quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

Petição Pública - Educação Especial - Intervenção Precoce

Para os interessados, publico o link da petição pública que solicita a abertura de um grupo de recrutamento para Docentes: Educação Especial - Intervenção Precoce na Infância.

quarta-feira, 30 de janeiro de 2019

Os espectros da exclusão

Aqui os servos nós eles senhores
aqui ficamos nós aqui levantam voo não
os aviões mas certas aves de arribação
Ruy Belo

Em 1933, projeta-se Zéro de Conduite: jeunes diables au collège. É um poderoso manifesto visual contra os ambientes escolares repressivos e anacrónicos. A mensagem fílmica centra-se na revolta dos alunos contra o cosmos asfixiante de uma escola; o espírito que anima os adolescentes é justamente reivindicar a liberdade: “Liberdade ou Morte! A nossa bandeira deve ser desfraldada!” – gritam entusiasmados os escolares. A curta-metragem incorpora o registo autobiográfico de Jean Vigo, mas insere-se num período fértil de intensa e premente reflexão pedagógica em que fervilhava a possibilidade de mudar o mundo reinventando a escola e, para além de circunstanciais eventos, este documento é uma homenagem a todo um universo de pedagogos que, em face dos severos contrastes sociais, sempre se preocuparam na reconstituição da sociedade sem claudicarem do significado da dignificação da dimensão educativa, expurgando as injunções simbólicas das comunicações monológicas. A génese dos movimentos que ousaram inventar espaços educativos também está presente, por contraste, nesta marcante película.

Os tempos traumáticos da primeira refrega mundial questionaram a essência da escola e a carnificina de uma juventude deslocada abruptamente para o teatro de guerra evidenciou um inventário de temas existenciais e ruturas sociológicas que ultrapassava as inócuas estéticas de realismo emocional. Investiu-se na construção da paz através de uma educação nova capaz de dinamizar as gerações futuras para um espírito de cooperação e solidariedade; educar significava procriar um clima de liberdade e de harmonia como o garante da emancipação e a génese de um adulto melhor. Esta aventura teve inúmeros protagonistas, assumindo as escolas novas a autonomia, a educação mista, a aprendizagem pelos sentidos como as suas grandes missões. O contacto com a natureza e o desporto também estiveram presentes. Os tempos mudaram drasticamente e as ideologias totalitárias dos anos 1930 cercearam a gradual disseminação de um novo paradigma educativo. O confronto foi inevitável e vertiginosamente o declínio foi uma consequência, surgindo posições que se centraram numa educação para as elites, em detrimento da sua generalização pelas classes populares. A liberdade de aprender cedeu à introdução de uma disciplina física e simbólica; o combate pelo progresso humano foi-se dissipando em redutos centrados com religar o sentido da humanidade.

No entanto, a herança destes movimentos perdura e assume-se como uma via de ressurgimento de perspetivas pedagógicas e sociais que possam configurar alternativas nos tempos presentes.

A evolução recente das sociedades origina transformações de amplitude inusitada que indiciam uma absoluta incomodidade e fratura sociais. Fenómenos como o fecho de fábricas, o aumento do desemprego e da precariedade, os salários baixos e a multiplicação de horários atípicos, o nascimento do submundo das empresas de trabalho temporário, e o cortejo de múltiplas humilhações quotidianas, são uma constante. A paisagem urbana é angustiante e as periferias das cidades são desoladoras e anódinas. O desmantelamento mundo rural origina fenómenos de desmoralização e o tendencial afastamento dos centros de decisão. A dessincronização dos ritmos profissionais e familiares é uma realidade preocupante em concomitância com a reconfiguração das mesmas e um acentuado envelhecimento das sociedades. As sociedades representam-se numa dualidade que é também extensível ao território: o rural e os de baixo são o corolário de um crescimento económico impessoal e sedutor nas suas ilusões, ocultando os dramas e o sofrimento sociais. A escolarização tem um lugar crescente nas famílias, mas os destinos sociais, mesmo nos países igualitários, estão marcados pelo desmoronar da escola como veículo de “ascensão meritocrática” (Didier Eribon) e a mobilidade social é pautada pela crescente desvalorização dos lugares sociais de chegada para as classes populares, continuando, contudo, os “santuário da elite educativa” a reproduzir e a reduzir as questões essenciais (como sejam a educação e a cultura) a meras questões técnicas, encobertas por um discurso que reedita o a-histórico, abstrato e ideológico Homo economicus, em versões que os “missionários do vazio” (Leonard Cohen) se encarregam de matematizar e especular teoricamente, legitimando politicamente as desigualdades sociais como um inexorável destino, reduzindo a questão social a números e classificações, em simultâneo com a regressão das instituições a meras gestoras burocráticas de populações excluídas de apresentar os seus problemas, como admiravelmente denuncia Ken Loach no filme I, Daniel Blake (2016).

