terça-feira, 31 de dezembro de 2019

SETE IDEIAS PARA O SUCESSO DA INCLUSÃO

O texto que se segue faz parte das atas do I.º Congresso Cabo-verdiano de Educação Inclusiva (ConCEI) - “Desafiando os Caminhos da Educação Inclusiva em Cabo Verde” que decorerreu na Universidade de Cabo Verde (Uni-CV), nos dias dias 4 e 5 de dezembro de 2014.
O texto é da autoria de Ana Paula Loução Martins, Universidade do Minho, Instituto de Educação, CIEd, Portugal. Embora possa ser considerado de algum modo descontextualizado face ao enquadramento atual da educação inclusiva em Portugal,  a sua divulgação tem como propósito rever e refletir sobre conceitos, enquadramentos e práticas.


As sete ideias que (...) colocadas em prática contribuem para que a educação inclusiva das crianças com NEE seja especial e desta forma de sucesso são as seguintes:

1. A significância da diversidade dos alunos com necessidades educativas especiais no contexto da escola inclusiva: Os delegados que compareceram, em Salamanca (1994), na Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais, representando noventa e dois países, e vinte e cinco organizações internacionais, reconheceram a “necessidade e a urgência de garantir a educação para as crianças, jovens e adultos com necessidades educativas especiais no quadro do sistema regular de educação” (UNESCO, 1994, p. viii). O sistema de educação deve ser planeado, e os programas educativos implementados, tendo em conta a vasta diversidade das características, dos interesses, das capacidades, e das necessidades de aprendizagem, própria de cada uma destas crianças (UNESCO, 1994). O conceito de NEE reúne um grupo de crianças ou jovens que, por exibirem determinadas condições específicas - físicas, sensoriais, cognitivas, emocionais, comunicativas, sociais, ou qualquer combinação destas -, pode necessitar de apoio de serviços de educação especial, que facilite o seu desenvolvimento académico, social, e emocional, durante todo, ou parte do seu percurso escolar (Correia, 1997; Kauffman & Hallahan, 1997). Quando procuramos definir NEE é importante tomar em consideração a diversidade das características das crianças e jovens, bem como a necessidade destas serem elegíveis para serviços de educação especial (Hallahan & Kauffman, 1997). A “diversidade de características” está relacionada com a natureza das NEE (tipo, causa, severidade e implicações educativas) e com o próprio aluno (idade, género e historial). É de salientar que a identificação e deteção de qualquer tipo de NEE resulta sempre de uma avaliação compreensiva, feita por uma equipa multidisciplinar. 

2. A educação no ambiente menos restritivo possível: O aluno com NEE deve ser educado tanto quanto possível, junto dos alunos sem NEE, ou seja, no meio menos restritivo possível. O conceito de meio menos restritivo possível considera que o aluno, sempre que possível, deve ter a oportunidade de frequentar a escola da sua zona de residência e de interagir com os seus vizinhos e os outros membros da comunidade (Salend, 1998). Muitas vezes, no entanto, por razões económicas, os serviços especializados estão localizados em determinada escola, pelo que não existe alternativa em relação ao local de colocação (Osborne, 1996). Assim, este conceito significa que: a) que em termos gerais, é na escola, em casa e na comunidade, separado dos seus colegas sem NEE o mínimo possível; e b) a colocação em classes, ou escolas, especiais, ou em outro tipo de ambiente que não o da classe regular, só deve acontecer quando a natureza, ou a severidade da NEE, é de tal forma severa que uma educação na classe regular, mesmo com os apoios e serviços suplementares, não é apropriada e o aluno não é bem-sucedido (Hallahan & Kauffman, 1997, NICHCY, 1999; Smith, Pollaway, Patton & Dowdy, 1995). Para Smith, Pollaway, Patton e Dowdy (1995), a vida da criança e jovem com NEE deve ser tão normal quanto possível, e a intervenção a que é sujeito deve ser consistente com as suas necessidades individuais e, sempre que possível, não deve interferir com a sua liberdade pessoal. Por exemplo, um aluno não deve frequentar uma escola de especial, se puder receber uma educação apropriada na escola regular. A determinação do meio menos restritivo possível para certo aluno é, no entanto, uma decisão individualizada, baseada nas suas necessidades e características (Salend, 1998). 

3. A existência de serviços de Educação Especial de qualidade: Estes serviços referem-se a todos os apoios que o aluno poderá necessitar, de forma a maximizar as suas potencialidades. Segundo Friend e Bursuck (1996) podem incluir: 

• Apoio nos conteúdos curriculares e extracurriculares: Aspetos como a flexibilidade, as adaptações curriculares, e alguma atenção especial, devem ser considerados (Hallahan & Kauffman, 1997b). Adicionalmente, as atividades e as estratégias utilizadas na educação dos alunos com NEE devem ser baseadas nos conhecimentos produzidos pela ciência. Como tal, é necessário que o ensino na sala de aula e o apoio sejam baseados em métodos validados pela investigação. Segundo Brown-Chidsey e Steege (2005) as intervenções baseadas na investigação são importantes, pelas seguintes razões: a) aumentam a probabilidade de resultados positivos; b) as intervenções baseadas na teoria, opinião, testemunhos e avaliação subjetiva têm mostrado serem ineficazes; c) intervenções ineficazes resultam em falta de progresso; d) os alunos e as suas famílias têm o direito de esperar que os profissionais de educação especial utilizem intervenções que têm grande probabilidade de promover resultados positivos. Este tipo de apoio pode, ainda, implicar a utilização de meios tecnológicos, que permitam o restabelecimento e o aumento da funcionalidade dos alunos (Turnbull, Turnbull, Shank, & Leal, 1995). 

• Apoio na deslocação: Inclui a inexistência de barreiras arquitetónicas dentro do edifício escolar; equipamentos específicos, tal como, autocarros adaptados para a viagem de casa para a escola, elevadores e rampas (Osborne, 1996; Turnbull et al., 1995). 

• Terapias: Engloba serviços de 1) terapia da fala, com a identificação, o diagnóstico, e a avaliação de problemas da fala ou da linguagem, a terapia e o aconselhamento e orientação. Este serviço pode ser prestado às crianças, aos pais, e aos professores; 2) fisioterapia: muitos alunos, especialmente os que apresentam problemas motores, precisam de desenvolver a força e o controlo muscular, necessários para o seu trabalho na sala de aula; e 3) terapia ocupacional: serviço que melhora, desenvolve, ou restabelece, funções ou capacidades (Osborne, 1996; Turnbull et al., 1995). 

• Psicologia: inclui o uso de testes psicológicos e educacionais, e de outros procedimentos de avaliação; a interpretação de resultados de avaliação; a obtenção, integração, e interpretação, de informação acerca do comportamento das crianças, em condições relacionadas com a aprendizagem; o aconselhamento, aos profissionais envolvidos, durante a fase de planeamento de programas escolares; e o planeamento, e a administração de serviços de psicologia, incluindo aconselhamento para as crianças e famílias (Turnbull et al., 1995). 

• Sociais: inclui o aconselhamento individual, ou em grupo, à criança e sua família, as intervenções nos ambientes reais da vida da criança - casa, escola, e comunidade - de modo a aumentar o ajustamento da criança à escola -, e a mobilização de recursos da escola, e da comunidade, que permitam que a criança tenha sucesso no seu processo de aprendizagem (Turnbull et al., 1995). 

• Aconselhamento: serviços prestados por assistentes sociais, psicólogos, conselheiros, ou outros (Turnbull et al., 1995). 

• Educação e aconselhamento para os pais: assistência aos pais, com o objetivo de estes compreenderem a problemática, e perspetivarem o desenvolvimento do seu filho/a (Turnbull et al., 1995). 

• Médicos: serviços prestados por profissionais da área da saúde no âmbito do diagnóstico e da avaliação da criança. Um exemplo são os serviços de Audiologia, que incluem a identificação de problemas auditivos, a determinação do nível, do tipo, e do grau de perda auditiva, bem como a criação, e administração, de programas com vista à prevenção e tratamento de perdas auditivas (Turnbull et al., 1995). Esta listagem não é exaustiva, podendo ser incluídos outros serviços necessários para que o trabalho feito pelos professores seja maximizado. Como exemplo, a arte, a música, a dança terapêutica, outras atividades culturais, e a reabilitação visual, podem ser considerados na educação dos alunos com NEE. Segundo Correia (1996) este conjunto de serviços de apoio que descrevi, a que se poderá recorrer quando se está perante casos de alunos cujas características e necessidades de ensino o exijam, denomina de Serviços de Educação Especial. Correia (1996), considera que a educação especial não pode ser encarada como um sistema paralelo de educação. Segundo Smith (1998), os serviços de educação especial devem ter como objetivo que os alunos com NEE, ao longo das suas vidas, possam alcançar o seu potencial máximo, para que o seu futuro sejam o mais autónomos possível. 

