sábado, 21 de dezembro de 2024

Há desigualdade aos três anos de idade?

A desigualdade é um dos problemas mais difíceis de resolver no nosso sistema de ensino. De facto, os rendimentos dos nossos pais vão influenciar muito as circunstâncias em que crescemos, e os recursos e escolas a que temos acesso. A pobreza é assim um fator que influencia muito a capacidade de os alunos terem melhores resultados na escola, ou seja, de adquirirem mais conhecimentos, que lhes permitam lutar, em adultos, por uma vida melhor.

Quando olhamos para o caso de Portugal, vemos que, ao longo das duas primeiras décadas do século XXI, os alunos mais pobres tinham cerca de dois anos de atraso nos conhecimentos, quando comparados com os colegas nascidos em famílias de maiores rendimentos. Como termo de comparação, e usando os dados dos testes do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA), concluímos que, em Inglaterra, no final da década de 2010, esse mesmo fosso era inferior a metade, ou seja, os alunos mais pobres tinham um atraso de cerca de 11 meses em relação aos colegas.

Mas onde começam estas desigualdades? A resposta pode ser surpreendente para alguns. Na verdade, uma parte importante desta desigualdade no sistema de ensino acontece até aos três anos de idade, ou seja, antes mesmo de uma criança entrar na escola.

Vamos usar os dados disponíveis para o caso inglês que, infelizmente, não existem para Portugal. Em parte, isto acontece porque, em Inglaterra, existem recolhas de dados muito completas e até alguns estudos longitudinais. Este método de investigação segue uma criança do nascimento à idade adulta, permitindo analisar o que acontece ao longo da sua vida.

Uma análise recente, coordenada por Sir Angus Deaton, vencedor do Prémio Nobel, para o Institute for Fiscal Studies olhou para dois grupos acompanhados nestes estudos longitudinais: um de pessoas nascidas em 1970, outro de nascidas em 2000. A estes dados, juntaram outros questionários que lhes permitiram chegar a três conclusões.

Em primeiro lugar, confirma-se que as crianças desenvolvem as suas competências de forma muito desigual logo quando são muito pequenas. Aos três anos, as crianças nascidas nos agregados familiares com mais rendimentos apresentam uma probabilidade três vezes superior de ter elevadas competências cognitivas, sociais e emocionais do que as crianças de famílias mais desfavorecidas.

A segunda conclusão é que muitas destas diferenças acontecem por causa do ambiente em que a criança cresce, o que inclui pelo menos três fatores: educacionais (tais como a escolaridade dos pais ou acesso à creche), materiais (por exemplo, a habitação ou a alimentação) e emocionais (como as relações entre os pais, conflitualidade, a hora de deitar da criança ou a saúde mental dos progenitores). O relatório dá como exemplo o impacto que a pobreza tem nas mães, que, sabemos, também em Portugal é um dos fatores que mais influencia o desenvolvimento dos filhos, e também as suas notas na escola.

Por exemplo, as mães mais pobres têm 11 vezes maior probabilidade de sofrer de problemas de saúde mental como ansiedade, depressão ou stresse elevado, fatores que vão influenciar o desenvolvimento da criança logo aos três anos. Por outro lado, também há diferenças significativas quanto ao comportamento e aos estímulos dos pais: o relatório realça que 76% dos pais em famílias de maiores rendimentos leem histórias aos filhos todos os dias, número que representa quase o dobro das famílias mais desfavorecidas.

A última grande conclusão é que os primeiros anos vão ter uma influência muito grande quando crescemos, e até nos nossos salários na idade adulta. Aqui, também a escolaridade das mães parece ser um fator importante: as crianças com mães mais escolarizadas terão, em adultas, rendimentos cerca de um terço superiores às das outras crianças com mães menos escolarizadas. Metade destas diferenças salariais em adulto podem ser explicadas pelo desenvolvimento das crianças nos primeiros anos.

No essencial, o relatório pinta uma realidade com consequências importantes: uma parte muito substancial da desigualdade na educação já está vincada antes mesmo de uma criança entrar para a escola, entre os cinco e os seis anos.

Outros dados que temos disponíveis, por exemplo, os do Education Policy Institute, confirmam que, antes mesmo de entrarem para o 1.º ano, os alunos desfavorecidos já têm quatro meses e meio de atraso em relação aos colegas. Esse atraso vai crescendo proporcionalmente, de forma mais ou menos linear, conforme o tempo passa, duplicando no final do ensino primário e aumentando também no ensino secundário.

Ora, isto quer dizer que uma criança começa a escola já com um atraso nos conhecimentos, e esse atraso, que já lá estava, apenas vai aumentando à medida que o aluno progride no sistema de ensino. Leva-nos isto a uma questão muito importante: será que, se combatêssemos a desigualdade antes de as crianças entrarem na escola, podíamos diminuir de forma substancial a desigualdade à saída?

Os investigadores têm explorado algumas formas interessantes de o fazer, designadamente investindo na educação na creche e no pré-escolar ou mediante apoio financeiro direto às mães com menos rendimentos.

Infelizmente, em Portugal, por vezes o nosso sistema faz com que estas soluções sejam aplicadas do avesso, agravando problemas que deviam resolver. Por exemplo, de acordo com o relatório Portugal, Balanço Social, as crianças nascidas em famílias de maiores rendimentos tinham mais acesso à creche, e quase 60% das crianças de contextos desfavorecidos não frequentam a creche até aos três anos. Será que, se investíssemos mais cedo nas crianças que mais precisam, poderíamos acabar com a desigualdade?

As opiniões expressas neste artigo são exclusivamente do autor e não refletem os princípios ou posições das organizações às quais está associado.

Miguel Herdade

quarta-feira, 18 de dezembro de 2024

Referencial de Instituições e Participação Democrática



Encontra-se publicado, no site da Cidadania, o Referencial de Instituições e Participação Democrática.

Instituições e Participação Democrática é um dos domínios que integra a Estratégia Nacional de Educação para a Cidadania.

O Referencial publicado constitui uma base de trabalho essencial para abordar o domínio das Instituições e Participação Democrática, devendo ser adaptado ao Projeto Educativo da escola e à Estratégia de Educação para a Cidadania na Escola.

O documento funciona como um instrumento de apoio para docentes e agentes educativos, estruturando temas, subtemas, objetivos, descritores de desempenho, bem como, um conjunto de recursos que guiam na aquisição de conhecimentos e o desenvolvimento de competências, em alinhamento com os princípios do Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória.

Propõe-se a abordagem, na educação pré-escolar e nos ensinos básico e secundário, dos seguintes temas:

Democracia, Estados Democráticos, Instituições da Democracia.
Participação política de Portugal no Mundo: União Europeia, Instituições Internacionais.
Formas de participação democrática: Cidadania Portuguesa, Europeia, Global.

Na elaboração deste referencial foram parceiros da DGE o Centro de Informação Europeia Jacques Delors (Direção-Geral dos Assuntos Europeus - Ministério dos Negócios Estrangeiros), a Assembleia da República, a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (Direção de Ação Cultural e Língua Portuguesa), a Associação 25 de Abril e o Fórum dos Cidadãos.


Fonte: DGE

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Tutorias psicopedagógicas

O Ministério da Educação, Ciência e Inovação elaborou uma nota informativa sobre Tutorias psicopedagógicas, onde pretende clarificar conceitos e sugere formas de operacionalização. Do documento, destaca-se o seguinte:

As tutorias psicopedagógicas: definição, objetivos e metas

A tutoria psicopedagógica é uma medida de suporte à aprendizagem e à inclusão, que configura um apoio preventivo desde o 1º ciclo, para desenvolver competências pessoais, sociais e emocionais de crianças que apresentam fatores preditores de insucesso escolar.

Pela sua natureza preventiva, as tutorias psicopedagógicas configuram uma medida universal, uma vez que é preventiva e tem em vista o desenvolvimento pessoal e social dos alunos que ainda não manifestaram elevados níveis de insucesso, ao ponto de ficarem retidos ou abandonarem precocemente a escola. Assim, não deve ser considerada como uma medida seletiva no âmbito do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho.

