o uso de telemóveis em todo o recinto. A recente explosão mediática do caso – os responsáveis garantem que os alunos, hoje, socializam mais – tem vindo a instalar um debate na sociedade que está longe de ser consensual. Neste ano letivo, os agrupamentos de Almeirim também o vão proibir nas escolas do 1.º ciclo, seguindo uma recomendação do Conselho Municipal de Educação. Uma petição pública pelo caminho e o próprio ministro da Educação já pediu um parecer ao Conselho das Escolas sobre o uso de telemóveis dentro dos estabelecimentos de ensino, por se tratar de um “tema complexo”. Tão complexo que divide até os especialistas.

“O debate é totalmente pertinente, sendo certo que não concordo absolutamente nada com a exclusão total dos smartphones, nem na sala de aula porque pode ser um instrumento valioso, nem no recreio.” João Nuno Faria, psicólogo e coordenador do núcleo de intervenção no comportamento online na clínica PIN – Partners in Neuroscience, conhece bem as consequências do uso excessivo do telemóvel por jovens (lá iremos), mas defende que a proibição é “uma imposição altamente artificial”, “corre-se o risco de se criar uma realidade distópica dentro da escola”. Na verdade, lembra, os próprios adultos usam os telemóveis nas pausas do trabalho quando poderiam estar à conversa com os colegas. Porém, a questão primordial está em olhar para as escolas, “que são iguais à realidade dos anos 1980 ou 1990”. “As crianças hoje são diferentes, os estímulos mudaram, o conhecimento sobre o Mundo das crianças e jovens mudou, mas o recreio e a sala de aula são os mesmos.”

Mas quais são as vantagens do telemóvel na escola? Dentro da sala de aula, pode ser um instrumento pedagógico para pesquisar informação, para uma aprendizagem ativa, “se devidamente utilizado”. “Há uns anos valentes fui convidado para ir conhecer uma escola em Lisboa e um aluno do quarto ano veio mostrar-me o seu caderno, onde estava colado um QR code ao lado de uns apontamentos. Passando o tablet ou o telemóvel sobre esse código, dava acesso a um vídeo de uma nave espacial a romper a atmosfera e a entrar no Espaço, coisa que nenhum livro tem a capacidade de fazer.” A opinião de João Nuno Faria não é diferente quando o assunto é o recreio, que “já devia ser mais interativo, com códigos QR espalhados para caças ao tesouro, para exploração de interesses musicais, as possibilidades são gigantescas, mesmo para estimular a interação, e está-se a desperdiçar uma tecnologia que podia ser usada com benefícios”.

O psicólogo que trabalha com problemas de excessos, de adições online, não é alheio aos riscos das utilizações abusivas de smartphones ou de redes sociais. Longe disso. “Mas a proibição que se está a fazer não é pelo uso excessivo, é porque se olha para o recreio e se vê os jovens todos conectados. Mas qual é a alternativa? O contexto não é rico. Os recreios na maior parte das escolas em Portugal são ambientes estéreis, tirando um campo de futebol.” Além disso, sublinha, os casos de uso excessivo de smartphone são cerca de 2%. E os casos de risco andam perto dos 10%. “As consequências do uso desregrado são taxativas e preocupantes, uma delas é a queda do rendimento escolar, mas não corresponde a todos os jovens que usam smartphones.”

Riscos, os pais e os limites aos ecrãs

Olhemos, pois, para essas consequências. Estar fixamente a olhar para um smartphone não só traz problemas físicos como um conjunto de falta de experiências que a interação humana cara a cara proporciona, “é um vazio ao nível do treino de competências sociais não verbais”. As redes sociais também entram nos perigos, estão construídas com um algoritmo “que entrega aquilo que o indivíduo gosta, que atesta o que ele pensa e confirma as suas ideias sobre o Mundo, o que não estimula o espírito crítico”. Claro que há muita criatividade no TikTok, muito conhecimento a circular no Instagram ou no Facebook, mas a navegação vai bem além disso. E há dois aspetos ainda mais preocupantes para João Nuno Faria. A falta de desenvolvimento emocional, espelhado em “terminar relações por mensagem, sem o confronto cara a cara, sem sentir o impacto da dor no outro, o afastamento do humanismo”. E a questão da espera. “As interações pessoais implicam saber esperar, para um jogo de futebol entre amigos é preciso compatibilizar horários, esperar que toda a gente se equipe, se organize, é muito diferente do online em que o jogo começa imediatamente. As crianças hoje não treinam a espera.”

Certo é que os pais têm de entrar neste debate, conhecer os perigos, procurar serem modelos de uma utilização regrada, estar atentos a uma utilização excessiva. Só que perceber quando é que a utilização passa os limites não é tarefa fácil num mundo cada vez mais tecnológico. As orientações da Organização Mundial da Saúde (OMS) têm por base o sedentarismo e a atividade física. Até aos dois anos, segundo a OMS, ecrãs é melhor não. Depois, entre os dois e os cinco anos, sugere-se uma hora por dia no máximo e não mais de duas horas entre os cinco e os 17. “Se pensarmos na realidade atual, pondo todos os ecrãs dentro deste saco, é irrealista. Se virmos um filme na escola esgota-se aí o plafond? Há ecrãs e ecrãs. Os ecrãs passivos, onde entra um programa de televisão, um vídeo no Youtube, um filme, uma série. E os ativos, que são aqueles que devolvem alguma coisa de acordo com a interação, como as redes sociais e videojogos. Estes últimos têm muito maior potencial aditivo e é preciso estar-se mais atento”, avisa João Nuno Faria.

