terça-feira, 8 de janeiro de 2019

Desafios e oportunidades. Melhores desempenhos, professores experientes, e um país que investe na Educação


Um relatório da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico dedica duas partes ao sistema de ensino português e à utilização de recursos escolares em Portugal. É um documento exaustivo que toma o pulso à realidade do país e que não esquece a sua História, o tempo da ditadura em que a Educação não era prioridade, a revolução de Abril que trouxe a democracia e a vontade de escolarizar a população, a recente crise económica neste século que estancou gastos e reduziu o orçamento das famílias. O estudo da OCDE cruza realidades, números, dados, investimentos, políticas, prioridades, para realçar melhorias, sublinhar oportunidades, comparar, fazer reparos.

Nos últimos 20 anos, as oportunidades de aprendizagem para os alunos portugueses melhoraram, o que se reflete a vários níveis. “A frequência da escola é atualmente quase universal, as taxas de abandono escolar diminuíram drasticamente e os alunos de 15 anos têm agora um desempenho igual ou superior ao da OCDE nos testes de Matemática, Leitura e Ciências”, lê-se no relatório. Os progressos nos testes PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos não passaram despercebidos à OCDE. Uma média de 474 em 2006 que subiu para 501 em 2015, que nenhum outro país da OCDE atingiu nesse período, a maior subida de desempenho em Ciências, e uma média de Matemática que aumentou de 442 em 1995 para 541 em 2015, são relembradas, realçadas e valorizadas. 

Apesar da evolução num país que dedica 5,1% do seu PIB à Educação, superior à média da OCDE, há desafios. O abandono escolar tem vindo a diminuir, mas, ainda assim, é preocupante. “Treze por cento dos estudantes portugueses abandonam a escola antes de concluírem o Ensino Secundário. O desempenho escolar e a conclusão da escolaridade estão fortemente ligados à situação socioeconómica dos alunos, e as crianças provenientes de várias comunidades em Portugal têm resultados académicos significativamente piores do que os seus pares”. Há levantamentos, estudos, pesquisas, que sistematicamente mostram que a condição económica das famílias tem reflexos no desempenho escolar e que há um desequilíbrio entre as zonas urbanas e as áreas mais afastadas da urbanidade.  

O abandono escolar desceu de 28,3% em 2010 para 12,7% em 2017. A lei da escolaridade obrigatória de 12 anos terá ajudado a travar a saída da escola antes do tempo. Por outro lado, as retenções são altas. Trinta e quatro por cento dos alunos de 15 anos repetiram o ano pelo menos uma vez. A taxa de repetição vai variando de nível de ensino e de região. Em 2016, a taxa de repetição do 1.º ciclo do Ensino Básico era de 3,7%, no 2.º ciclo de 6,7%, no 3.º ciclo de 10%, e no Secundário de 15,7%. Taxas mais elevadas em Lisboa e no Sul do que no Norte e no Centro. Sabe-se também que as probabilidades de um aluno ter um baixo desempenho em Ciências é três vezes superior se pertencer a uma família com dificuldades económicas. 

Experientes, qualificados, bem remunerados 
O relatório da OCDE dá nota da centralização portuguesa e refere que a “maior parte das decisões estratégias são executadas pelo poder central”. E a Educação não é exceção. As decisões de contratação e distribuição dos recursos humanos pelas escolas, os salários dos professores, os orçamentos, estão nas mãos da administração central. No entanto, o país está num processo de descentralização, numa passagem gradual de competências e a OCDE recorda, a propósito, os contratos de autonomia, o projeto de autonomia e flexibilização curricular, o projeto-piloto com 14 municípios. De qualquer forma, a contratação e os salários dos professores do sistema de ensino público não saem das mãos do Governo. 

A OCDE lembra que 90% do orçamento para o setor educativo vai para os recursos humanos, uma percentagem acima da média da OCDE, de 78%, que em 2015 o rácio era de um professor para 10 alunos, e que, em 2013, 15% dos docentes tinham um contrato temporário anual, 75% estavam no quadro, e 10% com contrato a termo por mais de um ano. O envelhecimento da classe também entra no relatório. O típico professor do 1.º ciclo tem 46 anos, o do 2.º ciclo tem 49, o do 3.º ciclo e Secundário 48. Apenas 1% dos professores portugueses no ativo têm menos de 30 anos. A OCDE sugere regras de aposentação flexíveis sem penalizações “para que professores mais velhos pudessem abandonar uma carreira cognitiva e fisicamente desgastante de uma maneira digna”. E sugere também alterações nas tabelas salariais para que os primeiros anos da profissão sejam mais bem pagos e os aumentos ao longo da carreira sejam menores. 

O relatório faz um alerta: “Os professores portugueses não se sentem valorizados pela sociedade”. A OCDE sublinha que os docentes portugueses são experientes, altamente qualificados, bem remunerados - podem receber 1,3 vezes mais do que outro trabalhador com formação superior. Reconhece que o sistema de colocação dos professores nas escolas é transparente, mas aconselha a rever este processo. Até porque, sustenta, as escolas “têm uma capacidade limitada de expressar as suas preferências por um candidato específico” e os professores pouca liberdade para escolher um determinado estabelecimento de ensino. Por isso, as necessidades das escolas e os interesses dos professores andam desfasados. 

Os professores estão interessados no seu desenvolvimento profissional em várias áreas, nomeadamente na de alunos com necessidades especiais, no ensino multicultural, na gestão e administração escolares. Usam técnicas e práticas que adaptam a diversas realidades, o que não é muito comum noutros países, e têm tempo no horário para formações, para o seu desenvolvimento profissional. Mesmo assim, a OCDE faz algumas observações. “Apesar de uma forte capacidade, de apoios estruturais e de um sistema que permite uma rigorosa profissionalização da carreira, o sistema português ainda não maximiza o potencial dos seus professores e dos líderes nas escolas”. 

Diagnóstico feito, a OCDE avança com algumas sugestões. Recomenda, por exemplo, que se aposte na avaliação dos docentes e que as aulas sejam mais observadas. Recomenda uma maior transparência, prestação de contas e avaliação do financiamento da educação escolar, bem como alargar a autonomia das escolas, monitorizar a descentralização, acompanhar este processo. “Integrar a descentralização da gestão escolar no alargamento da autonomia das escolas. Isso pode incluir atribuir responsabilidade aos municípios por todos os assuntos operacionais, responsabilidade às escolas por recursos financeiros e humanos diretamente relacionados com o ensino e a aprendizagem, e responsabilidade ao governo central por capacitar as instituições locais”. 

“O estudo analisa a situação do sistema educativo, com base em dados estatísticos de 2015/2016, tendo sido desenvolvido já num período de reinvestimento gradual na escola pública, num movimento iniciado em 2016, após vários anos de políticas de austeridade”, refere, em comunicado, o Ministério da Educação que sublinha os passos que foram e estão a ser dados. Como a abertura de um novo ciclo de recrutamento e progressão de professores que, realça, “se deverá acentuar nos próximos anos, nomeadamente tendo em conta a aposentação de uma parte considerável do corpo docente e o restabelecimento das condições de progressão na carreira”. 

A tutela recorda as “políticas e programas de médio e longo alcance que têm ampliado o acesso, a qualidade e a equidade do sistema educativo, através de novos modelos em que as escolas, os professores e os alunos são os protagonistas”. E destaca ainda o desenvolvimento de uma fórmula de financiamento, pelo Instituto de Gestão Financeira da Educação, “de acordo com as características e necessidades de cada escola”.

Fonte: Educare por indicação de Livresco

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