4. Existência de colaboração entre membros de equipa: No contexto da educação inclusiva os professores relacionam-se, e colaboram com vários outros profissionais- psicólogo, médico, assistente social, ou terapeuta, por exemplo. Com alguns, podem ter de relacionar-se, e de colaborar, todos os dias; com outros não, porque não estão disponíveis, porque servem os alunos indiretamente ou trabalham só com as crianças que apresentam NEE mais severas (Friend & Bursuck, 1996). Este conjunto de profissionais, que trabalha em coloração, representa: A resposta global e única para os problemas educativos, sociais, psicológicos e médicos da criança com NEE. O mesmo é dizer que ela implica uma pluralidade de formações e, consequentemente, de funções, em que cada membro assume uma responsabilidade claramente definida e reconhece a importância das interacções com os outros elementos da equipa na avaliação da criança e planificação da intervenção para a satisfação das suas necessidades educativas. (...) A composição da equipa multidisciplinar não é, obrigatoriamente, sempre a mesma: será mais restrita ou mais alargada de acordo com a problemática da criança. (Correia, 1997, p. 92) 

A existência deste tipo de equipas descritas no texto de Correia (1997) implica colaboração entre vários profissionais e entre estes e as famílias e membros da comunidade. O primeiro objetivo da colaboração é criar um clima de elevado profissionalismo entre os intervenientes, para que os alunos atinjam o seu potencial máximo. Segundo Cook e Friend (1993), citados por Friend e Bursuck (1996), a colaboração é 1) voluntária; 2) baseada na igualdade relacional entre os intervenientes; 3) requer a partilha de objetivos comuns; 4) implica partilha de responsabilidades em condições de igualdade; 5) requer partilha de recursos (tempo, experiência, conhecimentos, espaços, equipamentos, entre outros); e 6) requer valores de confiança e respeito entre todos. Criar relações de colaboração num contexto inclusivo requer um esforço por parte de todos os envolvidos. Muitos profissionais que desenvolveram relações de colaboração reconheceram que estas são difíceis, mas que valem a pena. Friend e Bursuck (1996) consideram que as práticas de colaboração melhoram com a experiência e com a existência de comportamentos sociais assertivos. 

5. A participação da família: A colaboração entre a escola e a família constitui um pilar indispensável da filosofia inclusiva, pelo que os profissionais envolvidos devem ter a noção da dinâmica do sistema familiar da criança com NEE. A família tem sido descrita como um grupo constituído pela mãe, pelo pai, e por uma ou mais crianças, vivendo em conjunto. Esta visão estereotipada da família foi dramaticamente alterada nos últimos anos. A família tradicional não é mais representada por uma mãe, dona de casa, que cuida dos filhos, e por um pai que trabalha. Existem, atualmente, muitos géneros de agregados familiares, com os quais os profissionais têm de interagir. A escola deve transmitir a ideia de que os pais, ou outros elementos que estejam a desempenhar esse papel, devem ser envolvidos na educação das crianças e jovens. Embora existam grandes mudanças na estrutura da família, esta continua a ser considerada um elemento chave na vida da criança, e a unidade básica da sociedade (Turnbull et al., 1995). Quando uma criança com NEE se torna membro de uma família - por nascimento, adoção, diagnóstico tardio, etc. -, todos os elementos que a constituem precisam de fazer ajustes, de tomar decisões, e de solucionar problemas (Smith et al., 1995). 

A primeira dificuldade com que os pais se confrontam é a da aceitação, e compreensão, da problemática do seu filho. É primordial, para a aceitação da NEE da criança, que os pais compreendam, não só o diagnóstico, mas também as suas implicações futuras. Poderão ser criadas expectativas irrealistas, se tal não acontecer, o que pode resultar num problema maior para a família (Switzer, 1985, citado por Smith et al., 1995). Assim, a colaboração entre os pais e a escola tem sido encarada como indispensável nas práticas inclusivas eficazes. A escola deve personalizar as relações com as famílias, do mesmo modo que individualiza a educação dos alunos com NEE. Para que essa personalização seja possível, é necessário que os profissionais envolvidos compreendam a sua complexidade e as suas particularidades. 

6. O envolvimento dos amigos: Os amigos e os colegas são vitais na vida de todas as crianças e jovens, incluindo aquelas que apresentam NEE. Esta ideia, no entanto, tem sido bastante negligenciada (Turnbull et al., 1995). As amizades, que aumentam à medida que as crianças vão crescendo, podem ser úteis durante períodos de transição (Berndt & Hawkins, 1987, citados por Turnbull et al., 1995), servir de modelos, fornecer apoio emocional (Berndt, 1989; Cauce et al., 1990; Howes & Mueller, 1980, citados por Turnbull et al., 1995), e constituir oportunidades de desenvolvimento de comportamentos sociais e de comunicação (Hartup, 1983; Howes, 1983, citado por Turnbull et al., 1995). Numa classe regular, os alunos sem NEE, especialmente as raparigas, interagem com os alunos com NEE severas, em atividades de ajuda (por exemplo, movimentando-os ao longo da sala, indo buscar-lhes materiais), e geralmente tratam-nos de um modo paternalista (Evans, Salisbury, Palombaro, Berryman, & Hollowood, 1992, citados por Turnbull et al., 1995), o que não significa que sejam seus amigos. O professor de educação especial e o professor da turma, ao colaborarem entre si, ao apresentarem informação sobre as NEE, à turma, a outros profissionais, e aos pais, ao implementarem abordagens que permitam que as crianças aprendam em conjunto, e umas com as outras, ao proporcionarem oportunidades para trabalho em tutoria ou parceria, e ao ensinarem comportamentos de interação social às crianças com, e sem, NEE, estão a apoiar o aluno com NEE no desenvolvimento de amizades (Turnbull et al., 1995). 

7. O Envolvimento da comunidade: Os educadores e os professores têm a responsabilidade de educar todos os alunos, para que estes se tornem independentes, produtivos e se sintam parte da comunidade onde vivem. Muitas vezes, tanto o papel que a comunidade desempenha na educação dos alunos com NEE, como o apoio que pode dar aos professores e às famílias, é ignorado. Especialmente para os alunos com NEE severas, existem várias razões pelas quais uma educação com base em práticas desenvolvidas na comunidade é desejável. Em primeiro lugar, porque um ensino do tipo funcional, proporcionado em ambientes comunitários reais, aumenta a competência do aluno. Em segundo lugar, porque as simulações, na escola, não permitem que o aluno aprenda o que realmente necessita. Em terceiro lugar, porque os comportamentos necessários nos momentos de recreação, e de trabalho ativo, quando aprendidos dentro da sala de aula, dificilmente são generalizados para ambientes comunitários (Browder & Snell, 1992; Schlein, Green, & Heyne, 1992; Wehman, 1992, citados por Turnbull etal., 1995). Nos dias de hoje, a relação entre a escola e comunidade constitui um pressuposto essencial para o sucesso educacional de todos os alunos. A existência de um conceito de “serviços escola-comunidade” seria importante e simples: as escolas e outros serviços nacionais, e regionais, trabalhariam, em conjunto, no sentido de proporcionarem às crianças, e às suas famílias, os serviços de que necessitam (Behrman, 1992, citado por Turnbull et al., 1995). Este esforço iria, não só reestruturar a escola, mas também os serviços comunitários. As escolas tornar-se-iam participantes centrais, porque estes serviços seriam prestados, ou coordenados, por profissionais localizados na escola, ou num local próximo. Esta colaboração seria importante porque, muitas vezes é reduzida à família e às crianças a qualidade e a quantidade de serviços prestados, devido ao facto de o sistema nacional não responder às suas necessidades de uma forma compreensiva e coordenada. A questão que se pode colocar é a seguinte: por que razão se deve elaborar um plano consertado que promova a prestação de serviços especializados na escola?. As razões são simples e constrangedoras: as escolas são instituições tradicionais, dominantes em cada comunidade, que têm uma história de atendimento a alunos com NEE. Receber serviços na escola pode reduzir o estigma de associado à sua prestação num hospital, ou noutro local. Serviços prestados na escola poderão aumentar os benefícios da educação (Behrman, 1992, citado por Turnbull et al., 1995). É claro que em escolas de zonas rurais, onde este género de atuação não é possível, professores, e outros profissionais itinerantes, terão de cobrir estas áreas. A existência de serviços ligados às escolas, de colaboração entre pais e profissionais, e de uma educação funcional, são elementos chave para uma educação eficaz (Turnbull et al., 1995).

sábado, 28 de dezembro de 2019

Seminário "A Didática do Braille"

O Seminário "A Didática do Braille" realiza-se na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, Auditório Agostinho da Silva, no dia 8 de janeiro de 2020, quarta-feira, no âmbito da comemoração do Dia Mundial do Braille.

Este evento visa: assinalar o Dia Mundial do Braille 2020; partilhar experiências e práticas; refletir sobre diversos métodos para o ensino/ aprendizagem do braille; propor metodologias pedagógicas inovadoras, na base de evidências de sucesso.

O Seminário é reconhecido e certificado como Ação de Curta Duração para professores, nos termos do Despacho n.º 5741/2015, alterado pela Declaração de Retificação n.º 470/2015, de 11 de junho.

Consulte o Programa e faça a inscrição online

Fonte: INR

sexta-feira, 27 de dezembro de 2019

O que querem as crianças da educação pré-escolar?

Deixaram de pedir colo a toda a hora, começaram a gatinhar, atreveram-se a caminhar, a saltar, a correr, e agora fazem perguntas atrás de perguntas porque querem saber e descobrir, querem perceber como funciona tudo o que existe à volta. Estão a crescer e as brincadeiras fazem parte da compreensão do mundo, do desenvolvimento, da curiosidade e da imaginação, das competências emocionais e sociais. As crianças em idade pré-escolar, dos três aos cinco anos, querem brincar, jogar, aprender, mexer, perguntar, explorar. E voltar a brincar. Com os pais sempre por perto.