Fenómenos como o abandono escolar, o absentismo ou o homeschooling, entre outras modalidades de rejeição da escola, interpelam drasticamente o mundo educativo contemporâneo. A dimensão histórica destes fenómenos impõe que se indaguem, quer as justificações, quer as significações, que ao longo do tempo (em diferentes escalas e contextos socioeconómicos) foram assumindo tais manifestações (ou seja a sua génese e visibilidade) e a correlação dessas práticas com a centralidade da escola (generalização da escolaridade obrigatória bem como do seu prolongamento temporal) e as convulsões do mundo social. Impõe-se um exercício reflexivo em que se identifiquem as dimensões de resistência à escola – que a partir do século XIX se esboçaram, contrastando com uma retórica e empenho liberais ou o patrocínio dos movimentos filantrópicos, religiosos ou políticos, a favor da educação –, e à escolarização – que necessariamente não significa rejeitar o princípio, mas sim questionar uma certa forma de escola (e que presentemente se pode assumir como resistência ao aumento da escolaridade) – o que permite compreender a criação de escolas ou de dispositivos educativos alternativos ou enveredar por práticas autodidáticas. Merecem atenção particular dois tipos de fenómenos: por um lado, reconstituir a história de todas as populações excluídas ou recusadas pela escola, que não se circunscreveram só aos deficientes ou delinquentes; e, por outro lado, impõe-se uma história das interpretações psicológicas ou das explicações dos professores sobre o absentismo escolar para que se possam entender as razões desta modalidade de recusa da escola. A exploração destes eixos proporciona reinventar uma escola democrática capaz de fazer face aos confrontos que a assolam e que não são somente pedagógicos ou didáticos, são-no fundamentalmente de ordem social, impondo aos professores e educadores práticas inovadoras que sejam ocasião tanto para a mudança de métodos quanto uma reconfiguração da instituição. A quotidiana criação de modalidades pedagógicas de luta contra o abandono escolar permite prefigurar uma mutação na profissão e protagonizar a revolução silenciosa da escola, não ocultando as dimensões da ação pública face à crise da educação, que objetivamente reflete uma crise da sociedade.

José António Afonso

Professor Auxiliar do Instituto de Educação da Universidade do Minho e Investigador do Centro de Investigação em Educação (CIEd)

Fonte: Público

terça-feira, 29 de janeiro de 2019

Escola da Póvoa de Varzim usa plantas para integrar crianças com necessidades especiais

Uma escola da Póvoa de Varzim está a usar o cultivo de plantas e a jardinagem como forma de dotar 27 alunos, que beneficiam de ensino inclusivo, de melhores competências académicas e sociais.

O projeto nasceu há alguns anos no Agrupamento de Escolas Campo Aberto, na freguesia de Beiriz, com a criação de uma horta pedagógica, mas agora evoluiu para uma estufa, oferecida por uma empresa, onde o grupo de crianças com necessidades especiais é responsável por cuidar de várias plantas.

A intenção é que, com esta atividade, os alunos com idades entre os 10 e os 19 anos aprendam práticas de sustentabilidade, desenvolvam conceitos básicos de matemática, ciências, português e inglês, e, sobretudo, promovam relações interpessoais.

"É uma atividade mais prática, num trabalho que poderá significar, no futuro, uma empregabilidade e até autonomia enquanto adultos. É algo mais próximo do real, mais apelativo e motivador para a aprendizagem", explicou Gracinda Cadilhe, coordenadora de educação especial do agrupamento escolar.

A docente lembrou que muitos dos alunos integrados no projeto "sofrem de perturbações do espetro do autismo, que precisam de espaço para expandir energia, e onde possam tocar, sentir e cheirar".

"O ensino tem de ser diferenciado e proativo, respeitando a individualidade e a necessidade da cada um. Colocar estas crianças a sentir e trabalhar na estufa ou na horta, ajuda-as a descobrir de onde surgem as coisas. Hoje, onde tudo é muito digital, é importante voltar à terra", analisou a coordenadora.

Na nova estufa, com cerca de 80 metros quadrados, as crianças estão a cuidar de plantas que, no futuro darão mirtilos e framboesas, desenvolvendo a perceção que, ao produzirem, vão receber o retorno do seu trabalho e esforço.

"Sinto que com estas atividades há uma clara evolução destas crianças. Muitas chegam pouco amadurecidas e pouco autónomas, mas vão desenvolvendo as suas capacidades sociais e melhorando competências de conteúdos nas várias disciplinas que leccionámos na sala de aula", garantiu Gracinda Cadilhe.

Já o diretor do Agrupamento de Escolas Campo Aberto garantiu que estes projetos desenvolvidos no estabelecimento de ensino "apostam numa política educativa inclusiva, trabalhada com vários parceiros da comunidade local".

"Neste caso, com o apoio da empresa Cotesi, do Grupo Violas, que nos ofereceu a estrutura, conseguimos ter uma estufa maior, com outros recursos, para trabalharmos numa lógica inclusiva e de reforço dos conhecimentos e capacidade dos alunos", vincou João Grancho.

