quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Recomendações de medidas para apoio às crianças e jovens com cancro e seus cuidadores

Pela Resolução da Assembleia da República n.º 22/2018, recomenda ao Governo medidas para apoio às crianças e jovens com cancro e seus cuidadores.


Na área da educação:

- Aumento do número de docentes a trabalhar no Serviço Nacional de Saúde, garantindo o acompanhamento escolar a todas as crianças e jovens com doença oncológica.

- Reforço do apoio docente ao domicílio.

- Garantia dos recursos necessários para que as escolas e os hospitais implementem o ensino à distância, sempre que necessário.


Pela Resolução da Assembleia da República n.º 23/2018, recomenda ao Governo a implementação de medidas de proteção e apoio aos menores portadores de doença oncológica e aos seus cuidadores, destacando-se na área da educação:

- Reforçar e agilizar o acesso ao apoio especial educativo, previsto na Lei n.º 71/2009, de 6 de agosto.

- Aumentar as equipas docentes afetas aos hospitais, por forma a garantir que todos os menores portadores de doença oncológica que se encontram em internamento hospitalar tenham acesso a um regular acompanhamento escolar.

- Reforçar as equipas docentes de apoio ao domicílio, assegurando que os menores portadores de doença oncológica têm acesso a um regular acompanhamento escolar nas suas residências.

- Disponibilizar os recursos necessários nas escolas para garantir aos menores portadores de doença oncológica o acesso ao ensino à distância.

- Assegurar formação adequada aos docentes afetos ao ensino especial destinado a menores portadores de doença oncológica.


Resolução da Assembleia da República n.º 24/2018, recomenda ao Governo que reforce as medidas de apoio às crianças e adolescentes com cancro e às suas famílias, com destaque no domínio da educação:

- Permita o acesso das crianças e jovens com cancro ao apoio especial educativo, designadamente quanto às condições especiais de avaliação, frequência escolar e apoio na escola ou no domicílio, sempre que seja necessário e exista uma justificação clínica para tal, bem como quanto às adaptações curriculares;

- Garanta que os equipamentos especiais de compensação são atribuídos de forma célere;

- Reforce o corpo de docentes colocado pelo Ministério da Educação nos hospitais para um melhor e mais adequado acompanhamento das crianças e jovens com cancro.


Pela Resolução da Assembleia da República n.º 25/2018, recomenda ao Governo que tome medidas para garantir maior proteção aos menores com doença oncológica e respetivos familiares e cuidadores, para que:

- Crie as condições estruturais e de recursos humanos para garantir a todas as crianças e jovens, bem como à sua família nuclear (pais e irmãos), uma consulta de psicologia entre 15 a 30 dias após o diagnóstico da doença, assim como o acompanhamento psicológico regular, dando cumprimento ao previsto na Lei n.º 71/2009, de 6 de agosto, que criou o regime especial de proteção de crianças e jovens com doença oncológica.

- Regulamente o acesso ao apoio especial educativo previsto na Lei n.º 71/2009, de 6 de agosto.

- Reforce as equipas docentes nos hospitais com mais professores a partir do 5.º ano, uma vez que um professor por ciclo de aprendizagem é claramente insuficiente.

- Disponibilize mais professores de 1.º ciclo e de ensino especial para apoio ao domicílio, com critério uniforme de atribuição de horas entre os vários agrupamentos.

- Garanta uma maior comunicação entre a saúde e a escola, assente numa melhor articulação entre os hospitais, os médicos de família e as equipas de saúde escolar, que permita uma cabal reintegração escolar da criança com cancro.


Pela Resolução da Assembleia da República n.º 26/2018, recomenda ao Governo que adote medidas para reforçar o apoio às crianças e jovens com cancro, destacando-se no domínio da educação:

- Incremento da articulação entre agrupamentos escolares e docentes destacados pelo Ministério da Educação nos institutos portugueses de oncologia, de modo a melhorar o aproveitamento escolar e a integração e sociabilização das crianças e jovens com cancro;

- Concessão de autonomia aos agrupamentos escolares para reforçarem a carga letiva às crianças e jovens em regime de ensino no domicílio, uniformizando a legislação em relação ao número de horas mínimas atribuídas;

- Adaptação da carga letiva semanal de horas de apoio ao domicílio por parte dos agrupamentos escolares em função da capacidade de aprendizagem da criança ou jovem, destacando um professor com atribuição de meio horário (um mínimo de 10 h semanais);

- Deslocação ao domicílio de professores dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e do ensino secundário para acompanhamento letivo das crianças e jovens nas disciplinas consideradas fundamentais;

- Melhoria do apoio individualizado à criança ou jovem durante os intervalos das atividades letivas e nas atividades realizadas no exterior do estabelecimento de ensino, designadamente visitas de estudo e passeios, assegurando, para o efeito, o seu acompanhamento e supervisão individual por pessoal qualificado;

- Atribuição prioritária de professor para apoio ao domicílio a crianças do 1.º ciclo;

- Alargamento da Internet nos estabelecimentos de ensino frequentados por crianças ou jovens com cancro, ou, no caso de tal não ser possível, disponibilização de sala de aula onde o sinal seja atingido com qualidade, de modo a permitir o adequado acompanhamento das aulas por Skype;

- Atribuição às escolas ou agrupamentos escolares de meios e recursos, designadamente computadores com câmara incorporada, que possibilitem às crianças ou jovens o ensino à distância por Skype como um meio suplementar de aprendizagem, sem prejuízo do horário de apoio letivo efetivo;

- Disponibilização de alimentação adequada às crianças e jovens com cancro nas cantinas escolares.

Todas estas resoluções estão cheias de boas intenções. No entanto, interrogo-me se não seria possível chegar a um consenso alargado sobre esta matéria de forma a ser, eventualmente, mais eficaz junto do Governo. Ou, pelo contrário, esta dispersão de recomendações pode resultar numa atitude passiva por parte do Governo nesta matéria.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

«Algumas queixas de hiperatividade são sinais de boa vitalidade dos miúdos»

Pedro Strecht, 51 anos, pedopsiquiatra, tem mais de trinta livros publicados sobre questões relacionadas com o comportamento e o desenvolvimento de crianças e adolescentes.

Hiperatividade e Défice de Atenção (ed. Fundação Francisco Manuel dos Santos) é o mais recente e reflete sobre a forma como estamos a viver a família, o trabalho, a escola e questiona se não estará aí a origem desta verdadeira epidemia que é o diagnóstico de hiperatividade e défice de atenção. Porque para resolver um problema é preciso percebê-lo.

A hiperatividade e o défice de atenção parecem ser a epidemia deste início de século entre crianças e jovens. Há um sobrediagnóstico desta perturbação?
Sim, e a ideia central deste meu livro – Hiperatividade e Défice de Atenção – é que talvez estejamos a usar o mesmo rótulo para situações muito diversas, que temos de aprender a distinguir um pouco melhor.

Não terá este fenómeno muitas vezes que ver com o facto de vivermos cada vez mais em sociedades elas próprias hiperativas, tão desafiadoras como multitasking? Sim.

Não terá que ver com o tempo e a forma como lidamos com este, individualmente, nas famílias e na relação com as crianças, sempre com a sensação de que não o temos e cada momento é para aproveitar até ao limite, como se não houvesse amanhã? Se calhar, sim.

Não haverá muitas crianças que, por exemplo, não param quietas porque simplesmente não têm regras e limites bem definidos desde cedo? Também.

E quando as queixas vêm sobretudo da escola, não será porque os miúdos, ao contrário do que seria expetável com os avanços e as mudanças da sociedade, têm cada vez mais tempo de blocos de aulas e menos tempo de recreio e de vivência de casa, de família, de desporto, de atividades ao ar livre?

Mas a verdade é que até já se poderia falar numa geração ritalina, de tal forma a medicação tem sido a resposta de primeira linha adotada perante crianças com diagnóstico de PHDA [perturbação de hiperactividade e défice de atenção].
Nos últimos anos insistiu-se muito que o que podia ser hiperatividade com défice de atenção era algo que dizia respeito a uma dificuldade de processamento das substâncias libertadas entre as células nervosas – os neurotransmissores – e que, portanto, a resposta única ou quase exclusiva seria a medicação.

