sexta-feira, 30 de abril de 2021

Participação e envolvimento das famílias - construção de parcerias em contextos de educação de infância


A implementação das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, 2016, permitiu perceber a necessidade de elaborar materiais de apoio, entre os quais a conceção e publicação de brochuras.

Pretende-se que estas brochuras assumam uma perspetiva holística e articulada do currículo e contribuam para o desenvolvimento profissional dos educadores de infância e para a melhoria da sua prática educativa.

Reconhecendo-se a importância do envolvimento das famílias na educação dos seus filhos, é fundamental que, na educação pré-escolar, se promova a sua participação e se estabeleça uma estreita cooperação com os contextos familiares das crianças.

É nesse sentido que a Direção-Geral da Educação elaborou e disponibiliza a brochura Participação e envolvimento das famílias - construção de parcerias em contextos de educação de infância.

Fonte: DGE

quinta-feira, 29 de abril de 2021

Planear e avaliar na educação pré-escolar


No processo de implementação das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar (OCEPE), 2016, foi possível perceber a necessidade de elaborar materiais de apoio, entre os quais a conceção e publicação de brochuras. Pretende-se que estas brochuras assumam uma perspetiva holística e articulada do currículo e contribuam para o desenvolvimento profissional dos educadores de infância e para a melhoria da sua prática educativa.

Conforme referem as OCEPE, cabe ao/à educador/a de infância a construção e a gestão do currículo, o que implica observar, registar e documentar o que vai sendo realizado como suporte para o planeamento e a avaliação.

Considerando a relevância deste processo e as dificuldades mais frequentemente sentidas na ação educativa, a Direção-Geral da Educação elaborou e disponibiliza a brochura Planear e avaliar na educação pré-escolar.

Fonte: DGE

terça-feira, 27 de abril de 2021

“À Conversa sobre a acessibilidade digital"

O Instituto Nacional para a Reabilitação realiza o webinar “À Conversa sobre... a acessibilidade digital”, no próximo dia 29 de abril, quinta-feira, entre as 16h30 e as 18h00, no canal de YouTube do INR.

Esta sessão, inserida no ciclo de eventos online "À Conversa sobre...", destina-se a organismos da administração pública, central e local (Câmaras Municipais), responsáveis e técnicos de ONGPD, parceiros do INR, empresas, professores e alunos do ensino superior, secundário, profissional, ensino multimédia, sociedade civil e outros.

O webinar "À conversa sobre... a acessibilidade digital" tem como objetivos:
  • Partilhar a regulamentação relativa aos requisitos de acessibilidade dos sítios web e das aplicações móveis de organismos públicos;
  • Refletir sobre a sua operacionalização, visando sensibilizar para a importância de tornar mais acessíveis a todos, em especial a pessoas com deficiência, os sites da Internet e aplicações móveis do setor público;
  • Apresentar boas práticas de acessibilidade, em diferentes contextos, designadamente academia e empresas.
Para mais informação sobre os requisitos de acessibilidade dos sítios web e das aplicações móveis de organismos públicos, consulte o Decreto-Lei nº. 83/2018, de 19 de outubro.
No dia do evento, às 16h30, basta clicar no canal de YouTube do INR e aguardar a emissão. Não necessita de inscrição.

Consulte o aqui o programa e participe!

Fonte: INR

segunda-feira, 26 de abril de 2021

E se a hiperatividade e o défice de atenção infantil estiverem ligados à saúde do intestino?

Chamam-lhe “segundo cérebro” e compreende-se porquê: na última década, a comunidade científica tem vindo a reconhecer que os três mil milhões de bactérias que habitam no trato intestinal – o microbioma – influenciam o desenvolvimento do sistema imunitário e produzem neuroquímicos essenciais ao funcionamento cerebral. A cabeça e o intestino comunicam entre si através de uma rede complexa de neurónios e neurotransmissores – sistema nervoso entérico – e, embora pouco se saiba sobre estes mecanismos, os cientistas têm vindo a notar uma associação entre processos inflamatórios do intestino taxas mais elevadas de problemas neuropsiquiátricos (doença bipolar, autismo e esquizofrenia, por exemplo). Estudos realizados pela equipa do fisiologista americano Christopher Lowry, divulgados no tema de capa da edição da revista Monitor on Psychology, demonstraram que injetar bactérias benéficas (anti-inflamatórias) no intestino de ratos sujeitos a condições de stresse não só reduzia os níveis de medo e ansiedade na exploração do ambiente como prevenia colites induzidas pelo stresse.

Extrapolar estas conclusões para os humanos, admitindo que as alterações do foro mental podem ser resolvidas com terapias à base de “bactérias boas” e dietas específicas é excessivo e prematuro, mas o interesse pelo tema está a conquistar a comunidade científica e os profissionais de saúde, cada vez mais confrontados com a crescente oferta de suplementos e programas alimentares (caso da Gut And Psychology Syndrome ou GAPS) como resposta a problemas alérgicos e perturbações do desenvolvimento infantil, incluindo as dificuldades de aprendizagem e a perturbação de hiperatividade e défice de atenção (PHDA), sem consenso científico quanto à sua eficácia.

PHDA: Uma condição pouco compreendida

Joana Santos tem dois filhos, com 11 e sete anos, mas apenas a mais nova tem o diagnóstico de PHDA. “Tinha cinco anos quando a educadora do pré-escolar reparou que alguma coisa não estava bem com a nossa filha, era pouco atenta, caía da cadeira, tinha dificuldades no desenho e na caligrafia”, conta. “Em casa, era muito impulsiva e reagia de forma descontrolada, algo que se confundia com mau comportamento mas era, como se confirmou depois, uma doença.” Saber isso tranquilizou a família e possibilitou um rumo diferente, que implicou a prescrição de fármacos (estimulantes do sistema nervoso central da família das anfetaminas) e acompanhamento específico. “A medicação fez toda a diferença, sobretudo durante o tempo em que as aulas foram dadas à distância”, reconhece a mãe. A criança voltou ao sistema presencial e tem terapia semanal com uma psicopedagoga para as dificuldades de aprendizagem e é uma das participantes do Projeto M2Child a decorrer na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP).

Joana Santos tomou conhecimento deste estudo através das redes sociais e achou que valia a pena fazer parte das famílias que estão a aderir ao estudo, que foi distinguido com uma bolsa da Sociedade de Pediatria do Neurodesenvolvimento. “Acredito que, deste modo, estou a contribuir para que estas crianças sejam melhor compreendidas”, conclui.

Os segredos do microbioma

No estudo está prevista uma amostra de 110 crianças, com idades entre os cinco e os dez anos, e dois grupos (crianças com PHDA e sem perturbações no neurodesenvolvimento), que tanto podem chegar através das consultas dos serviços de saúde como da comunidade. “Trata-se de um projeto inovador, que envolve avaliação funcional e neuropsicológica e da realização de análises gerais e específicas do microbioma”, esclarece a pediatra Micaela Guardiano, coordenadora do departamento de Neurodesenvolvimento do Hospital de São João, no Porto.

Consciente de que “não existem meta-análises com respostas claras sobre a eficácia, ou a vantagem, de abordagens que implicam dietas ou suplementos específicos”, a clínica vê neste estudo uma oportunidade para “apurar se existe uma correlação entre o perfil neuropsicológico das crianças e aquilo que se passa no seu intestino”, ou seja, com as biomoléculas envolvidas na inflamação e na regulação do sistema nervoso, tendo em mente novas abordagens de modulação do microbioma.

Com uma prevalência estimada de cinco a sete por cento nas crianças e nos adolescentes (até aos 18 anos), esta perturbação do neurodesenvolvimento nem sempre requer medicação. Ela só faz sentido nos casos em que há sintomas moderados ou severos e que não respondem a outras terapias. “Nos casos ligeiros, passam pela intervenção psicológica para o treino de comportamentos, que inclui apoio parental, rotinas de sono, exercício físico e estratégias psicopedagógicas na escola”, observa Micaela Guardiano, referindo como exemplo “colocar a criança mais próxima do professor ou dar-lhe tarefas para que não esteja tanto tempo sentada”.