As tutorias psicopedagógicas têm como objetivos complementares:
  • o desenvolver competências de aprendizagem autorregulada que permitam a cada criança realizar as aprendizagens curriculares com qualidade, prevenindo o insucesso e o abandono escolar precoce;
  • o desenvolver competências que permitam a cada criança começar a construir um percurso de sucesso sustentável e a reconstruí-lo ao longo do ser percurso escolar.
As competências pessoais, sociais e emocionais envolvem, entre outras, aprender a aprender, metacognição, autorregulação, autoconhecimento, resiliência, resolução de problemas e competências empreendedoras.

São metas das tutorias psicopedagógicas que as crianças e jovens beneficiários da medida concluam o ensino básico sem retenções e concluam com sucesso o ensino secundário sem necessidade de alterar o seu percurso formativo, evidenciando uma escolha informada sobre o seu percurso formativo.

As tutorias psicopedagógicas: características-chave e destinatários

Existem cinco caraterísticas-chave das tutorias pedagógicas que enquadram a sua intervenção:

1. Abordagem holística: Considera o aluno como um todo, integrando aspetos físicos, emocionais, sociais e cognitivos.

2. Intervenção precoce e preventiva: Inicia-se no 1º ciclo, antes que as dificuldades de aprendizagem se evidenciem ou agravem.

3. Multidisciplinar: Este apoio é prestado envolvendo colaborativamente tutores, professores com formação específica, professores titulares de turma, equipas pedagógicas, EMAIE, outros técnicos e as famílias.

4. Orientação para o futuro: Foca-se na construção de percursos de sucesso sustentáveis de cada criança e jovem.

5. Fortalecimento de competências em contexto curricular: Desenvolve competências pessoais, sociais e emocionais, dentro e fora da sala de aula, essenciais para o sucesso escolar e para a vida em sociedade.

As tutorias psicopedagógicas destinam-se preferencialmente a crianças que frequentam o 1º ciclo do ensino básico, apresentam um percurso escolar sem retenções e reúnem pelo menos dois dos três fatores, que de acordo com a evidência científica, são preditores de insucesso e abandono escolar: o contexto socioeconómico desfavorecido das famílias, o baixo nível de qualificação das mães, e a condição de migrante ou de provir de uma família migrante.

Nos Agrupamentos de Escolas onde a situação se coloque, nomeadamente por motivos de gestão dos recursos humanos, sugere-se ser dada prioridade à ação junto de crianças que frequentam os 3º e/ou 4.º anos de escolaridade e apresentam todos os preditores de insucesso.

As tutorias psicopedagógicas: modelo de intervenção

A tutoria psicopedagógica deve ser dinamizada ao longo de duas fases. Na primeira fase, ao longo do 1º ciclo, com base num diagnóstico inicial, deve ser realizado e implementado o plano de ação tutorial com o objetivo de desenvolver competências pessoais, sociais e emocionais, que permitam a cada aluno realizar mais e melhores aprendizagens, assim como construir percursos de sucesso. Nesta fase, o tutor deve, além do trabalho direto com as crianças, assumir o papel de parceiro dos respetivos professores titulares, bem como dos futuros tutores e outros atores, sempre que necessário, para garantir uma intervenção holística.

Na segunda fase, ao longo dos 2º e 3º ciclos, os alunos devem continuar a ser acompanhados para consolidação das competências. Nesta fase, o tutor do 1º ciclo passa a assumir progressivamente os papéis de formador e conselheiro, passando a função de tutor a ser desempenhada por outros técnicos ou professores com formação específica.

O perfil do tutor das tutorias psicopedagógicas

No 1º ciclo do Ensino Básico, o tutor deve ser um técnico especializado com um perfil funcional que abranja várias competências e capacidades, entre as quais:

• capacidade de comunicar, interagir e estabelecer uma relação de confiança e proximidade com os alunos e de promover um ambiente seguro e favorável ao seu desenvolvimento;

• conhecimento das teorias e práticas psicopedagógicas e capacidade de identificar e intervir nas dificuldades de aprendizagem dos alunos, e de colaborar com os professores na identificação de aspetos críticos e na construção de ambientes de aprendizagem adequados às caraterísticas do público-alvo;

• conhecimentos científico e prático especializados sobre estratégias para identificar e desenvolver competências pessoais, sociais e emocionais em contexto escolar;

• capacidade para apoiar e orientar os alunos a desenvolverem estratégias de estudo eficazes, a serem autónomos no processo de aprendizagem e a superarem obstáculos pessoais e académicos;

• capacidade de organização, planeamento e gestão, para monitorizar o progresso dos alunos, planear sessões de tutoria e colaborar com os diferentes atores envolvidos;

• demonstrar empatia e paciência, crucial para criar um ambiente de aprendizagem positivo e acolhedor.

A partir do 2º ciclo do Ensino Básico, o papel de tutor deverá ser assegurado por outros técnicos ou professores com formação específica ministrada pelo tutor (1º ciclo) e/ou formação adquirida no âmbito da implementação do plano tutorial específico, dinamizada pela DGE, ou de outra formação que venha a ser disponibilizada para o efeito.

O que diferencia as tutorias psicopedagógicas de outras tipologias de tutoria?

Foco na prevenção e numa ação precoce (1º ciclo), lideradas (preferencialmente) por um técnico especializado que, em colaboração estreita com os professores titulares de turma, centra a sua ação no desenvolvimento de competências pessoais, sociais e emocionais das crianças em risco de insucesso.

Foco na aprendizagem autorregulada, que é considerada um preditor mais forte de bom desempenho académico do que a inteligência (QI) e é essencial para o sucesso académico, razão pela qual deve ser desenvolvida tão cedo quanto possível.

Foco na construção de percursos de sucesso, através da promoção do autoconhecimento, da exploração de oportunidades e recursos disponíveis no meio envolvente, da (re)formulação de objetivos, bem como no desenvolvimento de competências que facilitam a gestão de transições escolares.

Foco nas soluções, e não nas características pessoais do aluno. Ao contrário de outros modelos de tutoria assentes na relação “um tutor + um tutorando”, trata-se de uma intervenção que se afasta do modelo clínico. Em vez de privilegiar um quadro de planeamento individualizado, adota uma perspetiva que envolve todas as crianças ou toda a turma, quando se realiza em contexto de sala de aula.

Foco na colaboração, dado que tutor e professores titulares de turma, numa primeira fase, e equipas pedagógicas e outros tutores, numa segunda fase, são solicitados a desenvolver atividades promotoras de aprendizagem colaborativa, em rede e em meio escolar, respeitando as áreas de competência científica de cada ator.


segunda-feira, 16 de dezembro de 2024

Saber ler para viver melhor

Um quarto dos alunos portugueses a frequentar o quarto ano não têm níveis razoáveis de leitura e 23% dos jovens de 15 anos manifesta grandes dificuldades a ler. Com base nestes dados, do PIRLS de 2021 e do PISA de 2022, e no conhecimento de que uma intervenção precoce é essencial para que as crianças ultrapassem as dificuldades a Iniciativa Educação criou o programa “A a Z - Ler Melhor, Saber Mais”, destinado a apoiar os alunos do primeiro e segundo anos de escolaridade.

Como explicou Nuno Crato, o presidente da Iniciativa Educação, a escolha dos alunos que acabaram de iniciar o seu percurso escolar como alvo do programa baseia-se em estudos que mostram a importância da intervenção precoce para uma eventual recuperação. “O professor João Lopes [professor de psicologia na Universidade do Minho e coordenador nacional do programa A a Z] alertou-nos para o facto de que os jovens que têm dificuldade de leitura logo no primeiro e segundo ano de escolaridade têm possibilidades relativamente rápidas de recuperação e de atingir os níveis médios das turmas”, explicou o presidente da IE. Na verdade, a taxa de recuperação de esquemas de apoio aplicados a alunos de primeiro e segundo ano chega aos 80%. Uma percentagem que cai para metade nos dois anos seguintes e que, chegado ao quinto ano, não ultrapassa os 10%. “O que acontece é que a leitura e a escrita são instrumentos de aprendizagem. Ou seja, se eu não tiver esse instrumento não vou conseguir progredir razoavelmente”, explicou João Lopes.