O que digo é que estamos a rotular e a medicar em demasia sem tentar outras respostas. Algumas destas crianças até podem vir a precisar de medicação, mas o uso de psicofármacos na infância e na adolescência deve ser o topo da pirâmide, esgotadas que foram outras respostas.

Não é apenas dizer que algo se passa a nível neurológico, dar uma medicação e a criança melhora. Sem dúvida que muitas que tomam medicação melhoram, não é isso que está em causa. Eu até digo às vezes a brincar que todos nós melhoraríamos se tomássemos um psicoestimulante, claro. Mas isso tem consequências.

Que consequências?
Estamos a receitar psicofármacos quando o cérebro está ainda em desenvolvimento e hoje sabemos, pelos estudos da moderna neurociência, que para além dos 20 anos ainda há muitas áreas cerebrais que continuam a desenvolver-se, nomeadamente as que têm que ver com a ligação das emoções com os impulsos. E, portanto, sim, há consequências.

Mas há outras, indiretas, que também são importantes: eventualmente desde cedo, com algumas crianças e pais, [o excesso de medicação] não ajuda a que cada um vá descobrindo outras maneiras de se autorregular e tomar mais consciência de si e dos fatores que estão à sua volta e que claramente podem mudar.

Estamos a deixar tudo para a medicação?
Aposta-se na medicação como se fosse algo milagroso, mas não perguntamos aos pais quanto tempo a criança passa na escola, quanto tempo está em família, se as regras e os limites estão bem estabelecidos, e por aí fora. Pode ser incomodativo fazer estas perguntas e encontrar as respostas, mas com elas levamos as pessoas a refletir sobre alguns padrões negativos, que se conseguirmos mudar talvez isso tenha impacto no comportamento das crianças e dos adolescentes.

Num artigo que publicámos no site da Notícias Magazine sobre o programa Supernanny, que tanta polémica causou e foi entretanto suspenso, a coach parental Cristina Valente dizia que mais do que educar as crianças é preciso educar os pais. Concorda?
Sim, isso é muito importante nesta questão da hiperatividade. Por um lado, a necessidade da contenção emocional dos pais junto das crianças, por outro a questão das regras e dos limites. E depois a pressão, ou não, sobre o desempenho escolar e a regulação, ou não, dos tempos livres.

A primeira é muito importante, porque a contenção emocional implica tempo para estar, ouvir e compreender os mais novos, e hoje sabemos que é difícil conseguir isso.

Quanto às regras e aos limites, é muito incómodo dizer, mas a falta destes é que é hoje uma epidemia. Há muitas crianças que funcionam numa estrutura impulsiva, agem no imediato em função do que querem ou não querem.

Por outro lado, a escola é onde os miúdos passam mais tempo – muito tempo – sem descanso pelo meio. Uma escola em relação à qual os pais têm uma enorme expetativa quanto ao desempenho e também das alternativas em termos de tempos livres. Estamos a falar da escola, da família, da sociedade, é muita coisa que tem de mudar.

E, no entanto, não muda.
Sim, e isso é de alguma forma surpreendente. Estamos a falar de coisas que já sabemos há muito tempo, mas que depois não estamos a saber mudar. Porque continuamos a construir bairros que não têm um espaço que dê para as crianças virem cá para baixo brincar, jogar à bola, correr, conviver uns com os outros? Por que não favorecemos mais o desporto na escola ou outras atividades mais criativas como as artes em geral e também as humanidades?

Porque insiste a escola em blocos de aulas de noventa minutos em que a criança ou o adolescente deve estar quieto e calado a ouvir um adulto debitar matéria? Não admira que aumentem as queixas dos professores relativamente ao comportamento dos alunos. Nem um adulto aguentaria noventa minutos quieto e calado.
Isso é mesmo uma questão que temos de repensar. Os miúdos fazem testes de uma hora e meia no 5º ano. Não sei se os pais e os professores se lembram, mas nós tínhamos aulas de cinquenta minutos e intervalos de dez, depois de vinte e o ritmo era sempre este.

Um miúdo de 10 anos fazer um teste de uma hora e meia? Ao fim de meia hora a capacidade de atenção, memorização e até de desempenho começa a diminuir. Atenção, memorização e sobretudo reprodução de informação: o nosso sistema de ensino não pede muito mais. É triste, mas é verdade. Estejam quietos, decorem, fixem, reproduzam e não pensem muito, não se mexam mesmo nada, que em princípio tudo correrá bem se assim for. Felizmente assim não é.

Eu acho que algumas queixas de hiperatividade na escola são sinais de boa vitalidade de muitos miúdos. Quer dizer que ainda existem enquanto criança ou adolescente, respondem, reagem, não estão passivos, quietos, semimortos ou esvaziados de conteúdo perante o peso da expetativa escolar.

Outra coisa que talvez fosse importante repensar são os horários de trabalho. Refere no seu livro um estudo que diz que os pais passam em média quarenta minutos por dia com os filhos. Que consequências tem isto?
Já não é um estudo recente, mas não deve estar desatualizado e abordava o pouco tempo que os pais em Portugal e noutros países têm de relação exclusiva com os filhos. Talvez até tenha diminuído com a questão das novas tecnologias.

As novas tecnologias têm coisas ótimas, mas dispersam muito a atenção – uma mãe que está a mudar uma fralda e está a atender o telefone, um pai que está a brincar com o filho e a responder a e-mails. Na minha consulta já tenho pais que a interrompem para atender o telefone porque têm de responder muito urgentemente ao trabalho.

As pessoas reagiram com alguma ironia quando um partido – não me lembro qual – propôs o direito de os trabalhadores desligarem do trabalho quando estão em casa, mas esse direito é fundamental.

Há uma revolução por fazer a vários níveis: família, escola, trabalho?
Sim, é todo um paradigma que tem de mudar. Diz-se sempre, e é verdade, que os países nórdicos têm ótimas taxas de resposta escolar. Ora, na Europa, são os países onde as crianças passam menos tempo na escola. Claro que há incentivos à parentalidade, que os horários de trabalho são adaptados a isso… É uma questão de procurar uma melhor regulação – que também passa por uma atitude consciente da cada um de nós – entre tempo de trabalho, de escola e de descanso e lazer.

É um balanço que estamos a fazer mal, com muito pouco equilíbrio, e isso tem consequências nas crianças. Não é por acaso que em Portugal – nos adultos e nos pequeninos – somos um dos maiores consumidores de psicofármacos, nomeadamente de antidepressivos e ansiolíticos.

Em relação à questão da disciplina e da capacidade (e importância) de dizer «não» e estabelecer limites e regras, quando e porquê os pais perdem a capacidade de fazer isso?
Acho que se perde muitas vezes logo na primeira infância dos filhos, e por duas ou três questões. Por um lado, voltamos à questão do tempo: há menos tempo para os casais estarem juntos e estarem com os filhos.

Depois porque, de uma maneira geral, temos muito menos crianças por família e cada criança absorve uma expetativa de atenção muito grande dos pais. Estamos quase sempre a falar de filhos únicos, que obviamente, existindo toda a atenção e disponibilidade para eles, tornam-se o centro.

Por último, também acho que se torna mais difícil estabelecer regras e limites porque melhorámos muitíssimo em termos económicos e sociais e já não é preciso dizer tantas vezes «não», por exemplo, à compra de uma bola de futebol ou de outra coisa que a criança peça.

E depois também porque os miúdos se tornaram muito mais exigentes, porque têm sobre eles muito mais estímulos para dispersar a atenção, dos telemóveis aos tabletse às PlayStations, que antes os pais não tinham de gerir tanto.