“As crianças precisam de ter muito tempo para brincar. Brincar é a atividade mais importante para elas nestas idades”, explica Teresa Sarmento, doutorada em Estudos da Criança, professora do Instituto de Educação da Universidade do Minho, em Braga, com vários projetos e publicações na área da educação de infância. Tudo é importante nesta etapa da vida em que aprendem uns com os outros e com os adultos, com curiosidade, desenvolvendo a linguagem e os aspetos cognitivos e emocionais.

Brincar livremente deve ser uma ideia feliz e arejada. Teresa Sarmento refere que “há uma grande intromissão dos pais nas brincadeiras, na perspetiva de superproteção”. “As crianças precisam de se confrontar com desafios para serem capazes de experimentar formas de resolverem conflitos”, sublinha. Essa superproteção não ajuda na aprendizagem, no crescimento, no desenvolvimento. Incentivar a curiosidade e a imaginação é essencial, naturalmente em contextos seguros e protegidos de condições adversas.

Brincar é um mundo de infinitas possibilidades. Brincar com objetos, com materiais não estruturados, flexíveis, que permitam dar asas à imaginação. Saltar, correr, mexer o corpo. Ouvir uma história, abrir livros, ser a personagem de que mais se gosta. Fazer de conta, imaginar, sonhar. Assimilar o que existe à volta. Saltar à corda e ao elástico. Jogar à bola. Usar as novas tecnologias para brincar e aprender. Jogar em tabuleiros, jogar no computador, explorar conhecimentos no mundo digital com vídeos e mil e uma coisas sobre o próprio mundo. Sair de casa para passeios ao ar livre, assistir a um filme de animação. Conversar, perguntar, esclarecer.

“Entre os três e os cinco anos, as brincadeiras devem ter algumas componentes-base: conexão, diversão e exploração”, adianta Joana Laranjeiro (Mãe Catita), autora e coach parental. Há tanta coisa que pode ser feita. “Criar exercícios curtos onde a criança se sente desafiada a ampliar a sua curiosidade e capacidades, e em que se sente vista pelo olhar presente dos pais. Brincadeiras em que os objetivos são claros e a tarefa adequada à idade. Apostar na concretização e não na frustração. Misturar música, a utilização do corpo e, sempre que possível, contacto com a natureza. Deixar a criança liderar e inventar algumas brincadeiras”, aconselha.

Brincar nunca deve ser um assunto menor. “Deixar a criança ensinar aos pais algo que aprendeu é extremamente poderoso para a autoestima.” “Nesta idade, já é possível trabalhar as emoções com a criança, perguntando como se sentiu quando ganhou o jogo, ou quando perdeu. E em que parte do corpo sente a emoção com mais intensidade”, adianta Joana Laranjeiro.

A idade pré-escolar é também um precioso momento para trabalhar competências em várias áreas. Joana Laranjeiro lembra as palavras de Stuart Brown, fundador do National Institute for Play, que reforça a importância do brincar como um minilaboratório de aprendizagem. “E é uma excelente oportunidade para fortalecer a nossa relação com os nossos filhos. A relação é a base de uma infância feliz”.

Fonte: Educare

quinta-feira, 26 de dezembro de 2019

Manual para garantir inclusão e equidade na educação


(Clicar na imagem para aceder ao manual)

Essa publicação foi coordenada pela Seção de Educação para Inclusão e Equidade de Gênero na sede da UNESCO (Florence Migeon e Justine Sass) e pelo Escritório Internacional de Educação da UNESCO (Renato Opertti) com o apoio de Giorgia Magni, Émeline Brylinski, Hyekyung Kang e Caitlin Vaverek (UNESCO-IBE). A equipe gostaria de expressar sua gratidão a Soo-Hyang Choi, diretor da Divisão de Inclusão, Paz e Desenvolvimento Sustentável na Sede da UNESCO e Mmantsetsa Marope, diretora da UNESCO-IBE, por seu apoio ao longo do desenvolvimento da publicação.

Fonte: UNESCO

Audiência da Pró-Inclusão com o Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Educação João Costa

Aos doze dias do mês de dezembro, pelas nove horas e trinta minutos, a Pró-Inclusão foi recebida em audiência, pelo Senhor Secretário de Estado Adjunto e da Educação João Costa. Estiveram presentes, para além do Senhor Secretário de Estado, o Chefe do Gabinete, Dr. Jorge Morais e a Adjunta Dra. Luísa Ucha. Em representação da Pró-Inclusão, Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, estiveram o seu Presidente, David Rodrigues, Helena Neves e Margarida Loureiro, membros da Direção, e Maria João Lopes, membro do Conselho Fiscal. 

A audiência decorreu em clima ameno e inspirador, numa perspetiva proativa de escuta e partilha de reflexões mútuas. 

Após as palavras iniciais de agradecimento e boas vindas, David Rodrigues tomou a palavra fazendo uma breve exposição sobre a atividade da Associação, em particular do seu Centro de Formação: sensibilização dos atores educativos, para a educação inclusiva; formação de Professores; criação de um ‘Selo de Compromisso com a Inclusão. 

De seguida, destacou algumas questões relativas à operacionalização do DL n.º 54/2018, que têm sido apontadas como relevantes e a necessitar de algum tipo de esclarecimento, tais como: 

- qual o papel do governo no âmbito da formação inicial e especializada, nomeadamente no que que diz respeito a eventuais alterações consonantes com os princípios presentes nos normativos atuais, bem como ao perfil e opções profissionais dos docentes; 

- relativamente aos CRI, pretendemos saber se existe algum programa de financiamento com regras estipuladas e quais os critérios para atribuição de financiamento aos CRI. Sabendo que o financiamento se tem mantido inalterado, esta é uma situação que tem vindo a condicionar significativamente o trabalho dos técnicos que apoiam as escolas, trazendo, subsequentemente, implicações ao nível dos recursos a disponibilizar; 

- tendo em conta a grande diversidade de atuação das EMAEI, foi também identificada como essencial e urgente a preparação de formação principalmente dirigida às lideranças destas equipas; 

- reconhecendo a importância da implementação das medidas universais como fator facilitador para um mais amplo acesso ao currículo por parte de todos os alunos, como corrigir as discrepâncias na compreensão da sua abrangência? 

- nesta nova escola, em que todos têm um papel, não é importante uma formação com princípios muito claros relativamente ao que se pretende também para os diretores e assistentes operacionais? 

- a Intervenção Precoce é uma área na qual se identificam muitas lacunas, nomeadamente ao nível da operacionalização das ELI. 

Seguidamente, cada um dos membros da Pró-inclusão tomou a palavra para referir e apresentar várias perspetivas sobre a situação atual da implementação do DL n.º 54/2018. 

Diante das questões apresentadas, o Senhor Secretário de Estado tomou a palavra com vista a prestar alguns esclarecimentos, fazer sugestões e assumir compromissos. Relativamente à questão das ELI, informou que o valor de financiamento que o Ministério da Educação atribui a estas Equipas é de 15 milhões de euros/ano, estando destacados nas mesmas, a tempo integral, 538 docentes. Informou ainda terem sido identificadas duas grandes lacunas nas dinâmicas das ELI: falta de coordenação e de orientação estratégica. 

O mesmo acontece com as CPCJ, nas quais se encontram destacados mais de 500 docentes. Mediante as informações prestadas, David Rodrigues referiu a importância do Ministério se interrogar sobre que resultados espera com o investimento que tem vindo a fazer, bem como de que forma se poderiam avaliar esses mesmos resultados. 

Retomando a palavra, o Secretário de Estado Adjunto, referiu que prevê fazer esta avaliação através de inquéritos às escolas e avaliação externa da implementação do DL n.º 54/2018 (Lei n.º 116/2019, de 13 de setembro). Pretende ainda incluir os indicadores da Agência Europeia para as Necessidades Especiais e a Educação Inclusiva, na Portaria que se encontra em construção com vista a permitir fazer monitorizações e previsões consistentes. Sem dúvida que a recolha de informação até agora permitiu identificar dimensões críticas na implementação do DL n.º 54/2018, com base em evidências e com vista à contaminação das práticas, considerado mais importante do que a formação em si mesma. 

1.ª - Desburocratização do DL n.º 54; 

2.ª – Apontada alguma falta de comunicação entre o ME e as Escolas, o Secretário de Estado Adjunto referiu que o ME reúne com os diretores de 3 em 3 meses, desde a publicação do DL em referência, tendo sido o objetivo no primeiro ano, a clarificação dos conceitos, e, neste segundo ano (presente) pretender-se avançar para as práticas (assentes em narrativas) – por exemplo, ajudar a conceber formação e vídeos de narrativas “O que é que eu faço com os meus alunos”. Informou ainda que, com o Projeto MAIA (Domingos Fernandes, Hélder Pais, André Eusébio) se pretende dar um contributo no sentido de perceber a relação entre o DL n.º 54 e a avaliação; 

3.ª - Avaliação da eficiência dos recursos. Nesta dimensão serão contempladas áreas tais como (1) a formação dirigida às lideranças ao nível cultura organizacional, análise de eficiência, das práticas, das aprendizagens e da burocratização dos processos; (2) mostras de práticas ou narrativas (‘a escola dos possíveis’); (3) a implementação de espaços de reflexão tais como, por exemplo, jornadas, articuladas com a DGE, para os coordenadores das EMAEI; 

4.ª - Criar instrumentos para ajudar as escolas na organização dos PIT e na certificação de competências dos alunos que terminem a escolaridade obrigatória tendo por base um PIT; 

5.ª - Assinatura de um protocolo com o setor solidário/social sobre o modelo de financiamento dos CRI para os próximos anos; 

6.ª - Regulamentar o modelo de funcionamento dos colégios de educação especial; 

7.ª - Criar um referencial de avaliação externa das escolas tendo como fator preponderante a inclusão; 

8.ª – Abertura de concurso para propostas de formação apresentadas pelos CFAE. 