Preparar o futuro

Este é um programa cujo impacto é prolongado no tempo, como ficou claro no segundo episódio dedicado ao tema, que reuniu Gabriela Velasquez, a coordenadora regional do programa para o distrito do Porto, e Fernando Ferreira, docente no Agrupamento de Escolas nº1 de Gondomar e professor-tutor do programa nos últimos cinco anos, que tem testemunhado em primeira mão os resultados práticos do programa “A a Z”. A participação nas atividades da turma é um dos mais visíveis, refere Fernando Ferreira, que recorda a maior vontade de ler em sala de aula, como uma das principais transformações. “Um aluno com dificuldades na leitura não quer fazer os exercícios de leitura em voz alta”, explica o professor-tutor que deu ainda dois exemplos de sucesso do programa: uma aluna que concluiu o primeiro ciclo no quadro de mérito e uma outra que chegou a participar no Concurso Nacional de Leitura.

O fim das ‘dores de barriga’

Por seu turno, Célia Oliveira, psicóloga, professora na Universidade Lusófona e consultora do programa “A a Z” e Francelina Manso, professora na escola básica Gomes Freire de Andrade e coordenadora regional de Lisboa do programa, dedicaram o terceiro episódio do programa a analisar o impacto no bem-estar físico e mental das crianças. Isto porque, como mostra a investigação científica, as dificuldades de aprendizagem da leitura estão associadas ao aparecimento de problemas de ansiedade, baixa autoestima e dificuldades sociais.

“Um estudo de 2022 mostra claramente que há um aumento da ansiedade e uma diminuição da autoestima nas crianças que apresentam dificuldades na aprendizagem da leitura logo nas fases iniciais dessa aprendizagem. Mas quando estas crianças recebem apoio e começam a evoluir nesta aprendizagem da leitura, os seus níveis de autoestima aproximam-se dos das crianças que não têm dificuldade”, referiu Célia Oliveira, que citou ainda um estudo de acordo com o qual alunos com dificuldades de aprendizagem de leitura no segundo ano de escolaridade têm maiores probabilidades de desenvolver ansiedade social no quinto ano.

A ultrapassagem das dificuldades leva a um novo entusiasmo por parte dos alunos, como relatou Francelina Manso, recordando o caso de Sofia, que passou a ter muito maior disponibilidade para aprender e participar em sala de aula, mas também para ajudar os colegas. Depois de lidar com as suas fragilidades, o aluno aprende a lidar com as suas potencialidades e a partilhar esse conhecimento com os colegas, explica a coordenadora regional de Lisboa. “Há um olhar muito mais atento destas crianças para o colega que tem dificuldades - seja na leitura seja na escrita, seja até noutras áreas curriculares. Aquilo em que noto maior diferença é a confiança que as crianças ganham, não só em sala de aula, mas a confiança para se disponibilizarem para outras atividades”, diz.

Fonte: Dinheiro Vivo por indicação de Livresco

sábado, 14 de dezembro de 2024

A falta de recursos e de dados nacionais prejudica o problema da escassez de professores do educação especial

A Comissão dos Direitos Civis dos EUA organizou recentemente uma sessão de informação de um dia sobre a questão urgente da escassez de professores a nível nacional e sobre a forma como essa escassez afeta especificamente os alunos com deficiência. A sessão de informação incluiu testemunhos de investigadores, funcionários governamentais, educadores e estudantes que vivem a realidade quotidiana desta questão.

A sessão de informação incluiu quatro painéis: “O ensino público na era pós-pandémica”, “Debate sobre a escassez de professores no âmbito da defesa da educação”, “Do terreno: Educadores sobre a escassez de professores” e ”Do campo: Ouvir as pessoas afetadas”, todos eles moderados pela Presidente da Comissão, Rochelle Garza.

Uma ligação importante

Garza tem um interesse pessoal na questão, uma vez que ambos os seus pais eram professores de escolas públicas e o seu irmão, Robby, tinha graves deficiências até falecer em 2003. O irmão de Garza, Robby, sofreu uma lesão cerebral traumática à nascença que o impediu de andar, falar ou ver.

“Mas ele era um ser humano que merecia dignidade, respeito e educação. E os meus pais lutaram com unhas e dentes por isso para ele”, partilhou Garza numa entrevista após a sessão de informação.

Garza cresceu numa comunidade rural, numa estrada que liga a quinta ao mercado, o que dificultava a ida e a volta do irmão à escola.

“Conseguir um autocarro para o ir buscar não era uma realidade até muito mais tarde, por isso o ónus de ter de ir buscar o meu irmão era muito grande para os meus pais. E isso é incrivelmente difícil para as famílias trabalhadoras que não têm a capacidade, os meios, de suportar todos esses custos adicionais”, disse Garza.

A falta de professores

Isso foi na década de 1980, mas atualmente, as escolas das zonas rurais continuam a ter dificuldades em proporcionar aos alunos os recursos de que necessitam, especialmente aos alunos com deficiência. De acordo com Garza, a escassez de professores atinge mais as zonas rurais porque é mais difícil atrair e manter professores qualificados.

No ano letivo de 2023-24, havia cerca de 40,000 vagas de ensino conhecidas em todo o país, mas isso não inclui Nova York e Califórnia, onde faltam dados de vagas, tornando a estimativa nacional mais próxima de 60,000, de acordo com pesquisa de Tuan D. Nguyen, professor associado do Departamento de Liderança Educacional e Análise de Políticas da Universidade de Missouri.

Esta escassez levou a um aumento do número de professores pouco qualificados nas salas de aula devido a um aumento das licenças de emergência e provisórias emitidas para professores substitutos. Além disso, os Estados reduziram os requisitos de ensino e as certificações necessárias, pediram a ajuda dos pais, importaram professores internacionais e colocaram a Guarda Nacional nas salas de aula. Os dados mais recentes do Learning Policy Institute sugerem que cerca de 400 000 professores nos EUA - cerca de 10% da força de trabalho de professores - são subqualificados. No entanto, estes dados baseiam-se principalmente na investigação de Nguyen, por oposição à informação do Departamento de Educação, que recolhe dados sobre a escassez de professores de educação especial mas não os partilha publicamente.

Eliminar o Departamento de Educação?

Muitos dos participantes nos vários painéis manifestaram a preocupação de que o desejo do Presidente eleito Donald Trump de dissolver o Departamento de Educação venha a agravar ainda mais estas questões. No entanto, alguns, como Eric Hanushek, da Hoover Institution da Universidade de Stanford, acreditam que o financiamento federal pode continuar sem o departamento.

“Não me parece que a eliminação do Departamento de Educação possa fazer muito. O Departamento de Educação é principalmente responsável pelo desembolso de verbas. Esses desembolsos iriam para outro departamento... talvez um novo [Serviços de Saúde e Humanos] ou algo do género”, disse Hanushek.

“Mas não nos foi dito quem iria exatamente garantir que esses fundos estão a ser utilizados de forma adequada”, disse Garza. “É uma questão de direitos civis e de aplicação da lei.”

Ainda assim, o problema persiste, mais do que o departamento que irá gerir os fundos. Uma das políticas fundamentais que poderia aliviar a questão é a Lei da Educação dos Indivíduos com Deficiência, que não foi totalmente financiada desde a sua criação. Não se sabe ao certo por que razão a lei não foi totalmente financiada, embora muitos dos participantes no painel partilhem o sentimento de que a sociedade não respeita a profissão de professor e, mais especificamente, os educadores que trabalham com alunos com deficiência.

Os membros do painel propuseram várias soluções para colmatar as lacunas em matéria de educadores especiais, incluindo dar mais voz aos pais na educação dos seus filhos, aumentar o rácio aluno/professor e aumentar os salários dos professores. Ao longo da sessão de informação, surgiram três temas claros: o financiamento integral da IDEA, o aumento dos dados sobre o estado da escassez de professores e a melhoria da valorização pública da profissão docente.

