quinta-feira, 12 de novembro de 2015

Boas notas em pó

Nos Estados Unidos, é prática comum os miúdos tomarem medicamentos que ajudam à concentração. A pressão da imensa competição e a necessidade de terem notas que lhes permitam chegar às melhores universidades deram gás ao consumo deste tipo de substâncias, que são amplamente receitadas pelos médicos - mais de 40% dos estudantes até aos 19 anos admitem tomá-las. 
Estamos a falar de 21 milhões de prescrições por ano de medicamentos originalmente usados para acalmar crianças hiperativas mas que são receitados a miúdos a partir dos 10 anos, sem problemas, para ajudá-los a concentrar-se, a memorizar, a aumentar a energia e a resistência, por exemplo, em períodos de exames. 
Depois de experimentarem os benefícios competitivos a curto prazo, é difícil convencer os estudantes de que devem fazer o esforço sem aquela ajuda extra, razão pela qual começou a generalizar-se também o tráfico de comprimidos nas escolas americanas. Quem não consegue uma receita do médico facilmente arranja quem lhe passe um par de cápsulas a troco de qualquer vantagem. E é aqui que a coisa azeda ainda mais: sem controlo e muitas vezes sem que os pais saibam destes negócios, torna-se demasiado fácil os miúdos comprarem - e tomarem - gato por lebre. E nem sempre são simples pílulas de açúcar. 
O problema dos medicamentos para a concentração não é um exclusivo dos Estados Unidos. No primeiro estudo feito em Portugal sobre o consumo deste tipo de substâncias, no ano passado, concluiu-se que um quarto dos jovens entre os 18 e os 29 anos já os tomaram. O inquérito do INE ontem divulgado reforça essa tendência: mais de 26% dos jovens entre os 15 e os 24 anos tomam habitualmente remédios não prescritos, sendo sobretudo analgésicos, anti-inflamatórios e suplementos para a ansiedade e a concentração. Números que preocupam, ainda mais quando o próprio bastonário dos Médicos alerta para o facto de não haver bases científicas que atestem a eficácia destas substâncias nem testes que esclareçam sobre todos os efeitos que tomá-las pode ter. O caso americano devia servir-nos de exemplo - para o que não deve ser feito. Ainda vamos a tempo de travar.

Joana Petiz

Fonte: DN

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