Sugere ainda uma articulação entre a Pró-Inclusão e os cinco representantes dos CFAE, no sentido de verificar áreas de complemento da formação dos mesmos. 

Finalmente, e ainda no âmbito da formação docente, verificar se o Despacho n.º 779/2019, de 18 de janeiro, responde às exigências atuais de formação, com vista à certificação da mesma, considerando-a na dimensão científica e pedagógica.

Fonte: Newsletter n.º 129 - dez2019

terça-feira, 24 de dezembro de 2019

NEIDE É MULHER, NEGRA, DEFICIENTE, MÃE SOLTEIRA, MESTRE, E QUER UM TRABALHO

Paula Neide Reverendo da Conceição nasceu no Huambo, sul de Angola, em 1986. A 10 de novembro, um dia antes de o país celebrar o 11º aniversário da Independência (11 de novembro de 1975). Neide é mulher, mulata, tem uma deficiência motora (64% de incapacidade), um filho (três, incluindo com graça na prole o irmão um ano mais novo e a prima de 18 anos, que vivem com ela em Vila Real), uma licenciatura, um mestrado (obtidos em regime de estudante-trabalhadora).

Fez e faz mil e uma formações, ações de voluntariado e de valorização profissional, sonha em ser cozinheira. Passou fome durante os anos de chumbo da guerra civil. E só lamenta o tratamento preconceituoso que em Portugal, onde vive há dez anos, lhe dedicam e que considera estar na raiz do único lamento: não consegue um único trabalho, emprego, ganha-pão.

A vida de Neide tem sido crua e dura, mas a capacidade de luta e de resistência, embora com alguns abalos, é o que lhe alimenta a esperança. “Ser mulher, negra e deficiente não ajuda nada. Tenho uma deficiência motora, uma atrofia muscular de tipo 3, provocada por uma doença genética neurológica. Provoca-me dificuldades de locomoção”, explica Neide.

“Sou mãe solteira [o pai do filho abandonou-a grávida] e sofro um pouco com o racismo. O meu filho tem 13 anos e joga futebol. Às vezes, em Murça, ouço: ‘O seu filho é o pretinho?’ Uma professora dele disse-lhe: ‘Leste tão bem, quem te ensinou?’. E na escola: ‘Tão bem vestido, quem te deu a roupa?'”, relata sem rancores esta mestre em Ciências da Comunicação, especialidade em administração escolar, licenciada em Línguas e Relações Empresariais – degraus académicos que galgou na UTAD – Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.

“Além do racismo, também estou grata. Fui bem recebida, há bons hospitais, o miúdo é bem recebido, de forma geral, na escola”, acrescenta a mulher que já fez todas as formações e atualizações profissionais que lhe aparecem pela frente e estejam ao alcance de um orçamento muito limitado.

“Fiz um contrato inserção + com o núcleo de Vila Real da Rede Europeia Antipobreza – a EAPN-Portugal [na sigla inglesa]. Terminou no dia 11 e não sei se o vão renovar, tem de ir ao conselho para ser tomada uma decisão”, explica, pouco antes de partir para casa (Angola), onde vai passar o Natal com familiares e amigos.

“Fui contratada como administrativa. Aprendi algumas coisas que nem sabia, como relatórios mais específicos”, prossegue, antes de exigir que a avaliem pelo que vale no mercado de trabalho, e não pelas condições físicas, de género e sociais. “Gostava mesmo era de trabalhar num hospital. Em que pudesse atender as pessoas, porque eu gosto mesmo é de me envolver com as pessoas. A educação não me desafia. Eu prefiro mesmo é ser inserida no mercado de trabalho, com contrato, subsídio de férias… Quero ter uma vida e um trabalho normais, é importante para mim para mostrar ao meu filho”, diz. Parece simples que uma mulher de 33 anos, licenciada e com um mestrado, que nunca se nega a fazer mais uma ação de formação profissional (“estar parada é que não. É como a atividade física, se se estiver parada, atrofia-se”).

“Eu queria mesmo era estudar marketing. Gosto muito de falar e de me envolver com as pessoas. Quando vim em 2009 para Portugal, tinha um plano para regressar a Angola, mas a educação no meu país é muito precária. Em conversa com os meus pais e a UTAD, decidi fazer o mestrado em políticas educativas, com especialidade em gestão escolar. Tenho um filho e sei que a escola tem problemas. Queria fazer uma aprendizagem para levar para lá o conhecimento. Mas fiquei parada. A tese de mestrado é muito teórica, seria melhor algo mais prático”, disseca Neide.

“Eu não gosto de facilidades, mas um empurrãozinho não fazia mal”, acaba por assumir. Mas por “empurrãozinho”, no fundo, entende uma avaliação isenta e assente no mérito nos trabalhos a que se candidata. “Gostava de ser cozinheira. Cozinho muito bem os pratos da minha terra, faço uma muamba ótima, mas já sei fazer muitos pratos de bacalhau. O meu filho adora bacalhau com natas. Mas não posso trabalhar num restaurante, porque exige andar muito tempo de pé e a minha deficiência não mo permite”, confessa.

“Ao domingo gosto de ir à igreja e acordo mais cedo para preparar o almoço. E olhe que não acordo rabugenta por causa disso. O meu filho pede-me muitas vezes: “Podes fazer lasanha? A tua comida é a melhor do mundo.” E eu fico toda contente”, admite, orgulhosa.

Porque para quem cresceu distante do pai (é a sua quinta filha), que se divorciou da mãe há 25 anos, quando Neide tinha 8, e lhe seguiu a vida de longe, e com a progenitora, de quem é a primogénita, a ter de fazer longas viagens para a sustentar a ela e ao irmão, quem sentiu a implacável marca da guerra na pele, nunca nada é dado como garantido.

“Comer é uma bênção, eu sei, porque já passei fome. Naqueles anos de guerra [os duros anos 1990], as pessoas quase não saíam à rua. Não havia bens alimentares nas prateleiras. Comíamos o que a natureza nos dava. Abóbora cozida, batata-doce, amendoim, porque Angola é muito fértil”, aprofunda. “Cresci sem leite, praticamente sem manteiga. E chateia-me que o meu filho não goste deste ou daquele fiambre. Eu jantei muitas vezes chá com batata-doce. Quando me levavam um chocolate, era um diamante”, sublinha.

A viver em Vila Real, terra de origem do avô materno, que esteve emigrado em Angola e voltou depois à terra natal, Neide tem o prato cheio de responsabilidades. “O meu irmão, de 32 anos, o meu filho, de 13, e a minha prima, de 18 anos, vivem comigo. E parece que tenho três filhos. Às vezes, estou na piscina na reabilitação e recebo mensagens do meu irmão: “Acabou o gás”; “Não há isto e aquilo””, ri-se Neide, contando a prole com graça e generosidade.

Com tanto trabalho para se especializar através da UTAD, a educação seria um caminho lógico, mas Neide sente que não é essa a vocação. Preferia trabalhar numa unidade de saúde em que o trabalho pudesse aliar a vocação humanista de se ligar permanentemente às pessoas e às suas necessidades. “Mas eu não tenho medo, faço qualquer coisa”, garante.

“Antes, alisava sempre o cabelo. Mas há dois anos achei que chegava. Cortei o meu cabelo todo e deixei que crescesse naturalmente. Ficou todo afro. Este é o meu cabelo”, diz em jeito de definição cultural, de identidade e de vontade de ser quem é. Uma mulher, negra, com uma deficiência motora de 64%, mãe solteira e imigrante. É com estas características que vai continuar a lutar pela igualdade de acesso ao mercado de trabalho. Para conseguir um contrato com os direitos laborais legais que façam jus ao investimento que fez em formação superior e em cursos de atualização. E sempre com a vontade de o fazer num ambiente laboral em que possa estar em contacto permanente, e envolvida, com pessoas. Muitas pessoas a quem possa emprestar a sua experiência de vida para as fazer sorrir.

Fonte: Life DN

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

O Natal do tio Chedas


À medida que os anos se acumulam nos ossos, maior parece ser a necessidade que os Homens sentem em recordar a própria infância. Num mundo em que tudo muda tão depressa, parece ser fundamental acreditar que, pelo menos uma vez por ano, ainda subsiste uma noite em que quase tudo continua a ser igual, sem, no entanto, nunca se tornar banal. É a noite em que o Menino volta a nascer dentro de cada um de nós... 

Talvez por isso, agora que o Natal se aproxima uma vez mais, dou por mim a recordar aquela época da meninice em que a minha avó São me puxava para junto da lareira e me contava as histórias mais belas que algum dia pude ouvir. 

– O tio Chedas ― explicava-me a minha saudosa avó ― vivia numa gruta do Algar, bem lá no meio da floresta… 

― Numa gruta, avó?! 

― Sim, numa gruta, imagina! Não digas a ninguém, mas contava-se cá em Vila Franca que ele tinha ajudado a matar o rei Dom Carlos e, por isso, decidiu esconder-se por aqui. Quem me contou isto foi a tua bisavó Ana, pois eu ainda era muito pequenina quando tudo aconteceu … 

― A avó também já foi pequenina?! 

