Iniciado o ano letivo, já há pais preocupados com as dificuldades que os filhos têm na escola. Mas todos podem ser bem sucedidos, garante este especialista em educação. O segredo é mudar de hábitos. E ganhar serenidade. Porque a inteligência não falta a ninguém.
Para estudar bem, há que aprender a fazê-lo primeiro. Qual a fórmula para se conseguir melhores resultados e a motivação dos estudantes?
Sabemos hoje muito acerca de como funciona a cabeça e o coração do ser humano, de modo que só temos de aplicar isso à escola para os estudantes alcançarem o êxito que procuram evitar quando temem o fracasso. Um fracasso que faz, inclusive, muitos sofrerem para lá do âmbito escolar. Os resultados dependem mais do tipo de esquemas que são feitos e de como se memoriza: como se comprime o que há para aprender e como se expande a informação durante um exame. Todos podem aprender a técnica. Também importa motivar de maneira diferente, com base na verdade e no presente. Já não serve dizer «tu consegues, mostra o que vales», porque isso apenas cria ansiedade e nova oportunidade de fracassar, a quem já tem a experiência do fracasso, diante da expetativa de um adulto que teme dececionar outra vez. O resultado é rapidíssimo porque o ser humano funciona bem, aquilo que falha é o sistema educativo.
Todas as crianças têm os «ingredientes» para obter bons rendimentos?
Todos os estudantes têm recursos suficientes para mudar as notas e atingir os objetivos desde que aprendam a fazê-lo e encontrem forças para isso. Todos são fantásticos carros de Fórmula 1 a precisar que os tirem da garagem, os ponham a correr e lhes ensinem os passos a dar e como começar, abastecendo-os de combustível – a motivação autêntica. Conheci milhares de crianças e nenhuma era incapaz de muita coisa. Muitas vezes chamamos preguiçosos a meninos inteligentes que, ao crerem que não terão êxito, se recusam a iniciar um esforço e que, ao não fazê-lo, acreditam ser incapazes. Ao fim e ao cabo, a capacidade é a soma da necessidade de algo e o esforço para consegui-lo. Quando nós próprios sentimos essa necessidade e nos esforçamos, tornamo-nos capazes. É fácil confundir preguiça com inibição quando alguém receia o fracasso.
Como se explica, então, a elevada taxa de insucesso escolar?
Os resultados escolares dizem-nos que devíamos mudar, e muito, o nosso sistema de ensino. Alterando as formas de avaliar, estimular e motivar os conteúdos, teríamos uma educação mais inteligente, humana, pessoal e emocional e fomentaríamos a criatividade e a imaginação, fundamentais no processo de criação dos génios das ciências e letras.
Os mesmos estudantes iriam sobressair nessas circunstâncias?
Sem dúvida. Critico muitas vezes o facto de não aprendermos a ler completamente. Se dedicássemos a educação primária, sobretudo até aos 10 anos, a aprender a ler melhor, a expressar-nos, a refletir, a calcular, a observar, a escutar, na secundária todos teriam muito melhores notas, e depois também nos estudos universitários. A escola está feita para o hemisfério esquerdo do cérebro, que é lógico, sequencial, analítico, e exclui da avaliação o hemisfério direito, o da intuição e imaginação. Se um professor não se esforça por atender todas estas variações, personalizadamente, acaba por dar aulas somente a cinco ou seis crianças em vinte. Mas eu sou um apaixonado por fazer o que está na minha mão. Enquanto o sistema não muda, podemos fazer muita coisa.
Motivação + método = êxito? Qual é a grande missão dos pais e professores? Porque vemos com frequência que desejar algo não basta para alcançá-lo…
Desejar algo não é consegui-lo, mas é o início. Os educadores têm de saber que se já temos em nós os recursos cerebrais para podermos estudar, e há hábitos que fomentam isto (a motivação), e sabem quais são os primeiros passos eficazes para começar e, depois, quais são os mais eficazes para seguir caminho (o método), então o êxito é inevitável. Todos os anos conheço mais de sete estudantes que passam de uma média de cinco negativas para uma média de excelente em apenas um mês. Outros necessitam do curso inteiro. Mas todos conseguem chegar lá, desde que encontrem a motivação suficiente e o método adequado ao seu caso pessoal.
A escola está concebida ao contrário do que devia ser? Temos um sistema puramente avaliativo, em que apenas importa o resultado dos testes?