Financiar integralmente o IDEA

A principal solução proposta pelos membros do painel e pelos comissários foi o financiamento integral do IDEA. Mesmo com o Departamento de Educação intacto, segundo Garza, o IDEA só tem sido financiado em cerca de 15%, embora o governo devesse cobrir 40% das suas despesas.

“O ensino público tem sido uma pedra angular da sociedade americana. Tem sido algo acessível a todas as famílias, independentemente da sua situação financeira”, afirma Garza. Na sua opinião, a educação financiada pelo governo federal deveria nivelar o campo de ação para todos os estudantes americanos, mas essa marca é perdida quando os estudantes com deficiência não têm acesso aos recursos de que necessitam devido à falta do financiamento prometido.

“Devíamos cumprir essas promessas e não desfinanciar o ensino público à custa dos estudantes com deficiência”, afirmou Garza.

Aumentar a infraestrutura de dados

A falta de dados - e a consequente análise - em torno da escassez de professores de educação especial a nível nacional agrava a questão, desvalorizando-a. Mais dados sobre a escassez de professores de educação especial, o esgotamento e a rotatividade permitiriam que os fundos chegassem às áreas mais necessitadas, aumentando a equidade e o acesso aos recursos para os alunos afetados.

Melhorar a avaliação pública dos professores

Em média, os professores norte-americanos ganham 68 000 dólares, ou seja, menos 8% do que a média das pessoas no mercado de trabalho. Assim, 17% dos professores têm um segundo emprego fora da escola, enquanto 36% ainda estão a tentar pagar os empréstimos estudantis. Sem apoio público e financiamento governamental, estes professores registam elevados níveis de esgotamento que aumentam a rotatividade dos professores nas escolas, conduzindo a piores resultados para os alunos. Devido à já mencionada falta de dados, estes números não são específicos do domínio da educação especial, pelo que a dimensão desta luta é sobretudo anedótica.

Uma forma de melhorar esta baixa valorização é investir nas linhas de recrutamento de professores das comunidades rurais e urbanas para inspirar os estudantes a entrar na profissão docente. No entanto, isto exigirá dados e apoio monetário para fornecer incentivos financeiros e bónus às áreas mais necessitadas.

A Comissão dos Direitos Civis dos Estados Unidos aceitará comentários do público até 15 de dezembro, antes de compilar todos os testemunhos e informações num relatório com recomendações políticas.

“O nosso papel é garantir que o presidente e o Congresso sejam informados destes desafios específicos”, disse Garza, ‘e depois, esperamos, fazer algumas recomendações que nos possam levar a um lugar melhor no que diz respeito ao acesso à educação especial para estudantes com deficiência’.

Garza acredita que, mesmo que o Departamento de Educação seja desmantelado quando o relatório estiver concluído, “é importante reconhecer o que está a acontecer, ou seja, que existe uma escassez de professores em todo o país e que há formas de a resolver”.

Por Alyson Trager

Traduzido com a versão gratuita do tradutor - DeepL.com

Fonte: Smart Brief por indicação de Livresco

sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Ensinar a escrever pode ajudar os alunos a falar bem

O termo «oratória» refere-se à capacidade de discursar e debater ideias. Este conceito está na ordem do dia em Inglaterra porque o Partido Trabalhista, atualmente no poder, pôs a oratória no centro da sua política educativa. Isto foi recebido com alguma apreensão: receia-se que a oralidade passe a ser considerada uma competência autónoma, como se fez com o «pensamento crítico», o que é um erro. Sabemos que ambas as competências dependem muito do contexto.

O debate que a valorização da oratória suscitou em Inglaterra pode ser muito útil aos professores e especialistas em educação de outros países. (É importante lembrar que, apesar de a Inglaterra fazer parte do Reino Unido, os outros países constituintes controlam os seus sistemas educativos, e o reforço da oratória é um fenómeno que ocorre apenas em Inglaterra.)

A oratória não significa apenas ensinar as crianças a falar. É óbvio que quase todas as crianças aprendem a falar sem instrução explícita, pelo menos a sua língua materna. Há, no entanto, vários tipos de conversação, incluindo um género mais formal que a maior parte das crianças não adquire naturalmente.

As vantagens de aprender e dominar um discurso formal não se limitam à possibilidade de discursar em público ou de vir a participar em debates oficiais, atividades a que apenas uma minoria dos adultos de dedica. Como defende James Mannion, um apoiante da oratória da Universidade de Cambridge, a oratória reforça em termos gerais a autoconfiança dos alunos e pode ajudá-los a causar uma boa impressão, destacar-se em entrevistas de emprego ou fazer amigos.t

Com base na sua experiência de criador e praticante de um «programa que tinha por base a oratória» numa escola secundária há alguns anos, James Mannion considera que o enfoque na oratória foi transformador para estes alunos.

Um dos alunos disse o seguinte acerca deste programa: «Ensinou-me a não ficar calado. Mostrou-me que as minhas ideias são importantes. Agora tenho coragem para participar em todas as aulas.» James Mannion refere que o grupo que seguiu este programa «obteve nos exames os melhores resultados que esta escola já viu», sendo que os alunos de contextos desfavorecidos foram os mais beneficiados.

Oratória e escrita

Clare Sealy é uma britânica especialista em educação cuja reflexão sobre oratória — e em particular a relação entre a escrita e a fala — é sobremaneira interessante. Clare Sealy defende que aprender a escrever é um passo fundamental para o domínio do discurso mais formal que é descrito como oratória.

Clare Sealy argumenta que escrever implica «a aprendizagem de uma nova língua, uma língua que não é a língua materna de ninguém». Quando falamos, ao contrário do que acontece quando escrevemos, usamos muitas vezes frases entrecortadas, linguagem ambígua e estruturas sintáticas e vocabulário mais simples. É muito mais provável que usemos expressões como «bom» ou «do género» para encadear o pensamento durante uma conversa do que uma expressão como «demais a mais». (A primeira pessoa que ouvi defender a ideia de que a linguagem escrita é como uma segunda língua foi Judith Hochman, coautora do meu livro The Writing Revolution, há muitos anos.)render a escrever é s formal

Escrever como falamos – principalmente da forma como muitos jovens falam – não funciona por vários motivos. É impossível conseguirmos ver quem nos lê da mesma forma que olhamos para alguém com quem estamos a conversar, e quem nos lê também não nos consegue ver. Isso significa que não podemos usar gestos nem a entoação vocal para esclarecer o significado de termos mais vagos, e quem nos lê não nos pode avisar que está a ter dificuldades. Além disso, os erros gramaticais perturbam mais um leitor do que um interlocutor. Os erros escritos ficam para sempre na página ou no ecrã, em vez de desaparecerem em vibrações sonoras.

Uma das vantagens de aprendermos a utilizar esta «segunda língua» escrita é o facto de ela nos ajudar na compreensão da leitura. Quem consegue utilizar uma expressão como «demais a mais» ou orações subordinadas quando escreve, irá provavelmente ser capaz de as compreender quando as encontrar em conteúdo escrito por outrem.

Outra vantagem é que, quando aprendemos a exprimir-nos de forma mais complexa, os nossos pensamentos também se tornam mais complexos. Aprender aquilo a que Clare Sealy chama «linguagem de escrever» permite «organizar e alargar o pensamento», bem como «fortalecer a capacidade de pensar de forma abstrata e analítica», diz a autora. Essa aprendizagem é depois transferida para o discurso académico — a tal oratória — que «flutua num mar de linguagem escrita».

Simultaneamente, escrever é muito mais difícil do que falar — é pelo menos mais difícil do que falar sem qualquer formalidade. Como refere a ciência cognitiva, escrever impõe uma «carga cognitiva» mais pesada à memória de trabalho. Se tentarmos escrever sobre assuntos mais complexos, ou sobre os quais pouco sabemos, essa carga aumenta ainda mais.

Para que os alunos aprendam a escrever, é importante que os professores consigam modular essa carga cognitiva, dividindo o processo em partes mais viáveis. É preciso começar ao nível da frase e fornecer instruções específicas, praticando muito e repetidamente cada etapa. Os professores também precisam de garantir que os alunos sabem o suficiente sobre o tema em questão: só assim conseguirão escrever sobre ele de forma coerente. Escrever sobre um assunto que conhecemos bem pode revelar-se simples, mas ninguém é capaz de escrever sobre algo que não consegue compreender.

