segunda-feira, 31 de agosto de 2020

MOOC Eucação Inclusiva 2020

A Direção-Geral da Educação vai lançar a 2.ª edição do MOOC Educação Inclusiva no próximo dia 28 de setembro de 2020, através da plataforma NAU.

Trata-se de uma versão revista e com caráter mais prático do MOOC realizado no início de 2019 e que pretende apoiar os professores na operacionalização do regime jurídico da Educação Inclusiva.

O MOOC Educação Inclusiva está estruturado em três módulos nucleares, cujos conteúdos incidem sobre opções metodológicas (abordagem multinível e desenho universal para a aprendizagem), recursos organizacionais específicos, avaliação e adaptações, entre outros.

O curso terá a duração de cerca de um mês, correspondendo 25 horas de trabalho.

Ao longo do curso, os participantes terão oportunidade de aprofundar o seu conhecimento sobre o atual quadro da Educação Inclusiva, refletir sobre as suas práticas pedagógicas, bem como partilhar ideias e atividades.

A conceção do curso foi orientada para os professores em geral, encontrando-se aberto à comunidade educativa.

Esta formação não está acreditada pelo Conselho Científico-Pedagógico da Formação Contínua, mas a sua conclusão permite a obtenção de um Certificado de Conclusão do Curso.

Veja a vídeo de apresentação do MOOC Educação Inclusiva.

Inscrições: faça a sua inscrição neste endereço. Serão aceites inscrições até final do primeiro módulo de introdução ao curso (4 de outubro).

Contacto para dúvidas sobre a organização do curso - MOOC-EI@dge.mec.pt

Contacto para dúvidas sobre o acesso à Plataforma NAU – ajuda@nau.edu.pt

Fonte: DGE

domingo, 30 de agosto de 2020

Estas duas youtubers têm dislexia. E já não têm medo de falar sobre ela

E se, na tua cabeça, um “q” virasse um “p” ou um “v” um “b”? E se as letras dançassem e tu lhes perdesses o rasto? E se, depois de uma primeira leitura, tivesses de ler uma segunda e talvez uma terceira? É um pouco assim que se sentem Alexandra Magalhães, de 23 anos, e Cláudia Dias, de 25, duas youtubers com dislexia. “No primeiro ano de escola, a minha mãe e a minha professora achavam estranho eu trocar algumas letras, porque eu até era uma criança inteligente”, conta Alexandra. Já Cláudia partilha que, “quando estava no 2.º ano”, lhe davam “coisas do 1.º”. 

Não é um problema assim tão incomum. Segundo Helena Serra, uma das fundadoras da Dislex – Associação Portuguesa da Dislexia, “10% dos alunos em sala de aula terão estas características”. E, apesar de se ter verificado uma grande evolução desde a fundação da Dislex em 2000, Helena reconhece que continua a haver “algum desconhecimento”. Não porque o tema “não seja conhecido”, mas sim porque raramente se fala “das características, das necessidades destas crianças”.

Cláudia e Alexandra são provas de que é possível lidar com a dislexia sem que esta as defina. Para Alexandra, licenciada em Teatro pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, a ideia de criar um canal de YouTube surgiu, não por causa da dislexia, mas, sim, por causa da cicatriz que tem no peito, resultado de operações que fez ao coração. “Criei o canal para falar da auto-estima”, explica a jovem, que conta com perto de 1500 subscritores.

Já Cláudia é formada na área da Dança, o que pode comprovar alguma ligação dos disléxicos “às artes”, aspecto que é referido por Helena Serra. Cláudia já fazia parte dos vídeos de YouTube da sua irmã gémea quando, no segundo ano de faculdade, decidiu criar o próprio canal. Hoje, já com 48,8 mil subscritores, faz vídeos de lifestyle (se bem que gostava de aliar “o YouTube à dança”). 

“A dislexia não é impeditiva. O importante é que haja uma intervenção precoce”, ressalva a professora Helena Serra, até porque há uma longa lista de figuras públicas disléxicas, desde Leonardo da Vinci, a Einstein ou Steven Spielberg. Mas, apesar dos percursos de sucesso destas duas jovens, quer Cláudia quer Alexandra apontam para a necessidade de consciencializar a sociedade para o problema. 

“Acho que é importante informar os pais de crianças com dislexia”, comenta Alexandra, que não teve medo de publicar um vídeo em que fala abertamente do tema: “Quando os meus pais souberam que eu tinha dislexia, senti que tinha sido uma bomba.” Cláudia corrobora; toda a sua vida sentiu uma “certa vergonha”. Era muitas vezes atacada em comentários no YouTube por cometer erros ortográficos. A publicação de um vídeo sobre o problema foi um acto de coragem: “Com o YouTube, ganhei uma voz e queria ajudar as pessoas”, revela. A recepção do público ao vídeo foi melhor do que a esperada: “Sem dúvida que o melhor desse vídeo foi receber os testemunhos”.

Alexandra estava no 2.º ano da escola primária quando que lhe foram diagnosticados os “3D”, como a jovem lhes chama: “dislexia, discalculia e disortografia”, resultado de “ter sido operada duas vezes ao coração”. No 4.º ano, ficou retida na escola primária e, durante o ensino básico, teve sempre apoio a Língua Portuguesa, não podendo ser descontada nos testes de qualquer disciplina por erros ortográficos.

Cláudia vivia no Reino Unido durante a escola primária, o que atrasou o diagnóstico de dislexia, pois pensava-se que as dificuldades se deviam às barreiras linguísticas. Ao regressar a Portugal, foi-lhe finalmente diagnosticado o problema, mas a escola onde andou “não lidou bem com a situação”. “Davam-me apoio especial em conjunto com uma menina com síndrome de Down”, explica Cláudia. Só mais tarde, ao mudar de escola, começou a sentir “uma evolução” graças à ajuda que lhe foi prestada. “Aí começou o meu caminho de descoberta.”

Helena Serra explicita: “Os disléxicos são inteligentes e criativos nos domínios que não envolvam palavras escritas. Há um distúrbio neurológico. Há graus severos, graus intermédios, graus moderados e mais ligeiros (…). É como se as palavras não fossem fixadas no cérebro.” A professora, que decidiu fundar a associação ao entrar em contacto com uma colega disléxica, observa que muitos destes alunos são subvalorizados pois as suas dificuldades não são trabalhadas. “A dificuldade permanece ao longo da vida”, elucida. “Mas, com técnicas, vamos criando a capacidade de estarem à defesa, de fazerem a prevenção.”

Depois de ter partilhado o seu testemunho enquanto disléxica, Cláudia comenta que não sente necessidade de fazer mais vídeos sobre a disfunção neurológica: “Penso que não se justifica fazer mais vídeos sobre o assunto, tenho imensa gente que me ajuda e se identifica e tento dar um apoio no dia-a-dia”. Apesar disso, viver com a dislexia será sempre “um processo” durante a sua vida. Já Alexandra planeia continuar a falar sobre o tema através da criação de um podcast para “alertar e ajudar as pessoas”.