O responsável considerou que, atualmente, os diretores das escolas têm cada vez mais de promover "políticas que possam atender ao perfil dos alunos para que estes tenham sucesso", considerando ser fundamental o "trabalho dos professores e os contributos dos parceiros que possam acrescentar valor para a criação de novos projetos".

"Temos uma ambição grande que a partir desta proposta [da estufa], possamos desenvolver outras. Temos desenhado para o futuro construir um espaço de raiz dedicado a uma cozinha pedagógica, mais ampla, que possa ser usada por todos os alunos da escola", concluiu João Grancho.

Fonte: Público

Aplicação para denunciar falta de acessibilidade recebe mais de 650 queixas em oito meses


A aplicação para telemóvel “+ Acesso para Todos”, da Associação Salvador, recebeu em oito meses de existência mais de 650 reclamações por problemas com acessibilidades, mais do dobro das recebidas pelo Instituto Nacional para a Reabilitação em 2017.

Em declarações à agência Lusa, Joana Gorgueira, do departamento de Gestão de Projetos – Acessibilidades, explicou que a associação criou o projeto “Portugal Mais Acessível”, no qual se insere a aplicação, por sentir que, apesar da Lei das Acessibilidades ter 20 anos, “as mudanças são poucas”.

“A associação tem 15 anos, mas na realidade as mudanças acontecem de forma muito lenta. A maioria dos locais não são acessíveis a cadeiras de rodas. Sentimos que estas modificações não aconteciam e tínhamos de fazer alguma coisa”, justificou.

A aplicação é livre e pode ser instalada por qualquer pessoa, que através dela avalia os espaços em termos de acessibilidade, tendo em conta quatro itens: casa de banho acessível, existência de estacionamento reservado a pessoas com deficiência, entrada sem impedimentos e circulação interna sem obstáculos.

“É uma espécie de ‘tripadvisor’ das acessibilidades”, classificou Joana Gorgueira, referindo-se à aplicação para telemóvel que tem avaliações de restaurantes e hotéis.

Com a aplicação “+ Acesso para Todos” instalada é possível além da avaliação, fazer uma reclamação, que é depois reencaminhada para as entidades competentes, ou seja, o Instituto Nacional para a Reabilitação (INR) e as Câmaras Municipais.

A app foi criada em maio de 2018 e até ao final desse ano recebeu mais de 2.600 avaliações de espaços, entre elas 650 reclamações, feitas pelos mais de 1.800 utilizadores que descarregaram a aplicação.

Números que, entretanto, já aumentaram ligeiramente tendo em conta a utilização feita durante o mês de janeiro e que se poderá traduzir em 1.850 utilizadores, cerca de 2.700 avaliações e à volta de 665 reclamações.

Joana Gorgueira destacou que as mais de 650 reclamações recebidas em oito meses são mais do dobro do total de reclamações recebidas pelo INR em todo o ano de 2017, o que demonstra que a aplicação “tornou-se numa forma fácil de as pessoas denunciarem os sítios que estão em incumprimento”.

De acordo com a responsável, o problema com as acessibilidades persiste porque há falta de fiscalização, uma responsabilidade que está nas mãos do INR e das autarquias, apontando que entre as Câmaras Municipais “são muito poucas as que fazem essa fiscalização”.

Por outro lado, sublinhou, há também muitas exceções à lei, apontando que, por exemplo, os restaurantes com menos de 150 metros quadrados não são obrigados a ser acessíveis.

“Já tivemos casos de sucesso e bons exemplos em que falámos com o restaurante e eles puseram uma rampa amovível e a indicação da existência dessa rampa. Já há soluções que acabam por facilitar a vida de pessoas com deficiência motora”, defendeu.

Joana Gorgueira salientou que as pessoas com deficiência quando saem de casa não sabem de vão encontrar obras, passeios mal rebaixados ou o metro avariado e estes problemas “são o principal fator de exclusão social”, que obriga a que estas pessoas tenham de “demorar horas a planear o seu dia”.

“Se a fiscalização começasse a acontecer, acreditamos que podia haver mudanças”, defendeu, acrescentando que a Associação Salvador acredita que 2019 pode ser um ano de mudança.

O tema da acessibilidade vai ser discutido esta terça-feira num debate promovido pela Associação Salvador, intitulado “Acessibilidades, um dos principais fatores de exclusão social das pessoas com deficiência motora”, no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa.