E à medida que os níveis de ensino vão subindo e os temas se vão tornando mais complexos, escrever torna-se cada vez mais difícil. É por isso que a escrita — juntamente com a compreensão da leitura e a oralidade — não pode ser vista como uma capacidade ou um conjunto de capacidades que podem ser ensinadas de forma totalmente abstrata.

A ligação entre oralidade e escrita é bidirecional

Os alunos podem beneficiar muito se entendermos a escrita como um processo aliado à fala, bem como à audição e à leitura (todos elas parte integrante do processo de aprendizagem). Como aponta Clare Sealy, a aprendizagem da linguagem complexa da escrita pode facilitar um pensamento e um discurso mais complexos. Mas importa perceber que esta influência se dá também no sentido inverso: pensar e falar sobre um assunto, mesmo que de forma informal, pode incentivar a que se escreva com maior facilidade sobre ele.

Tive oportunidade de observar esta ligação bidirecional numa sala de aula em Monroe, no estado norte-americano do Louisiana, um agrupamento escolar bastante desfavorecido que adaptou o programa que descrevo em The Writing Revolution ao currículo diversificado que por norma segue. A professora de uma turma do terceiro ano em que os alunos leram A Teia de Carlota começou por organizar um debate sobre uma das personagens principais. O segundo passo foi dar aos alunos um exercício com base nas ideias que tinham surgido no debate: os alunos receberam um conjunto de frases às quais faltavam conjunções como «porque», «mas» e «logo» para completar individualmente. Depois deste exercício, houve um novo debate onde se conversou sobre as respostas que cada um tinha dado.

A mera utilização de conjunções simples como as deste exemplo pode enriquecer a linguagem oral. Professores do ensino básico e secundário em Monroe garantiram-me que bastam alguns meses a fazer exercícios como o do porque/mas/logo para as melhorias na expressão oral de todos os alunos se tornarem evidentes.

«A comunicação oral deles ficou dez vezes melhor», afirma um professor do primeiro ano. «No começo do ano letivo, respondiam com uma palavra apenas. Mas como aprendemos a fazer frases completas, agora os alunos respondem com frases completas. E depois há outra criança que pergunta: “Posso acrescentar uma coisa à frase dele?” E acrescentam um porque.»

Estes exercícios estão a lançar as bases para uma linguagem oral mais complexa — e para um pensamento e uma escrita mais complexos. Porque ou logo irão dar origem a por conseguinte ou portanto, e mas transformar-se-á em por outro lado e em não obstante. Os professores do ensino básico com quem falei previram que a exposição precoce a formas de linguagem escrita iria facilitar o progresso desses alunos nos anos seguintes. E os professores dos níveis de ensino superiores confirmaram essa previsão: «Percebemos todos os anos que as crianças chegam aos níveis superiores a escrever melhor», revelou um professor de humanidades do sexto ano.

Os professores do ensino básico e secundário também me disseram que o ensino da escrita melhora em termos gerais a compreensão da leitura, a motivação e a aprendizagem. Embora este grupo não tenha apontado melhorias na linguagem oral dos alunos, outros professores que utilizaram este método já o referiram.

A oratória, no sentido de falar em público ou debater, pode exigir algumas capacidades que não pertencem à escrita, como saber quando fazer uma pausa enfática. Mas ambas têm sem dúvida muitos aspetos em comum. A juíza do Supremo Tribunal estado-unidense Sonia Sotomayor descreve no seu livro de memórias a dificuldade que tinha em escrever quando iniciou o seu percurso universitário em Princeton. No entanto, Sonia Sotomayor apercebeu-se rapidamente de que podia recorrer às técnicas de oratória que aprendera no liceu para escrever dissertações. E acabou por entrar para a história.

Seria bom que as escolas de outros países prestassem mais atenção à oratória, mas o risco — tal como está a acontecer em Inglaterra — é que a oratória comece a ser vista como a solução para tudo e algo que pode ensinar isoladamente. Não precisamos de «programas especiais de oratória», com matérias próprias, tal como não precisamos de programas de escrita separados do resto.bom que as escolas de outros países prestassem mais

A oratória e a escrita, juntamente com a oralidade e a audição, têm de ser vistas como componentes da aprendizagem que só se podem desenvolver em conjunto com o conhecimento — e esse conhecimento deve estar integrado num programa coerente e rico em conteúdos que comece logo nos primeiros anos de escolaridade. Os alunos não serão capazes de falar bem nem de escrever bem sobre temas que conhecem pouco. Ao mesmo tempo, tanto a oralidade como a escrita são formas de aprofundar e reforçar o conhecimento.

Esta publicação é uma tradução e adaptação do artigo «Want Students to Be Good Speakers? Teach Them to Write», disponível aqui.


Natalie Wexler

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

Formação de professores vai incluir saúde emocional

É uma das recomendações do Observatório da Saúde Psicológica e do Bem-Estar: a introdução da promoção de competências socioemocionais e a valorização da diversidade e do autocuidado na formação inicial dos futuros educadores e professores.

Na reunião para a apresentação do estudo sobre a saúde psicológica nas escolas, o secretário de Estado da Administração e Inovação Escolar, Pedro Dantas da Cunha, confirmou que uma das alterações do regime de habilitações é a integração da literacia socioemocional, diversidade e inclusão como áreas obrigatórias. O diploma começa a ser negociado quinta-feira com os sindicatos. (...)

Fonte: JN por indicação de Livresco

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Número de alunos com “vulnerabilidades psicológicas” baixou

O Ministério da Educação, através da DGEEC, apresenta o relatório do estudo “Observatório Escolar: Monitorização e Ação | Saúde Psicológica e Bem-estar”, que teve como principal objetivo proceder à recolha e monitorização de indicadores de saúde psicológica e bem-estar nas escolas portuguesas, tendo em vista o desenho de propostas de intervenção diferenciadas, em função das necessidades identificadas, por grupos etários e por região geográfica.

Recorde-se que no âmbito do Plano de Recuperação das Aprendizagens 21|23 Escola +, e tendo em conta o “domínio inclusão e bem-estar” do eixo “Ensinar e Aprender”, com vista ao reforço das competências socio-emocionais no cumprimento do Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, considerou-se importante monitorizar a saúde psicológica e bem-estar nas escolas, numa iniciativa inédita.

Este estudo resulta de um trabalho de parceria entre a Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, Direção-Geral da Educação, Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, Equipa Aventura Social/ ISAMB, Universidade de Lisboa, Ordem dos Psicólogos Portugueses e Fundação Calouste Gulbenkian, e conta com a coordenação científica da Professora Doutora Margarida Gaspar de Matos (Equipa Aventura Social/ ISAMB, Universidade de Lisboa).

O estudo está disponível em: https://www.dgeec.mec.pt/np4/1357.html

Fonte: DGE

Em Portugal 40% dos adultos só compreendem textos simples e matemática básica

Portugal participou num inquérito da OCDE às competências dos adultos em literacia e resolução de problemas e, numa comparação entre 31 países, aparece entre os últimos da tabela.

Cerca de 40% dos adultos que vivem em Portugal só conseguem compreender textos simples e resolver aritmética básica, segundo um estudo da OCDE em que os portugueses apenas são melhores do que os chilenos. Apenas os chilenos têm mais dificuldades do que os portugueses a interpretar textos ou a realizar operações matemáticas necessárias no seu dia-a-dia, segundo os resultados divulgados esta terça-feira pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

Pela primeira vez, Portugal participou no Inquérito às Competências dos Adultos de 2023, que avalia as competências da população em literacia, numeracia e resolução adaptativa de problemas e, numa comparação entre 31 países, aparece entre os últimos da tabela. (...)

Fonte: Continuação da notícia em Público, por indicação de Livresco




terça-feira, 10 de dezembro de 2024

Há falta de professores para as crianças com necessidades específicas

Os pais dos alunos com necessidades educativas especiais estão revoltados por causa da falta de professores. Os diretores das escolas reconhecem que falta pessoal, incluindo assistentes operacionais. Milhares de alunos do ensino público acabam por não ter o acompanhamento que a sua condição exige.