Fonte: Público

sábado, 29 de agosto de 2020

Professor de Educação Especial: o que faz, o que querem dele?

 A Educação Especial é um ramo da Educação destinado a responder às necessidades específicas de alunos, de acordo com as suas características, capacidades e necessidades, tendo a finalidade de cumprir o seu potencial na interação com os desafios do contexto.


Falamos de alunos com deficiência, perturbações do desenvolvimento ou outras condições intrínsecas, que se constituem como barreiras ao seu desenvolvimento, à aprendizagem dentro do currículo padrão e à sua qualidade de vida em geral.
Um docente de Educação Especial tem de saber, antes de mais, como todas crianças aprendem, como se desenvolvem, que etapas e que percursos fazem… em termos intelectuais, emocionais, sociais, físicos, numa interseção de áreas da saúde, da psicologia do desenvolvimento, da pedagogia e outras ciências sociais. Para além disso, deve dominar um conjunto de adaptações, medidas e estratégias individualizadas de ensino para os alunos com Necessidades Específicas, NE, para promover a sua aprendizagem e desenvolvimento de forma adequada, incluindo ferramentas e conhecimentos específicos em acessibilidade, tecnologia adaptada, áreas de aprendizagem específicas como língua gestual, braille, orientação e mobilidade, comunicação aumentativa, adaptação de materiais, estratégias e métodos, processos de organização comunicacional ou comportamental, de aprendizagem funcional, de promoção das interações sociais e de transição para a vida, entre outras; sabendo quando, porquê, em que contextos e a quem se aplicam.

Este conhecimento permite desenvolver um conjunto de propostas adequadas de remoção de barreiras, tendo em conta o que está em causa naquele particular e porque se seguem determinados caminhos/estratégias.

Neste processo de conhecer e promover uma melhor educação destes alunos com Necessidades Específicas, é importante conhecer ainda as condições individuais, as perturbações do desenvolvimento, transtornos e deficiências, saúde e diferentes situações intrínsecas, como causas de barreiras individuais. Sabe-se que todas estas situações individuais se manifestam no confronto com os contextos e é nessa medida que se tornam um maior ou menor problema. Por isso a escola necessita de professores treinados nesta área com um olhar abrangente das condições individuais, para proceder à análise do que se passa nos contextos de aprendizagem e da vida escolar e saber como atuar junto dos alunos e da comunidade educativa.

Não basta ter ferramentas para pensar no que fazer, é também ter o conhecimento do porque se está a fazer assim e não de outra maneira qualquer. Conhecer as condições que influenciam o desenvolvimento, permite igualmente uma melhor aferição dos apoios, medidas e recursos a afetar.

A Educação Especial complementa as restantes áreas disciplinares e é transversal a todas elas e a todos os ciclos, permitindo ainda o diálogo de diferentes áreas científicas. É esta a sua riqueza e o seu contributo base.

 Esconder terminologias cria barreiras

A Convenção dos direitos da Pessoa com Deficiência (2006), vem valorizar os direitos destas pessoas, dizendo que não basta eliminar a discriminação e promover a integração e a vida autónoma; é importante conhecer os elementos que caracterizam essa pessoa, para se poder identificar a gravidade dos seus limites e a potencialidade das suas capacidades.

No atual “A Guide for ensuring inclusion and equity in education” (UNESCO, 2017 – Education 2030), os termos Educação Especial e Necessidades Educativas Especiais fazem parte, bem como é dado destaque para a fragilidade e risco de exclusão das crianças com deficiência e a necessidade de respostas específicas (p.13). Os aspetos ligados à deficiência e às perturbações do desenvolvimento, estão desde há muito estudados, como fatores de alto risco para a exclusão.

O termo Deficiência não caracteriza a pessoa como um atributo determinista, mas sim como o resultado da interação das suas características individuais com o meio. É preciso conhecer, para incluir, desmontando os processos de exclusão. Não dar atenção ao conhecimento das características desenvolvimentais das pessoas com deficiência ou incapacidade, é apostar no desconhecimento que vai criar barreiras e tornar invisíveis as suas necessidades específicas e a consequente afetação e rentabilização de recursos específicos. A prática é moldada pelo conhecimento que se tem das situações, dos conceitos e pela utilização de uma linguagem adequada.

Por isso o Professor de Educação Especial tem de ter conhecimento das perturbações mais frequentes com que a escola vai lidar, quer pelas suas características, quer pela forma como alteram o funcionamento.  Daí a importância de conhecer diagnósticos, sintomas, comportamentos, funções cognitivas, afetivas, traços de personalidade, físicos, combinação de perturbações; bem como os aspetos que mais podem influenciar boas decisões educativas.

Não é preciso catalogar para intervir, mas é fundamental conhecer o indivíduo para intervir adequadamente, usando este conhecimento para identificar as barreiras individuais e planear o seu derrube de forma informada, sendo também atores do seu destino.

Devem ser usadas as terminologias técnicas e da saúde, internacionalmente adotadas para um diálogo claro e consequente. Não devemos ter medo das palavras quando elas são usadas para promover a igualdade. Devemos sim, centrarmo-nos nas nossas ações, porque são elas que vão dar o significado às palavras.

A Educação Especial é uma área da Educação para responder às necessidades específicas das pessoas com deficiência e/ou com dificuldades de aprendizagem. Os professores de EE devem ser detentores de saberes para responder às especificidades da deficiência e/ou dificuldades de aprendizagem. O foco não está na incapacidade, mas no saber olhá-las e dar-lhe o uso devido para promover cada aluno, nomeadamente sabendo mobilizar os recursos e as estratégias específicas.

A Inclusão como objetivo da Educação Especial


Inicialmente a Educação Especial centrou-se no indivíduo e desenvolveu-se em ambientes segregados, porque nos anos 70 e 80 em Portugal a massificação do ensino criou problemas de tal ordem, que alguns ficaram para trás. Criaram-se as instituições de educação especial, separadas do sistema educativo regular, para dar resposta às necessidades educativas dessa população. Portanto nós podemos ter uma Educação Especial, mas não inclusiva.

Portugal no final dos anos 80, subscreve documentos internacionais importantes na definição de sistemas educativos inclusivos, desenvolvendo toda uma dinâmica de desinstitucionalização e de criação de condições nas escolas regulares. E foi aqui que mais uma vez entrou em ação a Educação Especial.

DL 319/1991- Primeira lei de Educação Especial, com o objetivo de promover a integração, dos alunos com necessidades educativas especiais decorrentes de uma deficiência ou não.

Decreto-Lei nº20 de 2006 de 31 de janeiro 2006- Criado o Grupo Disciplinar no Sistema Regular de Ensino, dos Professores de Educação Especial cuja função é: “promover a existência de condições para a inclusão socio educativa de crianças e jovens, com nee de carater prolongado.”