Voltemos ao recinto escolar. Para Iolanda Ribeiro, professora na Escola de Psicologia da Universidade do Minho e coordenadora do grupo de investigação em Linguagem, Leitura e Escrita, que desenvolve programas para escolas, muitos deles digitais, além de jogos interativos de leitura ou atividades digitais para pais e filhos, a pergunta que tem de ser feita é “por que é que as crianças precisam de um telemóvel na escola?”. A partir do 2.º ciclo, afirma, a questão é pertinente, mas até lá “não há razão nenhuma”.

Não é só o isolamento e a menor interação social, é o menor desenvolvimento de competências, as alterações do sono. “Isto implica pensar não só na escola, mas em todos os contextos da vida da criança e no facto de os pais lhes darem telemóveis tão cedo. Não o fazem por mal, fomos todos submersos pelo digital, mas há aqui um papel fundamental da família”, refere a investigadora. Até as crianças entrarem para o 1.º ano, alerta, é preciso muito controlo.

E pondo os olhos no debate que se acendeu nos últimos tempos, Iolanda Ribeiro assume que uma proibição generalizada nas escolas pode ser exagerada, “não podemos ignorar que as crianças nascem num ambiente digital, mas pode ser boa para abrir uma discussão mais alargada”. Uma discussão que tem de envolver sociedade, Ministério, escola, família, ciência. “Não sei se vai ser possível proibir os telemóveis em todas as áreas da escola. Mas definir regras parece-me fundamental, até pelos impactos neurológicos que os estudos têm vindo a apontar. A ciência também tem de ajudar a clarificar o caminho. É óbvio que há coisas no digital fantásticas, pode ser muito útil para a aprendizagem com atividades orientadas, mas o seu uso tem de ser controlado”, atesta.

Lá fora e as dúvidas entre proibir e sensibilizar

Olhemos para a Europa. Nomeadamente para a Suécia, onde o governo está a recuar na aposta que tinha na digitalização total do ensino, as escolas estão a voltar a recorrer mais aos livros e a reduzir o tempo dedicado às pesquisas nos tablets. Em França, a proibição de telemóveis nos estabelecimentos de ensino foi adotada em 2018. Nos Países Baixos, a mesma medida avança no próximo ano. Lia Raquel Oliveira, professora universitária de tecnologia educativa, tem vindo a mudar de opinião. “Antigamente, achava que os telemóveis deviam ser usados também na escola. Hoje não. Acredito que, pelo menos até ao sexto ano, não deve haver telemóveis nas escolas. A partir daí há que haver bom senso, criar caixas para guardar os equipamentos em determinados momentos. Já temos informação suficiente para sabermos que nos distraem completamente, que nos tiram o foco, pior ainda nos mais jovens. E o uso tem de ser cauteloso.”

Do 6.º ano para a frente, a docente do Instituto de Educação da Universidade do Minho não é defensora da proibição, mas, tal como João Nuno Faria, acredita que é preciso abandonar a escola pós-industrial e criar a escola do século XXI, para se pensar em como se encaixam os telemóveis. “É inglório e absurdo pensar na questão dos telemóveis sem pensar a escola, os currículos, para que existe, como se faz.”

Júlio França conhece bem os corredores das escolas. É psicólogo da educação numa secundária e faz uma ressalva antes de tudo: “O telemóvel não é o diabo em si. Sei que há professores que recorrem a jogos digitais, que usam esta ferramenta na aula, e que os alunos até se sentem mais motivados quando o podem usar.” O problema é a vida para lá das paredes da sala de aula, são as horas infinitas de olhos nos ecrãs nos recreios e em casa. “Vemos, muitas vezes, que os alunos acabam por não socializar nos intervalos. Estão sentados, cada um a olhar para o seu telemóvel e isso promove o isolamento social.” Não é só, há consequências físicas, de saúde mental, “e a questão do bullying nas redes sociais, um fenómeno que se vê a acontecer e que é muito facilitado porque o telemóvel está mesmo à mão”.

Apesar de tudo, a proibição taxativa não lhe parece a receita milagrosa, “o fruto proibido é o mais apetecido, cada escola ou agrupamento deve poder decidir no seu regulamento interno”. Até porque, lembra, “o comportamento nas escolas não é diferente daquele que todos nós temos socialmente, a vida na escola não faz mais do que refletir o que se passa fora”. O caminho, acredita, é o da sensibilização e os profissionais da educação têm de entrar neste jogo. “Hoje, a escola é responsabilizada por tudo e mais alguma coisa, mas neste tema pode de facto haver um papel importante na promoção de hábitos saudáveis nos intervalos.” Sendo certo que as famílias não podem ser desresponsabilizadas, não se podem demitir de um trabalho necessário, “não podem ter medo de definir limites aos filhos, não podem continuar a fazer o que se vê nos restaurantes, a entregar o telemóvel aos miúdos para eles se entreterem”. Embora o psicólogo admita que “hoje é praticamente impossível fugir a isso” e que é difícil contrariar estes hábitos.

Júlio França não é adepto de verdades absolutas quanto ao tempo de ecrã por dia, depende de família para família, mas dá uma dica. “O uso do telemóvel, do computador, da Playstation, da Nintendo não pode ser o tempo maior da vida da criança. Precisa de se mexer, de ter atividade física, de interagir com outras crianças e adultos. A exposição aos ecrãs não pode ser a fatia principal do bolo do dia a dia da criança.”

Há uma certeza, as crianças e jovens de hoje serão adultos necessariamente diferentes em termos de comportamento daqueles que passaram a infância a jogar à bola. Mas ainda não há consenso nem tampouco fórmulas mágicas sobre o caminho a seguir dentro das escolas.