Encontrar respostas

Joana Gomes começou por estudar microbiologia e doenças infecciosas, esteve profissionalmente ligada à área da dor e acabou por dedicar-se às neurociências. Um desvio que teve na base um acontecimento de vida: “Tenho um filho com nove anos, diagnosticado com esta patologia e queria perceber melhor o que havia nessa área.” Hoje, a neurocientista e professora no departamento de Biomedicina da FMUP é coordenadora do Projeto M2Child, que está a ser feito em colaboração com o i3S – Instituto de Investigação e Inovação em Saúde. “As famílias que têm chegado a nós esbarram com preconceitos e falta de respostas; aqui encontram alguém que se interessa pelas suas angústias e tenta ver o problema com outros olhos”, faz saber.

A avaliação dos dados recolhidos está prevista para setembro, mas independentemente dos resultados do estudo, a investigadora sublinha o facto de ele se alinhar com o que se faz lá fora e que assenta nesta hipótese: “A desregulação do microbioma pode traduzir-se na libertação de moléculas que interferem com o funcionamento do sistema imunitário que, por sua vez, altera os neurotransmissores responsáveis pela comunicação entre os neurónios.”

No plano internacional existem trabalhos com resultados promissores (caso da terapia fágica, em que se introduzem vírus que infetam e modulam as populações de bactérias no organismo) na regulação do microbioma e a possível associação a problemas de saúde mental, mas no caso da PHDA “ainda há muito pouca coisa descrita”. Nesse sentido, a pesquisa visa “estudar os metabolitos libertados pelos microorganismos do intestino e cruzar essa informação com a avaliação clínica das crianças” e explorar os mecanismos de uma perturbação “mais prevalente nos rapazes e subdiagnosticada nas meninas, por não terem tanta impulsividade, sendo mais visível o défice de atenção”.

Quanto às mudanças alimentares, cientistas e clínicos carecem de estudos seguros para dar luz verde, por exemplo, a dietas isentas de glúten e caseína (das bebidas lácteas) ou ao consumo de prebióticos (moléculas que estimulam o crescimento de bactérias boas), probióticos (bactérias vivas que facilitam a digestão e se encontram nos alimentos fermentados) e afins. “É complicado, porque apenas se pode dizer que mal não fazem.” Talvez num futuro próximo se venha a saber mais sobre os mecanismos do “segundo cérebro” e novas combinações, comprovadamente eficazes, que o tornem um aliado na promoção da saúde mental.

Fonte: Visão

domingo, 25 de abril de 2021

Borderline: as emoções à solta e a fazerem o que querem do corpo

No primeiro ano da primária, as diferenças entre Raquel e os seus colegas cimentaram-se: aborrecia-se facilmente com as brincadeiras do recreio, e procurava sempre “desafios maiores”, explica a jovem, que aos três anos já sabia ler. Não tardou até os pais descobrirem que era uma criança sobredotada. “Foi o diagnóstico inicial, mas o que se passava comigo ia muito além disso”, explica Raquel Moreiras, agora com 21 anos.

Embora fosse uma criança “extrovertida” e num frenesim de actividades — tocava clarinete, fazia teatro, participava em projectos como o Parlamento Jovem —, os ataques de pânico e de ansiedade foram-se tornando constantes. Sem perceber como nem porquê, aos 12 anos vivia uma depressão profunda que a impedia de sair da cama ou ir às aulas, e que desencadeava episódios de automutilação — e uma tentativa de suicídio. “A adolescência foi passada num sítio escuro. Como era muito nova, não percebia o que estava a acontecer”, diz Raquel.

Quando terminou o secundário, deixou os Açores para estudar na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na altura, o psiquiatra que a acompanhou durante a adolescência redigiu uma carta que Raquel deveria fazer chegar ao profissional de saúde que a fosse seguir em Lisboa. “Num momento de impulsividade, decidi abrir a carta. Estava à espera de ler que sempre tive depressão ou ansiedade, mas dizia que eu sofria de perturbação de personalidade borderline”, recorda a jovem. “Fiquei em pânico. Eu sabia que, ao contrário da depressão, que pode ser tratável, teria de viver com borderline para sempre.”

Na sombra

Numa altura em que a pandemia coloca novos desafios à saúde mental, há tendencialmente um maior entendimento sobre problemas como a depressão ou a ansiedade. Ainda assim, há outras doenças mentais que continuam na sombra, como acontece com o transtorno de personalidade borderline.

Este transtorno afecta entre 2% e 6% da população mundial e é marcada pela desregulação de emoções. “É como se as emoções estivessem completamente livres, e fazem o que querem do corpo”, afirma Diogo Carreiras, investigador na Universidade de Coimbra e autor do primeiro estudo no país focado na perturbação borderline na adolescência. A nível comportamental, caracteriza-se por oscilações de humor, impulsividade, autocrítica, crises de identidade, “sentimento de vazio” ou “receio de abandono”, explica o investigador.

Outra característica comum são os comportamentos autolesivos — segundo este estudo focado na detecção de borderline na adolescência, as raparigas fazem mais cortes superficiais em determinadas áreas do corpo enquanto os rapazes tendem a bater neles próprios — e a ideação suicida. Há investigações que mostram que cerca de 75% de pessoas com esta perturbação cometem, pelo menos, uma tentativa de suicídio.

“Chuva de defeitos”

Como se trata de uma doença desenvolvimental (ou seja, não é causada por um acontecimento), pode surgir da combinação de factores biológicos e ambientais, marcados na infância ou adolescência. No caso de Nélia Catarina Neves, apesar de a sua mãe também ter uma psicopatologia, para compreender a perturbação de personalidade é necessário recuar até 2002, quando tinha 14 anos e foi vítima de abusos sexuais. Passados dois anos, a sua melhor amiga foi vítima de abuso sexual do mesmo agressor e acabou por se suicidar.

Desde essa altura que é acompanhada por psicólogos e psiquiatras, mas o diagnóstico de borderline só foi feito dez anos depois, em 2012. Até então, nunca tinha ouvido falar desta doença. “Sempre pensei que era deprimida ou simplesmente estranha”, explica Nélia, agora com 32 anos. Insatisfeita com a parca informação que lhe foi dada na consulta, decidiu pesquisar sobre a doença na Internet. “Tudo o que lia parecia uma chuva de defeitos que ia ter para o resto da vida. Como estava tão assustada com aquela descrição, procurava encaixar o meu perfil noutro diagnóstico mais leve”, explica.

Em negação com a doença, interrompeu as consultas de psiquiatria e dedicou-se “totalmente” ao curso de Direito, que iniciava por aquela altura. Mas rapidamente o seu estado clínico piorou: a ansiedade aumentou, tinha períodos “de constante raiva”, outros em que não conseguia sair da cama, e as oscilações de humor agravaram-se. “Passava da maior das felicidades para choros constantes, vontade de morrer e episódios de automutilação”, afirma.

Uma história semelhante é partilhada por Raquel. Como o diagnóstico coincidiu com o início da licenciatura, parou com as consultas e a medicação. “Ia começar o curso que eu queria e ia fazer a minha vida. Pensava que não havia nada para correr mal”, recorda Raquel, que, neste período, também começou a ter crises de impulsividade e até episódios dissociativos — ou seja, em que existe uma intrusão espontânea na consciência. A jovem destaca, em particular, uma noite em que estava a estudar em casa e quando deu conta estava “no meio do cruzamento” do Campo Grande, em Lisboa, “sem saber como tinha ido lá parar”, diz. “Separei-me da realidade durante algum tempo, é como se deixasses de estar presente”, clarifica.

Muitas vezes, a automutilação era a resposta. “Com borderline temos uma ideia de dissociação, de não te sentires real, e a dor física ajudava-me a sentir alguma coisa”, afirma. Sem conseguir fazer os exames da faculdade — saía das salas a chorar nos primeiros minutos —, acabou por chumbar no primeiro ano de licenciatura.

“Faz parte de mim”, mas “não é quem eu sou”

Passar de “uma situação de aluna de mérito para não ser capaz de terminar um exame” pôs a nu o descontrolo das emoções de Raquel — e serviu de rastilho para procurar ajuda. Há três anos, retomou a psicoterapia, e o primeiro desafio foi construir uma identidade além da doença. “Foi importante perceber que tenho uma patologia que não posso ignorar, mas que não é um rótulo. Faz parte de mim agora e para sempre, mas não é quem eu sou.”