No Dec-lei 3/2008 com os seus defeitos e potencialidades, era claro ao definir que a Educação Especial tinha como objetivo de promover a Inclusão, como seria lógico, dado o historial e o avanço neste domínio, conseguido em grande medida, pela Educação Especial ao longo de 30 anos.

A Educação Especial passa a atuar no contexto natural da escola e tem como objetivo de ação a Inclusão.



A Educação Inclusiva propõe que todos os alunos, com ou sem necessidades específicas, tenham o direito de interagir e aprender juntos nos contextos naturais de aprendizagem. É um processo contínuo de eliminação de barreiras, para uma participação plena em todas as dimensões da sociedade. Ela existe porque há excluídos da escola e do ensino, daí a necessidade de respeitar as diferenças e promover a igualdade de acesso e de direitos, através de mecanismos de equidade, porque todos somos diferentes e nem todos partimos do mesmo ponto. Só se podem desenvolver processos de equidade, quando se conhecem os diferentes pontos de partida de cada um.

A inclusão tem ainda uma dimensão social e pessoal muito importante de realização e cumprimento de um projeto de vida próprio, ao mesmo tempo que se é aceite e reconhecido pelos outros como um igual.

Sabendo que a Inclusão é um direito, conquistado pela luta pela igualdade das pessoas com deficiência ao longo de décadas, faz com que hoje não seja concebível uma Educação Especial que não seja Inclusiva.

Com a necessidade de promover a Inclusão, a função do professor de Educação Especial tornou-se mais abrangente, deixou de estar apenas centrada nas características do aluno e passou a atuar também no contexto educativo junto dos professores, das famílias, de toda a escola e da comunidade educativa. O aluno no seu contexto natural é o palco da construção dos necessários contextos inclusivos que devem ser criados nas escolas. Contextos de aprendizagem e contextos de desenvolvimento social e de inclusão em todos os aspetos da vida da escola e das relações ricas que aí se desenvolvem.

O professor de EE, para além de especialista no atendimento e planeamento para os alunos com problemáticas específicas, passa também a exercer um papel de diálogo transversal, de consultor, colaborador, formador e parceiro. A sua função, não ficou diminuída, muito pelo contrário, ficou mais rica e abrangente.

A-     Primeiramente tem de compreender os efeitos que as perturbações têm no desenvolvimento individual no confronto com o contexto e as aprendizagens atípicas e atuar com estratégias individualizadas adequadas. Dominar um conjunto de estratégias individualizadas de ensino dos alunos com NE, para promover a sua aprendizagem; criar ambientes favoráveis à aprendizagem e inclusão; promover interações positivas, avaliar e tomar decisões para cada aluno;

B-     Paralelamente pega neste conhecimento específico e leva-o para o contexto natural de educação, que é a escola e a sala de aula, trabalhando em conjunto com toda a comunidade educativa. A Inclusão na escola prepara a inclusão social e deve prever interações e apoio no desenvolvimento social e afetivo dos jovens para a sua identificação e adequado desenvolvimento físico e psicológico. A Inclusão na aprendizagem apela à formação pedagógica dos professores de EE, (daí a importância de serem docentes), que têm de dominar aspetos centrais para possibilitar a inclusão nos contextos naturais de aprendizagem, nomeadamente o apoio, a diferenciação pedagógica, a flexibilidade curricular, metodologias ativas de ensino, a autonomização dos alunos, o foco nas capacidades e nos processos, ensino colaborativo, entre outros.

A Educação Inclusiva tornou-se o objetivo da Educação Especial. Uma não pode existir sem a outra, porque uma fornece ferramentas essenciais para conhecer e atuar na diversidade e a outra dá o propósito à utilização dessas ferramentas.

É hoje claro que a função dos professores de Educação Especial é promover as condições para a Inclusão socioeducativa de crianças e jovens com NE e se hoje nos pudemos orgulhar do nosso sistema nesta área e se existem muitas escolas e professores empenhados em promover a Inclusão e qualidade de ensino para os alunos com NE, isso acontece graças à ação dos professores de Educação Especial ao longo de décadas.

O fato dos docentes de Educação Especial terem como objetivo promover a Inclusão, é uma mais-valia para o sistema e levou a que, também na sua formação, a Educação Inclusiva estivesse presente, dado que se constituiu como objetivo central do seu trabalho. É por isso de elementar justiça que isso seja reconhecido, valorizado e reforçado.

Os professores de Educação Especial passam a ter este papel fundamental abrangente em duas dimensões, quer através de um trabalho de diálogo interdisciplinar e apoio indireto à escola e pais, quer também através de intervenção direta com alunos sempre que necessário.

O foco da Educação Especial está nas capacidades não está na categorização nem nas incapacidades. Deve-se, no entanto, saber olhar para ambas, compreendê-las e procurar as respostas que facilitam a aprendizagem e a participação na sala de aula e no contexto escolar e social, para que se possa falar de Inclusão. O papel do professor de Educação Especial deverá também promover a articulação e a interseção com todos os intervenientes para adaptar estratégias, criar acessibilidades e mobilizar todos os instrumentos de flexibilização curricular para promover a inclusão. 

Não perder o equilíbrio para um lado, sob pena de diluir o indivíduo.
Nem perder o equilíbrio para outro lado, sob pena de o privar dos seus contextos naturais. 
Em ambos os casos, o resultado será a exclusão.

Todos os professores são professores de Inclusão.

Pensar que apenas pela ação da Educação Especial a escola se torna inclusiva é um erro. A simples presença dos professores de Educação Especial, mesmo que com o objetivo de promover a inclusão dos alunos com Necessidades Especiais, não torna a escola inclusiva para TODOS.
Falta cumprir a Inclusão na escola e no sistema. Todos devem partilhar o mesmo caminho de construção permanente e não apenas alguns, sob pena de não haver caminho, ou sequer destino.

A Educação Inclusiva é um valor e um desígnio transversal, que deve motivar uma reforma educacional, não apenas para alunos com dificuldades na aprendizagem, ou com necessidades específicas. Não se confina a determinado nicho, é antes um processo de toda a escola e, como tal, tem de ser visto tendo em conta a visão da própria escola e a participação dos professores e dos pais. Uma inclusão de cima para baixo, ignorando aqueles que serão os seus obreiros, não terá grandes resultados porque não vai ter em conta a Inclusão até dos próprios professores. A escola tem hoje desafios de insucesso, violência, multiculturalidade e de diversidade a diferentes níveis, que devem motivar um olhar muito mais abrangente em relação à promoção de uma Escola Inclusiva.

Para se criarem condições para que os professores possam mudar, arriscar, criar, é necessário dar-lhes autonomia e ouvi-los. Desenvolver a Inclusão na escola, não passa por, de repente, dizer que o professor de Educação Especial é de Educação Inclusiva e querer a partir daí que a Inclusão se generalize. A Educação Inclusiva é uma tarefa de todos os professores e de toda a escola. Todos os professores são professores de Inclusão.  A Educação Especial é um dos parceiros nesse percurso. Porque se assim não for, a Inclusão não se concretiza, só porque um pequeno grupo profissional assim se denomina.

