No dia 1 de Julho de 2011, nas páginas do PÚBLICO, noticiava-se que o ministro Nuno Crato mantinha a sua declaração, dos seus tempos de analista educacional, de ser essencial implodir a estrutura alegadamente gigantesca do Ministério da Educação e Ciência (MEC).
Mais de três anos depois, parece que esse foi um objetivo amplamente atingido e pelo qual o atual ministro merece ser reconhecido. Nas últimas semanas, o MEC mostrou-se politicamente inexistente e tecnicamente incompetente para resolver um problema para o qual há muito tinham sido feitos diversos avisos. O problema relacionado com a Bolsa de Contratação de Escola (BCE) e com a fórmula usada para ordenar os candidatos “explodiu” com o ano letivo a arrancar e motivou as mais desastradas declarações públicas, que oscilaram entre a afirmação da perfeita normalidade da situação e o pedido de desculpas do ministro em pleno Parlamento. Pelo caminho, o secretário de Estado da Administração Escolar desapareceu em combate até reaparecer por minutos na SICN em estilo “português suave” e a estrutura técnica do ministério demonstrou até que ponto a implosão anunciada tinha sido conseguida, ao mostrar-se incapaz para resolver um problema que seria impensável nos tempos dos miniconcursos distritais feitos à base de candidaturas em papel.
Quando Nuno Crato foi escolhido para ministro, considerei que era uma excelente opção política, mas que era necessário complementá-la com uma equipa de secretários de Estado com competência técnica. As escolhas então feitas foram, em particular para a área do ensino não superior, desastradas e evidentes cedências a clientelas muito particulares. Para além de uma secretária de Estado fugaz cuja maior qualidade foi termo-nos esquecido dela logo que foi substituída, tivemos um secretário de Estado (aquele que agora desistiu de aparecer) cuja função parece ter sido apenas a de estabelecer “pontes” e “diálogos frutuosos” com alguns grupos de pressão na área do mercado da Educação, mas que se revelou sempre de grande inépcia ou banalidade nas intervenções públicas sobre o setor, em especial quando empurrado para falar pelo próprio ministro em audições parlamentares e outras circunstâncias semelhantes.
No momento atual, em que continuam por colocar centenas ou milhares de professores contratados, após o processo igualmente rocambolesco das rescisões, o MEC optou pela sua estratégia habitual: negar os problemas até ao limite do impensável e procurar não fazer aquilo que lhe era aconselhado a partir de “fora”. Parece que para este MEC, na esteira de uma imagem de marca do Governo, isso é encarado como uma cedência, um sinal de fraqueza. Não interessa se os conselhos são bons e ajustados. Desde que venham das escolas, dos diretores, dos professores, não podem ser considerados.
Até que a realidade é demasiado forte e se sacrifica um qualquer diretor-geral que, diga-se de passagem, só pecou por sair tarde; se encena um ato de contrição e se arrasta a resolução do processo por mais umas semanas, na base da pura teimosia.
O MEC começou por dizer que o problema da BCE atingia apenas uma pequena parte dos professores e das necessidades das escolas. Recentemente, foi dito, em nota de imprensa, que “as novas listas representam menos de 0,8% dos cerca de 110 mil professores que estão nas escolas desde a abertura do ano letivo”. Isto é uma meia verdade, se é que existe tal coisa. Podem ser 0,8% dos professores em exercício, mas representam mais de 20% das vagas a preencher pela BCE, ou seja, das necessidades das escolas e dos alunos.
Este não é apenas um problema de professores prejudicados por más colocações, uns a ficar inicialmente ultrapassados de modo injusto e outros a ser atingidos pela revogação das colocações obtidas – depois de Nuno Crato ter ido ao Parlamento dizer que ninguém seria prejudicado pelos erros que só podem ser atribuídos ao MEC. Este é um problema das escolas e, muito em especial, dos alunos que continuam sem professores e sem aulas a um nível que eu não via, a caminho de meados de outubro, há mais de duas décadas. Lembro-me de coisas parecidas, enquanto aluno, ali pelos anos 1980.
O MEC implodiu, de facto.
Em termos políticos, o ministro anda à deriva, pois nunca percebeu (nem parece ter querido perceber) os meandros da sua área de governação e os secretários de Estado parecem mais preocupados em sobreviver ao fogo sem se chamuscar. Em termos técnicos, é incompreensível que o “algoritmo” continue errado (é essa a minha convicção) e se pretenda dar a entender que as falhas são informáticas. Não, os erros são humanos e bem humanos. De incompetência, em primeiro lugar; de arrogância, em segundo. E são erros que resultam de um MEC incapaz de dar resposta à tarefa mais básica que existe no setor: fazer o ano letivo arrancar na maior normalidade possível para os alunos.
O MEC implodiu como Nuno Crato desejava.
Mas seria esta a implosão necessária?
Paulo Guinote
In: Público
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