Fonte: Expresso por indicação de Livresco

segunda-feira, 28 de janeiro de 2019

“Todas as crianças têm potencialidades”

“A Bagos d’Ouro começou com um sonho. Sonho de uma sociedade mais justa, de um Douro mais equilibrado, mais equitativo e, sobretudo, mais inclusivo. Onde todas as crianças tivessem igualdade de oportunidades. Onde as novas gerações tivessem um papel ativo na inversão do ciclo de pobreza e exclusão social através da Educação, a ‘arma mais poderosa para mudar o Mundo”. A apresentação da Instituição Particular de Solidariedade Social, de iniciativa exclusivamente privada, que surgiu em 2010 para promover a educação de crianças e jovens carenciados do Douro, como forma de inclusão social no território, mostra a sua postura. Tem vários projetos, desenvolve uma estratégia de proximidade, um trabalho personalizado junto dos mais novos para acompanhar o seu percurso educativo, social, e familiar, até à entrada no mercado de trabalho. Há aqui um compromisso de longo prazo. Um acompanhamento contínuo, sustentado, persistente. Atento e cuidado. 

A sua área de intervenção abrange seis concelhos do Douro - Alijó, Armamar, Murça, Sabrosa, São João da Pesqueira e Tabuaço – e, neste momento, acompanha 80 famílias, 145 crianças e jovens. E todos têm as suas responsabilidades neste apoio escolar e familiar sistemático. Há planos definidos, objetivos traçados, e caminhos para os alcançar. A Educação é um pilar fundamental para a Bagos d’Ouro, uma forma de reverter o ciclo de pobreza e de exclusão social. Nesse sentido, trabalha em parceria com várias instituições e empresas, tem uma metodologia de intervenção dentro e fora das quatro paredes, e envolve todos os intervenientes: crianças, jovens, famílias, escolas, comunidade. Um trabalho direto com pais, professores, voluntários e parceiros sociais locais. Os agentes imprescindíveis em todo este processo.

O trabalho é vasto e inclui várias vertentes. Vocações, competências pessoais e sociais, hábitos de leitura, empreendedorismo, empregabilidade. Promover o sucesso educativo das crianças e jovens sinalizados é um dos objetivos da instituição. Há outros como prestar apoio social às famílias, assegurar condições de vida dignas, desenvolver competências a vários níveis, orientar e promover a inserção na vida ativa, prioritariamente no território do Douro. 

No terreno, pelas escolas dos seis concelhos do Douro e pelas casas das famílias referenciadas, andam cinco psicólogos atentos. “Todas as crianças têm potencialidades”, sublinha Mafalda Ferrão, responsável pela coordenação social da Bagos d’Ouro. O trabalho é bastante focado neste princípio. Numa região pobre e carenciada, com famílias com baixa escolaridade e níveis de desemprego elevados, a instituição apoia crianças e jovens, desde o 1.º ciclo do Ensino Básico à entrada na vida ativa, que não têm oportunidades educativas, que vivem num agregado familiar que não consegue ou não tem ferramentas para os estimular, que não são espicaçados para irem mais longe. Um dos objetivos é precisamente reverter esse ciclo de pobreza da região, ajudar os alunos nos seus percursos escolares, nas escolhas vocacionais. Segui-los no dia-a-dia, em muitos dias, em vários anos. 

Mafalda Ferrão fala numa plataforma que olha em várias direções e que abre portas as experiências e oportunidades. Que ajuda nos momentos de maiores dificuldades, que valoriza conquistas e êxitos. “Trabalhamos muito a questão do estudo de uma forma muito preventiva e de autorregulação”, explica. Trabalha-se a autonomia no estudo para comprovar capacidades. Uma plataforma que também realça potencialidades e o mérito. A coordenadora social fala também de sonhos e expetativas das crianças e jovens, perspetivas que quase não existiam no começo do trabalho da instituição. “No início, percebemos que havia muita falta de sonhos”, recorda. Hoje já não é assim, foi feito um caminho, e os sonhos e as expetativas alimentam a dedicação, o esforço, a concentração, o envolvimento na escola. 

O trabalho não pára, os sonhos também não, e há novos projetos na forja. Um deles é criar um espaço, num dos seis concelhos, onde as crianças e jovens Bagos d’Ouro possam ir durante o dia, depois das aulas, lanchar, estudar, fazer os trabalhos da escola antes de irem para casa, ocupar os tempos livres. É um sonho para concretizar em 2020. 

Compromissos, mentores, livros 

O processo de sinalização da Bagos d’Ouro é feito em rede, a partir de vários olhares dos parceiros locais que conhecem a realidade que têm à sua volta. E assim identificam-se crianças e jovens com falta de oportunidades educativas do 1.º e 2.º ciclos de ensino, bem como jovens do 3.º Ciclo e do Ensino Secundário com resultados escolares de nível elevado, Bom e Muito Bom. Crianças e jovens de famílias com carência económica comprovada, do Escalão A. Depois disso, é assinado o compromisso Bagos d’Ouro para envolver e responsabilizar crianças e pais na definição de objetivos e trabalho a fazer. 