Sabemos hoje que a Educação Inclusiva só se realiza num sistema de ensino diferenciado e individualizado, que responda às diferenças e isso vem trazer à baila todo um conjunto de conhecimentos pedagógicos que não devem ser apenas exclusivos da Educação Especial, mas sim transversais ao processo ensino-aprendizagem. São desafios de ordem pedagógica para uma escola melhor, que deve inclui todos.

Aqui a Educação Especial estará na primeira linha, pelo seu percurso e pela formação dos seus profissionais, mas estes, não podem estar sozinhos, têm de fazer parta de uma reforma global do sistema educativo, na área legislativa, gestão e organização escolar, pedagógica, nos processos de ensino, na avaliação, na vida social escolar e na formação inicial dos professores de todos os ramos da educação.

Em resumo, o que falta cumprir na Educação Especial?

1º - Propor sem ambiguidades, um corpo de conhecimento deste ramo da Educação e valorizá-lo como fundamental para a educação inclusiva destes alunos e para a construção da inclusão nas escolas. Reconhecer as diferentes dimensões da Educação Especial Inclusiva como um todo;

2º - Aprofundar e clarificar um Perfil Funcional adequado a estes professores, que responda às escolas e aos pais, definindo claramente o que se pretende da Educação Especial, sem olhar apenas a aspetos financeiros;

3º - Melhorar a formação dos professores de Educação Especial, tornando-a abrangente nas suas dimensões, sólida nos pressupostos científicos, uniforme em todo o país, valorizante para os professores e adequada às exigências;

4º Continuar a lutar para qualificar a educação destes alunos na escola regular, quer ao nível da aprendizagem, quer ao nível da participação social e das interações na aceitação pelo outro.

Todas estas transformações só se conseguem através de uma reforma global do sistema educativo
          na área legislativa,
          gestão e organização escolar,
          nos processos de ensino,
          na vida social escolar
          na formação inicial dos professores de todos os ramos da educação
          na cultura e nos valores
          na perceção dos próprios sobre a mudança.

Todos os ramos da Educação deverão ter como desígnio a Inclusão, a Educação Especial é apenas um deles.

É um erro pensar que se constrói uma Escola Inclusiva, eliminando áreas educacionais, em vez de as fortalecer.

Temos de ter uma Educação Especial Inclusiva, num Sistema Educativo Inclusivo, como parte de um mesmo desígnio, não permitindo que algo mude, para que todo o ensino fique na mesma.



Texto base da intervenção na Conferência On-line “Vencer a Crise”

27 a 29 de abril 2020


Jorge Humberto Nogueira

Fonte: Especial Educação

sexta-feira, 28 de agosto de 2020

Sinais de alerta da dislexia: perceção de alunos com dislexia

Pela importância, pela pertinência e pelo potencial impacto, partilho o artigo da colega Maria de Fátima Almeida com o título "Sinais de alerta da dislexia: perceção de alunos com dislexia". Atendendo à extensão do artigo, destaco o resumo, a introdução e a conclusão, ficando disponível o acesso ao texto.


Resumo
Partindo de um levantamento de sinais de alerta de dislexia – conceito que, como propomos, é diferente de marcadores de Dislexia - empreendido pela DISLEX - Associação Portuguesa de Dislexia, por nós adaptado no âmbito do presente estudo e integrado sob a forma de questionário, foram inquiridos cinquenta e três alunos desde o primeiro ciclo até ao ensino secundário, já com diagnóstico desta Perturbação de Aprendizagem Específica, sobre a intensidade e frequência com que sentem estas dificuldades. Com uma metodologia quantitativa e o recurso à aplicação de questionário, foi possível encontrar os sinais que mais alunos sentem com mais e com menos intensidade e frequência por nível de educação e de ensino e de uma forma global. Percebendo quais são as maiores dificuldades sentidas pelos alunos inquiridos, pudemos propor o que deve ser feito pela escola de forma a minimizar o impacto da desvantagem relacionada com o fator individual dislexia.

Introdução
Nenhum aluno pode ser deixado para trás. Este é o lema da educação inclusiva. Aliás, um dos direitos fundamentais consagrados na Constituição da República Portuguesa é que “Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.” (Lei Constitucional n.º 1 de 10 de abril, 2005, art.º 13.º, n.º 1). E a escola é, sem dúvida, o espaço por excelência para fazer valer esse direito. 

Existem estudos sobre a perceção de professores quanto à problemática da dislexia; há estudos sobre a atitude dos pais e professores com crianças disléxicas. Não encontrámos, contudo, investigação que se foque na perceção que os próprios alunos têm das suas dificuldades de leitura e escrita, associadas à dislexia, dos sinais relacionados com esta problemática e, por isso, considerámos que seria importante ouvir alguns destes alunos. 

Este texto, dividido em oito pontos, é iniciado com um enquadramento teórico sobre os conceitos de dislexia, insucesso na dislexia, sinais de alerta e marcadores na dislexia e, por último, focase na questão da perceção; o quinto ponto integra alguns aspetos metodológicos relacionados com a implementação do estudo, o sexto foca-se nos resultados e o sétimo integra a discussão dos mesmos, seguindo-se a apresentação de algumas conclusões.

Conclusão
É urgente perceber o que é a dislexia e quais são as dificuldades dos alunos, e de cada aluno, com dislexia. Com o presente estudo procurámos conhecer melhor estes alunos, ouvindo as suas perceções quanto às suas maiores dificuldades.

Os alunos com dislexia apresentam dificuldades significativas no seu percurso escolar, sentidas ao longo do tempo. Fica, de facto, claro com este estudo que não só as dificuldades não desaparecem com a idade como a perceção das dificuldades se acentua ao longo do tempo, possivelmente porque deixam de se importar com a opinião dos outros (no estudo, o outro é o inquiridor) - falamos dos pares, que frequentemente maltratam os alunos com dislexia por não compreenderem as suas dificuldades ou por simples desporto/maldade – ou porque será maior o seu conhecimento relativamente ao esperado.

Apesar de reconhecermos a pertinência dos dados que apresentámos, não podemos deixar de mencionar o facto de a amostra de alunos do ensino secundário ter apenas 6 participantes. 

Acreditamos que este estudo poderá dar um importante contributo para que se compreenda melhor a desvantagem em que se encontram os alunos com dislexia e para que se atenue na escola – e futuramente na sociedade - essa desigualdade.

Acesso ao texto aqui ou aqui.

O mundo de Joana. Já saltou de paraquedas e agora está apaixonada

A cadeira de rodas não prende Joana. Não consegue andar, não pode ir à casa de banho sozinha, mas a paralisia cerebral que à nascença lhe roubou os movimentos dos membros inferiores ficou-se por isso mesmo. Joana é uma força da natureza, radical, até: já andou de moto de água, já experimentou baloiço 3D e já saltou de paraquedas. "Foi o dia mais feliz da minha vida. É como se conseguisses voar, como se o mundo estivesse ali à tua frente! É como se conseguisses agarrar o mundo na mão."