Fonte: Notícias Magazine por indicação de Livresco

quinta-feira, 21 de setembro de 2023

Pais que estudam pelos filhos

Dizia-me uma mãe: "Não me posso demorar, tenho de ir gravar um resumo das aulas para o meu filho ouvir." Esta mãe lê a matéria que o filho aprende na escola, resume-a, grava um áudio e o filho apenas tem de o ouvir.

Estará esta mãe a ajudar o seu filho?

Os pais que fazem as coisas pelos filhos (e não com os filhos) acabam por evitar que estes se confrontem com as dificuldades e os desafios próprios da vida - e falamos aqui da vida como um todo, e não apenas da vida escolar.

Será esta forma de exercer a parentalidade promotora de um crescimento saudável?

A resposta é não.

Muitos pais substituem-se aos filhos quando estudam e fazem os trabalhos de casa por eles. Diria que estamos perante um problema em confiar e uma enorme necessidade em assumir o controlo, acabando por proteger de uma forma excessiva e que não facilita o desenvolvimento das necessárias competências de trabalho e hábitos de estudo.

Assistimos também, muitas vezes, a pais que vivem o percurso escolar dos filhos com elevada ansiedade, demasiado centrados no rendimento académico e na competição. Há pais que já se questionam sobre a universidade onde os filhos irão estudar, quando estes frequentam ainda o 1.º ciclo. Pais demasiado exigentes acabam ainda por potenciar estados de ansiedade nas crianças, que se manifestam quando têm de ir ao quadro, falar perante a turma ou realizar uma avaliação. Temos crianças que choram quando recebem um "Bom", porque os pais querem (ou exigem) um "Muito Bom". Crianças que crescem a acreditar que não são suficientemente boas, com o natural impacto negativo que isto tem em termos de autoestima e aceitação de si mesmas.

É fundamental que os pais ajudem os filhos a vivenciar a escola de uma forma construtiva e securizante, palco também de relações interpessoais e de aprendizagens informais. Não são apenas as notas dos testes e aquilo que é afixado na pauta que interessa.

Os pais devem ainda estimular a autonomia e a independência, orientar e guiar, mas permitindo o erro, a frustração e a desilusão que, afinal de contas, fazem parte da vida de todos nós.

Rute Agulhas

Fonte: DN

quarta-feira, 20 de setembro de 2023

"Se o seu filho sabe como usar um smartphone aos 2 ou 3 anos, não é porque seja inteligente, é porque o engenheiro que desenhou o smartphone é inteligente"

A canadiana, perita em educação, Catherine L'Ecuye esteve em Portugal, no início do mês, para promover os seus livros onde desmistifica algumas teorias da pedagogia que se foram cimentando nos últimos anos. Acredita, acima de tudo, que as crianças precisam de tempo para brincar sem ecrãs e que "perdemos muito tempo e recursos em métodos que não estão respaldados pela ciência e há muitos gurus que se aproveitam da ignorância dos pais".
Editora planeta

A conversa com a psicóloga especialista em educação, Catherine L'Ecuye, com o SAPO24 acabou por acontecer por email uma vez que a agenda da autora internacional não permitiu que o encontro fosse presencial. Canadiana, a viver em Barcelona, tem feito da educação o seu dia-a-dia, lançando livros e conferências por todo o mundo, sendo consultora de educação em vários países, como o México.

Em Portugal é editada pela Planeta e a conversa com o SAPO24 girou muito em torno dos seus livros Educar na Realidade, e Educar na Curiosidade, onde, com base em conhecimento científico validado, partilha com os encarregados de educação estratégias para criar crianças mais saudáveis e melhores adultos. Ficou por responder se tornar as crianças a parte central de uma família, permitindo-lhes tudo o que pedem, é impedi-las de crescer na realidade. E também como fazer que uma criança atinja aquilo a que a escritora chama de motivação transcendente, uma vez que acredita que a motivação externa, tão comum na educação, criou jovens apenas preocupados consigo mesmos.

Com um doutoramento em educação e psicologia, mãe de quatro filhos, diz ser essencial que as crianças tenham contexto e um sentido para as ordens e regras que lhes são dadas. Os diálogos com as crianças são várias vezes referidos ao longo dos livros, tantas quantas as vezes em que acredita ser um exagero a exposição que hoje as crianças têm à tecnologia.

As crianças têm hoje falta de tempo e espaço para se aborrecerem e se tornarem criativas?

Tolstoi dizia que o aborrecimento é "desejar desejar". É importante que os nossos pequenos tenham tempo livre para brincar. Hoje enchemos as suas agendas até ao ponto de parecerem pequenos executivos stressados. A educação infantil converteu-se numa carreira. As aulas estão estão cheias de métodos, mas esquecemo-nos do que precisa uma criança com menos de seis anos, e de como aprende: através das relações interpessoais e das experiências sensoriais. É a partir dos seis anos que a criança começa a desenvolver o pensamento abstrato e tem um sentido de aprendizagem mais formal.

Diz que devemos educar as crianças com realismo. Acha que sobreprotegemos as crianças? Quanto do mundo real lhes devemos mostrar sem os prejudicar? Como, por exemplo, falar-lhes de guerra, doença e morte?