A terapia (aliada a psicofármacos) tem ajudado Raquel a compreender os seus padrões de raciocínio e comportamento e a desenhar ferramentas para os conseguir alterar. “Eu sinto as coisas intensamente à mesma. A patologia está lá, mas o trabalho de a controlar é meu”, acrescenta. Aos poucos, os “truques” aprendidos na terapia foram ajudando a melhorar a relação com os outros e até a descobrir novos gostos, como a política, juntando-se a colectivos como a Greve Climática Estudantil. “De todas as emoções, a esperança para mim era a mais assustadora. Mas a terapia deu-me a esperança de que podia ter uma vida diferente. Isso é uma vitória”, conclui.

Para Nélia, a psicoterapia foi fundamental para perceber como “coisas simples” podiam ajudar a controlar as suas emoções — os dias são mais leves quando escreve, faz longas caminhadas ou está com os amigos. Por outro lado, não cair em episódios de automutilação continua a ser uma batalha. E, independentemente da psicoterapia, garante que a doença tem sempre impacto nas suas decisões — como, por exemplo, a de não ser mãe.

Nélia recorda os comentários do seu ex-namorado, que a criticava nos seus períodos de crise dizendo-lhe que, se “continuasse assim”, seria “uma mãe de merda”. No entanto, explica que esta decisão não é contagiada por estes episódios, mas resulta de uma reflexão que se estende há anos. “Tenho noção das minhas limitações, e sei que mesmo estando num bom momento não há nada que me impeça de ter um relato de automutilação, em que estou com os olhos inchados e a dizer que quero morrer, como se fosse um disco quebrado. Uma criança não deve passar por isso”, diz.

Do dicionário à escola

Há estudos que indicam que são as mulheres quem apresenta traços de borderline mais elevados — por exemplo, na investigação da Universidade de Coimbra focada na perturbação borderline na adolescência, verifica-se uma proporção de três raparigas para um rapaz.

Na opinião de Raquel, esta prevalência contribui para a “fetichização” que existe sobre a doença e a imagem “da rapariga com comportamentos tóxicos” — cenário que piora com a “falta de exemplos realistas” em filmes ou séries, acrescenta Nélia, que não se sentiu representada em filmes como o Girl, Interrupted, que decorre num hospício nos anos 1960. Mas esta caracterização inadequada trespassa dos ecrãs: numa das aulas do mestrado de Psiquiatria Social e Cultural, um professor de Nélia disse à turma que as pessoas com borderline “deviam ser chamadas pelo nome do que são: ‘psicopatas femininas’”, relembra Nélia as palavras do professor.

Desmistificar a borderline é um exercício de várias frentes, e Nélia encontrou o seu espaço no online: além de se incluir em associações que fazem um trabalho esclarecedor sobre várias doenças mentais (como a The Pineapple Mind), tem um blogue onde escreve sobre borderline — bem como uma página de Facebook e Instagram, chamada Psychiatry Noob. “Comecei por fazer isto porque era uma forma de partilhar o que sentia sem ser julgada. Depois houve pessoas que vieram falar comigo porque se sentiam representadas”, afirma. “As redes sociais são importantes para chegar a outras pessoas borderline, porque achamos sempre que ninguém nos entende”, acrescenta.

Com a pandemia a alertar para a importância da saúde mental, as jovens consideram que esta é uma oportunidade para um melhor entendimento (e discussão) da borderline. E os avanços já se sentem: este mês, à boleia das novas palavras associadas à covid-19, o dicionário Priberam da Língua Portuguesa integrou finalmente a palavra bordeline — mas há também progressos nas escolas.

Este é o primeiro ano lectivo em que os psicólogos escolares de todo o país podem usar os questionários desenvolvidos pela equipa da Universidade de Coimbra para avaliar e sinalizar traços borderline nos alunos. É uma das conquistas do primeiro estudo dedicado a esta perturbação na fase da adolescência e, apesar de ser recente para a comunidade escolar, o investigador Diogo Carreira está optimista. “Desde o início do ano que os pedidos para usar estes questionários estão sempre a chegar.”

Fonte: Público

sábado, 24 de abril de 2021

Não me agarrem, que isto é inclusão

A minha filha sai da escola, entra no carro, e diz-me, muito agitada, que foi agarrada. Digo-lhe para estar tranquila, que falo com a professora para não acontecer outra vez. Ela acalma-se, e no dia seguinte vai para escola, em paz e feliz.

Quantas pessoas se identificam com este episódio? Parece relevante, ou algo trivial? A minha filha é autista, e digo-vos, é muito importante. Tão importante, ao ponto de escrever este texto para mostrar o que é a inclusão, e a importância do diagnóstico.

O comportamento em causa é uma defesa táctil – causado por uma aversão sensorial a um certo tipo de toque. A acção em causa não foi maldosa – faz parte da rotina de levar as crianças à casa de banho, tocando-as assertivamente. Mas para a minha filha não é um toque bom. Porque as crianças não têm todas as mesmas respostas sensoriais a estímulos.

Como a minha filha é autista, tem acompanhamento na escola de uma professora de educação especial e de duas terapeutas, ocupacional e da fala, que funcionam como “tradutoras” do comportamento. Podem explicar de que se trata: uma aversão sensorial. Com esta informação, a escola pode acomodar a minha filha – transmitir às profissionais envolvidas que não se trata dum capricho da criança, nem dum mau comportamento, mas das suas características sensoriais. Não se pretende impedir toques carinhosos, afectos, através duma política de “não tocar”. Trata-se de saber tocar.

A minha filha está numa escola pública – EB1 de Santa Rita, do Agrupamento de Escolas da Lousã. O apoio das terapeutas é prestado pelo Centro de Recursos para a Inclusão da ARCIL. Teve o diagnóstico no Hospital Pediátrico do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra. Foi lá que nos disseram: “a melhor terapia é a escola”. E é verdade. Mas para a escola ser a melhor terapia, ela tem de se tornar num “ambiente interpretativo” – onde as necessidades sensoriais da criança são tidas em conta.

Parece simples? Mas não é. Requer da parte de todo o ambiente escolar uma atenção partilhada à criança. É com terapeutas tradutores e com uma boa comunicação com a família e com todas as pessoas que compartem a vida da criança que se produz este ambiente que lhe permite aprender e florescer, ao seu ritmo. É este ambiente escolar terapêutico que produz os melhores resultados.

Infelizmente, há muitos obstáculos a que se produza este ambiente tão necessário a todas as crianças, em particular as autistas. Para começar, há um medo enorme ao diagnóstico, ao “rótulo”, partilhado por profissionais de saúde e membros da família, que fazem com que a escola não tenha acesso às informações que necessita para interpretar e acomodar a criança. O resultado é um desastre: meltdowns permanentes consideradas “birras”. Crianças expulsas. Agressividade. “O que fazer quando a criança se passa?”, perguntava-me uma professora doutra escola. Respondi que o mais importante é compreender porquê que “se passa” – para evitar ou minimizar esse comportamento.

Por vezes, as acomodações são tão simples como colocar bolas de ténis nas cadeiras para que não façam ruídos sob chão de tijoleira. Ou a criança poder sair da sala com uma auxiliar educativa para se acalmar. Por vezes, as acomodações são tão simples como poder chegar uns minutos mais tarde, para entrar bem-disposta e regulada depois de uma má noite de sono.

Isto é Lousã, com anos de experiência na implementação da Escola Inclusiva. A inclusão faz-se todos os dias, e há que mostrar que é possível. E quero acreditar se é possível aqui, tem de ser possível em todo o lado.

Rita Serra

Fonte: Público

sexta-feira, 23 de abril de 2021

Dia Nacional da Educação de Surdos

O dia 23 de abril tem como objetivo relembrar a importância da Educação das Pessoas Surdas, como fator determinante para o seu desenvolvimento pessoal e inclusão social.

A História demonstra que a comunidade surda sempre reivindicou o direito de aprender e de ensinar, no âmbito dos Direitos à Educação.

Na visão atual de educação inclusiva, considera-se a importância das escolas bilíngues neste processo, que se baseiam no facto das Pessoas Surdas viverem uma condição bilíngue e bicultural, isto é, conviverem no seu dia a dia com duas línguas: a língua gestual e a cultura da comunidade surda do seu país e a língua oral e a cultura das pessoas ouvintes.

