quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Uma escola nova a cada ano letivo

No início de mais um ano letivo, muitos professores preparam-se para o regresso às aulas e, para muitos, será também a chegada a uma escola nova. Este fenómeno da rotação de professores e consequente instabilidade é comum no Sistema de Ensino português. Considerando o período entre 2007 e 2018, em média, por agrupamento de escolas públicas, a percentagem de professores novos em cada ano letivo flutuou entre os 20% e os 30%. No ano letivo 2017/18, em 90% dos agrupamentos, mais de 20% dos professores eram novos nestes mesmos agrupamentos. Esta rotação é mais prevalente entre os professores contratados, tendo picos para os professores de quadro nos anos de concurso interno, ou seja, quando os professores de quadro podem concorrer a outras escolas. O sistema tem uma enorme dança de cadeiras e estes números espelham bem a instabilidade para escolas e professores.

Esta rotação não é indiferente para os resultados das escolas. Apesar de não haver uma medição do impacto que tal pode ter nas aprendizagens no caso português, noutros Sistemas de Ensino, como o inglês ou americano, foi possível mostrar que a excessiva rotação de professores tem um impacto negativo sobre os resultados dos alunos. Tal resulta essencialmente da perda de professores que estavam mais habituados a lecionar no contexto específico de cada escola.

Mas esta rotação não é igual para todas escolas, sendo que são aquelas que estão enquadradas em meios socioecónomicos mais desfavorecidos que veem uma maior mudança dos seus professores de um ano letivo para outro. Senão vejamos, se medirmos a composição social da escola através da percentagem de mães que têm Ensino Superior, podemos verificar que esta está correlacionada com o nível de rotação do corpo docente. Entre 2007 e 2018, nas 10% de escolas com maior concentração de mães com o Ensino Superior, em média, em cada ano, a percentagem de novos professores é de 22%. No sentido contrário, as 10% de escolas com menor concentração de mães com o Ensino Superior teve uma rotação média no mesmo período de 27%. Contudo, quando nos focamos nos anos em que existiu concurso interno de professores, ou seja, anos em que os professores de quadro de escola puderam mudar de agrupamento, esta diferença entre os dois tipos de escola aumenta - 27% vs. 37%. Encontramos diferenciais semelhantes na rotatividade de professores, quando comparamos escolas considerando com maior ou menor concentração de alunos com Ação Social Escolar ou onde a média dos resultados dos alunos nas provas de final de ciclo é mais alta ou mais baixa. Ou seja, a rotatividade não é igual em todas as escolas, sinalizando que os professores têm poucos incentivos para permanecer em escolas de contextos menos favoráveis ao desenvolvimento das aprendizagens.

É hoje claro nos estudos quantitativos dos determinantes do sucesso escolar dos alunos que, apesar da enorme condicionante dos fatores familiares, é o professor que, dentro da escola, mais pesa nos resultados destes alunos. Neste sentido, devemos interrogar-nos que incentivos existem hoje para que os professores desejem permanecer em escolas com contextos sociais mais desfavoráveis. A verdade é que estes incentivos pouco existem. Em termos pecuniários, de salário, de estabilidade ou progressão na carreira, as características da escola onde se leciona não tem qualquer influencia. Igualmente, quando falamos da indução de novos professores, ou seja, na capacidade de integrar os professores quando mudam de escola, devemos interrogar-nos se esta indução existe verdadeiramente em muitas escolas. Em particular, em contextos mais difíceis falta uma integração e acompanhamento feito em proximidade entre os professores mais antigos e aqueles que estão a chegar à escola e que possa dar os incentivos e o apoio necessário a quem chega pela primeira vez.

Num momento em que discutimos a revisão do modelo de recrutamento de professores, estes mecanismos de incentivo e de apoio devem ser ponderados e criados por forma a que no início de cada ano letivo as escolas enfrentem um corpo docente mais estável, sobretudo naquelas onde esta estabilidade é ainda mais necessária.

Pedro Freitas

Fonte: DN

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