Uma sensação de liberdade indescritível só semelhante à que sente quando entra no mar e a água fria lhe arrepia a pele. O mar, o vento na cara - Joana sonhava ter uma moto - acalmam-na quando está triste, quando está stressada. "É uma liberdade!"

A liberdade que uma incapacidade motora de 74% não lhe retirou. Porque desde sempre Joana Nunes, 21 anos, não se acomodou às limitações físicas. Olhando para o seu currículo ninguém diria que as tem. Nunca deixou de fazer nada. Estudou, entrou na faculdade, no curso de Psicologia que acabaria por abandonar, fez um curso de pós-produção de vídeo e criou um canal no YouTube onde partilha um pouco da sua vida, Joana Nunes sobre Rodas.

O amor trouxe-lhe uma motivação acrescida para combater todas as supostas limitações. Conheceu Odair como que por acaso, ao sair do comboio da Fertagus no Pragal (Almada). Ela lembra-se de que estava com dificuldades na rampa e que ele pegou na cadeira, a ajudou a sair e lhe deu um cartão para o caso de precisar de alguma coisa. Ele fixou tudo, até o que ela tinha vestido naquele dia, o traje da faculdade.

O comboio do amor

Voltaram a encontrar-se numa estação de comboios, já ele trabalhava na Decathlon, em Setúbal. "É o comboio do amor", diz Odair. O que esta relação trouxe para a vida de Joana foi o elevar da sua autoestima e o reforço da sua motivação. Tão bem está Joana que já acredita que um dia virá a andar. "Quando se tem uma pessoa que gosta de nós é tudo mais fácil. E com ele percebi que as coisas acontecem porque têm de acontecer."

Une-os o amor e o mesmo problema físico. Odair tem 70% de incapacidade, só começou a andar aos 6 anos. No seu boletim médico conta com mais de 30 cirurgias. E para Joana é importante ter uma pessoa que a ama e que já passou pelo mesmo.

É nesta altura da sua vida que Joana recorda palavras muito cruéis que um dia ouviu da boca de alguém próximo. "Fazia-te bem teres um relacionamento, mas não tens nada para oferecer à outra pessoa." Joana tem e recusa que estar numa cadeira de rodas dê a alguém o direito que pensem que é menos mulher do que as outras.

Foi a partir dos 15 anos que Joana diz ter percebido que não tinha de ter limitações - os amigos do secundário foram uma ajuda grande. Por isso, no baile de finalistas não se ficou por ver os outros dançarem - teve direito ao seu par, a escolher um vestido bonito e a dançar a sua valsa.

"Ó mãe, as suas filhas não vão ser nada"

Joana tem uma irmã gémea, a Inês, também ela com paralisia cerebral, mas com uma incapacidade de 97% - não anda, não fala, mas, diz a mãe, Ana Nunes percebe tudo e é dona de um forte sentido de humor.

As gémeas nasceram às 24 semanas no Hospital de São Bernardo, em Setúbal. Para fazerem nascer Joana, Inês ficou cerca de 20 minutos sem cuidados. "Devia ter sido sujeita a oxigénio e não foi", conta a mãe. Na altura percebeu-se que deveria haver algum problema com Joana, que nasceu com um índice de Apgar 3 - foi reanimada e ao quinto minuto subiu para 5. Inês, curiosamente, nasceu com índice de Apgar 9 numa escala de 10.

O caminho que as duas irmãs fizeram é semelhante ao dos bebés prematuros que nascem com pouco mais de um quilo - incubadora, internamento na neonatologia, fisioterapia. À mãe iam dizendo que "tinham o tempo delas, que não era compatível com o das outras crianças". Eram acompanhadas por uma equipa multidisciplinar no hospital. Só quando as meninas tinham 3 anos, na sequência de uma convulsão de Inês, é que Ana ouviu o veredicto, da boca de uma terapeuta, da forma mais crua que se possa imaginar: "Ó mãe, as suas filhas não vão ser nada nem ninguém porque têm paralisia cerebral!"

Tudo por elas: de Cuba a Düsseldorf

Não há palavras para explicar o que Ana sentiu nesse momento, o chão a sumir-se debaixo dos pés. Mas foi por pouco tempo. "Começámos a fazer a nossa equipa multidisciplinar, com especialistas do Porto, de Lisboa, de Coimbra, e quando elas tinham 4 anos fomos para Cuba. Se houve negligência? Os médicos encobriram-se uns aos outros. O processo do dia do nascimento delas desapareceu."

Nos três meses e meio que estiveram em Cuba, Joana melhorou em termos cognitivos a olhos vistos: já falava espanhol, conhecia as cores. Mas desde cedo que Joana começou a falar. "Aos 2 anos, dizia otorrinolaringologista." Os pais nunca se resignaram e quando Joana andava no 6.º ano foram a Düsseldorf, na Alemanha, para as duas irmãs fazerem um autotransplante de células estaminais.

O percurso escolar foi sempre bem-sucedido, com boas notas. Mas nem sempre foi fácil. Ainda não é fácil. Falta-lhe a liberdade de poder andar. "De poder ir à discoteca, de não ter de pedir ajuda no comboio ou nas escadas, de não ter de pedir ajuda para ir à casa de banho, para aquecer a comida." E os pensamentos que às vezes "não são os melhores", diz Joana Nunes.

"Já pensei que a culpa de estar assim era minha. E da minha irmã também." Porquê? "Pensamentos maus existem sempre, mas temos de lutar contra isso."

"Em criança perguntava o porquê de isto me ter acontecido, de ser como era. Mas na adolescência foi mais complicado, tinha menos amigos. Quando era pequena, as outras crianças estavam sempre a puxar-me para cima, convidavam-me para onde fossem. Na adolescência isso deixou de acontecer, afastaram-se de mim... Comecei a ser mais recatada, mais reservada. Mas não me sentia sozinha. Tinha um ou dois amigos. A amizade é o mais importante que se pode ter. A vida não é preto e branco, o lado bom e o lado mau. Temos de tirar das pessoas o lado bom."

É verdade que quem viveu toda a sua existência numa cadeira de rodas se deparou com o preconceito. Às vezes os olhares não são de pena, até são do género "como é que esta rapariga consegue?" Mas incomodam. Porque se há coisa de que tem a certeza é de que consegue fazer tudo aquilo a que se propõe. Não começámos por dizer que já saltou de paraquedas e que se andou a baloiçar no vazio?

E é essa Joana que predomina, a Joana com boa vibe, que passa boas energias através dos vídeos que posta no seu canal. "O meu objetivo é sempre passar uma mensagem positiva."