"Educar na realidade" não quer dizer ensinar tudo às crianças e converter a aula numa amostra do que há no mundo. O mundo está louco, tanto que basta vermos os telejornais para comprová-lo. Eu quero que a aula seja um lugar sagrado, como um claustro, um lugar resguardado, e onde protegemos a criança do mal que se passa no mundo. Tem que ser um ambiente preparado adaptado às etapas da infância, dos seus ritmos, da sua inocência, da sua sede de beleza, de natureza, de silêncio, de mistério. Quando falo de "educar na realidade", refiro-me, entre outras coisas, à importância da educação offline.

Em Portugal, houve no ano passado pais que fizeram greve às provas de aferição do 2º e 4º ano por serem em computadores. E, este ano, há já algumas petições para que sejam proibidos os telemóveis nos recreios. Isto é benéfico para as crianças ou impede-as de crescer "no seu tempo"?

Não há nenhum conjunto de evidências que prove os benefícios do uso de tecnologia nas aulas. O conceito da inovação responde a uma lógica comercial, não educativa. No relatório Students, Computers & Learning (2015), fica claro que o uso de computadores acima da média da OCDE leva a piores resultados educativos. O próprio Steve Jobs admitiu que a tecnologia não ia solucionar os problemas educativos. Na minha opinião piora esses problemas porque dissipa a atenção.

Num mundo em que as crianças são constantemente estimuladas, como as proteger dos estímulos típicos do mundo moderno que, segundo diz, as fazem ficar "apáticas"?

Quando sobre estimulamos uma criança, a sua tenção arterial sobe. Torna-se apático e deixa de perceber estímulos mais discretos, mas não menos importantes, como o som de um pássaro, um pôr de sol, a reclamação de um ente querido, etc. É importante que os sons e as imagens se harmonizem com a ordem interior da criança. Temos de readaptar os nossos filhos ao mundo real, quotidiano. Caso contrário, aborrecem-se com as imagens nas aulas e em casa, serão incapazes de se concentrar e de manter uma conversa tranquila.

Diz que os pais impediram as crianças de ter desejos por lhes darem tudo o que pedem. Como pode um pai dizer não ao pedido de uma criança que usa como chantagem ser a única da turma que ainda não tem determinada coisa?

Temos de ajudar os nossos filhos a fazer estatísticas. Dizem que "toda a gente tem", mas não é assim. Na maioria das vezes são dois ou três. Temos de falar com os restantes pais e mães para criar um ambiente diferente e mais próximo do nosso estilo educativo. Por exemplo, não faz falta dar 20 presentes a uma criança no dia de anos, tão pouco faz falta comprar um smartphone a uma criança de 12 anos ou passar os fins-de-semana num parque de diversões. Nós passamos o dia a trabalhar para comprar. Temos de voltar a um consumo mais responsável e dedicar mais tempo a planos familiares simples, tranquilos. A única coisa que as crianças precisam é de passar tempo com os seus pais.

Refere que as crianças crescem cada vez mais rapidamente e perdem partes importantes de ser crianças. Mas se os pais as puserem em contacto mais tarde com algumas tecnologias, ou realidades, não fazem delas menos evoluídas em relação a crianças da mesma idade? Como atingir este equilíbrio?

Não é assim. Os futuros empreendedores não precisam de ser adultos viciados no telemóvel. Precisam de ser pessoas capazes de escutar, e de ter a atenção focada durante muito tempo. Não querem ser pessoas incapazes de inibir os estímulos externos ou encantados pela irrelevância. Precisam de ter autocontrolo, temperança, força interior e critério. Não é preciso ter um smartphone aos 12 anos para saber usar o Word e o Excel com 22 anos. Temos de formar os nossos jovens tendo em atenção o Office, claro, mas não é necessário converter o tablet num método educativo para o atingir. Se o seu filho sabe como usar um smartphone aos 2 ou 3 anos, não é porque seja inteligente, é porque o engenheiro que desenhou o smartphone é inteligente. A tecnologia está desenhada para ser 'plug&play'.

É costume vermos crianças a fazer refeições enquanto vêem desenhos animados ou brincam nos tablets. Isto entra na categoria de "multitarefa" que diz ser prejudicial à criança?

Nunca deveríamos relacionar o uso e abuso de tecnologia com a refeição. Quando uma criança come, come. Recompensar a criança que come com mais ou menos tecnologia pode contribuir para o desenvolvimento de distúrbios alimentares.

Diz que a escola mais tecnológica pode não ser a mais benéfica para uma criança. Quais, então, os critérios que os pais devem ter em conta na hora de escolher uma escola para os filhos?

Não há evidência que relacione a qualidade educativa com o uso de tecnologia. Escolher um colégio é uma tarefa complicada e muito pessoal. Depende do projeto familiar de cada lugar. Em 2024, vou lançar o ensaio novelado "Conversas com a minha professora", que está pensado para ajudar os pais a definir o seu projeto educativo para melhor escolherem a escola dos filhos.

Como se pode aumentar o tempo de concentração de uma criança respeitando os seus limites?

As crianças concentram-se quando encontram atividades ou desafios que se ajustam às suas capacidades. Quando o desafio é demasiado fácil, aborrecem-se. Isso acontece com ecrãs. Quando o desafio é demasiado difícil, sentem ansiedade. Quando há um equilíbrio entre as capacidades e as dificuldades da criança, então a criança entra num ritmo (flow) em que pode estar atento até três horas (o Montessori diz isso, e podemos comprová-lo nas suas aulas) sem se modificar.

Refere a importância da cultura e da beleza na primeira infância, esta é uma realidade apenas atingível para pais com dinheiro, ou que já eles próprios tenham noção da importância da cultura?