O diagnóstico de síndrome de Mowat-Wilson, uma doença responsável por atrasos no desenvolvimento físico e cognitivo, chegou ao primeiro ano de idade. Desde essa altura que os pais de Maria fazem o que conseguem para ajudar a filha.

À medida que foi crescendo, os pais procuraram uma escola de ensino regular, onde o convívio com crianças sem necessidades educativas especiais pudesse estimular a filha .Mas, com o passar do tempo os desafios, têm aumentado.

Nem sempre há professor de ensino especial

Cerca de 8% das crianças e jovens, do Pré-Escolar ao Ensino Secundário, fazem parte do Ensino Inclusivo, com medidas seletivas de suporte à aprendizagem e à inclusão. Os últimos dados da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência mostram que,só no ano letivo passado, quase 90 mil alunospertenciam ao Ensino Inclusivo. Grande parte deveria ter apoio de um professor de ensino especial em sala de aula, o que nem sempre é possível.

“É necessário chegarem às escolas públicas mais professores de educação especial. É necessário que esses alunos tenham mais terapias. E também é necessário, para que esses alunos tenham um crescimento o mais saudável possível, assistentes operacionais, funcionários”, lista Filinto Lima, presidente da Associação Nacional de Diretores de Agrupamentos e Escolas Públicas.

"A Escola da Maria"

Rui, o pai de Maria, decidiu criar um projeto de inclusão para as crianças com necessidades especiais, como a filha: “A Escola da Maria”.

A ideia surgiu em 2017, “pelo facto de não haver escolas a funcionar com inclusão”, afirma.

O projeto está agora a ser desenvolvido, para que a escola seja uma realidade dentro de cinco anos, com a intenção de ajudar o maior número de crianças.

Fonte: SIC Notícias, com vídeo, por indicação de Livresco

segunda-feira, 9 de dezembro de 2024

A escola do seu filho está a prepará-lo para o sucesso... ou para a prisão?

O cliente mais novo que tive que foi chamado pela polícia foi um aluno do jardim de infância de 5 anos. O cliente mais novo que tive que foi algemado era um aluno do segundo ano de 7 anos.

Ambos eram crianças pequenas, praticamente bebés. Ambos eram alunos autistas que estavam a ter um dia mau. Estou sempre a ouvir as pessoas a tentarem justificar as SRO (não funcionam, sigam os dados) e outras medidas punitivas.

Mas expliquem-me, por favor, como é que uma criança de 5 ou 7 anos pode ser suficientemente perigosa para precisar de ser algemada?

Já ouviram a expressão “conduta da escola para a prisão”, certo? Parece um mau filme de terror, mas para demasiados miúdos é uma dura realidade. Vamos explicar o que é realmente, porque é que acontece e o que nós (sim, VOCÊ também!) precisamos de fazer para o mudar.

O que é a conduta da escola para a prisão?

A conduta da escola para a prisão é uma tendência perturbadora em que certas políticas e práticas disciplinares nas escolas aumentam a probabilidade de os alunos - especialmente os alunos marginalizados - acabarem no sistema de justiça criminal.

Em vez de receberem apoio, orientação ou mesmo apenas uma consequência razoável pelo mau comportamento, muitas crianças são confrontadas com castigos que imitam as penas criminais: detenções, suspensões, expulsões e até confinamento. Essencialmente, são expulsos da sala de aula e colocados numa via rápida para a prisão.

Quem é mais afetado?

As crianças que já estão a enfrentar os maiores desafios são as mais afectadas pelo ciclo escola-prisão. Pense nisso: crianças de cor, crianças com deficiência, crianças de famílias com baixos rendimentos e jovens LGBTQ+.

Os alunos negros têm 3,5 vezes mais probabilidades de serem suspensos ou expulsos do que os seus colegas brancos, e os alunos com deficiência têm duas vezes mais probabilidades de serem suspensos fora da escola. Não é exatamente o tipo de estatísticas com que queremos ganhar, certo?

Mas não se trata apenas de saber quem é mais castigado. Também tem a ver com a forma como são castigados. Por exemplo, as crianças com problemas comportamentais ou emocionais podem ser fechadas numa “sala de isolamento” - um espaço minúsculo e vazio, semelhante a um armário, que se assemelha a uma cela de prisão. E qual é a lição? Que quando nos portamos mal, somos fechados, tal como na prisão.

Estatísticas sobre o projeto “escola-prisão” (School to Prison Pipeline)

Aqui estão 10 estatísticas chocantes sobre o pipeline da escola para a prisão que destacam o seu impacto nos estudantes, particularmente naqueles que são negros, deficientes ou marginalizados de outra forma:

1. 70.000 estudantes presos na escola: Todos os anos, cerca de 70.000 alunos são presos em escolas dos Estados Unidos, muitas vezes por infracções menores, como comportamento perturbador ou absentismo.

2. Os alunos negros têm 3,5 vezes mais probabilidades de serem suspensos: Os alunos negros têm 3,5 vezes mais probabilidades de serem suspensos ou expulsos do que os seus colegas brancos, mesmo por comportamentos semelhantes, o que os torna mais vulneráveis à conduta.

3. Os alunos com deficiência representam 25% das detenções: Apesar de os alunos com deficiência representarem apenas 13% da população escolar total, representam 25% das pessoas detidas ou encaminhadas para as autoridades policiais enquanto estão na escola.

4. Os alunos com deficiência têm o dobro da probabilidade de serem suspensos: Os alunos com deficiência têm duas vezes mais probabilidades de serem suspensos fora da escola do que os seus colegas sem deficiência.

5. 10 milhões de dias de instrução perdidos anualmente: Os alunos americanos perdem cerca de 10 milhões de dias de instrução todos os anos devido a suspensões, o que tem um impacto significativo no seu progresso académico.

6. Altas taxas de suspensão estão ligadas a taxas de abandono escolar: Os alunos suspensos ou expulsos por uma infração discricionária têm quase três vezes mais probabilidades de entrar em contacto com o sistema de justiça juvenil no ano seguinte.

7. Escolas com altas taxas de suspensão têm taxas de graduação mais baixas: As escolas com elevadas taxas de suspensão (mais de 20%) têm taxas de conclusão do curso até 20 pontos percentuais mais baixas do que as escolas com taxas de suspensão mais baixas.

8. Mais de 14 milhões de estudantes frequentam escolas com polícia, mas sem conselheiros: Mais de 14 milhões de estudantes frequentam escolas com um agente da autoridade, mas sem um conselheiro, psicólogo ou assistente social para prestar apoio à saúde mental.

9. Os estudantes negros representam 15% das matrículas, mas 31% das detenções: Embora os estudantes negros representem 15% da população estudantil, são responsáveis por 31% das detenções relacionadas com a escola.

10. Os estudantes negros e pardos têm 2,5 vezes mais probabilidades de serem detidos: Os jovens de cor têm 2,5 vezes mais probabilidades de serem encaminhados para as autoridades policiais ou de serem objeto de uma detenção relacionada com a escola, em comparação com os seus homólogos brancos.

Estas estatísticas revelam os profundos preconceitos raciais e de deficiência enraizados em muitas práticas disciplinares escolares, realçando a necessidade urgente de reforma.

Como é que as escolas estão a contribuir?

O ensino público americano está a participar, sem saber (ou sabendo), nesta conduta. Eis como:

1. Políticas de Tolerância Zero: À partida, estas políticas parecem uma boa ideia - nada de armas, drogas ou violência nas escolas. Mas, na realidade, significam muitas vezes que mesmo as infrações menores (como falar mal ou faltar às aulas) podem levar à suspensão ou expulsão. Não são feitas perguntas, não é considerado o contexto. Um passo em falso e estás fora.

2. Agentes de Recursos Escolares (SROs): O que era suposto tornar as escolas mais seguras tornou-as, em alguns casos, mais parecidas com miniprisões. Os SROs entram frequentemente em ação para tratar de questões disciplinares que os professores costumavam gerir eles próprios. E, por vezes, fazem-no prendendo alunos por comportamentos que, na realidade, não justificam uma ida à esquadra da polícia.