E a questão da culpa? Não andamos todos demasiado e desnecessariamente imersos em culpas que não temos e não trazem nada de positivo ou produtivo?
Winnicott, um pedopsiquiatra que morreu nos anos 1970, falava de good enough parents, pais suficientemente bons, pressupondo que o normal é termos falhas. Não podemos ter a ideia de que vamos fazer tudo bem, vamos responder a tudo, vamos estar sempre disponíveis, porque senão andamos sempre movidos a culpa e vamos fazer as reparações possíveis em relação a várias circunstâncias e acabamos por ceder nas regras, nos limites e etc.

Quando as crianças são mais agitadas, mais indisciplinadas ou mais ativas há sempre alguém que vem com o diagnóstico de hiperatividade. Não será papel dos médicos servir de filtro e ajudar a distinguir o que é patologia do que é falta de regras ou disciplina? Para não cairmos depois no extremo oposto, e indesejável, que é pensar que não há miúdos hiperativos, há é miúdos malcriados.
Completamente de acordo. Os rótulos servem só para nos organizarmos em termos do nosso pensamento. Acima de tudo temos de tentar perceber cada criança e sobretudo evitar a consequência mais fácil do rótulo que é abandonar o investimento naquela criança. Esse é um erro muito grande.

Tal como é um erro pensar que todo o desenvolvimento da infância e da adolescência se faz sem a presença de dificuldades. Quando miúdos dão as suas chatices, isso é que é normal.

Há cada vez mais a expetativa de que o desenvolvimento dos miúdos seja algo completamente liso ou plano. E não é. Ainda bem que há miúdos que se mexem, porque é uma forma de expressar várias coisas. Penso que devemos fugir ao rótulo no sentido de catalogar e fugir ao catalogar, não abdicando do nosso envolvimento pessoal na situação, que acontece muitíssimo.

Eu tenho professores que me questionam por que motivo ainda não dei medicação àquela criança, e eu respondo: mas porque é que ainda não a sentou mais perto de si ou porque é que ainda não valorizou o que ela pode ter feito de bem quando termina uma tarefa, etc.? Quando pomos as coisas fora de nós acaba por ser mais fácil…

Os pais delegam na escola, a escola culpa os pais, os pais e a escola mandam para o psicólogo ou para o pedopsiquiatra para ele tratar… Parece que andamos sempre a empurrar responsabilidades de uns para os outros. Não seria importante cada um assumir o seu papel e trabalhar em conjunto? E haver uma diferença mais clara na cabeça das pessoas entre o que é doença e o que é rótulo?
Sim. Exemplo concreto: tristes por vezes todos estamos, o que não significa que estejamos com uma depressão. Há dias em que podemos estar mais ativos ou mais mexidos sem que isso faça de nós um hiperativo.

O que acontece com uma criança é não apenas função de um património genético ou biológico que herdou, mas é sobretudo expressão de uma modulação de imensos fatores que passam pela própria criança, pelos pais, pela família alargada, pela escola, pela sociedade e pela cultura vigente.

Se tivermos esta ideia mais lata, estaremos muito mais aptos a olhar as crianças como um todo e não a fragmentá-las em rótulos ou patologias. Este balanço é que é muito importante.

Mas quais são então os sintomas ou sinais de que estamos perante uma perturbação de hiperatividade e défice de atenção que justifique intervenção clínica e medicamentosa?
Julgo que a intervenção clínica se justifica sempre que as queixas são significativas e sentidas quer pelos pais quer pela escola, acabando por ter impacto significativo sobre o dia-a-dia da criança e sua família. Quanto à medicação, deve ser sempre a resposta última ou complementar a outras respostas que são possíveis.

domingo, 28 de janeiro de 2018

Já há guiões sobre questões de género nas aulas de todos os ciclos

“Muitas vezes falo-lhes, por exemplo, em termos de poesia do facto de haver mais homens nos manuais, mesmo quando temos imensas poetisas com muita qualidade. Por que é que os manuais estão cheios de homens? Eu discuto isso com os alunos e noto que às vezes as miúdas se viram para os colegas e dizem ‘Estás a ver? Eu bem tinha razão!’”.

Trazer uma perspetiva de género para a sala de aula é um desafio para muitos educadores, mas para Sara Barbosa, professora do ensino secundário no Agrupamento de Escolas Monte da Lua, em Sintra, é um trabalho que compensa. “Eles normalmente gostam de debater os assuntos, sobretudo as raparigas. Elas sentem-se muito validadas.”

O trabalho de professores preocupados em olhar para a educação com “lentes de género” tem sido facilitado nos últimos anos com os Guiões de Educação, publicados pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) desde 2010. Estas obras, que têm como eixo “a construção de um conhecimento sobre a humanidade igualmente integrador de homens e de mulheres”, foram desenvolvidas para servir de apoio a professores de vários ciclos de ensino. Mais de 1000 docentes de todos os distritos do país tiveram acesso a acções de formação acreditadas entre 2013 e 2016, de acordo com dados enviados pela CIG, e os exemplares estão disponíveis em muitas bibliotecas escolares e até municipais, ou em formato digital no site da comissão.

O guião para o ensino secundário foi o último a ser publicado, no passado mês de dezembro, encomendado à Associação Portuguesa de Estudos sobre as Mulheres (APEM). Nesta publicação, a CIG privilegiou a vertente científica, centrando-se nas disciplinas “que configuram a estrutura do ensino secundário” ao invés de se focar mais em temáticas transversais, como acontecia para os guiões dirigidos aos outros ciclos de ensino. Para tal, a CIG voltou a convidar especialistas em Estudos sobre as Mulheres de várias áreas para trazer uma perspectiva de género para algumas áreas “fundamentais” do secundário, garantindo que “a educação para a cidadania também se faça no contexto específico de cada disciplina”. “Não é possível falar de estereótipos sexistas e procurar combatê-los se o conhecimento ensinado nas diferentes áreas do saber permanecer humanamente incompleto e estereotipado”, refere a CIG (...).

Espírito crítico

E como é que se pode abordar o programa das disciplinas do secundário com uma perspetiva de género? O guião está dividido por nove capítulos que abrangem as áreas de Português, Inglês, Filosofia, Educação Física, História, Biologia, Economia e História da Cultura e das Artes.

É sugerido aos professores sublinharem o trabalho de mulheres que contribuíram para cada uma das áreas, analisando textos nas aulas. Na Ciência, por exemplo, o trabalho pode passar por contrariar o estereótipo de que “ser cientista é fazer parte de uma profissão masculina” ou até pensar no impacto social de técnicas como o acesso à reprodução assistida. Já na História da Arte, os docentes podem desconstruir o falso argumento da qualidade, “um dos principais e, muitas vezes, mais perversos argumentos para justificar a desproporção persistente entre mulheres e homens no mundo das artes e da literatura”. Os professores de Economia, por sua vez, são convidados a colocar aos alunos questões como: “Será que a desigual participação dos homens e das mulheres no mercado de trabalho produz desigualdades no acesso a bem-estar e a direitos?”

O guião encerra com um capítulo dedicado a “temas do mundo atual”, como o assédio sexual ou as mulheres na religião. As secções sobre conciliação trabalho-família e empreendedorismo feminino são da autoria da actual secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, que contribuiu enquanto investigadora ainda em 2015.

A investigadora Cristina C. Vieira, coordenadora deste guião para o ensino secundário, partilha a experiência enquanto formadora das oficinas dinamizadas com professores, afirmando que os docentes têm “mostrado grande interesse e abertura para aplicar as actividades propostas”. Mesmo havendo vontade, trazer esta perspectiva de género para as aulas “não é sempre óbvio”, reconhece a professora Sara Barbosa, para quem estas questões deveriam ser integradas no currículo. “Isto não deve ser um trabalho pontual, deve ser um trabalho sempre presente.”

Mas todos os contributos, pontuais ou continuados, são valiosos para alimentar nos alunos o espírito crítico em relação às desigualdades de género que permeiam a sociedade, desde o conhecimento científico até às relações pessoais. “Quando saem das aulas e vão a conversar uns com os outros acho que aí ganhámos, porque é mesmo isso que é necessário no ensino secundário — que eles falem sobre as coisas e pensem sobre as coisas.”