A beleza é gratuita. Um pôr do sol, a natureza, um sorriso amável. A beleza encontra-se em museus e catedrais, mas também se encontra na rua. Não creio que tudo o que seja belo sempre se compre com dinheiro. Temos de saber distinguir entre elitismo intelectual e elitismo económico. Temos de aspirar a que a cultura seja para todos, independentemente do nível económico.

Como é que um pai se pode proteger dos "neuromitos da educação" que lhes são mostrados todos os dias, muitas vezes mascarados de ciência? Como distinguir ciência de pseudo-ciência?

Não é verdade que "tudo se molde entre os zero e os três anos" (este é o mito dos primeiros três anos), não é verdade que se tenha que "sobre estimular os miúdos ao máximo" (o mito do enriquecimento), não é verdade que existam períodos críticos para a aprendizagem (o mito dos períodos críticos). Há 15 anos que me dedico a defender a educação baseada em evidências. É uma pena que tenhamos tanto interesse pela homeopatia educativa. Perdemos muito tempo e recursos em métodos que não estão respaldados pela ciência e há muitos gurus que se aproveitam da ignorância dos pais. Por isso escrevi o "Conversas com a minha professora", nesse livro explico de onde vêem os métodos que se usam hoje nas nossas aulas. O prólogo será de Nuno Crato, que tem feito um longo trabalho, em Portugal, a defender a educação baseada em evidência.

Para terminar, tem quatro filhos, as estratégias que usou com os quatro foram as mesmas? Onde entra o feitio de cada criança na educação? Como pode um pai adaptar-se?

Claro que cada criança é um mundo. Para saber o que resulta melhor com cada filho tem que se passar tempo com ele. A educação requere tempo. Por isso é que se têm multiplicado os livros de "receitas" de como educar. Parece-me terrível que exista a "indústria do conselho encaixotado" (como chamamos a esse tipo de livros). Isso acontece porque os pais têm pouco tempo, uma pena. Temos de voltar a conectarmos com as necessidades de cada um dos nossos filhos. A sensibilidade parental vale mais que qualquer livro de crianças.

Fonte: Sapo24

terça-feira, 19 de setembro de 2023

“Uma Escola de TODOS – Utopia ou Realidade?”

A Associação de Solidariedade Social dos Professores e a Delegação de Setúbal vêm por este meio divulgar o Seminário subordinado ao tema “Uma Escola de TODOS – Utopia ou Realidade?”, a realizar no próximo dia 14 de outubro de 2023, no Auditório da Escola Secundária Sebastião da Gama em Setúbal, incluído nas Jornadas Pedagógicas “Outubro - Mês do Professor”.

O Seminário “Uma Escola de TODOS - Utopia ou Realidade?” surge integrado na realização das Jornadas Pedagógicas em Setúbal, uma iniciativa da Delegação de Setúbal da ASSP, apoiada pela Direção Nacional da ASSP, em colaboração com os Agrupamentos de Escolas do Concelho, Câmara Municipal e Instituto Politécnico de Setúbal.

O Seminário decorrerá no dia 14 de outubro 2023, no Auditório da Escola Secundária Sebastião da Gama, sede do Agrupamento do mesmo nome.

Com a realização deste Seminário a ASSP pretende proporcionar aos Professores momentos de reflexão, análise e discussão sobre os grandes desafios que a Escola e todos os agentes educativos enfrentam diariamente na procura da melhoria da qualidade das práticas pedagógicas que concorrem para as aprendizagens de TODOS os alunos e para o seu sucesso educativo.

Uma Escola de TODOS – Utopia ou Realidade? trará a Setúbal conferencistas que nos poderão ajudar a pensar uma Escola mais justa e equitativa para TODOS.

O Seminário está creditado como uma ACD de 6 horas.

Para frequentar o Seminário terá de se inscrever na fiche de inscrição : .https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSfUKFsWDwdUwQLc4VEnezfLCRtG0vZDvW_c_Mb8-MnraoFwng/viewform

Para estudantes e associados, o seminário é gratuito .Para não associados o valor é de 10€


domingo, 17 de setembro de 2023

São as políticas, e não o absentismo ou as aposentações, que causam a falta de professores

Milhares de alunos meses a fio sem professor a pelo menos uma disciplina, ou com constantes substituições dos precários que os ensinam, são sinais preocupantes para as democracias; por cá, tornaram-se indisfarçáveis desde 2017. Como se regista nos EUA, no RU e em vários países europeus (os nórdicos resistiram porque têm classes médias maioritárias e consistentes), é nos territórios com mais problemas sociais ou isolados, ou atingidos pela especulação imobiliária, que cresce a falta de professores.

Aliás, ser professor já só motiva uma minoria interessada na formação em educação básica. É o resultado das reformas neoliberais, sintonizadas com a OCDE, que visaram a sustentabilidade económica dos estados. A forte redução dos orçamentos da educação exigiu políticas de engenharia social que incluíram a descredibilização da escola pública e dos seus professores. Em regra, os governos seleccionaram uma forma de manipulação para popularizar as decisões: destaques mediáticos especulativos das estatísticas do absentismo dos professores e da sua massa salarial.

A bem dizer, Portugal chegou tarde a este processo. Mas acelerou-o a meio da década de 2000. Aplicou a eito, com pouca consistência teórica e sem estudos empíricos, um conjunto de políticas extremistas na carreira dos professores, e na sua avaliação, sustentadas por um modelo autocrático de gestão das escolas. As históricas contestações dos professores (2008 e 2013) - reconhecidas pelas oposições nas campanhas eleitorais, mas "esquecidas" logo que tomaram o poder -, anteciparam a crise vigente.