― Sim, meu tontinho, já fui. Há muitos, muitos anos… 

― Ó avó, os polícias nunca prenderam o tio Chedas? 

― Parece-me que não. A minha mãe contava-me que ele viveu cá até morrer e foi sepultado no nosso cemitério. 

― Mas ele estava sempre escondido na gruta? 

― Sim, sempre na gruta. Apenas existia uma altura do ano em que ele se arriscava a sair do covil… 

― Era a noite dos lobisomens, não era avó?! ― interrompia eu, de tão ávido que estava com a chegada do sempre surpreendente desenlace, que a minha avó dramatizava ainda mais com o enigmático olhar das videntes. 

― Não! Era a noite de Natal. Os lobisomens ficarão para outra história, uuuuuu… 

― A noite de Natal? ― perguntava eu, enquanto me continuava a desfilar pela imaginação aquele som do uuuuuu… Até hoje, nunca conheci ninguém que imitasse o vazio do medo tão bem como a minha avó. 

O tio Chedas ― como a avó São lhe chamava ― usava uma longa barba branca e coxeava ligeiramente. Embora eu nunca tivesse realmente acreditado que ele ajudou a matar o rei em 1908, certo é que ainda hoje, lá na minha aldeia nativa, existem pessoas que me asseguram que ele viveu na gruta do Algar, sempre escondido, tendo apenas como companhia os coelhos que ia criando e que depois se compadecia de matar para comer. 

Recordava-me a minha avó que todas as madrugadas do dia 25 de Dezembro o tio Chedas abandonava as galerias subterrâneas e vinha sentar-se junto à fogueira que ainda agora se acende no adro da capela. Depois de aquecer os pés e as mãos, caminhava solitariamente pelas gélidas ruas da povoação, revisitando cada casa adormecida na memória. 

Lá na aldeia, as pessoas passaram a conhecer-lhe esse ritual e habituaram-se a aguardar silenciosamente a sua passagem, espreitando-o por entre as frinchas das pedras. Nessa época de tanta fome, não havia iluminação, quer nas casas, quer nas ruas, e, por isso, apenas lhe pressentiam a sombra, cada vez mais contorcida e derreada pela caudalosa passagem dos invernos. 

Alguns conterrâneos, talvez porque a consciência lhes pesasse mais naquela altura do ano, começaram a deixar-lhe, pendurado nas portas, um saco com o pouco que lhes sobrara da ceia de Natal. A minha bisavó, que era forneira de profissão, guardava-lhe sempre uma côdea de pão de milho para que depois, algures pela madrugada dentro, ele pudesse fazer a consoada ao lado dos coelhos que criava, a única família que ainda lhe restava. 

Ao longo da meninice, ano após ano, fui ouvindo cada vez com maior espanto a fabulosa narrativa do tio Chedas e da sua enigmática gruta (ou mina, como tantas vezes ouvi dizer) no Algar. Ainda hoje, decorridas que são mais de três décadas, me arrepia só de pensar na imagem deste homem solitário a caminhar pelas ruas escuras da minha aldeia nativa, em busca do calor do Natal, para depois se refugiar nas intermináveis profundezas. E logo nessa noite tão transcendente, ao longo da qual todas as feridas se avivam e se revisitam intensamente alguns dos esqueletos que trazemos escondidos na alma… 

Este conto é dedicado a todos os anónimos da História que continuam a ajudar os seus semelhantes a encontrar a estrela de Natal, mesmo nas circunstâncias mais dramáticas desse profundo mistério cósmico ao qual damos o nome de vida. 

O brilho de Natal também faz parte dessas ilusões sem as quais a vida se tornaria insuportável. E escrever este conto é talvez a forma mais sentida que eu ainda possuo para desejar a todos os leitores um Santo e Feliz Natal. 

Renato Nunes 
(renato80rd8918@gmail.com)      

Recebido por correio eletrónico


domingo, 22 de dezembro de 2019

“A inclusão não é um fenómeno isolado”

Um dos maiores obstáculos à inclusão é, segundo David Rodrigues, presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial e membro do Conselho Nacional de Educação (CNE), “a dificuldade de conseguir conjugar e harmonizar todos os meios, todas as competências e oportunidades que se consideram essenciais num determinado momento para o sucesso dos alunos”. O professor de Educação Especial esmiúça conceitos, enumera desafios, fala do caminho feito e do que há para fazer nesta área no texto “2018: cimentar o compromisso com a Educação Inclusiva”, publicado no relatório “Estado da Educação 2018” do CNE.

Na sua opinião, é necessário ter em consideração vários elementos: práticas pedagógicas adequadas, comunicação e cooperação permanente nas escolas, saber trabalhar com as diferenças, perceber que a inclusão é um património a ser defendido e promovido por todos. “Pensar em inclusão só quando existem alunos com deficiência é uma grande pobreza, porque retira deste constructo as questões de etnia, de género, de identidade sexual, de nível socioeconómico ou sociocultural, que são absolutamente essenciais para entender uma sociedade complexa”, refere.

Nas últimas décadas, Portugal desenvolveu trabalho nesta área, nota-se um esforço continuado, e o país é citado como caso de sucesso das políticas educativas inclusivas por organizações internacionais, até porque 99% dos alunos com necessidades específicas estão em escolas regulares. Esta realidade provoca diversas leituras, segundo David Rodrigues. “Para algumas pessoas, trata-se da prova de que um pequeno país com meios muito limitados conseguiu atingir uma percentagem de inclusão rara e meritória; para outros, esta percentagem não passa de um número vácuo, dado que o que é importante considerar são as falhas que este número parece ocultar”.

Os números são importantes, mas também é preciso olhar para o quotidiano das escolas. E aí há muito para fazer, tendo em conta a “grande carência de recursos, a sua distribuição assimétrica, a necessidade de potenciar a confiança que as famílias depositam no trabalho da escola”. Espera-se então, de toda a comunidade, uma atitude inclusiva, o que significa acolher a diversidade, tirar o melhor partido dela de forma a ter um sistema educativo alicerçado na equidade, na inclusão e nos Direitos Humanos, como realça David Rodrigues.

O conselheiro nacional de educação refere que a inclusão é um “work in progress”, que se constrói dia a dia, e que é preciso fortalecer o conhecimento, a autonomia e a competência pedagógica, porque, escreve, “é neste terreno que a educação se joga, se perde ou se ganha”. A inclusão é, portanto, “um trabalho que raramente possui um quadro claro sobre o que é ‘correto’ fazer ou não fazer, em que não se conhece e prevê o processo”.

Há, por outro lado, várias coisas que a inclusão não é. “Não é um fenómeno isolado, delimitado ou pessoalizado. Não é isolado porque não pode existir se só estiverem presentes alunos com condições de deficiência”. Inclusão não são só os professores de Educação Especial, inclusão é toda a escola e toda a comunidade. “Delimitar a inclusão a pessoas ou serviços é um empobrecimento e uma desvalorização da riqueza da inclusão”, alerta.

Portfolios, avaliações orais e em grupo

A possibilidade de realizar trabalho pedagógico diversificado é um grande desafio para a Educação Inclusiva. “Entender o trabalho pedagógico como uma tarefa homogénea que tem por destinatários grupos homogéneos é um forte obstáculo à inclusão. Em várias escolas o corpo docente mostra dificuldades em mudar formas de ensinar e suscitar novas formas de aprender”, refere David Rodrigues. Há professores com dificuldade em mudar e há professores que querem fazer algo diferente.

“Torna-se claro que há muito trabalho a fazer para que a interação pedagógica seja feita de forma a chegar e a ser útil a todos os alunos sem deixar nenhum para trás”, avisa, realçando a importância da formação e da criação de modelos cooperativos que apoiem a inovação e permitam sustentar um trabalho pedagógico diversificado. As atitudes dos professores em relação a uma escola que não estabelece diferenças entre os alunos de Educação Especial são importantes neste campo.

Os meios para apoiar a educação de alunos com dificuldades ou deficiências é, regra geral, “muito insuficiente”, apesar da criação de Centros de Recursos para a Inclusão (CRI), com o objetivo de providenciar e proporcionar apoio de técnicos exteriores à escola, essenciais para a habilitação e educação de alunos com condições de deficiência ou dificuldade. O apoio “chega tarde e em quantidade bem inferior ao que tinha sido determinado” e, segundo David Rodrigues, “é certamente um desafio a enfrentar tornar estes apoios mais efetivos e pensar mesmo em novos modelos de fazer chegar de forma mais expedita e adequada estes meios às escolas”.

A avaliação está entre os maiores desafios à adoção de práticas inclusivas. “Encontra-se ainda muito presente a ideia de que para haver justiça na avaliação o processo deve ser exatamente igual para todos, para permitir que sobressaiam as diferenças de mérito entre os alunos”. “Esta preocupação com a avaliação é comum e chega até a influenciar as práticas e os valores na educação pré-escolar quando ainda se encontram bem longe as provas aferidas e nacionais de avaliação”, acrescenta. Há escolas que já aplicam modelos de avaliação, com critérios formativos, em detrimento dos tradicionais modelos de avaliação sumativa e normativa, recorrendo, por exemplo, a portfólios, a avaliações orais, a avaliações grupais.

A formação contínua é outro desafio. Há aspetos que devem merecer atenção, ou seja, o âmbito da formação, a quantidade da formação, os conteúdos da formação, a certificação da formação. “A melhoria destes aspetos da formação parece configurar um importante desafio no sentido em que é reconhecida a sua importância para a mudança de atitudes e práticas. Trata-se talvez de reforçar o financiamento e direcionar o esforço que tem sido feito na formação contínua para a tornar mais eficaz”, sublinha.