Desta forma, é entendimento consensualizado que, na educação, as crianças surdas devem ter direito a um ensino bilíngue, em primeiro lugar, o ensino/ aprendizagem da Língua Gestual Portuguesa e, em segundo, da Língua Portuguesa.

Consulte mais informação em www.fpasurdos.pt.

Fonte: INR

quinta-feira, 22 de abril de 2021

Webinário: Contributos do Docente de Educação Especial para a Educação Inclusiva

 A Pró-Inclusão, Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, vai promover um Webinário sobre o Docente de Educação Especial, no dia 29 de abril, entre as 17h00 e as 20h00.

Este Webinário terá duas Mesas nas quais serão apresentadas as reflexões sobre (1) a contribuição do papel do DEE para o desenvolvimento e reforço da educação inclusiva, e (2) a valorização desta profissão enquanto promotora de um sistema educativo e de uma sociedade mais inclusiva e equitativa.  

Programa do Webinário é o seguinte:

-> 17h00 - Abertura e enquadramento - Margarida Loureiro e Maria João Lopes
-> 17h30 - Mesa 1: Contribuição do DEE para a Educação Inclusiva
  • Isabel Borges (DEE/Coord. EMAEI - AE de Miranda do Corvo), 
  • Isabel Carioca (DEE/Coord. EMAEI - AE da Póvoa de Santa Iria - Vila Franca de Xira) e 
  • Susana Couto Lucas (DEE/Coord. EMAEI - AE da Lousã)
-> 18h20/18h30 - Pausa

-> 18h30 - Mesa 2:  Valorização da profissão do DEE: o que se espera e o que deveria ser a sua ação
  • João Adelino dos Santos (DEE/Diretor do AE de Vila Nova de Paiva)
  • Maria Isabel Carvalho (Coord. EMAEI/AE Pintor José de Brito de Santa Marta de Portuzelo)
  • Helena Bilimória 
-> 19h20 - Debate
-> 19h50 - Síntese e encerramento - David Rodrigues

Inscrições até às 17.30h do dia 28 de abril aqui.

Para mais informações, consultar aqui.

quarta-feira, 21 de abril de 2021

Inclusão?

Quando li a notícia pela primeira vez, sendo Abril, fui ao calendário para perceber se estava naquele filme com o Bill Murray, a Andie MacDowell e a marmota que previa o estado do tempo, pois poderia ter ficado preso no primeiro dia deste mês. Mas não. E fui então em busca de confirmação. E confirmou-se.

A Universidade de Hull, em nome da “descolonização do currículo” e da “equidade de oportunidades” decidiu aconselhar os seus professores a não insistir com os alunos para que escrevam em inglês correcto e a não assinalar os seus erros ortográficos. Parece que é tudo em nome de uma “ortografia inclusiva” que contrarie um “modo de expressão elitista”, típico de um norte da Europa, masculino e branco (The Telegraph, 11 de Abril). Em outra notícia (The Times, 12 de Abril), sublinha-se ainda que são várias as universidades que estão a adoptar “avaliações inclusivas” como parte de um esforço para combater a diferença de desempenho entre alunos brancos e negros, asiáticos ou de outras minorias étnicas e para reduzir o abandono escolar mais elevado por parte de alunos de contextos económicos mais pobres.

Muito se poderia escrever sobre esta noção distorcida de inclusão que parece achar que para se ser “inclusivo” e “equitativo” se devem abandonar padrões de maior rigor na avaliação. Por cá, existem tendências semelhantes, não vale a pena negá-lo e as justificações usam um vocabulário semelhante. Mas vou-me ficar, por agora, por apenas dois pontos sobre esta matéria:

Chama-se “paternalismo” e não “inclusão” às práticas de condescendência preconceituosa que assumem que os alunos de outras origens culturais/étnicas ou contextos económicos desfavorecidos só podem ter bom desempenho se os padrões de avaliação forem adaptados no sentido da simplificação.

E chama-se “desresponsabilização” e não “inclusão” às atitudes que prescindem de exigir que a sociedade no seu todo garanta condições para que todos os alunos, independentemente da sua origem, consigam o melhor desempenho possível, em vez de ser o sistema educativo a mascarar as desigualdades com artifícios administrativos.

Paulo Guinote

Fonte: Educare

Portugal apela a Estados-membros por medidas reais para pessoas com deficiência

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social apelou hoje a todos os Estados-membros da União Europeia para concretizarem em medidas reais a visão ambiciosa de uma Europa que combate a exclusão das pessoas com deficiência.

Ana Mendes Godinho, a quem coube apresentar as conclusões dos dois dias de trabalhos da videoconferência de alto nível sobre a Estratégia Europeia para os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030, no âmbito da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia, defendeu que todos os países têm "um grande e intenso caminho a percorrer".

"Este é o caminho para a Europa que queremos e ambicionamos, uma Europa social, verdadeiramente inclusiva, onde todos contam e ninguém é deixado para trás", sublinhou a ministra portuguesa.

"Uma Europa que valoriza a diversidade e promove a igualdade real e efetiva de todas as pessoas, que combate com meios, com resultados, com ambição, que combate a discriminação, a pobreza, a exclusão das pessoas com deficiência", acrescentou.

Nas palavras da ministra do Trabalho, é preciso uma Europa que tenha uma "visão ambiciosa", apontando que é essa visão ambiciosa que cabe a todas as ministras e ministros que tutelam a área da deficiência, lembrando que se trata de uma "missão" e que está nas mãos dos atuais governantes e na sua capacidade de decisão.

"E é esse o repto que eu deixo, para que esta visão ambiciosa, transmitida durante estes dois dias pela sociedade civil, pelas instituições, por todas as organizações, que seja também essa ambição que somamos nas conclusões que teremos nas nossas mãos e na nossa capacidade de decisão no conselho EPSCO [Emprego, Política Social, Saúde e Consumidores] e para o qual conto convosco neste caminho", disse Ana Mendes Godinho.

Um caminho que a ministra apontou que segue em direção à Cimeira Social, que decorre entre 07 e 08 de maio, no Porto, e onde vai ser discutido o plano de ação relativo ao pilar dos direitos sociais.

"Onde conto com todos para que esta ambição se torne em conclusões reais e que consigam mudar a vida das pessoas", frisou.

A ministra sublinhou ainda que a participação das pessoas com deficiência é essencial e de maior importância e que só há a ganhar com essa participação.

Momentos antes, o presidente do Fórum Europeu das Pessoas com Deficiência e representante das organizações da sociedade civil de defesa das pessoas com deficiência, Ioannis Vardakastanis, defendeu que nada deve ser feito sem a participação das pessoas com deficiência e que só vale a pena haver uma estratégia se efetivamente ela fizer a diferença na vida destas pessoas.

Segundo o responsável, é preciso um mecanismo robusto para fiscalizar a implementação da estratégia, do qual devem fazer parte pessoas com deficiência, tanto a nível nacional como europeu e aproveitou para pedir ao Conselho Europeu que designe os seus coordenadores dentro da estratégia.

"Precisamos de uma estratégia com uma base jurídica forte e de legislação que proteja a vida e os direitos das pessoas com deficiência", defendeu Ioannis Vardakastanis, que disse ter conhecimento de "histórias terríveis" de violação dos direitos humanos durante a pandemia.

Por fim, Joost Korte, diretor da Direção-Geral do Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão da Comissão Europeia, defendeu que a estratégia "é o principal contributo da União Europeia para um ímpeto a dar a nível nacional e europeu para melhorar os direitos das pessoas com deficiência".

Disse também que a comissão tem vários projetos para aumentar a acessibilidade das pessoas com deficiência, mas também para potenciar a oferta na área do emprego, nomeadamente com fundos para ajudar na passagem de uma institucionalização para um projeto de vida independente ou ao nível da circulação entre estados-membros.

Fonte: RTP

segunda-feira, 19 de abril de 2021

Maus-tratos na infância: identificar, intervir, agir

“Proteger crianças compete a tod@s” é o nome da campanha nacional que sensibiliza para os maus-tratos na infância e reforça o trabalho feito pelas comissões de proteção de crianças e jovens ao durante o confinamento e em tempos de isolamento. Um dos objetivos da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens (CNPDPCJ) é facilitar a comunicação de situações de perigo. A linha telefónica Crianças em Perigo, no número 96 123 11 11, criada durante a pandemia, recebeu, desde maio do ano passado, 854 chamadas e 1412 comunicações.