Acima de tudo, a inacção dos sucessivos governos desconvocou a esperança, instalou o desalento e eliminou a capacidade de contestação dos professores. Mas criou uma casta que se acomodou e que usa um argumentário que suaviza a consciência dos governos.

Para além disso, o marketing partidário manipulou os dados dos resultados dos alunos para certificar o caminho certo. A melhoria no PISA (OCDE), ou a "natural redução do abandono escolar" numa sociedade que se desenvolveu e escolarizou, serviu para discursos oportunistas nivelados pelas contendas sobre os rankings nacionais.

No essencial, as finanças passaram a supervisionar a educação. Como confessou Alexandra Leitão (teve pastas na AP e na Educação) ao Expresso de 19 de Agosto de 2022, "o sistema de avaliação da AP é injusto. Tentei modificá-lo e não consegui. Não houve abertura do Ministério das Finanças. Não vale a pena dizer outra coisa."

De resto, estabeleceu-se um silêncio estrutural sobre uma organização que "adoecia os professores" e os mergulhava num tríptico bem documentado: exaustão, amargura e indignação. Até quem experimentou o exercício, identificou de imediato os procedimentos parciais e arbitrários.

Tudo isto foi fatal. Não só promoveu a fuga dos professores, como transformou as escolas em laboratórios de controlo social e favoráveis ao caciquismo local. Aliás, é já só neste universo que encontramos "dinossauros" a dirigir a mesma escola durante cerca de duas décadas, ou até três ou mais, e que ainda são aplaudidos pela corte do sistema que faz assim tábua rasa da mais elementar ética republicana.

Por isso, a comparação da actualidade com 2010, como fez o actual ministro da Educação, regista a subida do absentismo e da mobilidade por doença sem a necessidade de inundar os leitores com números. Há causas transversais à AP (exaustão, envelhecimento e milhares de aposentações na década de 2020 que os governos ignoraram) e é igualmente consensual o efeito devastador das políticas.

Em suma, as democracias estão numa encruzilhada e aumenta a apreensão com o crescimento das desigualdades educativas e das escolas para ricos.

E antes do mais, sublinhe-se que a aceleração do digital na pandemia demonstrou a imponderabilidade da substituição de professores por máquinas (ou por qualquer modelo de tele-escola) tão desejada pelos ministérios das finanças, pela OCDE e pelas gigantes tecnológicas.

Mas um sinal sonoro da aflição europeia foi dado por Macron: "nenhum professor receberá menos do que 2000 euros líquidos mensais". Por cá, é matéria indiscutível. O debate não abre, nem com as ameaças frequentes de Bruxelas de levar Portugal a "tribunal se não acabar a “discriminação” dos professores contratados" que "auferem sempre o salário mínimo da carreira independentemente do número de anos de serviço" (que pode chegar às duas dezenas). E recorde-se: a carreira em Portugal é a que tem mais travões na AP e os professores são os únicos que não recuperaram a totalidade do tempo de serviço. Aliás, tornou-se agora mais evidente como eram parciais as contas das finanças.

"Uma mudança de políticas" permitiria, no mínimo, sonhar. Desde logo, tentar que o problema não se agrave e eternize. Recuperaria professores profissionalizados desistentes, revigoraria os que existem e oxigenaria a atractividade do exercício. Mas não há sinais nesse sentido; pelo contrário.

Nesta fase, a acção do Governo centra-se num recuo da lei das habilitações para algo semelhante ao que acontecia no início do milénio. Essa decisão provocou o tradicional debate sobre a melhor formação. Concorda-se com quem defende que a habilitação própria seja equivalente à que permite aceder ao mestrado profissionalizante essencial para a entrada nos quadros das escolas.

Resumidamente, não se ensina violino, basquetebol, gramática ou álgebra, sem se saber violino, basquetebol, gramática ou álgebra. Ajuda muito se se estudar Piaget, Freud, Hannoun, Erikson, Bruner, Ausubel, Sandel, Markovits e por aí fora. É também fundamental que a profissionalização seja em exercício nas escolas (plurianual de preferência) e não num apressado ensino à distância. Estes domínios são mais determinantes do que os debates que diminuem as pessoas porque se formaram depois de Bolonha, ao mesmo tempo que se omite a descida ocorrida com o absolutismo das Ciências da Educação.

E nunca é excessivo repetir que ensinar é difícil. Necessita de um clima de confiança e de boas condições de leccionação. Requer preparação e energia, e exige a desafiante adaptação da personalidade aos estilos de ensino. Inscreve estudo para a vida e convoca a esperança e o optimismo.

Acima de tudo, urge o regresso de aquilo que as políticas vigentes anularam: professores satisfeitos com uma escolha profissional digna que não os esgota em burocracia e em procedimentos digitais repetidos e inúteis, livres para ensinar e aprender e com tempo para a cidadania.

Paulo Prudêncio

Fonte: Blog Correntes por indicação de Livresco

sábado, 16 de setembro de 2023

Ministro da Educação quer lançar debate "ponderado" para reorganização do ensino secundário

O ministro da Educação quer lançar um “debate ponderado” sobre o que “pode ser uma futura organização do ensino secundário”. Num artigo de opinião no Observador, João Costa explica que “o ensino secundário científico-humanístico está organizado em cursos relativamente estanques”, apesar de os anos terem, desde 2019, a possibilidade de “permutarem disciplinas entre cursos”.

Porém, defende, “o conhecimento já não está arrumado em gavetinhas de fronteiras bem delimitadas”. “Entender fenómenos como as alterações climáticas ou pandemias convoca conhecimentos de várias áreas disciplinares. Por este motivo, queremos lançar um debate ponderado sobre o que pode ser uma futura organização do ensino secundário”, afirma o governante.