Diferença e desigualdade não são a mesma coisa

David Rodrigues chama a atenção para um ponto sensível: não se deve confundir diferença com desigualdade. Os conceitos são estruturalmente distintos. A inclusão, realça, lida com todas as diferenças, dos alunos, das famílias, dos professores. “Muito do trabalho ‘inclusivo’ nas escolas é constituído por este esforço de trabalhar com as pessoas a partir de onde elas estão, do que sabem, do que pensam, que atitudes e motivações têm. Pessoas e instituições diferentes a trabalhar com as diferenças. É este certamente um desiderato fundamental da inclusão”, escreve no seu texto.

Por outro lado, a desigualdade é socialmente injusta porque, refere, “nem sequer se pode arrogar a ser meritocrática: quem é desigual não o é por algo que tenha feito, mas sim por um conjunto de condições para as quais não fez nada ou quase nada”. Trabalham-se as diferenças com um único objetivo, para que das diferenças não nasça a desigualdade. “Para que as pessoas que têm necessidade de um tratamento diferente do que é estandardizado (todas?), ao não o terem, não serem consideradas inferiores, descartáveis e ‘menos’. A Educação Inclusiva é, assim, o trabalho pedagógico que se faz para que as diferenças não se convertam em desigualdades”.

O membro do CNE realça alguns aspetos do novo decreto-lei referente à Educação Inclusiva, publicado a 6 de julho do ano passado. Desde logo, a designação do próprio diploma, regime jurídico da educação inclusiva, que distingue entre alunos da Educação Especial dos alunos da educação regular, todos são considerados como tendo necessidades diferentes, mas todos pertencentes à mesma escola.

Há mais pontos que lhe merecem destaque na nova legislação, ou seja, a assunção de que todas as crianças e alunos têm capacidade de aprendizagem e de desenvolvimento educativo, a garantia de que todos têm acesso aos apoios necessários de modo a concretizar o seu potencial de aprendizagem e desenvolvimento, o direito ao acesso e participação, de modo pleno.

Fonte: Educare

sábado, 21 de dezembro de 2019

Doenças raras, oncológicas e deficiência. Pais com subsídios pagos a 100 por cento

A Assembleia da República aprovou esta sexta-feira, na generalidade, quatro projetos-lei de reforço da proteção social e laboral dos pais de crianças com doenças raras ou oncológicas ou com deficiência.

Os projetos-leis do CDS, Bloco de Esquerda, PAN e PCP foram todos aprovados, apenas com a abstenção do PS, e acompanharam uma petição pública da Associação Pais Heróis, alertando para a falta de suporte financeiro para acompanhar os seus filhos.

O CDS-PP propõe o acréscimo do período de licença parental em caso de nascimento de criança com deficiência ou doença rara em 60 dias, podendo este período extra ser gozado pela mãe ou pelo pai.

Na sua proposta, o CDS defende ainda que seja o aumento do montante dos subsídios por riscos específicos e para assistência a filho de 65% para 100% para o setor público uma vez que na anterior legislatura já tinha sido aprovada para o setor privado.

Por outro lado, o CDS defende também que o subsídio de assistência a um filho com deficiência ou doença crónica ou oncológica passe também a ser pago a 100 por cento.

O projeto de lei do Bloco de Esquerda (BE) vai também no sentido de alargar a proteção na parentalidade aos progenitores com filhos com deficiência, doença rara ou doença oncológica e determina o pagamento a 100% do subsídio para assistência.

O BE propõe também a majoração em 60 dias da licença parental inicial no caso de nascimento de criança com deficiência ou doença rara, o alargamento da redução de cinco horas do período normal de trabalho até o menor completar os 3 anos e o pagamento a 100% do subsídio para assistência.

A proposta do PCP aponta para o aumento de 30 para 90 dias de faltas justificadas e remuneradas ao trabalho ou durante o período completo de eventual hospitalização, tratamento ou convalescença e a criação de um subsídio para assistência a filho durante esse período.

O PCP defende também a garantia do gozo em simultâneo da licença para assistência a filho por parte dos dois progenitores e que o montante diário do subsídio para assistência correspondente a 100% da remuneração de referência e proteção em caso de desemprego dos progenitores.

Já o PAN defende alterações à lei laboral para que a licença prevista possa ser prorrogável até seis anos (atualmente é de quatro anos), nas situações de necessidade de prolongamento da assistência.

O partido Pessoas, dos Animais e da Natureza defende também que o montante diário para a assistência seja igual a 100% da remuneração de referência do beneficiário e que as despesas com alojamento das crianças com cancro e acompanhantes sejam comparticipadas em caso de insuficiência económica.

O PAN quer ainda que tenham direito a acompanhamento psicológico regular e que os sobreviventes de cancro infantil tenham acesso a consultas de acompanhamento especializadas, devendo estas estar disponíveis em todos os centros oncológicos ou hospitalares.

Fonte: DN

quinta-feira, 19 de dezembro de 2019

Testemunhos Da “Inclusão”

Publico um texto divulgado no Blog "O Meu Quintal" do Paulo Guinote.

Passo a apresentar me.
Chamo-me Marta e sou mãe da Maria. Mais conhecida como Maria Ervilhinha.
A Maria nasceu, há 5 anos, com uma Monossomia 22, denominada de Síndrome Phelan McDermid. Esta doença rara que assolou a Maria, por sequência da delecção do cromossoma 22 é enormíssima, o que lhe atribui inúmeras dificuldades, limitações e incapacidades.
A Maria faz ciclos intensivos terapêuticos de reabilitação em Braga, desde o seu diagnostico. Ja vai no sexto ciclo. Com muita luta e, as vezes, algum desespero, pois sao tratamentos muito caros: 10,200€ cada ciclo de 9 semanas.
Estes ciclos são espaçados semestralmente. Isto para a contextualizar.
A Maria andou numa IPSS aquando do seu diagnostico. Correu mal. Procuramos um Colégio privado. Ingressou e correu muito bem. Porém, engravidei e ela ficou comigo ate hoje. O mano fez agora 1 ano de idade.
Colocar a Maria numa escola dita inclusa sempre foi uma luta. Desde a primeira má experiência. A única opção viável e de aceitação em receberem a Maria foi apenas daquele Colégio.
Ora como a Maria está numa fase de pré escolar, com muitas limitações e atraso cognitivo ( um atestado multiusos com 99% de incapacidade), foi aconselhado pela equipa que a trabalha o regresso rápido á escola. Todos os parâmetros associados – socialização, grupo de pares, interacção – teriam de ser realmente trabalhados agora, nesta fase. Começou toda a busca por uma escola com valência de educação especial. Zero resultados obtidos. Descartou-se hipóteses com filtros de proximidade de casa e contexto/valência de ensino especial. Zero.
Fase 1) ir ao agrupamento da freguesia de residência e perceber como funciona. Péssima ideia. Apresentam o espaço com uma unidade de “deficientes, em que só saem de la para ir ao ensino regular 1h por semana, se se portarem bem; se se portarem mal voltam à unidade”. Imaginei logo que enjaulavam me a filha, como num zoológico, não fosse ela ter actos canibalistas.
Fase 2) Perceber como funciona a revisão da Lei 54/2018 e uma série de direitos relativos à área da deficiência e ensino das pessoas portadores de deficiência.
Fase 3) Procurar Colégios e Instituições Privadas. Bastava dizer que a minha filha tem NEE diziam de imediato que não haveria vaga, nem agora nem nos anos seguintes.
Fase 4) Retorno ao Colégio que acolhera a Maria em tempos, e planearmos em conjunto (equipa do Colégio e nós pais) a melhor forma de dar resposta à Maria. A necessidade de um professor, educador de ensino especial (pago por mim, aparte do Colégio) foi unânime.
Fase 5) Nós pais, na procura do dito acompanhamento para a nossa filha poder voltar à escola, encontramos uma associação que faria essas deslocações a contexto escolar com crianças como a Maria.
Acompanhamento das 10h as 13h, 5 vezes por semana = 1008€
Somando a isto, o pagamento da propina escolar e as sessões de terapias que a Maria necessita de fazer, pelo menos 2 vezes por semana, e que ascende aos 790€ / mês.
Posto isto, e sabendo que a minha filha recebe 62 € da bonificação da deficiência unicamente, como é possível o nosso governo dizer que não há discriminação na área da deficiência. Onde está a inclusão? Como posso eu ir trabalhar se as escolas fecham se a crianças deste tipo? Como é comportável para qualquer família este tipo de gastos para que a filha tenha um “normal” acompanhamento diário? Que raio de decretos e leis anda aquela gente toda no parlamento a criar?
No terreno é tudo tão diferente. Tão cru. Tão suicidário.
E recordar que para o próximo ano lectivo a Maria tem que estar matriculada numa instituição de ensino – seja para estar entregue ao “Deus dará” ou apenas para criar estatística de rankings – é revoltante. Desesperante.
O país é isto!
Aparte desta luta, existe a luta de angariar dinheiro para que a minha filha (e tantas outras filhas, de tantos outros pais!) tenha acesso a tratamentos de valores absurdos como os que referira. Há cerca de um mês atrás, numa publicação das redes sociais consegui fazer mexer o mundo; mexi com os ditos influencers e com alguma nata da sociedade que se diz benemérita, quando lhes pedi apenas a partilha da história da minha filha. Não mendiguei dinheiro. Correu muito mal e correu muito bem. Li gente a debater-se uns contra outros pela minha filha; gente a dizer me “você se pensa que os influencers têm que salvar a sua filha, está enganada! Bata a porta do governo e vá fazer greve de fome para a porta do parlamento, ninguém tem que a ajudar”…
E então… ficamos sem saber o que fazer, nem pensar…somos desprotegidos de uma constituição que se aparenta não discriminatória, e de dados estatísticos entregues ao Comité Europeu de Pessoas Portadoras de Deficiência fantásticos, quando na verdade nada de nada está a funcionar. Isto sem eu falar do que vejo na realidade, na prática quando me desloco aos locais onde estas crianças deveriam ser bem acolhidas. Ou minimamente acolhidas.
Desculpe a revolta nas palavras mas já me vejo sem saída para me fazer ouvir. Já me imaginei ate nas galerias do parlamento a ser algemada para gritar todas estas injustiças. Mas ninguém quer saber…
Nos últimos tempos já me revejo do outro lado da linha, sem solução. à espera que chegue o dia em que eu, obrigada, tenha que deixar a minha filha não-sei-onde, a não-sei-quem, a fazer-não-sei-o-que. Com o enorme receio de voltar para busca-la, e ela tenha fugido, esperneado, gritado, descompensado ou simplesmente sobrevivido a mais um dia estúpido, enrolada numa manta sem estimulação, qual lar à espera que os dias passem.
Morro dia a dia. E já quando me sinto no fim da linha, já só peço que o comboio passe rápido para acabar com este sofrimento.
Os melhores cumprimentos de uma mãe desesperada
Grata pela sua atenção,
Marta L.

quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Educação 2020: muita força p’ra pouco dinheiro

A agenda programática da educação expressa na proposta de Orçamento do Estado dificilmente terá verba para ser financiada. Muitas ideias para pouco dinheiro.

Ao ler a secção dedicada à educação, com números ainda pouco desagregados, a lista de boas intenções é mais longa que em anos anteriores e demonstra a continuidade da equipa governamental. A ambição discursiva vai muito para além do pequeno incremento que o orçamento proporciona, sinalizando que é expetativa do Governo que muitos programas propostos sejam implementados à conta da boa vontade e carolice dos funcionários do ministério e dos professores e diretores a nível de escola.

De notar que este orçamento a nível discursivo dá grande relevo a medidas associadas ao Plano Nacional do Sucesso Escolar (PNSE), algumas que transitam de anos anteriores (como flexibilidade curricular, tutorias, plano de ensino-aprendizagem da matemática, apoio a alunos carenciados) mas outras que surgem com alguma novidade: apoio a alunos imigrantes e a comunidades ciganas. De destacar medidas que podem representar um enriquecimento do papel da escola enquanto promotora de cidadãos cultos e interessados pelo mundo à sua volta: o Plano Nacional das Artes, a Ciência Viva nas escolas, a criação de escolas bilingues e o alargamento da oferta linguística a outros idiomas (mandarim ou italiano). Todas estas intenções correm o risco de ficar no papel ou de se transformarem numa sombra de si mesmas.

À luz do orçamento de 2019, os programas que foram orçamentados no âmbito do PNSE (reforço para projetos apresentados no âmbito do PNSE; tutorias e reforço das equipas de psicologia e orientação profissional) dispunham apenas de cerca de 50 milhões de euros para todo o ensino básico e secundário – o que significa cerca de 40,00€ aluno/ano.

Temos de aguardar pela desagregação de verbas para 2020, mas temo que se manterão na mesma ordem de grandeza. Se ao valor total do orçamento descontarmos as despesas em bens de capital (investimento na construção e recuperação de infraestruturas) e as transferências correntes (pagar a prestadores externos o ensino artístico, os contratos de associação, as instituições que lidam com inclusividade), o que resta são 5400 milhões de euros, dos quais 88% são salários. Temos pouco dinheiro para inovar, pouca margem para fazer floreados.

Pode ser que consigamos implementar alguns planos via ganhos de eficiência. Bem necessitamos se queremos experimentar novas estratégias e modernizar a escola. As ideias andam por aí, espelham muito do conhecimento que se vai acumulando nas universidades e na prática docente. Mas não chega. Temos de melhorar o planeamento de políticas, ser mais claros a elencar os seus custos e benefícios. É preciso planear, é preciso antecipar as dificuldades e promover os benefícios expectáveis. As ideias são fundamentais, mas não acontecem no vazio.

Isabel Flores

Fonte: Público

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Promover a inclusão e o sucesso escolar

O documento com as Grandes Opções do Plano 2020-2023 do XXII Governo Constitucional a apresentar à Assembleia da Repúblico inclui uma secção dedicada à promoção da inclusão e do sucesso escolar.

Nesse domínio consta o seguinte:

Apesar de uma redução de cerca de um terço entre 2015 e 2018, Portugal continua a ter níveis de insucesso e retenção demasiado altos – em 2018, foram cerca de 50 mil no ensino básico e outros 50 mil no ensino secundário – que contrastam com o observado na maioria dos países europeus, mantendo-se a sua forte correlação com as condições socioeconómicas de origem dos alunos. 

Por conseguinte, uma política de combate às desigualdades obriga à consolidação e alargamento de estratégias lançadas nos anos anteriores e que se têm demonstrado bem sucedidas, como é o caso do Programa Nacional de Promoção do Sucesso Escolar, do Apoio Tutorial Específico ou da qualificação dos serviços de psicologia, orientação e apoio social escolar. É fundamental continuar os esforços de monitorização e aferição dos resultados destes programas e compreender como se podem potenciar articulações, aperfeiçoamentos e sinergias, de forma a encontrar-se a solução mais adequada a cada contexto e a cada aluno, de forma a prevenir e mitigar o insucesso, criando, assim mesmo, um Plano de não retenção no ensino básico, trabalhando de forma intensiva e diferenciada com os alunos que revelam mais dificuldades. 

Algumas estratégias adicionais estão previstas para diversificar esta linha de trabalho, até 2023, em diálogo com as escolas e as comunidades educativas, focando aspetos já identificados como críticos para a inclusão e o sucesso de todos os alunos: 

Definir uma estratégia integrada de ação sobre a aprendizagem da matemática, consonante com o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória e com o currículo dos ensinos básico e secundário e os princípios orientadores da avaliação das aprendizagens; 

• Garantir maior inovação, formação e estabilidade às escolas em territórios socialmente mais desfavorecidos e marginalizados, reforçando o combate à segregação e a sua vinculação às dinâmicas de desenvolvimento comunitário; 

• Melhorar a eficácia dos sistemas de aferição do sistema ensino/ aprendizagem para alunos e professores; 

• Reforçar as políticas de ação social escolar e implementar um programa de apoio a famílias vulneráveis, que articulem e tornem eficaz a ação da escola, da família e dos serviços da segurança social no terreno; 

• Dinamizar programas específicos de combate ao abandono escolar por alunos com deficiência, apostando na transição entre a escolaridade obrigatória e a vida ativa, através da implementação efetiva de Planos Individuais de Transição; 

• Apostar em programas de mentorado entre alunos.

segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Paralisia cerebral: Diagnóstico não é destino

Cristiana Marques é exemplo de que um diagnóstico não é sinónimo de um caminho sem esperanças. A vimaranense tem paralisia cerebral e embora não se defina por esta condição, assume que teve que ultrapassar desafios acrescidos e que identifica ainda muitas barreiras e entraves à plena participação na sociedade. Obstáculos que o presidente da Federação das Associações Portuguesas de Paralisia Cerebral (FAPPC), Abílio Cunha, também reconhece e, por isso, sublinha a importância do Dia Nacional da Paralisia Cerebral, comemorado a 20 de outubro, para dar mais visibilidade às pessoas com paralisia cerebral. 

“Ela não vai andar, não vai falar e não vai fazer nada”. Foi a frase proferida por um médico há 29 anos para explicar aos pais de Cristiana Marques o que é que a filha tinha e o que podiam esperar deste diagnóstico: Paralisia Cerebral. A verdade é que a vimaranense consegue andar, embora utilize cadeira de rodas para distâncias mais longas, fala sem qualquer tipo de comprometimento da compreensão verbal, é atleta de boccia e é técnica de apoio ao cliente na empresa Primavera, em Braga. “Foi um choque e a partir daí [os meus pais] foram à procura de respostas porque não se conformaram. A única resposta que conseguiram foi da Associação de Paralisia Cerebral de Braga mas era um bocado longe e surgiu daí a ideia da fundação da Associação de Paralisia Cerebral de Guimarães com outros pais e outros familiares que ajudaram a reunir o maior número de clientes”, explica Cristiana Marques. Foi este percurso que muitos familiares e amigos de crianças com deficiência há algumas décadas fizeram para fintar diagnósticos médicos pouco promissores, apostando na criação de instituições focadas em todos os aspetos da habilitação possível dos respetivos filhos. Cristiana Marques teve que realizar muitas cirurgias e fazer fisioterapia diária para contrariar os efeitos desta lesão não progressiva que ocorre aquando o desenvolvimento do sistema nervoso central. 

