Os diretores escolares apelam ao Governo para que reforce as equipas de psicologia nas escolas onde há mais casos de violência, salientando que o aumento de criminalidade esconde muitas vezes histórias de crianças negligenciadas pelas famílias.
O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2024 revela um aumento de crimes nas escolas: No ano letivo de 2023/2024, as forças de segurança registaram 5.747 ocorrências de natureza criminal, o valor mais elevado da última década.
“Estes números refletem aquilo que se passa cá fora na sociedade. As pessoas estão muito mais agressivas e impulsivas”, defendeu o presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas, Filinto Lima, em declarações à Lusa.
Nas escolas, professores e funcionários notam que os alunos já “não resistem a uma resposta negativa, partem logo para a agressão e acabam por tentar resolver um problema criando outro”, contou Filinto Lima, que também está à frente de um agrupamento em Vila Nova de Gaia.
Filinto Lima diz que estes casos acontecem maioritariamente “nos grandes centros urbanos, também há relatos de violência em sítios mais pequenos“.
É nas escolas dos distritos de Lisboa e Porto que se regista a maioria das ocorrências, mas também há centenas de casos em Setúbal, Aveiro, Faro, Braga, Leiria ou Santarém, segundo o RASI, que revela que quase metade dos crimes são agressões físicas (2.249), mas também houve quase mil furtos, 171 ofensas sexuais, 117 roubos e 76 ocorrências por posse ou uso de arma.
As agressões acontecem quase sempre entre alunos, mas também há casos em que os professores e restantes funcionários se tornam vítimas dos alunos, contou Filinto Lima.
As escolas contam com serviços de psicologia e são os psicólogos e mediadores sociais quem, muitas vezes, sinalizam as crianças e jovens em risco. Nos casos mais graves, são encaminhados para os centros de saúde ou hospitais.
Mas Filinto Lima alertou que há “muitas escolas que necessitam de ver os seus quadros de psicologia reforçados” e por isso apelou ao Ministério da Educação para que faça um levantamento para perceber “onde colocar mais técnicos especializados para dar resposta a estas questões e tentar conter este escalar de agressividade e violência”.
Os técnicos que trabalham as competências emocionais dos alunos encontram, invariavelmente, crianças e jovens que “estão ao deus-dará”: “Temos muitos alunos cujos pais não se interessam pela vida deles nem pela escola. Temos pais de alunos que nunca vimos. São alunos que estão abandonados, estão ao deus-dará”, lamentou o diretor do Agrupamento de Escolas Dr. Costa Matos.
Os dados do RASI foram registados pela PSP e pela GNR e, no âmbito do Programa Escola Segura, as forças de segurança fizeram no último ano letivo mais de 25 mil ações de prevenção nas escolas, que abrangeram mais de um milhão de alunos.
Governo garante que as escolas continuam a ser seguras
Apesar dos pedidos realizados pelas escolas para reforçar as equipas de psicologia nas escolas onde há mais casos de violência, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação garantiu esta terça-feira que as escolas continuam a ser locais seguros, ainda que a criminalidade nos estabelecimentos de ensino ser o mais alto dos últimos 10 anos.
“Tínhamos essas tendências já nos últimos anos e tem vindo, de facto, a aumentar. De qualquer maneira, as nossas escolas continuam a ser muito seguras. É preciso dizer que partimos de valores muito baixos”, justificou Fernando Alexandre.
O ministro reforçou que as situações “são localizadas” e a “maior parte das escolas públicas são seguras”, pelo que “as famílias podem estar tranquilas”. No entanto, a tutela está a tomar medidas para fazer face ao crescimento da criminalidade entre os mais jovens, através de uma articulação com os municípios.
Segundo Fernando Alexandre, a “Escola Segura” da PSP, “tem um papel muito importante”, mas também “a relação das autarquias com as forças de segurança, que conhecem a realidade local” e o que “se passa fora do próprio espaço escolar”.
Questionado sobre a falta de assistentes operacionais, com várias ocorrências a verificarem-se dentro das escolas, o ministro admitiu que o “rácio dos assistentes operacionais tem de ser revisto”, informando que está a decorrer um estudo articulado com a Associação Nacional de Municípios.
“Mais uma vez, estamos a falar de uma área que é da responsabilidade dos municípios, mas que não diminui a responsabilidade do Governo. Ou seja, a segurança nas escolas e as condições de trabalho são em todo o território nacional da responsabilidade do Governo. Não haja dúvidas sobre isso”, insistiu. No entanto, a descentralização está relacionada com a “atribuição para desempenhar as funções”.
“Temos um plano que está pronto para termos uma reorganização do espaço escolar, onde o pessoal não docente tem de ser afeto a tarefas educativas com um perfil especial, com uma formação adequada, o que neste momento não acontece”, informou.
Sobre a nova linguagem que é usada nas redes sociais pelos mais jovens, Fernando Alexandre apelou a uma supervisão dos pais, assumindo, contudo, que o ministério mudou a política dos smartphones, ao recomendar a sua proibição nos 1.º e 2.º ciclos, restrições no 3.º ciclo e “orientações para o seu uso no secundário”.
Este foi um “passo no sentido de alertar para os riscos que a utilização dos smartphones e das suas aplicações podem ter para as crianças”.
Fizemos também o grupo de trabalho de cyberbullying, que já fez um conjunto de recomendações”. Temos, obviamente, de reforçar a área dos psicólogos”, apontou, ao revelar que não é a favor da proibição. “Não podemos proibir as redes sociais numa área da digitalização. A proibição do uso dos smartphones até, por exemplo, ao 12º ano, como alguns países fizeram, não concordo. Temos é de ter uma cultura educativa, saber qual é a melhor forma de selecionar informação e de saber usar o telemóvel”, aconselhou.
As ocorrências de natureza criminal nas escolas aumentaram 6,8% no ano letivo de 2023/2024, sendo este o número mais elevado dos últimos 10 anos, indica o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI).
De acordo com o RASI de 2024, a que a Lusa teve acesso, as forças de segurança registaram um total de 7.128 comunicações, das quais 5.747 foram de natureza criminal. Os números relacionados com a parte criminal têm vindo a aumentar significativamente desde o período da pandemia, que corresponde ao ano letivo de 2022/2021. Há 10 anos, no ano letivo de 2014/2015, o número de ocorrências de natureza criminal foi de 4.768, abaixo dos valores registados no último ano letivo.
O RASI detalha que a maioria dos episódios aconteceu dentro dos recintos escolares e destaca ainda os crimes de ofensas à integridade física, com 2.249 ocorrências, furtos, com cerca de 1.000, ofensas sexuais, com 171 ocorrências, e roubos, com 117. Há também a registar 76 ocorrências por posse ou uso de arma.
Fonte: Observador por indicação de Livresco
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