A iniciativa pretende chamar a atenção em toda a linha: sociedade civil, familiares, amigos, vizinhos, conhecidos. Todos têm responsabilidade de comunicar casos que conheçam. Há uma brochura, um vídeo e uma ficha de comunicação de situações de perigo, no site da CNPDPCJ, divulgada pelo Ministério da Educação junto das escolas. Uma metodologia inovadora e adaptada ao período de ensino à distância que capacita os estabelecimentos de ensino para a sinalização de situações de perigo.

“É muito importante que as crianças compreendam que, apesar de estarem em casa, continuam a ser protegidas por todos: familiares, vizinhos, amigos, professores/educadores, médicos, polícias, bombeiros, Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ), tribunal”, escreve Rosário Farmhouse, presidente da CNPDPCJ, na brochura. “É muito importante que os clubes, as salas de estudo, os amigos, os psicólogos, pedopsiquiatras, telefonem para as crianças e perguntem como estão, se precisam de alguma coisa, e que falem mesmo com elas de forma intermitente (liguem sem ter combinado o dia e a hora) e escutem atentamente, registem o que parece estranho ou preocupante”, acrescenta.

Em 2020, cerca de 18 mil crianças, entre os 0 e os 3 anos de idade, foram acompanhadas pelas comissões de proteção de crianças e jovens. A violência sobre crianças em contexto familiar é um grave problema social e a proteção é um assunto que tem de envolver toda a comunidade. Os maus-tratos acontecem. Agressões físicas repetidas e brutais, tortura psicológica e emocional. Por isso, toda a atenção importa. Observar, escutar, perguntar se está tudo bem, perceber reações, entender a linguagem verbal e corporal. A CNPDPCJ insiste que a indiferença não pode abafar o dever de proteção.

Abril é o Mês Internacional da Prevenção dos Maus-Tratos na Infância, o mês do laço azul que simboliza o combate à violência sobre crianças. O país ficará pintado de azul, edifícios históricos, como castelos, o ascensor da Nazaré, o marco geodésico de Vila de Rei, os paços do concelho de Lisboa, entre outros monumentos e lugares.

“A violência não educa”
No início de abril, a CNPDPCJ, para assinalar a abertura da Campanha do Mês da Prevenção dos Maus-Tratos na Infância, em parceria com a Fundação Nossa Senhora do Bom Sucesso, organizou uma conferência virtual com o nome “Cuida bem de mim – Os desafios da primeira infância”. Rosário Farmhouse, presidente da CNPDPCJ, alertou para a urgência de desconstruir alguns mitos. “Os maus-tratos são transversais a todas as classes sociais, não existem mais maus-tratos numa classe ou noutra, podem existir contextos que potenciam os maus-tratos”, referiu. É necessário quebrar ciclos e ideias formatadas. “A violência não educa”. E a palmada educativa não faz sentido.
O presente é extremamente importante a vários níveis. “Aquilo que fizermos às nossas crianças é aquilo que vamos ter no futuro”, vincou Rosário Farmhouse. Se o contexto é de comportamentos agressivos e violentos, então “a probabilidade de replicação é muito elevada” e o ciclo de violência não tem fim. “Quem protege as suas crianças está a trabalhar para um futuro melhor”, sublinhou a presidente da CNPDPCJ.

A ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, abriu o encontro online e deixou várias mensagens. A proteção de crianças e jovens é “um desígnio de todos”. “Hoje, mais do que nunca, cabe a todos acautelar e proteger as crianças e os jovens numa situação nova e excecional que atravessamos. A resposta de agir e de proteger é um desígnio de todos nós”, disse.

“O tempo em que as crianças não têm de estar presencialmente nas escolas, creches e jardins de infância comprometeram a capacidade de atenção e de vigilância, mas as comissões de proteção de crianças e jovens não baixaram nunca os braços. Mantêm-se firmes, reinventaram-se e diariamente mantêm a sua atenção, contacto e acompanhamento de milhares de crianças e famílias que diariamente precisam de especial ajuda e apoio”, sustentou a ministra.

Maria do Carmo Vale, pediatra do neurodesenvolvimento, abordou a importância dos primeiros anos de vida, fundamentais para o desenvolvimento emocional e intelectual da criança. “Quando a criança nasce há uma influência ambiental extremamente importante que vai fazer, validar, vincar, aperfeiçoar, e até estilizar, essa rede neuronal de forma a que a criança desenvolva todas as competências com as quais nasceu”. É uma rede, explicou, “que se vai densificando consoante a consistência, a repetição de estímulos, a inovação, a experimentação, que a criança vai fazendo e que os adultos ajudam a fazer”. Os adultos como modeladores ou provocadores de aquisição de competências das crianças. Como peças essenciais para o crescimento da criança.

A pandemia é um momento crítico. “O que parece que sobressaiu foram os problemas de equilíbrio mental parental, despoletados pela agressividade do isolamento que teve de ser imposto, e que se refletiu nas crianças. Os mais prejudicados são os mesmos, os que têm dificuldades em casa”, lembrou Maria do Carmo Vale. O que se pode fazer? Apoiar crianças e famílias, diagnosticar situações mais cedo, ganhar terreno na parte de socialização e na aquisição de competências.

Ana Teresa Brito, professora do ISPA – Instituto Universitário de Ciências Psicológicas, Sociais e da Vida, doutorada em Estudos da Criança, lembrou a necessidade de cuidar uns dos outros. Os profissionais que estão perto das crianças, as famílias que também precisam de ser cuidadas. “Os profissionais precisam de perceber que a criança é ela e a sua circunstância e as famílias são muito importantes”. Se a pobreza atinge maioritariamente as crianças, é preciso, em seu entender, parar para pensar neste assunto. “Devia ser objeto da nossa atenção, como podemos contrariar isso”.

Sinais de alerta. O choro e o silêncio
A brochura da campanha, acessível em formato digital em vários websites, enumera sinais de alerta. São vários. O choro repetido ou um silêncio perturbador numa casa com crianças. Crianças que não são vistas à janela, nas varandas ou quintais, como se tivessem desaparecido. Adultos que choram discreta e disfarçadamente. Marcas físicas como nódoas negras, hematomas, queimaduras, dentadas, abanões, pontapés, empurrões, agora mais difíceis de ver e de identificar devido ao isolamento.

O abuso psicológico e emocional com insultos, ameaças, culpabilização, falta de afeto e de atenção, rejeição afetiva. A suspeita de abuso sexual. Segundo o Conselho da Europa, uma em cada cinco crianças já foi vítima de abusos sexuais. “A criança é usada para diversas práticas que visam a gratificação e a satisfação sexual de adultos ou jovens mais velhos em situações de poder e controlo”. É outro grave flagelo a que as crianças podem estar sujeitas.

Negligência parental, o sofrimento causado à criança com a omissão de cuidados básicos e essenciais. Acidentes domésticos por falta de vigilância, quedas, ingestão de medicamentos ou produtos cáusticos, queimaduras, alimentação inadequada, falta de higiene, fome, clausura. A saúde de uma criança é um aspeto muito importante, seja física, seja mental.

“Também as crianças com problemas de saúde mental, em acompanhamento psicológico ou em pedopsiquiatria, podem revelar uma maior propensão para a irrequietude, turbulência, sono agitado, pesadelos, insónias e terrores noturnos. Muitas vezes, também isso agrava a tensão familiar, desencadeando medidas repressivas ou castigos, que podem facilmente evoluir para maus-tratos/abusos”, avisa a CNPDPCJ.

“Os bebés, não conseguindo expressar em palavras a sua tristeza, medo, insegurança, desconforto e ansiedade, usam o choro para chamar a atenção dos pais/cuidadores. Alguns adultos ‘perdem a cabeça’ com esse choro insistente e podem abaná-los violentamente, provocando graves lesões cerebrais e hemorragias que podem mesmo conduzir à morte do bebé. Torna-se, pois, urgente e absolutamente necessário que todos possamos garantir o especial dever de proteção das nossas crianças/jovens”.

O isolamento social não pode enfraquecer o cuidado de proteger as crianças e impedir de agir. Todas as crianças merecem uma infância feliz. Por isso, é necessário, sublinha a campanha, “ajudar as famílias que se encontram a atravessar momentos particularmente difíceis fazendo com que possam nesta fase ter comportamentos que não comprometam o bem-estar das suas crianças”. A campanha pede para agir e não calar. “Vamos sinalizar para que as famílias possam ter acesso a ajuda e a atenção de que precisam para reparar os seus danos”.