A Paralisia Cerebral provoca, maioritariamente, descoordenação motora, rigidez e perda de força muscular, descontrolo da cabeça, dos membros e dos olhos e tremores, fazendo com que provoque problemas de marcha e dificuldades ao nível da utilização dos braços e das mãos. A lesão das regiões do cérebro responsáveis pelo movimento pode ser provocada por infeções congénitas, prematuridade, baixo peso ao nascer, hipoxia perinatal, citomegalovírus, entre outros. Podem ocorrer também comprometimentos auditivos ou visuais, além de alterações da linguagem, do comportamento e da aprendizagem mas é importante ter em consideração que a maioria das vezes a paralisia cerebral não está associada a qualquer incapacidade intelectual. No entanto, a verdade é que é frequente associar-se às pessoas com paralisia cerebral comprometimentos cognitivos o que faz com que muitas vezes se subestimem as competências sociais e profissionais de quem tem esta síndrome. “No início na primária foi muito complicado, a professora não estava preparada para uma criança como eu. Não se mostrou muito recetiva e até dizia que eu não tinha que andar numa escola de ensino regular porque eu não me sentava sozinha na cadeira, não segurava a cabeça e porque babava o caderno”, lembra Cristiana Marques. Nessa altura a jovem não participava em passeios da escola, nem desfiles de Carnaval. Com a entrada no segundo ciclo o contexto académico de Cristiana Marques melhorou, mas, ainda assim, a interação da turma não era a melhor. “Eu nunca tive muita convivência com a turma porque eles iam para as atividades deles e eu ficava na salinha do ensino especial. Embora não precisasse, ficava lá porque não tinha com que me entreter. Convivia mais com outras turmas”, refere. “Esta falta de alternativas é uma barreira à inclusão social”, afirmou o presidente da direção da Sociedade Internacional de Paralisia Cerebral e pai de uma criança com esta condição, John Coughlana, na comunicação que fez durante a Conferência “Inclusão social e o papel das organizações na sociedade civil”, realizada a 20 de outubro no Centro Cultural Vila Flor. 

Não foi fácil compreender este tratamento por parte dos colegas, mas Cristiana Marques diz que agora já não guarda qualquer tipo de ressentimento. A vimaranense encara as lembranças do secundário como as melhores que tem do tempo de escola. “Parte dos pais desde cedo não terem receio de interagir com miúdo que vejam na rua e que interajam de forma natural, sem nenhum olhar esquisito e sem falar ‘à bebé’ porque o miúdo pode perceber”, aconselha. Este foi um dos preconceitos existentes na sociedade também identificado por John Coughlana, nas comemorações do Dia Nacional da Paralisia Cerebral: “As pessoas têm o hábito de perguntar-me ‘Como é que se chama o seu filho? Quantos anos tem?’. E pensam que têm que falar com o pai e não com a criança”, exemplifca. O presidente da Federação das Associações Portuguesas de Paralisia Cerebral (FAPPC), Abílio Cunha, considera que os preconceitos se têm esbatido com o tempo e aponta a Lei 54/2018 sobre a educação inclusiva e que visa responder à diversidade das necessidades e potencialidades de todos e de cada um dos alunos, como sendo “a alavanca para esbater, no futuro, todos os preconceitos sobre a paralisia cerebral”. 

“Acredito que este decreto-lei, apesar de ainda ter muitos anticorpos, refiro-me a lóbis, no futuro terá certamente um impacto na vida das pessoas com paralisia cerebral”, defende Abílio Cunha. A Paralisia Cerebral afeta aproximadamente duas em cada mil pessoas e é um dos problema de desenvolvimento mais comum nas crianças. O presidente da FAPPC também tem paralisia cerebral e apesar de algumas dificuldades de controlo motor e de comunicação, a verdade é que sempre que dá a cara, também enquanto presidente da Associação do Porto de Paralisia Cerebral, consegue passar, perfeitamente, a mensagem de defesa dos direitos das pessoas com deficiência. Abílio Cunha considera que as atuais evoluções da sociedade não ocorrem ao ritmo desejado. “Continuam a persistir os atropelos que violam todos os direitos plasmados na Constituição e nas diversas convenções – surgindo novas barreiras que condicionam muito mais as ‘tradicionais’ barreiras arquitetónicas contra as quais tanto lutamos. Refiro-me às barreiras digitais, barreiras tecnológicas ou barreiras de atitudes, entre outras”, enumera. São barreiras muitas vezes intransponíveis e que impedem as pessoas com deficiência de alcançarem os seus sonhos e concretizarem as suas realizações pessoais. Cristiana Marques tem conseguido ultrapassar estes obstáculos, atingindo dois objetivos importantes: trabalhar e ter carro próprio. ”Pelo que eles viram no currículo eu tinha pé e meio dentro da empresa. Foi engraçado que na entrevista perguntaram-me quantos hobbies é que tinha e eu disse que tinha a piscina, catequese e disse-lhes que queria voltar ao boccia. E ele diz ‘Eu tenho uma condição para tu entrares, ai de ti que deixes algum desses passatempos para te dedicares ao trabalho. Porque os passatempos é que te vão dar energia para encarares a semana inteira de trabalho’”, conta. Uma visão rara no mercado laboral mas que a empresa Primavera BSS, sedeada em Braga, demonstrou ter ao contratar Cristiana Marques. Outro sonho que, por diversas vezes, está mais distantes e torna-se mais difícil de alcançar quando se coloca na “equação”, do dia-a-dia de uma pessoa, uma incapacidade/deficiência é a autonomia na mobilidade. “Foi o ganhar asas. Tirar a carta não foi difícil da minha parte, foi difícil pelas burocracias que exigiam”, explica Cristiana Marques. “Em maio de 2009 comecei as aulas, em junho fiz exame a código, em agosto comecei as aulas de condução e em setembro estava aprovada à segunda por completa implicância do engenheiro. Mas pronto, já estava à espera: quando eles começam a olhar para nós de cima a baixo, a olhar para a muleta”, lembra. A distância entre ter carta e ter carro foi de sete anos e a partir do momento em que passou a conduzir criouse um antes e um depois na vida de Cristiana Marques impossível de ignorar. “Foi um ‘adeusinho pai’ porque agora vou onde quero. Mas eu dizia que quando tivesse carro não ia parar em casa, mas isso nem sempre acontece porque de cada vez que quero sair tenho que pensar duas vezes onde posso ir”, descreve. A faceta mais visível da vida de Cristiana Marques é enquanto atleta de Boccia, mas é também enquanto catequista que vai conseguindo junto dos mais novos naturalizar a diversidade funcional e contribuir para uma sociedade inclusiva. “Ainda há pessoas que ficam admiradas por ter tirado um curso, ter tirado a carta e por estar a trabalhar, parece um feito enorme e não é nada de especial. Colocam um rótulo e dizem esta pessoa é incapaz de tudo. Ainda ficam admiradas quando digo que faço tudo dentro de casa, arrumo o meu quarto, lavo a loiça, ajudo a limpar. Aos olhos dos outros sou uma heroína”, analisa. Cristiana Marques considera que tornar a sociedade mais inclusiva parte de cada um, uma opinião também partilhada por Abílio Cunha que defende que as pessoas, independentemente das suas diferenças, deveriam ser capazes de “assimilar a riqueza da diversidade humana e sentirem a obrigação de serem agentes dessas mudanças”. 

O dia 20 de outubro veio ajudar à sensibilização da sociedade civil para a importância do respeito pela inclusão e para a necessidade de apoio na defesa dos direitos das pessoas com paralisia cerebral. O Dia Nacional da Paralisia Cerebral veio para ficar, até não mais ser necessário. 

Comemorações do Dia Nacional da Paralisia Cerebral 

As Comemorações do Dia Nacional da Paralisia Cerebral e dos 25 anos da Associação de Paralisia Cerebral de Guimarães (APCG) tiveram a 19 de outubro o momento alto com a realização da Gala dos Afetos no Pavilhão Multiusos da Cidade Berço. “A direção da Associação de Paralisia Cerebral de Guimarães está de parabéns pelo riquíssimo programa onde todos tiveram a oportunidade de usufruir dos encantos e belezas da Cidade Berço, mas também pela conferência realizada no último dia – onde os vários intervenientes abordaram o tema da Inclusão”, elogiou o presidente da FAPPC em entrevista ao Fórum Municipal. Além de Abílio Cunha e de John Coughlana a conferência dedicada ao tema “Inclusão social e o papel das organizações na sociedade civil”, contou com a presença do presidente da Câmara Municipal de Guimarães, Domingos Bragança, do reitor da Universidade do Minho, Rui Vieira de Castro e do presidente do Instituto Nacional para a Reabilitação, Humberto Santos. Foi uma palestra moderada pela vereadora da Ação Social da Câmara Municipal de Guimarães, Paula Oliveira e que foi enriquecida ainda com a intervenção de vários participantes presentes na plateia. As comemorações tiveram início a 18 de outubro, sexta-feira, mas a realização de uma prova desportiva chamada Jogos com Barreiras que envolvia os alunos das escolas e os técnicos das associações nacionais de paralisia cerebral no Toural foi cancelada porque a chuva não deu tréguas. Para o ano há mais, certamente, noutra localidade do país, porque é importante enraizar a celebração do Dia Nacional da Paralisia Cerebral em jeito de “reconheci - mento de todas as associações de paralisia cerebral que, diariamente, estão no terreno para apoiar e serem agentes que proporcionam a cada um e a cada uma os meios e as ferramentas para que o próprio possa ter a possibilidade de escolher o seu próprio caminho”. “Mas este Dia é também importante para relembrar aos decisores que as suas orientações têm que passar pelo respeito e não discriminação das pessoas com paralisia cerebral em todas as áreas de intervenção”, concluiu Abílio Cunha.