Foi este pensamento que norteou a escolha do curso universitário. "Sempre quis ser psicóloga para ajudar a pessoas no sentido de não terem tão maus pensamentos como eu já tive, tantos complexos como eu já tive. Sempre quis compreender as pessoas. Tentei durante um ano e meio mas não consegui..."

Não foi um período fácil o da faculdade. Não era o trajeto de comboio entre Palmela e o Pragal porque esse já faz tranquilamente, nem sequer o facto de estar nas aulas e ter de pedir que a levassem ao WC. "Uma auxiliar da faculdade chegou a dizer-me 'não te levo à casa de banho porque não quero', mas não foi por causa da casa de banho que deixei a faculdade..." A verdade é que Joana não estava a rever-se no curso, entrava em stress e quando entra em stress bloqueia.

Até que descobriu uma grande paixão: o vídeo. Tirou um curso de edição de vídeo na Lisbon School of Design e diz ter encontrado a sua vocação. "Estou feliz, percebi o que queria fazer. A edição é uma espécie de arte. Escrevemos uma história, podemos criar imagens e manipulá-las para fazer essa história..."

O sonho é trabalhar num estúdio, fazer aquilo de que gosta. Com uma certeza: ser sempre exigente consigo própria. "Tenho de ser sempre a melhor." Ao contrário da faculdade que a bloqueava, a edição puxa-lhe pela criatividade.

A extensão da sua liberdade

Em janeiro, um anjo da guarda entrou na vida de Joana Nunes. Tecnicamente é uma assistente, mas Marina Torres apresenta-se como "a extensão da liberdade da Joana". Passam juntas entre quatro e seis horas por dia, ao abrigo do CAVI (Centro de Apoio à Vida Independente), que foi proposto a Joana pela APPACDM.

Marina acompanha Joana a todas as suas atividades - ao ginásio, à fisioterapia, às aulas de código, leva-a à casa de banho... Ainda foi com ela um mês à faculdade e levou-a a Lisboa durante os três meses do curso de edição de vídeo. Explica-lhe como se vai para aqui e para li, mostra-lhe os caminhos. Em suma, ajuda-a ser mais independente.

Só há uma coisa que Marina deixou claro desde o início. "Não faço atividades radicais, tem de ser uma escolha minha." E sabendo como é Joana, um dia destes teria de estar a atirar-se no vazio... Mas as atividades que Joana ainda sonha fazer são mais calmas - surfar e nadar com golfinhos.

Daqui já nasceu também uma relação de amizade. "Só temos uma verdade: a condição para estarmos bem com alguém é através do respeito, da amizade. Temos muitas coisas a aproximar-nos. Porque também é extremamente difícil. As coisas boas não são fáceis", afirma a assistente. E, para além das 20 horas que o contrato determina, acabam por estar mais tempo juntas, Marina vai à casa de Joana, vão à praia...

"A Joana ensina muito aos outros. Estamos no mundo para amar e ser amados. E ela ensinou-me a ser carinhosa, a mimar os outros. É tão bom ser simples e dizer 'amo-te princesa' Dizia-me e fazia-me confusão... Ainda estou em aprendizagem. Eu mostro-lhe os caminhos físicos e ela mostra-me os caminhos interiores, as emoções."

A mãe de Joana e de Inês está sempre lá, a acompanhar o percurso da filha, quantas vezes sem ser vista. Como quando Joana fez a excursão de finalistas a Paris e os pais seguiram o mesmo percurso paralelo, sem ela saber. "Sou mãe galinha, mas a cinco metros atrás. O que eu quero é que ela seja feliz!"

Fonte: DN

quinta-feira, 27 de agosto de 2020

Pais de crianças com doenças crónicas temem regresso presencial às aulas e pressionam médicos

O presidente do Colégio de Pediatria da Ordem dos Médicos revela que os médicos estão a ser pressionados pelos pais das crianças com doenças crónicas para passarem declarações a atestar que as crianças têm de ter ensino à distância.

"Os médicos têm sido solicitados a emitir declarações a dizer que as crianças que têm doença crónica e, como tal, não podem frequentar o ambiente escolar, que têm um risco enorme e que exigem que sejam as autoridades a fornecer os meios técnicos para seguir as aulas em casa", adianta Jorge Amil Dias (...).

Jorge Amil Dias pede que as autoridades de saúde intervenham, publicando uma orientação clara para estes casos: "Precisamos que o Ministério da Saúde, a Direção-Geral da Saúde, em colaboração com a Ordem dos Médicos, emita alguma recomendação ou alguma lista das situações que tipicamente configuram um risco especial e que nos ajudem a tranquilizar os pais em relação a isso."

Caso contrário, argumenta, "vamos da parte dos pais deixar alimentar um pânico tremendo e da parte dos médicos colocá-los numa situação insustentável de exporem o menino que, por um azar da vida, possa vir a ser contagiado e a culpa foi do médico que se recusou a emitir a declaração".

Amil Dias sublinha que a maioria das doenças crónicas nas crianças não representa um risco acrescido para a Covid-19, mas há casos que podem merecer uma proteção especial, como é o caso das crianças que necessitam de usar uma traqueostomia (orifício artificial criado cirurgicamente), por terem "menos áreas de proteção da mucosa, menos superfícies de resistência".

Fonte: TSF por indicação de Livresco

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

“Normas da DGS ignoram completamente o desporto para deficientes”

O Comité Paralímpico de Portugal (CPP) considerou esta quarta-feira que as normas divulgadas pela Direcção-Geral da Saúde (DGS) para a retoma de parte da actividade desportiva “não respondem às necessidades” e ignoram o desporto para pessoas com deficiência”.

“As normas ignoram completamente o desporto para deficientes, a maioria das quais estão em grupos de risco”, afirmou o presidente do CPP, José Lourenço, (...) lamentando que o documento divulgado na terça-feira pela DGS “não faça qualquer menção ao desporto adaptado”.

José Lourenço lembrou que as normas que agrupam as várias modalidades tendo em conta o risco de contágio do novo coronavírus não consideram qualquer modalidade adaptada, dando como exemplo o boccia, o goalball e o râguebi em cadeira de rodas, que estão sob a alçada da Federação Portuguesa para Pessoas com Deficiência.

O presidente do CPP entende também que o documento “não é nada explícito” no que se refere às modalidades que estão sob a alçada das federações de modalidade.

“O andebol ou o basquetebol em cadeira de rodas são, naturalmente, diferentes da modalidade praticada por pessoas sem deficiência”, afirma, reiterando: “Não há preocupação com o grupo de risco que é o das pessoas com deficiência.”

O líder do movimento paralímpico considerou que, além de não responderem às necessidades do desporto, as normas “colocam em causa a viabilidade do próprio desporto, porque as camadas jovens e de formação não são contempladas”.

“Admitimos que possam existir muitos atletas que vão deixar a prática desportiva e trocá-la por outras actividades”, afirmou, lembrando que “no desporto para pessoas com deficiência o recrutamento é muito difícil”.