Há vários programas no terreno. O Programa Educar para o Futuro, para o 1.º e 2.º ciclos, que monitoriza a situação escolar, a motivação, o desempenho, o rendimento escolar, a assiduidade. Trabalha estratégias de organização e métodos de estudo, envolve os pais no acompanhamento educativo dos seus filhos, cria experiências educativas, assegura o material escolar necessário, desenvolve competências empreendedoras. O Programa Integrar no Território destina-se ao 3.º ciclo, ensino secundário e ensino superior, e também acompanha o desempenho e o rendimento escolar, já orienta a escolha vocacional, promove experiências educativas e profissionais, nomeadamente estágios de verão ou trabalho de voluntariado. Assegura os recursos materiais e financeiros para continuar os estudos e acompanha e monitoriza a inserção na vida ativa. 

A Bagos d’Ouro não esquece os pormenores como a remodelação do espaço de estudo com boas condições de luz e conforto. Trata ainda da integração dos alunos em atividades de tempos livres e campos de férias, dá apoio com explicações individuais, ajuda no regresso às aulas com manuais e material escolar, e está atenta a bolsas escolares, universitárias, e de estágio. 

O Programa de Apoio Social à Família existe para promover práticas parentais mais adequadas na valorização da escola e do trabalho e assegurar recursos necessários na alimentação, habitação, saúde, vestuário. 

O Projeto Sítio dos Livros, para o 1.º e 2.º ciclos, desenvolvido em parceria com a Roof, permite o acesso gratuito a livros através de uma plataforma solidária para pesquisa e requisição. São mais de 600 livros doados pelos trabalhadores da empresa. O Projeto Mentor, para os mesmos níveis de ensino, desenvolvido em parceria com a consultora Jason Associates, identifica um mentor para cada criança. A par da Bagos d'Ouro, cada mentor ajuda a criança e a sua família a desenvolver competências no âmbito das rotinas diárias, valorização pessoal, comportamento, expressão verbal, acompanhamento escolar entre outras. É um projeto-piloto. 

E há ainda o Projeto Take Action | Realiza-te no Douro para o 3.º Ciclo, Ensino Secundário e Ensino Superior que pretende trabalhar a escolha vocacional dos jovens, através de iniciativas que promovam o conhecimento das profissões. A instituição pretende alargar este projeto a alunos mais novos. Neste momento, promove ações que permitam construir o imaginário profissional, bem como promover competências pessoais, de empregabilidade e empreendedorismo que facilitem a entrada no mercado de trabalho ou a criação do próprio emprego.

Fonte: Educare

domingo, 27 de janeiro de 2019

ESCLEROSE MÚLTIPLA: Quando a reabilitação falha, o corpo é que paga

Médico fisiatra, fisioterapeuta, neuropsicólogo, psiquiatra, terapeuta da fala, terapeuta ocupacional. É cada vez mais comum que estes profissionais trabalhem juntos num serviço pensado para recuperar e reabilitar alguém que, por doença ou acidente, tem défices motores ou cognitivos. Falar em reabilitação é falar neste conjunto cada vez mais abrangente de competências com um objetivo comum: devolver o máximo possível de independência a alguém que a perdeu. Muitas vezes isso significa facilitar o ato de vestir uma camisola ou comer sozinho —​ este é também um campo onde os avanços e expectativas são flutuantes. Reaprendem-se funções perdidas. Relembram-se movimentos esquecidos. Noutros casos, trava-se a perda de capacidades. A meta é a funcionalidade.

É um trabalho longo, de treino. “É como um atleta que vai a um ginásio: um compromisso que devia ser diário”, há-de dizer a fisiatra Maria Pais de Carvalho ao longo desta reportagem. Implica uma gestão de expectativas —​ doentes com patologias semelhantes podem recuperar de forma nem sequer comparável. E de frustrações. Apesar dos enormes passos que a reabilitação tem dado em Portugal nos últimos anos, o acesso está longe de ser universal. Por isso há quem sinta as mudanças no corpo, mas não viva com elas muito tempo por falta de continuidade.

Foi o caso de Joel.

Chaves — Cacém

Joel Santos anda a pensar nisto há oito anos. Que, se vivesse num grande centro urbano, talvez a sua doença não tivesse andado descontrolada durante tanto tempo. Talvez o diagnóstico de esclerose múltipla tivesse sido mais rápido. Talvez conseguisse chegar mais facilmente aos tratamentos. “Mas estou em Chaves”, diz, não com fatalismo. O facto de não haver neurologista no hospital central da cidade, fá-lo percorrer algumas centenas de quilómetros, quase todos os meses, para ir a consultas e fazer tratamentos.

A cerca de 450 quilómetros a sul de Chaves, no Cacém, Andreea Tican, de 35 anos, também depende de uma cadeira de rodas para se deslocar —​ algo que cada vez menos é sinónimo de um diagnóstico de esclerose múltipla. Mas a sua experiência é bastante diferente. Tem a perceção de que quase tudo mudou desde que há 11 anos soube que tinha esta doença crónica e autoimune, que afeta entre seis mil e oito mil pessoas em Portugal. O diagnóstico é hoje mais rápido, menos falível. Menos vezes se confundem os primeiros sintomas com depressão, ansiedade, problemas cervicais ou oftalmológicos, graças à maior disponibilidade de meios complementares de diagnóstico e uma crescente sensibilidade dos profissionais de saúde para a doença. “Principalmente, os médicos de família estão mais alerta.” A disponibilidade de fármacos duplicou nos últimos anos e são cada vez mais os que têm acesso antecipado a medicamentos inovadores. Mas a reabilitação só é realidade para alguns — cada vez menos à medida que caminhamos para o interior.