Ao fazer um balanço do arranque do novo ano letivo, que diz ter arrancado “com a alegria normal do regresso às aulas” de mais de um milhão crianças e jovens, João Costa assinala as três áreas a que o Governo pretende dar particular atenção, além do ensino secundário: a transição digital, a recuperação das aprendizagens devido às marcas deixadas pela pandemia nos alunos e o ensino para os migrantes, com a necessidade de mais formação e apoios para a “inclusão de todos”.

Para terminar o artigo publicado esta quinta-feira no Observador, o governante deixou uma mensagem aos que “dizem que nada foi feito”, destacando 11 medidas que foram implementadas já este ano como, por exemplo, a “vinculação de mais de 8 mil professores, o valor mais alto desde que há registo, cumprindo o compromisso de combate à precariedade” ou a “alteração das condições para a vinculação, passando a reconhecer-se o tempo de serviço acumulado independentemente da natureza ou duração dos contratos”.

Na “maior parte” das medidas para o setor, afirma João Costa, “a decisão final incorporou sugestões dos representantes dos professores de forma bastante significativa”. “Sem intransigências, mas sempre com responsabilidade”, conclui.

Fonte: Observador por indicação de Livresco

sexta-feira, 15 de setembro de 2023

Iris já tem escola

Iris, 12 anos, é aluna com notas dignas de quadro de mérito. No portal das matrículas, por mais refresh que o pai dela fizesse à página, a mensagem era: “A Aguardar Colocação". Depois de a CNN Portugal ter revelado a história, Iris passou a ter escola

Iris e o pai respiram de alívio depois de semanas de angústia e incerteza sobre o próximo ano letivo. Iris Lopes, aluna de quadro de mérito, transitou do 6º para o 7º ano e só ficou a saber que escola vai frequentar no dia em que o Ministério da Educação deu arranque ao ano escolar para cerca de 1.300.000 alunos e já depois de ser notícia num artigo da CNN Portugal.

“Acabou esta indefinição e este desespero. Sobretudo para ela, que começa agora a ter alguma estabilidade tão necessária para este ano letivo, que já de si é exigente”, resume o pai, Pedro Lopes, em conversa telefónica com a CNN Portugal.

A escola de Vale de Milhaços foi a terceira hipótese colocada pelo encarregado de educação de Iris aquando da matrícula no portal do Ministério da Educação. Mas nem isso diminui a felicidade da jovem de Corroios, que fica agora a saber que vai frequentar a escola onde terminou o 6º ano, “uma escola que conhece, onde já é conhecida, onde gostou de estar e onde toda a gente gosta dela, pelo seu comportamento e pela sua postura”.

“Aliás, só não coloquei esta escola em primeiro lugar porque tem poucas turmas de 7º, 8º e 9º e disseram-me que tem tão poucas vagas que nem valia a pena tentar. E eu sei que turmas na Vale de Milhaços estão no limite de alunos. Olhe, vão ter de pegar numa turma já no limite e inventar lugares e quem sabe inventar mesas e cadeiras, que a gente sabe que as escolas muitas vezes também não fazem mais porque não podem”, lamenta Pedro Lopes.

Iris ainda não sabe, portanto, qual vai ser a sua turma, mas sabe que agora já pode tratar dos manuais e comprar o material escolar necessário para os próximos nove meses.

Fonte: CNN Portugal por indicação de Livresco

quinta-feira, 14 de setembro de 2023

A criança com deficiência que vai à escola pela primeira vez

Esta semana, milhares de crianças entram pela primeira vez numa sala de aula. Chegam a um espaço novo, com regras e pessoas diferentes, que constitui um amplo território de possibilidades e desafios. Muitos desses alunos possuem algum tipo de deficiência.

Se o meu filho não fala, como vai explicar que tem sede? Se a minha neta não caminha, como vai brincar com os outros meninos no pátio? Se a minha enteada tem medo, como poderá comunicar às assistentes as próprias emoções? Será que a diferença funcional da minha criança será explicada à turma, facilitando a integração e evitando estigmas? O coração de um cuidador pode estreitar-se e ficar tão compacto como um grão de milho.

Num discurso proferido em 1981, a escritora Toni Morrison (https://www.publico.pt/2019/08/06/culturaipsilon/noticia/morreu-escritora-toni-morrison-cronista-america-negra-premio-nobel-literatura-1882537) fez o elogio das narrativas que só alguns estão em posição de elaborar. “Se existe um livro que queiras muito ler, mas que ainda não esteja escrito, então tens de escrevê-lo”, disse no Conselho de Artes de Ohio, nos Estados Unidos, a primeira autora negra a ganhar o Nobel da Literatura.

Tânia Vargas é mãe de um menino autista com duas síndromes raras e incuráveis: a osteogénese imperfeita (também conhecida como doença dos ossos de vidro) e síndrome de Ehlers-Danlos. Escreveu o livro infantil O Pardalito Gonçalinho (https://www.amazon.com/Pardalito-Gon%C3%A7alinho-Portuguese-T%C3%A2nia-Vargas/dp/B0BSJBWWXT) (2022) precisamente para incorporar a experiência do filho numa história que promovesse a inclusão. Nesta publicação independente, com ilustrações de Vanessa Ribeiro, parte-se de condições médicas ou neurológicas muito específicas para chegar a um território mais amplo, que é o da deficiência na infância.