José Lourenço alertou também para o problema dos custos dos testes à covid-19, previstos pela norma, em função do grupo de risco no qual a modalidade se encontre inserida.

“Não foram dados apoios extra e agora os clubes e associações ainda se vêem confrontados com os custos elevados, tendo em conta a cadência de testes que é expectável que se faça”, sublinhou, lembrando que o “movimento associativo é feito, na sua maioria, de gente voluntária”.

Perante o que considera ser “um documento que não responde às necessidades”, o CPP defende uma “classificação urgente da norma” e a “criação de uma linha de apoio que permita que os clubes possam assegurar os testes, sem nunca descurarem a saúde”.

A DGS actualizou na terça-feira as normas para a retoma das competições de modalidades desportivas colectivas, incluindo o râguebi e os desportos de contacto no grupo de alto risco.

A actualização das normas permite a retoma de modalidades como o futebol não profissional, andebol, futsal, basquetebol, voleibol e hóquei em patins, encarregando as federações e os clubes de avaliarem o risco de contágio de covid-19 e de “elaborar um regulamento específico para a prática desportiva, em contexto de treino e em contexto competitivo, de acordo com a estratificação de risco da modalidade”.

Fonte: Público

Estudo da Deco revela famílias pouco satisfeitas com ensino a distância no 1.º ciclo

Apenas três em cada dez pais inquiridos num estudo da Deco (Associação Portuguesa para a Defesa do Consumidor) se manifestaram satisfeitos com o ensino à distância no 1.º ciclo e a maioria revelou que os filhos tiveram saudades da escola durante o confinamento.

Segundo um inquérito realizado pela associação de defesa do consumidor no final de Junho, a maioria dos 537 pais inquiridos não avaliou de forma positiva o novo modelo de ensino imposto pela pandemia da covid-19.

Em meados de Março, o Governo decidiu encerrar todos os estabelecimentos de ensino, como forma de conter a propagação do novo coronavírus, e todos os alunos, desde o pré-escolar ao ensino superior, foram para casa.

No caso do ensino básico, as crianças não puderam regressar à escola e o 3.º período foi passado à distância, com aulas online e os professores num ecrã.

Para alguns pais com filhos no 1.º ciclo, o novo modelo de ensino foi pouco satisfatório e os 537 encarregados inquiridos pela Deco atribuíram uma classificação média de 5,8 numa escala de 0 a 10.

Segundo os resultados divulgados esta quarta-feira pela associação, o apoio prestado às crianças com necessidades educativas especiais foi aquele que mereceu por parte das famílias uma avaliação mais negativa (2,5 em 10), sendo que apenas 5% dos pais referiu a realização de algum trabalho neste sentido.

Entre os aspectos menos satisfatórios, os encarregados de educação referiram também as tarefas propostas pelos professores e as aulas por videoconferência com outros docentes além do titular.

Por outro lado, as aulas por videoconferência e os vídeos gravados pelo professor titular foram os aspectos positivos mais referidos, seguidos das aulas televisivas na RTP Memória e do apoio suplementar dado pelos docentes, que mereceram uma avaliação média de 5,8 e 5,5 em 10, respectivamente.

Saudades da escola e dos amigos

Da parte das crianças, a experiência do ensino a distância parece não ter sido particularmente positiva e se as saudades das escolas e dos amigos se fizeram sentir pela maioria, a facilidade em acompanhar as actividades foi pouca.

De acordo com os resultados do inquérito, só um quarto das crianças do 1.º ciclo ficou feliz com a mudança e 84% admitiriam sentir saudades da escola, enquanto 91% manifestaram o mesmo sentimento em relação aos colegas.

Por outro lado, apenas um terço dos alunos teve facilidade em concentrar-se durante as aulas online, a que assistiram durante o 3.º período em casa maioritariamente através do computador, e em trabalhar de forma autónoma com as plataformas digitais.

Ainda assim, a maioria (81%) realizou todas as tarefas propostas que, segundo 40% dos pais, foram em maior quantidade em comparação com aquilo que os professores propõem habitualmente, mas apenas metade conseguiu fazê-lo sozinho.

No total, 72% dos pais referiram, por isso, que os filhos precisaram de ajuda suplementar, sobretudo para esclarecer dúvidas durante o estudo autónomo, mas também com explicações sobre a matéria e orientação para seguir o plano de aulas diário.

Cerca de metade dos encarregados admitiu ainda que a aprendizagem em casa foi mais difícil para as crianças que, na sua maioria, se manifestaram preocupadas com a avaliação final.

O próximo ano lectivo arranca entre 14 e 17 de Setembro e nessa altura os alunos já poderão regressar à escola e ao ensino presencial, que será o regime presencial durante os três períodos lectivos. Caso a situação epidemiológica volte a empurrar os alunos para casa, a prioridade será para manter, sempre que possível, os 1.º e 2.º ciclos nas escolas.

Fonte: Público

Nota: Destacado pelo autor do blog

terça-feira, 25 de agosto de 2020

“Quero tornar a Língua Gestual Portuguesa acessível a todos”

Derrubar barreiras. Criar laços. Facilitar a comunicação. Integrar. São algumas formas de definir o que é a Língua Gestual Portuguesa (LGP). Com apenas 15 anos, António Coito, natural de Rio Maior, decidiu pôr mãos à obra e lançar um projecto que visa tornar a LGP numa língua “acessível a todos”. Chamou-lhe ‘’LGP para todos’’ e consiste na disponibilização de vários recursos (gratuitos) que permitem aos interessados adquirir alguns conhecimentos básicos sobre esta forma de expressão, reconhecida enquanto língua da comunidade surda portuguesa, pela Constituição da República em 1997.

Em que consiste o projecto ‘’LGP para todos’’?
Este projecto consiste num conjunto de vídeo-aulas produzidas por mim, que contém conteúdos dedicados à aprendizagem de Língua Gestual Portuguesa, que são apoiadas de recursos, nomeadamente, fichas de síntese e fichas de consolidação de conhecimentos que reforçam os conteúdos leccionados em cada uma das aulas. Este projecto é 100% gratuito. No site onde se encontram os recursos, existe ainda um local dedicado a dúvidas, onde qualquer pessoa pode expor a sua dificuldade, partilha ou opinião. Tenho dois cursos de formação, mas não sendo profissional na área, tentarei responder com o conhecimento que tenho, afim de garantir que a informação que é transmitida é correcta e objectiva. As aulas são publicadas às quartas-feiras e sábados no meu canal do Youtube (António Coito), no meu website (https://lgp-para-todos.webnode.pt/) e, ainda no meu perfil de Facebook (António Coito).