Fonte: Público

sábado, 27 de janeiro de 2018

Vendas de fármacos para hiperactividade baixam. É um bom sinal?

Pelo segundo ano consecutivo, as vendas de embalagens de medicamentos para a hiperatividade e défice de atenção diminuíram em Portugal (em 2017 e em 2016), invertendo a tendência de crescimento muito rápido dos anos anteriores que deixou alarmados vários especialistas e até chamou a atenção dos políticos.

Os dados mais recentes disponibilizados (...) pela Autoridade Nacional do Medicamento - Infarmed indicam que, das duas substâncias atualmente no mercado para tratar a PHDA, venderam-se perto de 254 mil embalagens, entre janeiro e novembro do ano passado. No mesmo período de 2016, foram comercializadas perto de 259 mil. Um decréscimo ligeiro, portanto, mas que vem no mesmo sentido do que já tinha acontecido em 2016.

Indicados para tratar a chamada perturbação de hiperatividade com défice de atenção (PHDA), os fármacos como a Ritalina, nome comercial mais conhecido do psicoestimulante metilfenidato, continuam a dividir opiniões. Há quem defenda que são prescritos em excesso e que a PHDA se transformou numa espécie de epidemia, mas há quem contraponha que estas teses não passam de mitos e até comportam riscos, como o de inibir alguns pais de pedirem ajuda para crianças e jovens com este tipo de perturbação.

Este debate saltou para a ordem do dia quando foi divulgado em 2015 o primeiro (e até agora único) estudo do Infarmed sobre a utilização de fármacos para a PHDA – e que indicava que, desde 2003 e até 2014, o crescimento fora quase exponencial. Nesse ano, Álvaro Carvalho, psiquiatra à frente do Programa Nacional para a Saúde Mental da Direção-Geral da Saúde, alertou que havia um recurso excessivo a este tipo de fármacos e que era necessário estudar a situação. Foi com base nos dados então divulgados – e que apontavam para a prescrição de cerca de 5 milhões de doses por ano – que tanto o Bloco de Esquerda como o PAN apresentaram projetos de resolução no Parlamento no ano passado.

"Um novo paradigma de diagnóstico"

A polémica reacende-se agora com um ensaio sobre este tema que vai ser lançado na próxima semana. No livro intitulado Hiperacividade e Défice de Atenção: Da presença e Ausência de Si, editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, o pedopsiquiatra Pedro Strecht propõe uma visão mais abrangente e defende que é necessário “um novo paradigma de diagnóstico e intervenção” no que à PHDA diz respeito.


Recordando que ao longo dos últimos anos tem aumentado exponencialmente o número de crianças diagnosticadas como tendo o quadro de hiperatividade com défice de atenção, "bem como aquelas que precocemente iniciam medicação regular com psicoestimulantes", Pedro Strecht pergunta: “Será que todos estes rapazes e raparigas são verdadeiros hiperativos?” .

Olhar para esta perturbação “é uma tarefa muito mais desafiadora do que simplesmente rotular e medicar”, sustenta num artigo publicado na edição online da Visão, lembrando que só no ano passado foram vendidas “mais de cinco milhões de embalagens” deste grupo de psicofármacos destinados a menores de 15 anos de idade. 

Para o neuropediatra Nuno Lobo Antunes, que lançou em 2014 um livro sobre esta problemática (Mais Forte Que Eu - Hiperatividade e Défice de Atenção), Pedro Strecht está a ser “pouco honesto” quando se refere aos números, ainda por cima errados, de vendas destes fármacos, dando a entender que apenas são utilizados por crianças e adolescentes em Portugal. 

Ao contrário do que muita gente pensa, nota, "estes medicamentos também são consumidos por adultos”. E diz que a ideia que Pedro Strecht espalha de que “médicos e pais são capazes por dá cá esta palha de medicar as crianças” é “insultuosa para as famílias que vivem num sofrimento significativo”.

“Os pais só vão ao médico depois de terem tentado tudo e mais alguma coisa”, afirma, garantindo que “ninguém confunde a exuberância natural da infância e da juventude com a hiperatividade e défice de atenção”. Para Nuno Lobo Antunes, esta discussão tem mesmo contribuído para eclipsar outro debate que era “bem mais importante fazer”: o da prescrição de medicamentos neurolépticos, antipsicóticos como a Risperidona, que diz já ter visto serem dados “a crianças de dois e três anos”. “Esse é que é um problema muito sério”, afirma.

Um problema biológico

O que os dados do Infarmed indicam é que o crescimento da utilização de fármacos para a PHDA foi, de facto, quase exponencial ao longo de mais de uma década. No estudo de 2015, o Infarmed observava que o consumo de metilfenidato tinha disparado desde que esta substância (que no mercado português é vendida com os nomes Ritalina, Rubifen e Concerta) começou a ser comparticipada pelo Estado em 2003.

Um crescimento que, frisa-se naquele trabalho, também se observou noutros países e pode ficar a dever-se "a uma multiplicidade de fatores, incluindo o maior conhecimento da doença". Mas também se lembra que o tratamento farmacológico para a PHDA “continua a ser um tema controverso devido a uma eventual excessiva medicação de crianças e adolescentes e ao potencial abuso de medicamentos estimulantes”.

A PHDA é uma condição caracterizada por “sintomas persistentes de hiperatividade, impulsividade e falta de atenção” e a prevalência é estimada entre 5 a 7% da população em idade escolar, sintetiza a autoridade do medicamento. Feito sob supervisão de um especialista em perturbações do comportamento na infância, o tratamento com estes fármacos não está indicado como de primeira linha para todas as crianças e adolescentes, mas apenas para aquelas que apresentem sintomas severos ou moderados, recorda.

Além do metilfenidato, em 2014 passou a ser comparticipada em Portugal também a atomoxetina (Strattera de nome comercial), que é usada quando o psicoestimulante não resulta ou tem contraindicações. 

Evidentemente, admite Nuno Lobo Antunes, “haverá crianças medicadas que não deviam estar medicadas, mas também haverá muitas que deveriam ser medicadas e não são”. Criticando aquilo que designa como "informação de Facebook", o neuropediatra nota que os fatores genéticos são claramente preponderantes neste tipo de perturbação que prejudica não só o desempenho escolar, mas também familiar e tem repercussões sérias - estas pessoas têm por exemplo mais acidentes de viação ou gravidezes indesejadas. “Este é um problema biológico, não da sociedade”, enfatiza.

Já Pedro Strecht defende que o que se deve fazer nestes casos é “uma leitura emocional de cada criança e adolescente no seu contexto dinâmico”, olhando-a não só através do “potencial genético” que herdou, mas também em função das “múltiplas interferências ambientais”, como ritmos de vida, circunstâncias familiares específicas, adequação escolar”. E dá exemplos: ter e dar mais tempo de tranquilidade e relação afetiva com os mais novos "parece ser uma boa resposta", tal como "delimitar regras diárias simples", ajudar a manter ritmos adequados de sono e vigília e conseguir um melhor balanço escola e lazer.

É preciso fazer um estudo

“Não sei se haveria necessidade dessa embalagens todas”, comenta a pediatra e presidente do Infarmed, Maria do Céu Machado, que não deixa de notar, porém, que “as especialidades pediátricas são habitualmente muito criteriosas na prescrição de psicofármacos” e que este tipo de medicamentos têm indicação para serem usados apenas em fases transitórias. 

O que será necessário perceber, observa, é se o número de casos está ou não a aumentar, um estudo que está por fazer em Portugal. Mas reconhece que falta também saber até que ponto a vida moderna, com pouca atividade ao ar livre e muita tecnologia, não conduz a um dispêndio menor de energia e se isso poderá ter um impacto no aumento de diagnósticos.

Contestando aquilo que classifica como "mitos", José Boavida Fernandes, neuropediatra que é presidente da Sociedade Portuguesa de Défice de Atenção, fez contas e concluiu que haverá cerca de 25 mil utilizadores destes fármacos na população em idade escolar. Ou seja, cerca de 1,7% do total, bem menos do que a prevalência estimada da PHDA em estudos epidemiológicos internacionais. Esta onda de críticas, lamenta, é "o somatório de várias ideias postas a circular, algumas equívocas e que têm na base informações erradas".