“Se não fosse eu a procurar e a pedir, estava sem fazer nada”, diz Joel. É um retrato comum feito pelas quase duas dezenas de profissionais de saúde e doentes ouvidos (...) para tentar perceber qual o acesso das pessoas com esclerose múltipla à reabilitação: a capacidade instalada de maioria dos hospitais públicos esgota-se com casos agudos, revezando os doentes crónicos para clínicas de reabilitação, na área de residência, comparticipadas pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS). Mas há casos de sucesso.

“Quase por acaso”

O hospital de Chaves fica a poucos minutos de carro da casa de Joel. O único neurologista está de baixa prolongada desde setembro de 2015 e o Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro (CHTMAD), onde o hospital se integra, não tem capacidade para alocar alguém dos seus quadros para esta unidade. Os utentes passaram a ser seguidos na capital de distrito, onde Joel tem consulta de três em três meses. Com a mesma frequência desloca-se ao Hospital São João, no Porto, para fazer tratamentos específicos, que o hospital de Vila Real não administra.

A busca pelo diagnóstico começou “quase por acaso”. Tinha perdas de sensibilidade, “dores estranhas”, cansava-se muito — algo que, olhando para trás, sentia desde os 20 e poucos anos. “Desvalorizei sempre. Era a coluna, o stress, ...” Um dia, na tropa, deu por si esticado no chão, durante uma corrida, por ter perdido forças nas pernas. Consultou uma série de ortopedistas. Até que em conversa com o irmão, que acabara de descobrir que tinha esclerose múltipla, também ele reconheceu os sintomas.

Joel não tinha surtos, episódios de disfunção neurológica que têm as pessoas com a forma inflamatória e mais comum da esclerose múltipla (surto-remissão). É também a mais fácil de diagnosticar, por implicar episódios muito pronunciados de perda repentina de capacidades cognitivas e/ou físicas, recuperadas parcial ou totalmente na fase de remissão. Na forma progressiva da doença, os sintomas são, à partida, mais dissimulados, apesar da perda de capacidades, ser veloz, por exemplo.

“Depois de chegar ao neurologista, estive muito tempo para descobrir o que tinha”, conta Joel. O diagnóstico chegou em 2010, ao fim de um mês de internamento para que pudesse fazer a bateria de exames em diferentes cidades.

Aos 34 anos, pôde finalmente associar um nome ao facto de o corpo estar a deixar de lhe responder. Começou a fazer medicação e, pouco depois, fisioterapia. Isso não travou a progressão da doença. Em 2012, pegou numa bengala. Depois numa canadiana. Duas canadianas. No final desse ano, estava na cadeira de rodas. “Foi muito rápido.” A vida deu uma volta. Deixou o trabalho na área da informática. Encostou a paixão à fotografia. Hoje, aos 42 anos, a junta médica diz-lhe que tem 80% de incapacidade física.

Fez fisioterapia quase desde o início. Mas acha irónica a forma como lhe foi dado acesso. Aconteceu, não por ter esclerose múltipla na forma progressiva, mas por causa de uma fratura nas costelas, na sequência de uma queda. “No serviço de urgência, acharam por bem que fizesse fisioterapia. E foi aí que entrei.” Agora está há mais de um ano parado, por falta de renovação das credenciais. No SNS, mesmo para doentes crónicos, a fisioterapia é prescrita por períodos. Ao fim desse tempo, os utentes têm alta e voltam à consulta para a pedir novamente.

Recorrer ao privado não é uma opção. Joel deixou de trabalhar em 2012, a mulher está desempregada e têm dois filhos, de 13 e 15 anos.

Voltar à estrada principal

“Quando uma pessoa sente que tem menos força, que cai facilmente, que não tem o equilíbrio que deseja ou porque sente que está cada vez mais parada, é como se andasse numa estrada secundária. O que queremos é que as pessoas voltem à estrada principal e sintam facilidade no movimento.” A metáfora é de Sofia Baptista, fisioterapeuta na Unidade de Neuro-Reabilitação da Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM), no Beato, em Lisboa. Aberta em 2004, é a única exclusivamente pensada para a doença. Dá resposta a cerca de meia centena de pessoas da área metropolitana de Lisboa.