3. Isolamento e contenção: Quando uma criança tem um colapso, em vez de lhe ser dado o apoio de que necessita, pode ser restringida ou colocada em salas de isolamento. Isto não é apenas emocionalmente prejudicial - também pode ser fisicamente perigoso. E sejamos realistas, se fecharmos as crianças num quarto minúsculo, estamos a ensinar-lhes que o confinamento é uma resposta normal ao comportamento. Parece-lhe familiar?

4. Reencaminhamento excessivo para a justiça juvenil: Em vez de resolverem os problemas de comportamento na escola, alguns distritos adotaram a política de encaminhar os alunos para a polícia por infrações menores. Faltar às aulas, ter um comportamento perturbador ou até mesmo fazer uma birra pode levar uma criança à frente de um juiz e não ao gabinete de um conselheiro. (...)

O que é que precisa de mudar?

É evidente que o sistema está avariado. Então, o que é que devemos fazer? Eis alguns pontos de partida:

1. Eliminar as Políticas de Tolerância Zero: Temos de deixar de criminalizar os comportamentos típicos da infância. Em vez disso, implementar práticas de justiça restaurativa, em que as crianças aprendem com os seus erros sem serem expulsas da escola.

2. Melhor formação para professores e funcionários: Os educadores precisam de mais apoio e formação para gerir comportamentos difíceis - especialmente quando se trata de crianças com deficiência. Em vez de agravar as situações, devem ser-lhes ensinadas técnicas de desanuviamento e como prestar cuidados informados sobre o trauma.

3. Mais conselheiros, menos polícias: Sejamos realistas: as escolas precisam de mais assistentes sociais, conselheiros e psicólogos - não de mais polícias. Os alunos que lidam com traumas ou desafios comportamentais precisam de apoio de saúde mental, não de algemas.

4. Proibir a reclusão e limitar a contenção: Acabaram-se as salas de confinamento minúsculas e as restrições prejudiciais. Todas as crianças merecem sentir-se seguras e apoiadas na escola, independentemente da forma como exprimem as suas emoções.

5. Aumentar o acesso a serviços de educação especial: Isto pode parecer óbvio, mas vale a pena dizer: os programas de ensino especial com financiamento e pessoal adequados são um fator de mudança. Proporcionam o apoio personalizado de que os alunos com deficiência necessitam, ajudando-os a ter sucesso académico e social.

6. Envolver os pais e as comunidades: As escolas devem criar parcerias significativas com os pais, especialmente os das crianças marginalizadas. Quando os pais estão informados, envolvidos e capacitados, podem defender mais eficazmente os seus filhos.

Vamos fazer melhor

Os nossos filhos merecem melhor. O pipeline da escola para a prisão não é apenas um problema “deles” - é um problema “nosso”. Afeta-nos a todos porque afeta o futuro da nossa sociedade.

É altura de falar alto, fazer perguntas, exigir mudanças e trabalhar em conjunto para garantir que todas as crianças têm a oportunidade de aprender, crescer e prosperar sem a ameaça de serem empurradas para o sistema de justiça criminal.

Fonte: A Day In Our Shoes por indicação de Livresco

sábado, 7 de dezembro de 2024

Conferência Episcopal desenvolve «manual de apoio para a inclusão de pessoas com deficiência»

O Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência e o Secretariado Nacional de Educação Cristã (SNEC), organismos da Conferência Episcopal Portuguesa, estão a desenvolver um manual de apoio a animadores e catequistas para a inclusão, “que pode ser transformador”.

“O Manual de Apoio a Animadores e Catequistas para a Inclusão das Pessoas com Deficiência tem uma série de recursos que podem ser de consulta ou de leitura”, disse a diretora do Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência da Igreja Católica em Portugal, em entrevista à Agência ECCLESIA, neste Dia Internacional das Pessoas com Deficiência (03 de dezembro).

Carmo Diniz destaca que o ‘Manual de Apoio a Animadores e Catequistas para a inclusão de pessoas com deficiência’, com o título, em formato de pergunta, ‘ESTAMOS TODOS?’, vai incluir ensinamentos da Igreja Católica, “as tipologias da deficiência” e atitudes perante estas pessoas.

No novo documento, de ‘apoio para a inclusão de pessoas com deficiência’, os animadores, catequistas e demais agentes pastorais e leitores vão encontrar também “testemunhos de pessoas que já percorreram o percurso catequético” (Sebastião Palha; Carina Brandão; Ana Sofia Teixeira; Maria Cancela de Abreu; Rui Pardal), e “um bocadinho” da experiência da edição internacional da Jornada Mundial da Juventude em Portugal, a JMJ Lisboa 2023, realizada de 1 a 6 de agosto.

“É sempre importante, quer ao nível do que foi o trabalho de atenção à deficiência, quer lições aprendidas, coisas que se podem aplicar”, acrescentou a diretora do Serviço Pastoral a Pessoas com Deficiência da CEP, que considera que “este manual pode ser transformador”.

O presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana da CEP, no prefácio, destaca que nos últimos 50 anos, “felizmente, aconteceram progressos na justa consideração pela dignidade das pessoas com deficiência”.

“Pouco a pouco, deixaram de estar socialmente escondidas para passarem a ser consideradas nos seus direitos de pertença à mesma sociedade humana. Também na Igreja houve progressão na consideração pelas pessoas deficiência, mas algo se perdeu no decorrer dos séculos”, escreve D. José Traquina (bispo de Santarém), lembrando “a atenção dos Bispos portugueses” à realidade das pessoas com deficiência com a publicação das notas pastorais em 1981, 2003 e 2019.

Já o diretor do SNEC salienta que cada um destes agentes pastorais, a quem se destina o manual, “é a presença amiga junto das crianças, jovens e adultos com deficiência que fazem o Encontro com Jesus Cristo e, assim, encontram a Alegria de serem filhos e filhas muito amados por Deus”.

“Contamos convosco. Contai connosco… para melhor servirmos a Todos”, acrescenta o professor Fernando Moita.

A nova publicação, “um documento de trabalho, de consulta e também de aprendizagem” é apresentado a animadores e catequistas de todos os níveis de catequese, com o mesmo objetivo de “promover a integração e participação das pessoas com deficiência”.

Sobre o título deste manual, lê-se ainda que ‘ESTAMOS TODOS?’, é uma questão que “deve acompanhar sempre e ajudar” a estarem alerta para que “ninguém fique para trás”, salientando que a deficiência não pode ser barreira ao crescimento na fé e “também não devia impedir as amizades que este percurso de crescimento pode proporcionar”.

O ‘Manual de Apoio a Animadores e Catequistas para a inclusão de pessoas com deficiência’ vai ficar disponível online, em formato PDF, nas páginas na internet do Secretariado Nacional de Educação Cristã e do Serviço Pastoral de Pessoas com Deficiência, para além de “alguns exemplares físicos” que os dois organismos da CEP vão distribuir a catequistas, a professores da disciplina de Edução Moral e Religiosa Católica (EMRC), “bispos, diretores de Escolas Católicas e todos os que quiserem”, referiu Carmo Diniz, neste Dia Internacional das Pessoas com Deficiência 2024, no Programa ECCLESIA (...).

Fonte: Agência Ecclesia por indicação de Livresco

sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

Pela primeira vez desde o 25 de abril, “os filhos podem ter uma educação pior que os pais”. E a culpa é de "todos nós"

Um investigador, um professor e um aluno concordam que há muito a mudar na educação em Portugal – nomeadamente, em temas como a disciplina de cidadania ou os manuais digitais, que deviam ter "menos importância". São necessárias “medidas estruturais”, principalmente para responder à falta de professores que pode aumentar o fosso entre ricos e pobres nos próximos anos.