Aumento natural?

O médico, que desde 1989 trata crianças e jovens com metilfenidato - na altura importado pelos hospitais por não estar à venda em Portugal -, considera natural o aumento exponencial nos primeiros anos: “Foi o crescimento num país que não tinha nada [para a HPDA] e que passou a ter”. Esta medicação, compara, funciona como "um par de óculos" para quem vê mal ao perto. "Os óculos não curam mas corrigem" e o fármaco "corrige um problema químico do cérebro, como provam os estudos de imagiologia funcional".

De resto, admite, a preocupação com os eventuais efeitos a longo prazo da utilização de medicamentos em crianças com o cérebro em formação faz todo o sentido e está a ser objecto de investigação através de um projecto financiado pela Comissão Europeia. Os resultados preliminares recentemente divulgados demonstram que "não há efeitos sobre o sistema nervoso central". Pelo contrário, "há um efeito protetor", diz. A investigação continua.

Fonte: Público por indicação de Livresco

sexta-feira, 26 de janeiro de 2018

Educação familiar, comportamento e escola

Um dos efeitos que me pareceu mais inquietante produzido na sequência do programa da SIC Supernanny, lamentável a vários níveis registe-se, foi o desencadear de discursos sobre a excessiva permissividade na educação familiar, quase sempre acompanhados por referências à falta de uma “pedagogia do chinelo” (com diferentes designações) como fonte de todos os problemas e dificuldades sentidas na educação familiar e com repercussões noutros contextos da vida de crianças e adolescentes, designadamente, na escola.

Se por um lado a referência a algum excesso de permissividade em alguns contextos familiares me parece ajustada, a defesa de um estilo educativo contido na “pedagogia do chinelo”, apesar de colher alguma simpatia, veja-se boa parte dos conteúdos das caixas de comentários da imprensa, levanta sérias dúvidas e é gerador de inúmeros equívocos. Estes estendem-se à comunidade escolar com atribuição quase exclusiva das causas de indisciplina escolar a falhas no exercício da parentalidade. Sabemos que existe evidentemente uma relação significativa entre educação familiar e comportamento escolar, mas importa não esquecer que o comportamento na escola é também influenciado por outras variáveis além da família como o número de alunos por turma e as características da mesma, dimensão da escola, currículos, clima e liderança da escola, apoios e suporte ao trabalho de professores, formação, segurança e experiência do professor, etc.

Neste contexto e pensando sobretudo na educação familiar, um pequeno contributo para a reflexão que me parece desejável, diria imprescindível.

Começo por referir um estudo da Universidade de Pittsburgh publicado na Child Development, em 2017, que com clareza mostrava uma relação entre o que é designado por “parentalidade severa”, o baixo rendimento escolar e problemas de comportamento dos filhos. O estudo considerou diferentes variáveis e envolveu 1482 alunos, que foram acompanhados durante nove anos.

Por “parentalidade severa” entendeu-se o recorrer com regularidade ao gritar, bater ou outro tipo de comportamento coercivo, além de ameaças físicas e verbais como forma de punição.

O desenho do estudo é interessante, mas os seus resultados globais não são inesperados.

Alguma investigação sobre o que se designa por “estilos parentais”, o padrão de acção educativa dos pais, demonstra resultados no mesmo sentido, um estilo excessivamente autoritário parece estar associado a comportamentos desajustados dos filhos, mas é importante sublinhar que também demonstra que pais muito permissivos, mesmo quando procuram estabelecer laços afectivos fortes, podem ter nos comportamentos dos filhos um efeito da mesma natureza que a acção de pais muito autoritários ou, para usar a expressão do estudo, que exercem uma "parentalidade severa”. Dito de outra forma, a permissividade excessiva é tão problemática como o autoritarismo, não confundir com autoridade.

Neste cenário, o que se procura criar na acção junto dos pais é um exercício de parentalidade com afecto, evidentemente, mas com regras e limites que são um bem de primeira necessidade para o desenvolvimento saudável de crianças e adolescentes. Esta forma de funcionar é referida também por “estilo autoritativo”

A questão do meu ponto de vista que se pode colocar é: por que razões se verificam em tantas famílias fragilidades na mobilização desta parentalidade “autoritativa” em que se combina de forma adequada o afecto e a definição de regras e limites que conferem segurança e autonomia às crianças e adolescentes?

É ainda importante referir que esta fragilidade não afecta só famílias “problemáticas”, “disfuncionais” ou outra qualquer “condição” de risco. Muitas famílias com pais interessados, motivados, sentem dificuldade neste exercício. A experiência mostra-me que algumas das razões podem estar associadas aos estilos de vida e ao tempo disponível para os miúdos, a alteração de valores em que estamos envolvidos e todo o universo de estímulos e experiências em que as crianças e adultos estão envolvidos.

Não é, pois, estranho que algumas crianças, logo desde novas, cheguem à escola “desreguladas”, com baixa percepção de regras e limites e de formas adequadas de relação social.

Aqui começa a discutir-se o papel da escola e dos professores e, por vezes, um processo inconsequente de atribuição de culpa. Ninguém é “culpado” e todos somos responsáveis. Pais saudáveis, por que os há “doentes”, não gostam de ter filhos “maus”. Muitas vezes, estão perdidos e não sabem como fazer, por insegurança ou menor competência. Os pais negligentes e que “abandonam” e maltratam os filhos devem ser objecto de sinalização e abordagem atempada por partes das Comissões de Protecção que também sentem dificuldades para o cumprimento do seu conjunto de competências.

Os professores, por outro lado, não podem gastar mais tempo a “tomar conta dos alunos” e a gerir episódios de comportamento do que a “ensinar”. Acontece ainda que as crianças e adolescentes estão um tempo enorme na escola e, portanto, é na escola que também emergem as fragilidades da acção educativa parental.

Neste cenário, torna-se necessário que as comunidades encontrem formas de apoio ao exercício positivo e adequado à parentalidade, com dispositivos e recursos suficientes e competentes de mediação com as famílias que podem estar sediados nas escolas.

São ainda necessárias respostas aos problemas criados por famílias tóxicas, negligentes ou maltratantes que fazem mal às crianças. Só que nestes casos, a escola, fazendo naturalmente parte da solução, não é, só por si, a solução.

No que respeita ao espaço sala de aula e nos casos de indisciplina, o recurso a programas de natureza tutorial com tempo, formação e recursos adequados ou a presença de dois docentes na sala de aula podem ser bons contributos para criar melhores climas de funcionamento.

É verdade que tudo isto tem custos de tempo, humanos e económicos.

No entanto, os custos do desenvolvimento de crianças e jovens com comportamentos pouco saudáveis, com riscos de abandono e insucesso e, finalmente, exclusão, serão certamente mais elevados.

Como em quase tudo, é uma questão de opção.

José Morgado

Professor e investigador do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA)

Fonte: Público

quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Hiperatividade e défice de atenção: um novo paradigma

Ao longo dos últimos anos tem aumentado exponencialmente o número de crianças diagnosticadas como tendo um quadro de Hiperatividade com Défice de Atenção (HADA), bem como aquelas que precocemente iniciam medicação regular com psicoestimulantes.

Em Portugal, só no ano passado foram vendidas mais de cinco milhões de embalagens desse grupo de psicofármacos destinados a menores de 15 anos de idade, quando a população total de crianças e adolescentes até esse limite etário está longe de chegar aos dois milhões.

De repente, parece lógico perguntar se todos estes rapazes e raparigas são verdadeiros hiperativos ou se apresentam realmente dificuldades de concentração, num quadro descrito como secundário a um problema de segregação de neurotransmissores (substâncias que permitem o contacto entre células cerebrais) que de forma exclusiva parece centrar-se na resposta medicamentosa.