No pequeno ginásio, numa das visitas em dezembro, Gracinda Gonçalves, com 58 anos e o tipo progressivo da doença, faz os exercícios que a ocupam duas manhãs por semana nos últimos cinco anos. Está deitada numa mesa ortostática que a ajuda a ficar de pé, posição que tem dificuldade em manter de outra forma. Tira-lhe algumas dores, faz com que passe mais facilmente da cama para a cadeira, conta. “Não consigo andar, mas sinto-me melhor.” E facilita a vida ao seu cuidador, completa a fisioterapeuta Maria Carla Ribeiro.

Do outro lado da sala, Hugo Andreas, 42 anos, tenta reequilibrar a maneira como caminha, afetada por sucessivos surtos. Pega em triângulos sinalizadores de um lado para os empilhar do outro. As fisioterapeutas insistem na rotação dos ombros e na transferência de peso de um lado para o outro do corpo. Tentam que os dois lados reajam da mesma forma, sejam o mais simétrico possível. “Repetimos e damos estímulos para que determinados movimentos que estão esquecidos possam ser reaprendidos”, explica Carolina Reis, fisioterapeuta. Cabe-lhe perceber que tipo de alterações existem, que efeitos provocam nas funções motoras e como isso pode ser corrigido. E ter em atenção que, nas mesmas condições mas noutro dia, Hugo pode parecer uma pessoa diferente. A fadiga é um enorme obstáculo — pode aumentar a temperatura corporal e agravar os sintomas neurológicos da própria doença. E aqui aprende-se a respeitar o descanso.

“É muito importante encontrar formas de exercício direcionadas para a patologia”, refere Sofia Baptista. “É uma doença crónica que nunca é igual. Com a fisioterapia, a médio e longo prazo, a pessoa ganha uma percepção corporal que muitas vezes deixou de ter: a noção de que não está 100% na vertical, de que os músculos das pernas não estão a funcionar como deviam, de que a apreensão de objectos não está igual.” Há evidências de ganhos de força muscular, de controlo da fadiga, um aumento da resistência ao esforço, a melhoria do equilíbrio e da capacidade de marcha.

Maria Pais de Carvalho, médica especialista em medicina física e de reabilitação, é responsável por prescrever o plano de treinos: da fisioterapia, terapia ocupacional, terapia da fala às consultas de psicologia. Vinca a importância da reabilitação ser contínua, para evitar a perda de capacidades recuperadas. E incentivada, para recuperar “membros esquecidos” — não é raro que doentes negligenciem partes do corpo que funcionam menos bem. “É como um treino de atleta.”

Os mais novos ou que têm formas “benignas” da doença, como designa Sofia Batista, tendem a ficar mais afastados da reabilitação. Os casos mais avançados assustam-nos. “Mas a imagem da doença está a mudar muito rapidamente. Os diagnósticos são agora mais precoces, as pessoas têm medicação mais dirigida para a primeira e segunda linha. Há uns anos não era assim. Temos aqui uma mistura de duas épocas muito distintas.”

Dependendo do número e frequência das terapias, a mensalidade varia entre os 42 e 91 euros, com tarifas reduzidas para famílias com baixos rendimentos.

Incluir as famílias

A par do treino, há fármacos e estratégias que podem compensar os défices. A fisiatria encarrega-se de estudar e prescrever produtos de apoio, desde uma colher com cabo adaptado a um elevador de transferências. Alguns são aprendizagens simples: “Para uma pessoa com um défice de coordenação nas mãos, que não consegue cortar bem os alimentos, basta colocar um tecido antiaderente por baixo do prato, para este ficar mais fixo, e conseguir comer sozinha”, demonstra Maria Pais de Carvalho.

Estes ganhos na qualidade de vida ajudam familiares e cuidadores. A associação procura levá-los para dentro de casa. Há um fisioterapeuta com sessões diárias ao domicílio e uma assistente social. “Fazemos visitas para percebermos que barreiras arquitectónicas há em casa e como as podemos ultrapassar. Às vezes basta uma rampa à porta do prédio”, torna a fisiatra. Afinal, a perda de capacidades afecta a participação em sociedade — associa-se a baixas prolongadas, desemprego, reforma por invalidez — e a vida familiar. “As IPSS têm um papel fundamental em inserir as pessoas na comunidade. O tratamento de reabilitação só termina quando o doente está autónomo e está integrado.”

Um estudo de 2016 com 362 doentes seguidos no Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra concluiu que a percentagem de pessoas profissionalmente inativas (desempregados e reformados) era de 19,2%, entre os 25 e 54 anos, e de 51,1%, entre os 55 e 64 anos. Cerca de 72% desta amostra deixaram de trabalhar antes dos 65 anos.

Enquanto os terapeutas estão com os doentes num período curto, a família está lá o resto de tempo. E precisa de ajuda para saber o que fazer e como o fazer bem, atenta Susana Protásio, até ao início de Janeiro vice-presidente da SPEM. “Há essa resposta em Lisboa, no Porto e há um bom trabalho a ser feito em Coimbra. O resto do país é um deserto.”