De quem é a culpa se a escola pública nos próximos anos não ajudar a reduzir as desigualdades? “De todos nós”. Miguel Herdade, especialista em educação e desigualdades e convidado desta semana do Geração Z da Renascença/EuranetPlus, não tem dúvidas de que a falta atual de professores – “o mais importante nas escolas” – pode levar a um “aumento desse fosso [entre alunos mais pobres e mais ricos] e isso vê-se, por exemplo, no resultado dos exames PISA ou TIMSS”.

Este investigador, que também já fundou duas ONG sobre educação, aponta que um aluno atualmente no sexto ano de escolaridade “não teve ainda um único ano normal na escola” – primeiro por culpa de pandemia, agora devido à falta de professores. Esta é uma situação “preocupante” e que é capaz de fazer encravar o elevador social que a escola pode ser para os alunos mais carenciados.

“Por cada ano de escola, vão-se gerar melhores ordenados nessas crianças quando elas crescem. Quando nós tiramos tempo de escola, a sua capacidade de combater a pobreza é menor. Nós estamos a tirar o futuro de não serem pobres e de terem uma vida melhor do que aquela em que nasceram”, defende, para a seguir deixar o alerta: a situação nunca foi tão perigosa como agora.

“Se há coisa que Portugal conseguiu fazer desde o início da democracia foi levar a escola a mais gente e com muito mais cuidado. Agora, 90% dos jovens frequenta o ensino secundário. (…) Mas agora também, pela primeira vez desde o dia 25 de Abril, as crianças podem ter um sistema de ensino pior do que o dos seus pais, o que é uma coisa lamentável”, avisou.

Apesar de assumir que os governantes podiam “fazer mais” para resolver o problema, Miguel Herdade coloca as culpas “em todos nós”. Acredita que a sociedade civil podia ter uma voz mais ativa, “organizar-se em instituições (…) e ajudar outras pessoas”, em vez de arranjar alguém que “arca com todas as culpas”.

Neste trabalho “de pressão” ainda por fazer – “para que os nossos impostos ajudem a melhorar as condições dos professores” –, há discussões que “só nos tiram o foco”. A principal, diz, é a polémica em torno da disciplina de cidadania.

Cidadania e manuais digitais: estamos a dar-lhes demasiado destaque?

Apesar de considerar que a disciplina é “muito importante para uma sociedade onde há cada vez mais adversidade”, Miguel Herdade considera uma “pena” que uma das grandes questões dos últimos anos tenha sido a disciplina de cidadania e não “o flagelo” de problemas que o setor da educação atravessa.

André Simões, professor na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, alinha-se nesta perspetiva. Este académico olha para a polémica “como um problema dos políticos e não da escola” e teme que a revisão da disciplina seja um instrumento “para que os votos não fujam para uma determinada classe política”.

No painel, há também quem lide com a disciplina no dia-a-dia. É o caso de João Lopes, de 17 anos e aluno do 12.º ano de escolaridade num colégio em Lisboa. Aplaude a existência da disciplina que “gira à volta de conselhos e realidades muito práticas” e onde aprende coisas tão diversas e “úteis”, como o que fazer em situações de incêndios e outras emergências.

Ainda assim, e apesar de saber que é uma questão que gera dúvidas, assinala que um dos pontos mais positivos passa pela “autonomia” que as escolas têm sobre a disciplina, nomeadamente quando dão espaço aos alunos para “desabafarem” sobre questões que acontecem dentro da escola e da turma.

“É quando temos a oportunidade de dizer: ‘Esta semana foi uma semana em que tivemos quatro avaliações e sentimo-nos muito sobrecarregados. Como é que podemos melhorar isto? É na cidadania que temos, por exemplo, a oportunidade de entrar em contacto com algumas campanhas de voluntariado ou de ajuda a associações. E tudo isso passa não só por uma parte de valorização académica, que é um bocado o fundo da escola, mas passa também por uma valorização da pessoa”, acredita.

Para Miguel Herdade, há ainda outra discussão que “não é prioritária” nas escolas – a passagem para os manuais digitais. Este especialista diz olhar “com preocupação” para a intenção do anterior governo (que lançou um programa piloto há cinco anos), numa altura em que “há estudos que mostram que os alunos mais desfavorecidos perderam mais de 60% nas aprendizagens do que os de outros contextos” durante o ensino a distância.

Não há evidência científica do benefício da medida, mas João Lopes, cuja escola está integrada no projeto piloto, faz um balanço positivo, “apesar de ainda ser muito cedo”. Há vários meses a fazer “login” nos sites das editoras diariamente, o jovem prefere destacar as mais valias pela entrada dos computadores na sala de aula – e distanciar-se de quem critica “de forma ignorante” a medida.

“Conseguimos obter uma aprendizagem mais diversificada e mais integrada”, resume. “Pode parecer um bocadinho redutor, mas nós vamos sair da faculdade, trabalhar para uma empresa e não andamos à procura de enciclopédias para descortinar como devemos resolver algum tipo de problema. Dizermos que, só por estarmos a expor os jovens a mais tempo de ecrã, estamos a prejudicá-los automaticamente parece-me uma perspetiva ignorante”.

O Reino Unido aqui tão perto como exemplo para o ensino superior

Desde a pandemia, o sistema dos exames nacionais e de acesso ao ensino superior tem sofrido várias alterações, mas, para Tiago Herdade, essas mudanças não tornaram o processo mais justo e equitativo.

Este especialista considera que boas notas e rendimentos andam de mãos dadas e que um sistema que se baseie em sucesso escolar não resulta em Portugal. E puxa da sua experiência para ilustrar o argumento.

“Se formos ao meu grupo do WhatsApp, somos 10 rapazes, de um meio muito privilegiado, lisboeta e todos andámos na universidade”, começa, para logo depois dar um salto para a ponta oposta. “Mas, se olharmos para o mesmo grupo de rapazes nascidos numa região pobre de Portugal e pais pobres, só um desses dez rapazes é que vai andar na universidade”.

O primeiro passo para resolver o problema é, por isso, "desmistificar o problema em Portugal", que não está relacionado com as propinas, mas sim com “toda a desigualdade que começa antes da universidade”, nomeadamente com a dificuldade em suportar custos para alunos deslocados, como a habitação.

Miguel Herdade sugere que, em vez de reduzir as propinas, Portugal adote sistemas, como o do Reino Unido, em que o Estado paga as propinas e os alunos podem ir devolvendo o dinheiro a partir do momento em que são empregados.

Apesar de concordar com a ideia, André Simões é mais ambicioso – e pede ao governo para reforçar o valor das bolsas que concede, a fundo perdido, aos estudantes desfavorecidos.

“Se eu tiver uma família em que o pai ganha mil euros e a mãe também, é um pouco acima do ordenado mínimo, mas eu não sei se é o suficiente para manter um ou dois filhos no ensino superior. O Estado devia fazer mais também no que diz respeito a residências para estudantes. Não são só as propinas que impedem que as pessoas com recursos mais baixos estudem”, defende.

E Bruxelas devia ser mais interventiva na política educativa?

Miguel Herdade é rápido na resposta: não.

“Quem sabe o que é melhor para as famílias e para os alunos é quem está mais próximo deles. Não é, portanto, um sistema muito centralizado. Se nós em Portugal já no queixamos que as coisas são todas decididas no Ministério da Educação, imagina o que seria agora na Europa toda”, argumenta.

Este investigador assinala, no entanto, que Bruxelas pode fazer um esforço por se tornar mais relevante nos estudos sobre educação, relembrando que grande parte dos dados conhecidos hoje são elaborados por outras organizações internacionais, como é o caso dos exames Pisa, organizados pela OCDE.

No caso do ensino superior, e apesar de valorizar o impacto de programas de intercâmbio como o Erasmus+, André Simões pede um reforço das verbas – e, principalmente, a revisão das regras nos programas de investigação financiados por Bruxelas.

“Muitas vezes acontece termos na avaliação professores que não são da área. E dessas notas depende do financiamento que vem em parte do Governo português, mas também em grande parte da Europa. Portanto, deveria haver algumas mudanças nesse sentido, além de não se dever tratar as áreas das letras e das ciências sociais – entre as quais a educação, a pedagogia e a didática – como ciências exatas”, remata.

Fonte: RR por indicação de Livresco