Fonte: Educare

sábado, 17 de abril de 2021

Inclusão Sustentável: um longo caminho, mas necessário

Num mundo em permanente mudança e transformação, há coisas que não nos podem escapar. E uma delas é o papel da sensibilização para a diferença e para a inclusão. Enquanto colaborador do terceiro sector, não me posso demitir de dar o meu testemunho das inúmeras instituições e associações sem fins lucrativos que trabalham no terreno para ajudar quem mais precisa. É preciso pararmos e olharmos para estas pessoas, equipas, que todos os dias dão o seu melhor em prol de uma sociedade mais justa e mais inclusiva. E são a elas, que os agentes políticos, entidades públicas e empresas devem recorrer quando precisam de incluir. Porque a inclusão não é uma mera e pontual integração de uma pessoa com deficiência numa empresa para cumprir a quota, não é ajudar alguém na rua com um pedaço de comida, não é dizer que temos imensos utentes acompanhados ou ajudados.

Inclusão vai muito mais além. Vai ao ponto de sentirmos que ao ajudarmos uma pessoa ou uma família apenas, ficamos de coração cheio. E é quando o sentimos como um gesto imenso, que estamos a fazer inclusão. Porque inclusão sem qualidade não é inclusão, pode muitas vezes tornar-se em exclusão, principalmente na área da deficiência intelectual ou na prevenção da saúde mental. Inclusão com qualidade é agarrar aquela pessoa, aquela família com unhas e dentes e dizer, caramba eu vou ajudar-vos até ao fim, não vos largo nem vos deixo um segundo sem que a empresa, entidade, ou escola as perceba e aceite. E é esta mudança que me parece fazer mais sentido atualmente, em que toda esta crise pandémica, e consequente crise económica e social vai trazer.

Está na altura de deixarem o terceiro sector atuar, porque melhor do que ninguém sabe o que está a fazer e a acontecer no terreno. Conhece realmente os problemas que co-habitam muitas vezes ao nosso lado e nem damos por eles. Pessoas e famílias precisam de ajuda como nunca. E é sensibilizando, desdramatizando muitas vezes o que é simples, que podemos ajudar todos e, fundamentalmente, em rede. É necessário um espírito de equipa e de coesão entre todos os agentes principais nestas matérias, desde a saúde à educação, ao poder local, às instituições. Só assim poderemos mudar vidas, transformar futuros. Se todos unirmos esforços em prol de uma sensibilização adequada e bem direcionada, estaremos certamente a fazer o nosso papel enquanto cidadãos com responsabilidade social.

Trata-se de fazer inclusão sustentável, de longo prazo. Para a maioria das empresas ainda são números e é, de facto, compreensível que assim seja, pois as empresas vivem disso. Aqui, o grande desafio é mudar este mind set da maioria das empresas, porque algumas já fazem, e bem, este caminho e temos isso bem presente na APSA, através do nosso Programa Empregabilidade. Mas sabemos também que muitas ainda estão longe de atingir o verdadeiro sentido da inclusão. Claro que a lei das quotas tem vindo a acelerar todo este processo e existem empresas, inclusivamente, a criar departamentos de inclusão especializados, mas ainda que esse caminho seja positivo, é preciso perceber se esses departamentos são realmente eficazes. Acima de tudo, estamos a falar de vidas humanas. E se estas vidas forem bem acompanhadas e bem integradas podem dar muito valor à empresa. Esta sensibilização é fulcral, sobretudo junto dos dirigentes/chefes de equipas e CEO’s das empresas.

Existem já programas em curso, que visam a formação e sensibilização de quadros empresariais, programas que a APSA já implementa há bastante tempo e que são fundamentais para mudar a cultura de uma empresa. Aquilo que esperamos, enquanto agentes no terreno, é que um dia se deixe de falar em “inclusão” ou departamento inclusivo, e se assuma, com naturalidade, que aquela ou aquelas pessoas com deficiência deverão ter as mesmas oportunidades que todas as outras e serem tratadas de forma igual. O nosso papel é explicar, desdramatizar e sensibilizar para características diferentes e que, de certa forma, se tornarão comuns se a sociedade em geral for capaz de mudar o seu mind set através de uma melhor compreensão e perceção destas realidades. Neste momento, são já as empresas que procuram a ajuda da APSA para integrarem jovens com síndrome de Asperger, o que é fantástico. Mas o caminho para a inclusão plena é ainda longo e existem ainda muitas pedras para partir. Acreditamos que todos juntos faremos a diferença. E nem que seja na vida de uma só pessoa, já valeu a pena!

David Gaivoto

Fonte: Observador

Recrutar para a inclusão

A Acesso Cultura vai realizar no dia 20 de abril, pelas 18h30, o debate " Recrutar para a inclusão", na plataforma Zoom, com Interpretação em Língua Gestual Portuguesa e legendagem em português.

O curso “Diversidade e Inclusão”, que já teve três edições desde Dezembro 2020, gerou um debate rico e profundo sobre persistentes mentalidades e práticas de exclusão no sector cultural. Uma das questões que mais interrogações provocou é aquela dos processos de recrutamento.
  • Como podemos passar das palavras (“São bem-vindas candidaturas de todas as pessoas, independentemente de…”) à prática?
  • De que forma podemos criar contextos de trabalho realmente inclusivos?
Experiências recentes em Portugal (no Teatro Nacional D. Maria II e no Alkantara), mas também passos muito significativos noutros países (como é o caso da Pinacoteca de São Paulo, no Brasil) indicam que algumas organizações culturais procuram ativamente respostas.

O debate conta com a participação de Mila Chiovatto e Gabriela Aidar, da Pinacoteca de São Paulo.


Fonte: INR

sexta-feira, 16 de abril de 2021

Criação de grupo de trabalho para a definição do plano de recuperação e consolidação de aprendizagens

Pelo Despacho n.º 3866/2021, publicado em 16 de abril, cria-se o grupo de trabalho com a missão de apresentar sugestões e recomendações no âmbito da definição do plano de recuperação e consolidação de aprendizagens destinado aos alunos dos ensinos básico e secundário.

O grupo de trabalho tem por incumbência apresentar sugestões e recomendações ao membro do Governo da área da educação responsável pelo currículo, no âmbito da criação do plano para a recuperação e consolidação das aprendizagens e de mitigação das desigualdades decorrentes dos efeitos da pandemia da doença COVID-19, destinado aos alunos dos ensinos básico e secundário.

O GT tem como missão apresentar recomendações relativas a medidas a considerar na preparação dos anos letivos 2021/2022 e seguintes, a partir de um olhar sistémico e multidisciplinar, no âmbito da recuperação e consolidação de aprendizagens e da mitigação das desigualdades decorrentes dos efeitos da pandemia da doença COVID-19.

quinta-feira, 15 de abril de 2021

Procedimentos da matrícula e respetiva renovação e as normas a observar na distribuição de crianças e alunos

O Despacho Normativo n.º 10-B/2021, publicado em 14 de abril, procede à segunda alteração do Despacho Normativo n.º 6/2018, de 12 de abril, com a redação dada pelo Despacho Normativo n.º 5/2020, de 21 de abril, que estabelece os procedimentos da matrícula e respetiva renovação e as normas a observar na distribuição de crianças e alunos, e define o calendário de matrículas e respetiva renovação para o ano escolar de 2021-2022.

A Comissão Europeia apresenta a Estratégia para os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030

A Comissão Europeia apresenta uma ambiciosa Estratégia para os Direitos das Pessoas com Deficiência 2021-2030 (versão de fácil leitura) para assegurar a sua plena participação na sociedade. A nova estratégia baseia-se na sua predecessora, a Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020, e contribui para a implementação do pilar europeu dos direitos sociais.

A avaliação da Estratégia Europeia para a Deficiência 2010-2020 mostra que esta contribuiu para melhorar a situação em várias áreas, em particular a acessibilidade para pessoas com deficiência e a promoção dos seus direitos, colocando a deficiência no topo da agenda da UE. Contudo, as pessoas com deficiência ainda enfrentam barreiras consideráveis no acesso aos cuidados de saúde, educação, emprego, atividades recreativas, bem como na participação na vida política.