Porque razão decidiu lançar um projecto deste tipo?
Avancei com esta iniciativa no sentido de tornar a LGP uma língua acessível a todos e de despertar a curiosidade da população em geral. Sinto que há a necessidade de haver conhecimentos básicos sobre a Língua gestual portuguesa, porque, na verdade trata-se da língua materna da comunidade surda e, numa era em que se trabalha no sentido de incluir tudo e todos, creio que seja fundamental a sua aprendizagem. Assim sendo, lancei o projecto ‘’LGP para todos’’ que dispõe de vários recursos (gratuitos) que permite adquirir alguns conhecimentos básicos, mas importantes para conseguir comunicar com alguém que seja surdo.

Quando começou o seu interesse pela LGP?
Talvez seja uma questão que não tem um tempo certo. Todos nós, quando éramos pequenos, jogávamos o jogo da mímica. Para mim, esse jogo sempre despertou muito interesse, uma vez que a partir da nossa criatividade, tínhamos de explicar um dado objecto ou assunto, apenas com gestos. Mas, o acontecimento que fez com que ficasse com interesse em aprender, deu-se em Novembro de 2019, no decorrer de uma viagem à Sicília, no âmbito do projecto ‘’Erasmus+’’. Contactei com uma professora finlandesa que era surda e, acompanhavam-na duas intérpretes. A partir daí, aprendi e percebi que cada país tem a sua língua gestual, não sendo esta uma língua universal. Quando se deu o confinamento, face ao agravar da pandemia, encontrei uma notícia da RTP Ensina que publicitava uma escola virtual de LGP, desenvolvida pela Associação de surdos do Porto, que dava algumas bases gratuitamente. Desde então, já tirei mais um curso de nível iniciação e, agora, encontro-me num curso de nível intermédio.

Como vê o papel do intérprete de LGP na comunidade surda?
A meu ver, os intérpretes de LGP são verdadeiros heróis. Para muitos de nós, passa um pouco ao lado, o facto de haver ‘’a senhora dos gestos’’ no telejornal. Mas, a realidade é que com o agravar da pandemia em Portugal, todos nós percebemos que a sua missão é muito importante e, mesmo que o país pare, os intérpretes também asseguram serviços mínimos à população. Há ainda um longo caminho pela frente, mas o mérito da luta diária destes profissionais que fazem elo de ligação entre a comunidade ouvinte e a comunidade surda, ninguém lhes pode tirar.

Considera importante a população em geral ter conhecimentos básicos de LGP?
Considero fulcral. Imagino muitas vezes a angústia das pessoas surdas. Todos nós temos a ambição de sermos independentes quando crescemos, porém, com esta limitação, no nosso país, tornasse impossível. Quando nos deslocamos a um serviço, seja ele qual for, a sua maioria não tem ninguém que saiba língua gestual. É chato andar sempre com o papel e com a caneta. Seria muito mais fácil se todos nós tivéssemos conhecimentos básicos e, assim conseguiríamos comunicar alguma coisa.

Acha que há interesse por parte da comunidade ouvinte em aprender LGP?
Por experiência própria, e pelo aquilo que tenho ouvido, vindo das pessoas que me têm acompanhado, é que a LGP lhes desperta muito interesse, e eu acredito nisso! Porém, acredito que não seja muito fácil aprender LGP actualmente. Não se encontram muitos cursos disponíveis, as pessoas têm os seus empregos e têm pouca disponibilidade, o dia a dia das pessoas é muito atarefado. De qualquer modo, creio que haja muito interesse por parte da comunidade ouvinte em aprender LGP e, por muitos, não é uma hipótese colocada de parte. Desde que iniciei este projecto, recebi inúmeras mensagens de pessoas que fazem intenções de acompanhar as minhas vídeo-aulas, com a finalidade de aprender alguma coisa.

Defende que se inclua a LGP como língua opcional nos currículos escolares?
No meu ponto de vista, os currículos escolares deviam incluir a LGP como língua obrigatória. Muitos defendem, que não devia existir no currículo e, se existisse, deveria ser apenas como língua opcional, uma vez que os alunos é que devem tomar a decisão. Ora, vejamos. Eu, enquanto aluno, entendi que nos últimos anos tem havido uma tendência progressiva de deixar as escolhas nas mãos dos alunos. Acho muito bem, mas há limites! Muitas disciplinas existem no currículo e não são do agrado de todos os alunos. Eu nunca gostei de certas disciplinas, e sempre fui obrigado a tê-las, e depois?!? Foi isso que impediu que eu evoluísse como pessoa?!? Se é obrigatório ter aulas de línguas estrangeiras, porque não ter aulas de LGP obrigatórias, dado que é uma das 3 línguas de Portugal. E mais, numa era em que se defende a educação inclusiva, não se faz nada para incluir da forma mais adequada. Não é a colocarem os alunos com limitações, sejam elas quais forem, com os alunos ditos ‘’normais’’ dentro de uma sala, que os estão a incluir. Aliás, há testemunhos de pais que dizem que os filhos se sentem mais intimidados e constrangidos quando estão inseridos nas aulas de turma com os colegas. Trata-se de integração, mas isso não basta! Estão a incluí-los se prepararem as pessoas que fazem parte da comunidade no sentido de conseguirem comunicar com aqueles que têm problemas e lhes darem formação e bases para conseguir ter uma vida digna e minimamente independente.

Em outros países, nomeadamente nos EUA, o ensino da LG está difundido e divulgado como uma língua para todos. Em Portugal aparece quase como exclusiva da comunidade surda. O que acha que pode ser feito para mudar esta realidade e sobretudo a mentalidade das pessoas?
Em primeiro lugar, todos os programas televisivos, novelas, filmes, músicas, entre outros, deviam ter interpretação de LGP, uma vez que não é justo os membros da comunidade surda terem de assistir aquilo que está acessível e não aquilo que gostavam de ver e que vai de encontro dos seus interesses. Sempre ouvi dizer que todos nós temos o direito de ter os nossos gostos e preferências, mas não me parece que se aplique à comunidade surda, infelizmente. Em segundo lugar, devia ser incutido através de palestras e eventos de carácter informativo, a importância da LGP para a comunidade surda. Em terceiro lugar, valorizar e disponibilizar meios/formas de ensino de LGP quer para os jovens que se encontram na escola, quer para os adultos que se encontram no activo.

Como foi a experiência no programa #EstudoEmCasa, em articulação com os professores da sua escola e a RTP Memória?
A experiência no programa #EstudoEmCasa foi sensacional. Fez-me crescer como pessoa e como ser humano. Inicialmente, tive alguns receios, mas depois tudo decorreu com normalidade. Para além de ter desenvolvido e trabalhado certas competências, vivi uma nova experiência, contactei com o mundo televisivo e, por coincidência, com algumas intérpretes de LGP que também se encontravam num trabalho árduo com os professores, no sentido de garantir o ensino a todos. Todo este projecto fez-me perceber que mesmo que o mundo pare, o ensino será sempre uma das maiores prioridades, seja em que altura. Há a necessidade de respeitar mais aqueles que garantem o ensino dia após dia. Talvez, para muitos, tenha sido um ‘’abre olhos’’.

Fonte: Correio do Ribatejo por indicação de Livresco