Marta Soares é mãe da Matilde, uma menina cujo diagnóstico ainda não está fechado (apesar dos múltiplos esforços dos médicos e da família). Acaba de publicar, também de forma independente, A Primeira Aula (https://www.amazon.co.uk/primeira-aulaMarta-Soares/dp/B0CDNPTTTB), com ilustrações de Catarina Rodrigues. A obra aborda diversas questões — naturais e legítimas — que as crianças fazem em relação à diferença dos seus pares. Valida a curiosidade, dissolve o constrangimento e adianta respostas que facilitam o entendimento mútuo. A apresentação do livro (https://www.instagram.com/p/Cw5xmFmsfE9/) está agendada para a tarde deste sábado, dia 16 de Setembro, no Centro de Desenvolvimento Deslocar Palavras, no Barreiro, em duas sessões.

A criança que eu fui não leu livros com personagens com deficiência. Hoje não faltam títulos sobre o tema. E, quando não existem textos sobre condições específicas, as novas plataformas de publicação facilitam que sejam escritos e partilhados. É um motivo de contentamento.

A representação das crianças com deficiência nos produtos culturais ocupa um papel significativo no desenvolvimento infantil. Isto porque ajuda os pequenos leitores a compreender melhor a realidade que os rodeia, oferecendo-lhes a oportunidade de cultivar a empatia e o respeito pelas diferenças, sejam elas físicas, funcionais, religiosas ou culturais. Gosto de pensar que esta multiplicidade de narrativas pode ajudar a tornar o primeiro contacto com a escola mais rico e seguro.

Andréia Azevedo Soares

Fonte: Público

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

Webinar: O Direito a SER nas Escolas – Uma Escola Inclusiva, Uma Escola de Bem-estar!

A Direção-Geral da Educação e a Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género vão promover no dia 27 de setembro, entre as 17h30 e as 18h30, um webinar de divulgação e exploração do guia “O Direito a Ser nas Escolas”, orientações destinadas a pessoal docente e não docente com vista a uma Escola mais inclusiva que foi publicado no final do mês de junho.

Todas as crianças e jovens têm direito à educação, o que requer, necessariamente, que se sintam em segurança e em proteção nos espaços educativos que frequentam.

Enquanto elementos fundamentais para uma cultura inclusiva nas escolas, os e as profissionais de educação, necessitam de conhecimentos e competências profissionais que lhes permitam compreender, tomar decisões e intervir junto de toda a comunidade educativa, de modo a prevenir situações de discriminação e violência, bem como encontrar respostas adequadas e fundamentadas para os problemas que se colocam no dia a dia da vida em meio escolar. Só assim assegurarão a proteção e garantia dos direitos humanos de todas as pessoas, em particular das crianças e jovens, nesse contexto.

Neste sentido, afigura-se como estrutural capacitar/formar o pessoal docente sobre o conhecimento da legislação em vigor e a sua aplicação prática, assim como sobre formas de prevenção e atuação perante situações de discriminação ou violência (física, verbal, psicológica, sexual, presencial ou digital), de modo que garantam o respeito pelos princípios da igualdade e da não discriminação, em contexto escolar.

Para assistir, inscrição obrigatória e gratuita AQUI.

Nota: A participação neste webinar não pressupõe a emissão de certificado/declaração de participação, nem o envio de documentação.

Fonte: CIG por indicação de Livresco

segunda-feira, 11 de setembro de 2023

A mais bela profissão do mundo

Reinício do ano lectivo, tempo de examinar as doenças da escola e sondar o mal-estar dos professores. Um jornal, com vocação crítica desde o seu nascimento, fala da “crise dos professores” e analisa as causas do desinteresse pela “mais bela profissão do mundo”. As aspas, não sou eu que as coloco por estar a citar o dito jornal; é o jornal que se encarrega, através das aspas, de dizer que está a citar uma frase que nos foi transmitida pela tradição. Mas neste caso as aspas também significam outra coisa: que a expressão já não pode ser dita sem recuo, e só um ingénuo ousaria repeti-la sem aspas. A “mais bela profissão do mundo”, é dito logo no início do artigo, deixou de ser interessante e, por isso, atrai cada vez menos candidatos e provoca cada vez mais o abandono dos que nela entraram, por causa de condições de trabalho cada vez mais difíceis e uma remuneração pouco atractiva.

O jornal em questão não é português, é francês, chama-se Libération e analisa o estado da “Éducation nationale”, o mito republicano por excelência. Mas também podia ser um jornal português (https://www.publico.pt/2018/10/20/sociedade/entrevista/professores-sao-vitimas-organizacao-trabalho-1848122), espanhol, italiano, alemão (sim, até a escola alemã se debate com uma imensa falta de professores e uma degradação das condições de trabalho que leva muitos a abandoná-la). A escola, a mais bela instituição do mundo (sem aspas), ainda que as suas práticas tenham sido tantas vezes criminosas, perdeu os atractivos da beleza e ganhou a imagem de um cúmulo de deficiências e problemas.

Como toda a gente passou pela escola, toda a gente tem qualquer coisa a dizer sobre ela. Mas em Portugal ninguém sabe muito bem o que se passa no seu interior, é tudo exterior. Há pouco tempo, um estudante italiano, tendo concluído o exame de maturità que dá acesso à Universidade, escreveu um testemunho cruel da sua experiência, publicado num jornal. Por cá, estamos a precisar deste tipo de testemunhos, tal como precisamos de um discurso dos professores mais analítico, não exclusivamente centrado sobre questões sindicais e as condições pragmáticas de trabalho (por mais legítimo que seja este discurso, ele é insuficiente). (...)

António Guerreiro

Fonte: Continuação da notícia em Público