87 milhões de pessoas na UE têm alguma forma de deficiência. 50,8% das pessoas com deficiência estão empregadas, em comparação com 75% sem deficiência. 28,4% das pessoas com deficiência estão em risco de pobreza ou exclusão social em comparação com 17,8% das pessoas sem deficiência. Apenas 29,4% das pessoas com deficiência atingem um grau terciário em comparação com 43,8% das pessoas sem deficiência e 52% das pessoas com deficiência sentem-se discriminadas.

A nova Estratégia visa melhorar a vida das pessoas com deficiência na próxima década, na UE e não só. Os objetivos desta Estratégia só podem ser alcançados através de uma ação coordenada tanto a nível nacional como da UE, com um forte empenho dos Estados Membros e das autoridades regionais e locais em levar a cabo as ações propostas pela Comissão.

Reforçar a igualdade de participação e a não discriminação

A nova estratégia para dez anos estabelece iniciativas-chave em torno de três temas principais:

Os direitos da UE: As pessoas com deficiência têm o mesmo direito que outros cidadãos da UE de se mudarem para outro país ou de participarem na vida política. Com base na experiência do projeto-piloto em curso em oito países, até ao final de 2023 a Comissão Europeia irá propor um Cartão Europeu de Deficiência para todos os países da UE que facilitará o reconhecimento mútuo do estatuto de deficiência entre os Estados Membros, ajudando as pessoas com deficiência a gozar do seu direito de livre circulação. A Comissão trabalhará também em estreita colaboração com os Estados-membros para assegurar a participação das pessoas com deficiência no processo eleitoral em 2023.

Vida independente e autonomia: As pessoas com deficiência têm o direito de viver de forma independente e escolher onde e com quem querem viver. Para apoiar uma vida independente e a inclusão na comunidade, a Comissão desenvolverá orientações e lançará uma iniciativa para melhorar os serviços sociais para as pessoas com deficiência.

Não-discriminação e igualdade de oportunidades: A estratégia visa proteger as pessoas com deficiência de qualquer forma de discriminação e violência. Visa assegurar a igualdade de oportunidades e o acesso à justiça, educação, cultura, desporto e turismo. A igualdade de acesso deve também ser garantida a todos os serviços de saúde e emprego.

Traduzido com a versão gratuita do tradutor - www.DeepL.com/Translator

quarta-feira, 14 de abril de 2021

"A qualidade do ensino em Portugal é razoável"

A plataforma EDUSTAT - Observatório da Educação, que a Fundação Belmiro de Azevedo apresenta hoje, vai permitir ter informação detalhada sobre o sistema de ensino nacional. Para Alberto Amaral, porta-voz global do EDULOG e antigo reitor da Universidade do Porto, a falta de equidade no ensino é preocupante e a pandemia serviu para acentuar as desigualdades. Desigualdades que, no caso do superior, existem entre cursos ou entre universidades e politécnicos.

O EDULOG, o think tank de Educação da Fundação Belmiro de Azevedo, apresenta esta quarta-feira (14 de abril) a plataforma EDUSTAT - Observatório da Educação. Em que consiste este projeto?

O Observatório tem, neste momento, perto de 200 indicadores, e espera-se que até meados deste ano suba para 300, e irá ter informação sobre as coisas mais diversas, percentagem de alunos do ensino superior, origem dos alunos, origem geográfica, origem de acordo com a formação dos pais, frequência do secundário, até percentagens de reprovação, e aí por diante. Vai ter informação sobre todo o sistema de ensino de forma detalhada. E aqui nós tivemos um problema de organização do EDUSTAT, porque queremos que ele tenha dois fins: um fim para o público em geral e, por outro lado, informação para pessoas que são investigadoras e trabalham nestas matérias. O que tornou a implementação do EDUSTAT relativamente complexa. Mas faz-se.

Qual é o estado do ensino em Portugal?

A qualidade do nosso ensino é razoável. Nunca me esqueço de um colega holandês me dizerque pelo preço de um Fiat não se compra um Mercedes. E isto significa que há determinadas áreas onde nós conseguimos competir, mas partindo de uma situação de desvantagem, nomeadamente de natureza financeira. Se olhar, por exemplo, para a questão da investigação, uma universidade como Oxford ou Cambridge tem um orçamento de investigação que, se calhar, é igual ao de Portugal. É difícil. Essas grandes universidades têm recursos que nós não temos. E, portanto, é inevitável que isso aconteça. No entanto, os produtos que saem, por exemplo, do ensino superior são altamente apreciados por todo o mundo. Por exemplo, na área da saúde, as enfermagens, as tecnologias da saúde, as medicinas, etc., qualquer indivíduo com uma licenciatura portuguesa arranja facilmente colocação no estrangeiro.

No âmbito do EDULOG, teve acesso a dados que o tivessem surpreendido?

Quando se estuda este tipo de matérias, há sempre surpresas, tanto a nível nacional, como internacional. Por exemplo, está agora a ser discutida a criação de quotas de acordo com a etnicidade, sendo que isto já é feito nos Estados Unidos e no Brasil, mas as pessoas esquecem-se que nos Estados Unidos o Supremo declarou inconstitucional a atribuição de quotas com base na etnicidade e no Brasil os resultados também não têm sido aquilo que se esperava. O que aconteceu no Brasil foi que a expansão do sistema saiu essencialmente do lado do privado e, pior do que o privado, a distância. Hoje, a percentagem de alunos em ensino à distância no privado é superior àqueles que têm aulas reais. E, portanto, o que acontece é que, embora o sistema se tenha expandido e permitido a entrada de muitos alunos de classes que normalmente não entrariam no ensino superior, eles vão sempre para segundas e terceiras escolhas. Se olharmos para o caso português, temos também uma situação de equidade muito complexa. Houve um ano em que fizemos um estudo em que comparámos a Medicina com a Enfermagem e, enquanto na Medicina 75% dos alunos têm pais com cursos superiores, na Enfermagem 75% dos alunos têm pais sem curso superior. Nas Ciências Farmacêuticas, que são universitárias, com a Farmácia, que é politécnica, verá o mesmo tipo de situações. E se havia tradicionalmente casos em que a percentagem de alunos das classes favorecidas era muito alta, como é o caso de Medicina, isso hoje já se está a espalhar a outras áreas, até nas engenharias. Se comparar, por exemplo, o universitário com o politécnico, verá que a percentagem de alunos com bolsas no universitário é bastante mais baixa do que no politécnico. O que se traduz em que as classes desfavorecidas muitas vezes acabam por ir parar a cursos de menor valor. Outro exemplo, há três ou quatro cursos no Instituto Superior Técnico e na Universidade Nova de Lisboa, e aqui no Porto, em que a percentagem de bolseiros é na ordem dos 10%. Se for ver os mesmos cursos em Trás-os-Montes, a percentagem de bolseiros é de 50%. Durante o período em que o ensino era elitista - na altura do 25 de Abril havia 45 mil alunos no superior e hoje há 10 vezes mais -, essa distinção de classe fazia-se entre o entrar e o não entrar. A percentagem de alunos que entrava e vinha das classes mais favorecidas era muitíssimo superior à das classes desfavorecidas. Quando o ensino se expandiu, passou a haver muito mais lugares para toda a gente e passou-se a olhar não propriamente para a entrada ou não entrada, mas sim para o curso e para a instituição. Aquilo que antigamente era a coisa do "senhor doutor" entrou, agora passou-se a ver em que sítio entrou, se entrou no Técnico ou numa privada, ou se fez um curso de Medicina ou um curso de Enfermagem ou de Tecnologias da Saúde. Há sempre uma forma de falta de equidade que é preocupante. E que é um problema que não está resolvido em sítio nenhum do mundo. Há quem diga que só poderão ser corrigidas a médio prazo. E porquê? Porque, à medida que vamos avançando no tempo, a percentagem de indivíduos com licenciatura aumenta e, portanto, os filhos de pais com licenciatura também aumentam, e isso, eventualmente, permitirá criar alguma correção.

Como estamos em Portugal em termos de equidade?