Em “Hiperatividade e Défice de Atenção: Da Presença e Ausência de Si”, livro a ser editado neste mês pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, tentamos dar uma visão mais abrangente do problema, incluindo na questão diagnóstica, que claramente parece ter origens diversas consoante se olha para cada caso específico, e ainda da resposta terapêutica que deve compreender uma gama de alternativas mais vasta do que a simples medicação. De facto, a HADA pode ter origem em múltiplos fatores ou situações, alertando-se desde logo para a necessidade de se fazer uma leitura emocional de cada criança e adolescente no seu contexto dinâmico, ou seja, olhando-os através de um potencial genético que herdaram, mas também em função das múltiplas interferências ambientais, como ritmos de vida, circunstâncias familiares específicas, adequação escolar, entre outras possibilidades, e fazê-lo ainda olhando cada um na sua evolução temporal, juntando passado, presente e futuro. Todas as situações têm uma origem, desenvolvimento e consequências.

Vejamos assim alguns exemplos comuns:

– Ritmo de vida diário. Vivemos em sociedades em que cada vez mais o que é dado e simultaneamente esperado de uma criança é processado a uma velocidade imensa, com um padrão de estimulação e uma expectativa de resposta multitasking. Ter e dar mais tempo de tranquilidade e relação afetiva com os mais novos parece ser uma boa resposta.

– Introdução de Regras e Limites. Há cada vez mais crianças que “não param” porque, simplesmente, não respeitam a presença de barreiras limitadoras, incluindo o que poderemos designar por uma autoridade protetora. Mesmo quando tal acontece, a dificuldade em suportar a frustração é pobre, e a resposta impulsiva predomina. Delimitar regras diárias simples, ajudar a manter ritmos adequados de sono e vigília, aceitar como normais alguns momentos de frustração, é ajudar precocemente os mais novos nesta tarefa de desenvolvimento.

– Melhor balanço Escola (trabalho)/Lazer. Ao contrário do que muitos pais podem pensar, as crianças e os adolescentes de hoje passam em ambiente escolar uma quantidade de tempo incomparavelmente maior do que a nossa geração alguma vez o passou, estando sujeitas a critérios e expectativas de exigência desadequadas para algumas faixas etárias. Os tempos de recreio e espaços verdadeiramente “livres” diminuíram e são considerados vulgarmente “desnecessários”, o que é um erro dramático para toda uma geração.

– Adequação de Estímulos Ambientais. Incluindo os que estão presentes no jogo e nas atividades lúdicas em geral, hoje em dia dominados quase em exclusivo por videojogos aditivos, agressivos e proporcionadores de excitação psicomotora. Promover alternativas saudáveis, incluindo desportos de grupo e o contacto regular com a natureza, seriam ótimas ideias.

– Por último, no campo da psicopatologia é ainda importante recordar que muitas queixas (talvez a maioria) de situações de HADA são claramente reativas ou secundárias a fatores externos. Contudo, há também quadros clínicos que, podendo dar exatamente estes mesmos sinais, devem ser corretamente valorizados sendo alvo de uma intervenção precoce, sobretudo nos casos de alguma patologia depressiva da infância ou perturbações--limite ou border-line já na adolescência.

Olhar para a HADA é uma tarefa muito mais desafiadora do que simplesmente rotular e medicar. Será por isso que parece tão difícil aceitar-se a necessidade de um novo paradigma de diagnóstico e intervenção?

PEDRO STRECHT

Fonte: Visão

Psicólogos querem plataforma que registe intervenção praticada nas escolas

A Ordem dos Psicólogos defendeu esta quarta-feira no parlamento a criação de uma plataforma de registos dos atos praticados nas escolas por estes profissionais, à semelhança do que já existe na área da Saúde.

De acordo com a informação transmitida aos deputados da Comissão de Educação e Ciência, a medida sobre a intervenção dos psicólogos em contexto educativo assemelhar-se-ia a um modelo existente na área da Saúde (SClínico) e melhoraria a eficácia do trabalho destes profissionais.

Durante uma audição na comissão parlamentar, o bastonário da Ordem dos Psicólogos, Francisco Miranda Rodrigues, reclamou igualmente a criação de um regime de habilitação próprio para a docência da disciplina de Psicologia por psicólogos.

Para a Ordem é "inaceitável" que a disciplina continue "a não poder ser leccionada por psicólogos". A estrutura considera que estes são os profissionais com "o conhecimento científico para o fazer".

Os psicólogos pretendem também ser integrados no apoio aos professores tutores, no âmbito das medidas de combate ao insucesso escolar adoptadas pelo Ministério da Educação.

Insistem igualmente numa alteração ao sistema de contratação anual, por forma a serem contemplados pela abertura de lugares nos quadros.

"A necessidade de psicólogos em contexto educativo é reforçada pela prevalência das perturbações mentais, dos problemas de comportamento e sociais, que afectam um em cada cinco crianças e jovens", sustenta a Ordem num documento em que define prioridades.

No mesmo texto alega que, de acordo com "as evidências científicas", os ganhos económicos com a intervenção psicológica podem ser "até 17 vezes superiores aos valores investidos".

Fonte: Público por indicação de Livresco

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

Inclusão na Europa: a tartaruga e a lebre

Foi publicada a 17 de janeiro uma proposta de recomendação ao Conselho da Comunidade Europeia sobre a “promoção de valores comuns, educação inclusiva e na dimensão europeia de ensino” (COM-2018 – 23). Quando lemos um documento com o teor deste sentimo-nos mais europeus, seja lá o que isso quer dizer... Sentimo-nos europeus por ver escrito num documento orientador um conjunto de princípios que se inspiram numa visão lidimamente humanista, apelando para a qualidade da educação e para uma qualidade que abranja todos e não só alguns. Este documento opõe-se claramente à falácia liberal sobre educação. Os liberais alcandoram a liberdade e a responsabilidade ao lugar mais alto dos princípios educacionais. E sem dúvida que a educação sem um horizonte de liberdade e sem encorajar a responsabilidade é uma empresa falhada e puramente doutrinadora. No entanto, ao colocar a liberdade como valor supremo, a ideologia liberal esquece que a liberdade pode ser uma armadilha dado que, se não forem proporcionados os instrumentos para dela usufruir, ela se torna irrelevante e mesmo um argumento contra aqueles que a deviam ter mas que a não sabem aproveitar e usar. Ora este documento, ao realçar a importância do ensino de qualidade para todos, chama-nos a atenção para a indispensabilidade de proporcionar a todos, como condição prévia e à partida, condições para poderem usufruir de uma educação de qualidade, de liberdade e de efetiva responsabilidade.

Em relação à Educação Inclusiva, isto é, ao modelo que para além de pugnar pela educação de qualidade para todos os alunos, proclama que esta educação de qualidade tem vantagens em ser desenvolvida em ambientes naturalmente heterogéneos e diversos, este documento traça três recomendações que brevemente iremos comentar.

A primeira afirma que “todos os alunos devem ser incluídos em sistemas educativos de qualidade desde as primeiras idades”. Realçaríamos dois pontos nesta recomendação. Antes o facto de mais falar em “todos”. “Todos” significa que não é admissível que alguém se conforme com o abandono escolar. Se um sistema educativo se conforma com o facto de um aluno querer ou ter que abandonar a escola — mesmo que momentaneamente não veja a pertinência de lá estar — infringe esta recomendação que espera que todos cheguem ao fim da sua escolaridade. O outro aspeto diz respeito a “sistemas educativos de qualidade”. Sempre nos lembramos que, por vezes, são os alunos que têm mais necessidade de educação e aqueles que sem ela não podem progredir que, paradoxalmente, frequentam os sistemas educativos com menor qualidade.

A segunda recomendação é “proporcionar o apoio necessário aos alunos de acordo com as suas necessidades, incluindo aos que são oriundos de meios socioeconómicos desfavorecidos, os alunos migrantes, os alunos com necessidades educativas especiais e os alunos sobredotados”. Tal como a primeira recomendação, esta realça que a Educação deve ter uma preocupação particular com os valores da equidade, isto é, que ninguém seja excluído de uma educação de boa qualidade por características pessoais como ter necessidades específicas de educação devido a sobredotação ou a uma condição de deficiência ou por fatores sociais tais como o meio socioeconómico ou o estatuto de migrante. Proporcionar este apoio necessário é antes de mais uma medida de justiça social, dado que os alunos com estas características não podem ser punidos por terem características que não pediram e pelas quais não são, certamente, responsáveis.