Parece sempre que importa mais responder a uma lista de questões – respostas sabidas a perguntas sabidas, usando só a memória, com pouca ou nenhuma reflexão – do que o saber. O protagonismo devia ser canalizado para cada aluno e respetiva aprendizagem. Um professor é professor de uma classe de 25 alunos quando consegue que todos aprendam e lhes concede serem criativos num exame. Foi a imaginação que permitiu a Einstein formular as suas teorias da física ou a Steve Jobs criar a Apple. Somos com frequência escravos de uma média numérica, do passado de um aluno, e não aplicamos nas aulas o muito que sabemos sobre comunicação, sobre afetividade humana e o modo como ela influencia o rendimento. Sobre como unir o persuasivo ao argumentativo, como faz a publicidade.
Como se muda a forma de conceber os estudos?
Pondo em prática o que sabemos da psicologia, da pedagogia, da neurociência, da comunicação, da arte, da filosofia, da publicidade, da sociologia e também dos modernos avanços da matemática, da linguística, da linguagem e sua pedagogia. A maior alegria que um filho pode dar aos pais não é, à partida, a caderneta com boas notas, e sim o amor, a gratidão, a correspondência, a satisfação de vê-lo crescer livre, bom, são, equilibrado, feliz, capaz de gerar felicidade à sua volta. Disto quase não se fala, parece que é de menor importância. Quando estudar e aprender se torna agradável, gera motivação e a motivação faz que o estudo seja ainda mais eficaz.
Aquilo que deseja para os seus filhos é que sejam felizes, mais do que estudiosos? Todos os pais sentem o mesmo?
A inteligência, a aprendizagem e os estudos são meros meios para alcançar algo importante: a felicidade. Todos os pais querem que os seus filhos sejam felizes. No entanto, nem todos fazemos o que está ao nosso alcance para facilitar essa aprendizagem. Não os ensinamos a descobrir o extraordinário que existe no comum (organizando bem o Natal e os aniversários, por exemplo). Não os ensinamos a superar os seus próprios obstáculos evitando sobreprotegê-los, o mal educativo mais generalizado. Não os ensinamos que tudo na vida tem consequências, incluindo o positivo, nem os ensinamos com o nosso exemplo a estimar sem esperar nada em troca.
Tem oito filhos com idades entre os 4 e os 19 anos. Todos são capazes, seguros diante de uma prova?
Absolutamente. Os resultados deles confirmam-no. Talvez porque nem a eles nem a nós, pais, importam os resultados académicos nos exames. Eles são valiosos, as notas excelentes que tiram são o menos valioso que têm. Os filhos julgam que os estudos são o mais importante para os pais porque é isso que provoca a maior parte das discussões e das conversas, quase sempre de forma mais negativa do que confiante. Sentem ser isso o que mais influencia a relação entre eles e, à medida que acumulam experiências dos seus fracassos, assumem que com os estudos fracassa também a relação com os pais. Acabam todos por se distanciar e culpar-se uns aos outros, num círculo vicioso.
Recomenda que os pais acompanhem os filhos nos trabalhos de casa? Até porque é em casa que a criança aprende mais coisas, no âmbito doméstico, com os pais e os avós…
É bom estarmos com eles, mas sem sermos nós a fazer-lhes os deveres. A criança pede frequentemente para realizar as tarefas com alguém por perto para evitar sentir saudades, mais do que por motivos estritamente escolares. Devíamos ir retirando essa ajuda para a tornarmos mais autónoma: ficarmos de pé, em vez de nos sentarmos ao lado dela; ouvir as suas dúvidas a um metro de distância; sair da divisão a dada altura, ainda que vamos falando com ela; não estarmos sempre ali fisicamente. No fundo, trata-se de orientar os mais novos, assegurando-nos de que sentem ser eles a resolver os seus problemas. Isto alimenta-lhes a confiança, a segurança e a autoestima, algo mais necessário hoje do que imaginamos. É a baixa autoestima que está por detrás daquilo que todos os pais temem que possa acontecer aos seus filhos.
QUEM É FERNANDO ALBERCA?
Mestre em Direção de Centros Educativos, foi professor e diretor de vários centros docentes em Espanha. Especialista em educação, comportamento e aprendizagem de bebés, crianças e adolescentes, é autor de Todas as Crianças Podem Ser Einstein (ed. Planeta), Um Bom Filho Volta sempre (ed. Matéria Prima) e Adeus às Más Notas (ed. Planeta). É um dos escritores espanhóis que mais livros temáticos vendem além-fronteiras.
In: Notícias Magazine por indicação de Livresco
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