Estou a olhar para uma situação em que estou a avaliar o capital das famílias com base nas bolsas. Se eu comparar em Enfermagem, a percentagem de bolsas é na ordem dos 40,4%, e em Medicina é de 15%. Se comparar a Solicitadoria com o Direito, a Solicitadoria tem 50% de bolsas de estudo e o Direito tem 28,3%. Se comparar Farmácia com Ciências Farmacêuticas, Farmácia, que é um curso politécnico, tem 44% de bolsas de estudo e as Ciências Farmacêuticas têm 21%. Olhando-se simplesmente para a percentagem de alunos com bolsas de estudo, verifica-se que há uma discrepância muito grande entre cursos. E o politécnico tem, de facto, uma maior percentagem de bolsas de estudo do que o universitário. Ou seja, a composição do corpo dos alunos no politécnico é muito mais próxima da composição da população nacional. Basicamente, na universidade há claramente um favorecimento de alunos que ou não têm bolsas de estudo ou cujos pais têm uma licenciatura. Não esperava que fosse tão nítida esta situação.

Qual será o impacto da pandemia no ensino em Portugal?

Vai haver uma diminuição da qualidade do ensino. A nível do ensino não-superior, foram feitos exames que demonstraram que os alunos perderam significativamente pelo facto de terem ensino à distância e não ensino presencial. Portanto, é óbvio que aquilo que aprenderam tem menos valia do que teria em ensino presencial. Depois, como é óbvio, o mudar para este tipo de ensino vai aumentar de novo as desigualdades. Os meus netos desde os dois anos que tinham computadores, tablets, consolas de jogos e telemóveis e mais não sei o quê. E é uma diferença muito grande entre quem está nesse ambiente e quem tem dificuldades até de acesso à rede. Por outro lado, também o facto de os alunos serem filhos de pessoas com uma licenciatura faz uma enorme diferença, porque o apoio dos pais é completamente diferente daqueles que não têm esse tipo de situação. Claramente, esse tipo de ensino vai aumentar as diferenças de classe.

Que medidas se podem tomar para minorar ou anular estas desigualdades?

Aquilo que se tem verificado em qualquer país é que corrigir as desigualdades é extremamente difícil. O ensino, nomeadamente o ensino superior, é classificado como um bem posicional, ou seja, é um bem que permite atingir uma determinada posição. Se eu tiver uma licenciatura em Matemática ou em Medicina ou se tiver uma licenciatura em Harvard ou em Oxford, tenho uma posição dentro da sociedade e, portanto, os bens posicionais tendem a ser captados pelas famílias de mais recursos, quer culturais, quer financeiros. Há, no entanto, um conjunto de medidas que podem ser tomadas. A OCDE mostra que muito do que se passa no acesso ao ensino superior tem a ver com a formação anterior e, se reparar, há situações de alunos que são colocados em colégios para fazerem subir as notas e, portanto, concorrer em melhores condições. Há que corrigir as diferenças pré-ensino superior. Depois, a forma de acesso pode condicionar muito as igualdades. Se eu tiver um determinado curso, Medicina, por exemplo, com numerus clausus, isso aumenta as desigualdades. Uma área em que o governo deveria atuar forte e feio é no caso de instituições que, nomeadamente nas disciplinas que não têm exame nacional, dão notas extremamente elevadas - como Educação Física ou Filosofia, onde são todos corridos a 19 e 20 -, e isso traduz-se depois em facilitar o acesso. Deveríamos atuar de forma a corrigir tudo o que está antes, na medida do possível diminuir as desigualdades nessa área. Não percebo porque é que não se atua mais naqueles casos em que há uma grande diferença entre a nota interna e a nota do exame. E, infelizmente, também em algumas instituições públicas já há essa situação dos alunos corridos a 19 e 20. Na medida do possível, eliminar ou aumentar os numerus clausus, porque sabemos que quanto mais restritos forem os numerus clausus maiores serão as dificuldades em entrar e maiores os problemas em termos de equidade, melhorar tudo o que é ensino até ao superior, uma vez que a carreira anterior do aluno se irá refletir na facilidade ou dificuldade com que ele ingressa no ensino superior... O que vai acontecer, de geração para geração, é que a percentagem de pais com licenciatura vai aumentar, o que significa que cada vez mais os alunos que vão concorrer ao ensino superior têm pais com formação superior, e isso terá influência. A questão das quotas é muito discutível, pois repare que nos próprios Estados Unidos foram declaradas inconstitucionais, isto porque criam situações de revolta.

Como é que o impacto que a pandemia teve no ensino se irá refletir no estado do país?

É evidente que de forma negativa. Hoje vivemos numa sociedade onde o conhecimento e a inovação têm cada vez maior importância. Hoje vivemos numa situação em que muitas pessoas, para exercerem a sua profissão, precisam de conhecimento, precisam, nomeadamente, muitas vezes de uma licenciatura, e isso significa que se essa componente se degradou por força de ensino que não é feito nas melhores condições, isso depois vai refletir-se na qualidade do trabalho e na competitividade do país em termos internacionais.

No que ao ensino diz respeito, como define as medidas do governo durante esta pandemia?

Acho que se fez o possível. O país estava relativamente mal preparado, nomeadamente porque as metodologias de ensino à distância ainda eram muito incipientes, porque há uma percentagem significativa de alunos que não tinha computadores nem estava habituada a utilizá-los. E, portanto, eu acho que, dentro do possível, foi um comportamento relativamente correto. Vamos ver agora o que é que acontece com o desconfinamento. Vamos ver se não há de repente uma subida do número de pessoas infetadas como resultado desta reabertura. E é fundamental fazermos uma coisa, que já devíamos ter feito há mais tempo, e que é uma testagem muito mais numerosa do que a que temos hoje.

Além da testagem, já se devia ter feito mais alguma coisa?

Acho que já devíamos ter avançado mais rapidamente na correção da falta de computadores e internet, quando nós sabemos hoje que há zonas do país onde é quase impossível ter acesso à internet porque também não existem disponibilidades de ligação. E isso tem de ser corrigido rapidamente.

Para que ensino caminhamos em Portugal?

O que tenho estado a verificar é que, de uma maneira geral, a qualidade do nosso ensino superior é perfeitamente aceitável e razoável e, como se sabe, os licenciados das nossas instituições não têm dificuldade nenhuma em encontrar emprego em qualquer país europeu. Sabemos perfeitamente que países como a Alemanha e a Inglaterra recrutam no setor na saúde, recrutam no setor da engenharia ou noutras áreas, nomeadamente a informática, que muitas vezes há dificuldade em encontrar pessoas em Portugal porque foram contratadas por outros países. A Alemanha é um exemplo típico de recrutamento na área da engenharia. França e Inglaterra são conhecidas, por exemplo, pelos recrutamentos na área da saúde. Acho é que tem havido um progresso muito significativo. Hoje há uma grande diferença, até no setor da investigação. Hoje, Portugal tem algo a dizer na área da investigação, apesar de, em termos totais de financiamento, o país ainda ter dificuldades.

Fonte: DN

terça-feira, 13 de abril de 2021

2021 EUROPA CENTRAL E ORIENTAL, CÁUCASO E ÁSIA CENTRAL RELATÓRIO - INCLUSÃO E EDUCAÇÃO: TUDO SIGNIFICA TODOS


Preparado pelo relatório Global Education Monitoring (GEM), em parceria com a Agência Europeia para as Necessidades Especiais e o Ensino Inclusivo e a Rede de Centros de Políticas Educativas, o relatório regional sobre inclusão e educação na Europa Central e Oriental, Cáucaso e Ásia Central oferece um mergulho profundo nos principais desafios e soluções-chave. A região está a trabalhar arduamente para superar um legado, segundo o qual as crianças com deficiência frequentaram escolas especiais, uma vez erradamente consideradas como uma solução eficaz, segregadas por tipo de deficiência, se não totalmente excluídas da educação.

O relatório baseia-se em perfis profundos de 30 sistemas educativos na região. Apresenta também os riscos adicionais à inclusão agora colocados pela pandemia da COVID-19. Com base no Relatório Global de Monitorização da Educação 2020, documenta as barreiras enfrentadas pelos alunos, particularmente onde se cruzam múltiplas desvantagens. As suas recomendações fornecem um quadro sistemático para identificar e desmantelar estas barreiras, de acordo com o princípio de que "todos os aprendentes são importantes e igualmente importantes".

Para aceder ao relatório, aqui.

Traduzido com a versão gratuita do tradutor - www.DeepL.com/Translator