Por fim recomenda-se a “necessidade de facilitar a transição entre os diferentes níveis de escolarização permitindo o acesso a uma orientação vocacional e educacional adequada”. Esta recomendação faz todo o sentido em particular em Portugal, onde os diferentes ciclos da escolaridade obrigatória têm formas de organização e de objetivos tão diferentes. Lembraríamos a este título a transição tão abrupta do 1.º para o 2.º ciclo e do 3.º ciclo para o que seria agora considerado o 4.º ciclo (anteriormente “o secundário”).

Estas propostas de recomendação têm uma pertinência particular em muitos países da União Europeia que têm sido muito lentos e preconceituosos no desenvolvimento de políticas de Educação Inclusiva. Em muitos países da nossa Comunidade Europeia, a educação de crianças e jovens com dificuldades em instituições “especiais” é ainda a norma. Por isso é tão importante que estas recomendações sejam adotadas. Mas têm também um impacto em Portugal. Apesar de Portugal ter avançado mais rapidamente no desenvolvimento de modelos educativos inclusivos que muitos países da comunidade, resta-nos ainda muito caminho para andar. Muitos alunos com dificuldades nas nossas escolas não têm “todos” a “qualidade que merecem”, não dispõem do “apoio necessário” para ultrapassar as suas dificuldades, não conseguem progredir harmoniosamente através dos diferentes ciclos de escolarização. Por isso, estas recomendações são úteis para todos: para os que se avaliam mais à frente e para os que se assumem mais atrás. O importante é que todos os países europeus, toda a Comunidade Europeia, progrida o mais rápido e melhor que consiga de molde a proporcionar a todos os alunos uma educação inclusiva de qualidade com particular atenção àqueles que, por injustiças sociais, estariam condenados a uma educação “de segunda categoria”. E a este respeito, nada de excessos de confiança. Foi um europeu que escreveu a fábula da Tartaruga e a Lebre.

David Rodrigues

Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial; Conselheiro Nacional de Educação

Fonte: Público

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Regras relativas ao preenchimento das vagas para progressão ao 5.º e 7.º escalões da carreira

A Portaria n.º 29/2018, de 23 de janeiro, define as regras relativas ao preenchimento das vagas para progressão ao 5.º e 7.º escalões da carreira dos educadores de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário.

Candidaturas ao Prémio "António Dornelas"

As candidaturas ao Prémio "António Dornelas", que distingue estudos nas áreas do trabalho, emprego, formação profissional, relações laborais, segurança social, solidariedade e inclusão das pessoas com deficiência, estão abertas até ao dia 31 de janeiro.

Podem candidatar-se estudantes, investigadores e docentes do ensino superior com artigos/papers, dissertações de mestrado e teses de doutoramento, em qualquer área de intervenção do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.

Pretende-se que os trabalhos galardoados promovam a reflexão, análise e avaliação das políticas públicas ou fomentem a inovação em algumas áreas ou nas metodologias estatísticas.


Fonte: INR

segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Criação do grupo de recrutamento de Língua Gestual Portuguesa

Terminaram hoje as negociações entre o Ministério da Educação e as estruturas sindicais representativas dos docentes relativamente ao diploma que prevê a criação do Grupo de Recrutamento de Língua Gestual Portuguesa. Este diploma põe termo a uma situação que era premente resolver, reconhecendo aos formadores de Língua Gestual Portuguesa a integração na carreira docente, criando, para o efeito, o respetivo grupo de recrutamento. A estes docentes aplica-se o regime previsto no Estatuto da Carreira Docente, nomeadamente em matéria de vinculação, progressão e reposicionamento. Trata-se, assim, de corresponder ao justo anseio destes docentes, que lecionam a alunos surdos e a alunos ouvintes que pretendam aprender a Língua Gestual Portuguesa, cumprindo a sua proteção e valorização previstas na Constituição. Lisboa, 22 de janeiro de 2018.

Lisboa, 22 de janeiro de 2018

Texto original como Nota à Comunicação Social aqui.

domingo, 21 de janeiro de 2018

8º Encontro Nacional de Famílias 21

Nos dias 24 e 25 de março de 2018 terá lugar o 8º Encontro Nacional de Famílias 21.
Este encontro anual é um veículo essencial na partilha de informações, conhecimentos e experiências entre familiares de jovens e adultos com Trissomia 21 e foi criado pela Associação Pais 21.  Desde do seu primeiro momento de criação em 2011, tem sido primordial na promoção de novidades, métodos, técnicas de intervenção, informação, estudo e fomento de práticas de inclusão social e laboral para jovens e adultos com trissomia 21.

Este ano, o Dançando com a Diferença em parceria com a Associação Pais 21, traz pela primeira vez este acontecimento à Região Autónoma da Madeira sob a temática da “PROFISSIONALIZAÇÃO”.
Este encontro reunirá pessoas de todo o país que através de grupos de trabalho, workshops, partilha de opiniões e experiências discutirão o atual panorama da profissionalização dos jovens e adultos com trissomia 21 e qual o caminho a seguir para uma real inclusão no mundo laboral.

A nível geral, a programação estará distribuída da seguinte forma:
No dia 24 de março concentrar-se-á os grupos de trabalho sobre as mais diversas temáticas relacionadas com a profissionalização e as conversas com os convidados que abordarão a sua experiência profissional e relação com o tema central do encontro.
No dia 25 de Março as atividades concentrar-se-ão num espaço aberto à partilha por parte de todos os presentes, que terão aproximadamente 7 minutos apresentar e partilhar ideias, levantar questões, preocupações, ou até mesmo experiências pessoais e familiares. Depois seguimos um conjunto de workshops práticos nas áreas da Dança, da Televisão / Comunicação e ainda um workshop voltado aos pais onde se debruçará sobre a questão do “Que será o depois dos filhos terem conquistado a sua própria vida?”.

Pedimos a todos interessados façam a sua inscrição, impreterivelmente até o dia 12 de março de 2018, através deste link:https://goo.gl/forms/L5tP41fZ2CBmxTzD2
A sua inscrição será efetivada após o  pagamento por transferência bancária para o NIB 0018 000800259241020 21 e envio do comprovativo para o email info@danca-inclusiva.com
Para garantirmos melhores condições a todos os participantes precisamos do preenchimento de uma ficha de inscrição por participante. No caso de famílias, ao enviar o comprovativo, favor indicar o nome das pessoas inscritas.

O investimento é de 25€ para as inscrições individuais e 40€ para inscrições familiares. O valor para participação em cada workshop é de 5€.

Qualquer dúvida bastará entrar em contacto através do número: +351 92 706 9966 ou info@danca-inclusiva.com

Recebido por correio eletrónico

sábado, 20 de janeiro de 2018

Alemanha usa coletes de areia para controlar crianças hiperativas

Cerca de 200 escolas alemãs estão a pedir a cada vez mais crianças indisciplinadas e hiperativas que usem coletes cheios de areia. Será uma estratégia para as acalmar e manter sentadas nos seus lugares.

A história é relatada pelo diário britânico The Guardian. Os coletes de areia pesam entre 1,2 e seis quilogramas e custam entre 140 e 170 euros.

Por toda a Alemanha, há um número crescente de diagnósticos de Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção, o que provoca alterações na atenção, impulsividade e grande atividade motora. Um conjunto de sintomas que se repercute no desenvolvimento, na aprendizagem e no ajustamento social.

A prática não é nova. Os defensores dos coletes de areia argumentam que estes são uma abordagem terapêutica menos agressiva do que medicamentos, como o uso de Ritalina. Os detratores encaram-nos como uma reminiscência de camisolas de forças que eram usadas para restringir pacientes violentos em hospitais psiquiátricos. E inquietam-se com a possibilidade de estigmatização.

"As crianças adoram usar os coletes e ninguém é forçado a usar um contra sua vontade", declarou Gerhild de Wall, da escola Grumbrechtstrasse, no distrito de Harburg, em Hamburgo, ao The Guardian. "Os coletes ajudam-nas a ter um melhor sentido de si próprias, e isso, por sua vez, ajuda-as a concentrarem-se".

Segundo explicou, os coletes só são usados em períodos de 30 minutos. Muitos querem usá-los. "Os alunos saltam a cada oportunidade de os usar. Nós garantimos que as crianças que não precisam deles também os vestem, o que ajuda a evitar que haja um estigma associado ao seu uso".

Essas explicações não convencem os críticos, que entendem esta abordagem questionável. Vislumbram o risco de os coletes serem encarados como uma espécie de remédio único. Também há quem entenda que esta abordagem procura garantir que a criança encaixa na turma, sem atender à sua individualidade.

Petição em Portugal

Em Portugal, estima-se que cerca de 70 mil crianças sofrem de Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção. A terapêutica está muitas vezes reduzida à medicação. O Infarmed aponta para uma duplicação das vendas de metilfenidato: de 133 mil, em 2010, para mais de 270 mil embalagens, em 2016.

Na Net, corre uma petição com o objetivo de pôr a Assembleia da República a discutir modos de adaptar o modelo escolar e social, de modo a salvaguardar o direito destas crianças a “uma educação e inclusão sem obstáculos, com complementaridade de apoios a nível terapêutico”. Os signatários são agora 1072.

Fonte: Público

O VALOR DE UMA HISTÓRIA

Desta vez entrou na consulta acordado e a falar. O Gabriel tem seis anos. Conheci-o com três, metido num carrinho e muito ensonado. Vinha de Viseu sem diagnóstico. Tinha tido, desde os três meses de idade, crises epilépticas de vários tipos, muitas delas muito prolongadas e desencadeadas por febre. Quase não falava e os pais, gente inteligente, insatisfeitos com a abordagem clínica que o filho estava a ter num outro centro, decidiram partir em busca de novo parecer. Para mim o diagnóstico era óbvio e na consulta seguinte tinha a confirmação genética do síndrome de que suspeitara. Nesse Natal recebi por correio, num envelope almofadado, um lindo anjinho branco, enviado pela mãe do Gabriel. Ainda hoje o tenho pendurado no teto do meu gabinete.

Entretanto a epilepsia do Gabriel tem estado razoavelmente controlada e, apesar do atraso no desenvolvimento da linguagem, é uma criança com uma vida normal. Decidimos adiar um ano a entrada para o ensino básico, dando-lhe mais algum tempo de preparação na pré-primária. Hoje a consulta era rotina. Ajustar doses de fármacos, escrever informação para a escola....

Quando ele entrou no consultório, reparei que trazia na mão um saquinho cheio de M&Ms e pedi-lhe para me dar um. Fingiu não ouvir, foi direto à carteira da mãe onde meteu cuidadosamente a saqueta das guloseimas e em seguida correu o fecho.

Comecei a conversar com os pais e ele, entretanto, foi direto à mesinha das crianças onde se encontram jogos e livros.

- O Ruca! - exclamou entusiasmado.

- Pegou no livro e pôs-se de pé ao meu lado.

- Conta a história!

Aproveitei o momento para avaliar as suas capacidades intelectuais e linguísticas e comecei-lhe a contar a história. O Ruca levantava-se da cama entusiasmado, lavava-se e vestia-se sozinho rapidamente, pois estava convencido que naquele dia ia ao circo. Ao chegar à cozinha o pai disse-lhe que não era naquele dia mas sim no seguinte, sábado, que iriam ao circo. De repente reparei na cara do Gabriel. Estava quase a chorar. Eu estava muito preocupada a ler o texto e não tinha reparado no desenho que o acompanhava. Na imagem colorida, via-se o Ruca na cozinha em frente ao pai, com uma expressão tristíssima. Mudei rapidamente de página e continuei a ler, desta vez atenta à imagem que acompanhava o texto. O pai consolava o Ruca dizendo-lhe que nesse mesmo dia, depois da escola, iam lanchar a casa dos avós e comer bolo de chocolate. Olhei para a cara do Gabriel. A expressão de tristeza tinha desaparecido, tal como na cara do Ruca. Ia a virar a página mas o Gabriel prendeu-me a mão e ordenou:

- Espera!

Dirigiu-se à carteira da mãe e correu o fecho. Tirou de lá o saquinho de M&Ms e pediu à mãe para o abrir. Em seguida colocou-o na mesa à minha frente e disse-me:

- Come!

Não me fiz rogada, meti três dedos no pacote e comi um molhinho de bolinhas de chocolate. Era hora de almoço e eu tinha fome. Mais a mais eu senti que, segundo o Gabriel, eu merecia aqueles chocolates. Continuei a leitura com o Gabriel encostado às minhas pernas. Quando terminei a história, pegou no livro e arrumou-o em cima da mesinha. Os pais não fizeram mais perguntas sobre as capacidades cognitivas do filho. A história do Ruca tinha sido um instrumento valioso na avaliação cognitiva e emocional daquela criança.

Marquei a próxima consulta e despedi-me. O Gabriel beijou-me espontaneamente pela primeira vez.

Teresa Temudo
Fonte: Visão

Jovem portuense é o primeiro surdo-mudo a doutorar-se em Direito

Um jovem portuense foi o primeiro surdo-mudo em Portugal a doutorar-se em Direito, tendo sido aprovado com distinção pela Universidade do Minho, em Braga.

Filipe Venade de Sousa saiu orgulhoso, ao obter uma classificação unânime, de Bom com Distinção, no fim de uma tarde intensa a defender a sua tese.
Clicar na imagem para aceder à reportagem.

Fonte: JN

sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Diferenciar para aprender na sala de aula: questões e respostas

Em escolas que se caraterizam hoje pela heterogeneidade dos seus alunos deixou de ser possível continuar a defender a ideia que educar, nesses contextos, é ensinar tudo a todos, como se todos fossem um só. Se esta é uma afirmação relativamente consensual, importa reconhecer que deixa de haver consenso quando perguntamos o que se entende por diferenciar práticas, projetos e atividades pedagógicas ou como é que isso se faz no quotidiano de uma sala de aula. A saber:
Como é que entendemos a diferença no mundo em que vivemos?

A diferença é um problema ou uma propriedade?

São objetivos que orientam este webinar:
- Refletir sobre as diferentes conceções de diferenciação curricular e pedagógica que, hoje, tendem a suportar as representações dos professores sobre a problemática da diferenciação;
- Identificar algumas propostas de intervenção nos domínios da gestão curricular, da gestão e organização do trabalho pedagógico e da avaliação.
webinar irá iniciar-se com a temática da Diferenciação curricular e pedagógica – Das abordagens assistencialistas e compensatórias à abordagem inclusiva. Comparando-se os pressupostos, as implicações curriculares, pedagógicas e avaliativas dos projetos de diferenciação assistencialista, compensatório e inclusivo, constata-se que a diferenciação tanto pode ser um ato de empoderamento dos alunos, do ponto de vista das aprendizagens e formação, como, pelo contrário, pode constituir um ato de discriminação capaz de, em nome do reconhecimento das diferenças, legitimar as desigualdades e contribuir para as tornar aceitáveis.
Em seguida abordar-se-á a Diferenciação curricular e pedagógica – Das respostas desejáveis às respostas possíveis. Apresenta-se um conjunto de estratégias e de dispositivos que possibilitam a concretização de um projeto de diferenciação de caráter inclusivo, os desafios relacionados com a gestão diferenciada dos objetivos escolares, da organização do espaço e do tempo de aprendizagem e sobre modalidades de apoio educativo.
A reflexão sobre a avaliação e os diferentes modos de a concretizar, de forma congruente com uma visão inclusiva da Escola fecham este webinar.
Fonte: DGE