“Ali recuperei a garra”

Quando vai a Vila Real e ao Porto, Joel depende dos horários dos bombeiros, que transportam vários doentes. Pode sair casa às seis da manhã e voltar depois das oito da noite, para uma consulta que não dura mais de 15 minutos. “Uma pessoa perfeitamente funcional vai dar uma volta. Eu estou um dia inteiro sentado nesta cadeira, à espera. Com dificuldades para ir à casa de banho, para comer, tudo isso. É difícil.” Joel tem uma voz e postura calmas, as mãos no colo sobre as pernas.

Já propôs que fosse o médico a vir a Chaves, um dia por semana, por exemplo. “Até à data não houve abertura para isso.” Em resposta (...), o CHTMAD explica que, desde 2015, “ainda não foi possível destacar nenhum médico neurologista” para Chaves. Os oito especialistas existentes exercem funções nas unidades de Vila Real e Lamego.

A falta de um especialista num hospital não se traduz apenas nos quilómetros adicionais para os utentes. É também ilustrado pela sensibilidade que colegas de outras especialidades têm para detectar problemas neurológicos, neste caso. O especialista que poderia fazer o despiste não está na porta ao lado. Quando, há uns anos, Joel fazia semanalmente um tratamento como imunossupressores, era certo que dois dias depois ia às urgências com um episódio agudo de efeitos secundários, com febre muito alta e o corpo espástico. “Nas urgências não sabiam lidar comigo. Tinha de explicar as especificidades da minha doença e daquele tratamento”, conta.

Na fisioterapia, sentia a mesma falta de conhecimento específico da sua doença. “Os exercícios que eu fazia são exactamente iguais às de um acidentado.” Tendo uma lesão neurológica, permanente ou progressiva, e não ortopédica, os estímulos, o prognóstico e a recuperação são diferentes.

Joel e Andreea deram conta de que a esclerose múltipla tinha outras exigências quando passaram por centros de reabilitação especializados. Sem se conhecerem, ambos fazem elogios semelhantes. “Vim de lá e parecia outra pessoa”, confessa Joel, que esteve cinco semanas no Centro de Reabilitação do Norte (CRN), em Vila Nova de Gaia, em 2016. “Não conseguia dar um passo. E quando voltei conseguia sair da cadeira e ir à casa de banho, com apoios, mas a andar.” No centro fez exames que nunca tinha feito e teve acesso a consultas de meia dúzia de especialidades. “Nunca tinha ido a um urologista nem à nutricionista. Lá tive acesso a tudo e saí medicado.” Iniciou um tratamento, com toxina botulínica para reduzir a espasticidade, que agora continua em Vila Real.

“A evolução é real, vê-se”, diz Andreea. Esteve entre Março e Maio em Alcoitão, o maior e o único centro do género que não tem gestão pública. Fez pela primeira vez reabilitação intensiva para aprender a viver na cadeira de rodas e recuperar alguma mobilidade, mas o que destaca são os efeitos psicológicos. “Foram dois meses que mudam tudo. Aprendi a lidar melhor com aquilo que tenho. Aqueles terapeutas mostraram-me que, aconteça o que acontecer, tenho de lutar.” É isso que faz, agora com mais afinco.

Com o que aprendeu nas sessões de mindfulness, focando-se em pontos específicos do corpo, consegue “abstrair-se de tudo o resto”, acalmar-se, controlar a respiração. “A doença tira-te tanta coisa, que é normal deixares de acreditar em determinadas coisas. É fácil perder as ligações. É fácil tornares-te fria. Ali eu recuperei a garra, vi que podia melhorar. Agora só quero voltar. E toda a gente devia ter direito.”

Antiga engenheira electrotécnica, reformada por invalidez, Andreea trabalha na linha de apoio da SPEM — que emprega pessoas com esclerose múltipla, com ritmo e horários de trabalho adaptados às capacidades de cada um — e quer investir no seu próprio negócio. “A coisa boa desta doença é que, não sendo igual de pessoa para pessoa, quer dizer que não vais ficar como os outros. Desde que a pessoa se cuide, desde que a pessoa se trate — acho que isso é que importa.”

Mais médicos, mais camas

Além do CRN e de Alcoitão, existem duas outras unidades de reabilitação especializadas para onde são referenciados utentes do SNS, sobretudo, com lesões vértebro-medulares, traumatismos cranioencefálicos e vítimas de acidentes vasculares cerebrais (AVC): o Centro de Reabilitação Rovisco Pais, na Tocha (Cantanhede), e o Centro de Reabilitação de S. Brás de Alportel, no Algarve. Juntos constituem grande parte da resposta da rede de referenciação hospitalar de Medicina Física e de Reabilitação. No total, tinham cerca de 400 camas em 2016.

No país nunca houve, aliás, tantas camas para este fim. A rede de referenciação existe desde 2002 e desde então, até ao final de 2016, o número de camas duplicou. Ainda assim, está aquém do pretendido, demonstrou a revisão da rede no ano passado. Havia então 70 camas nos serviços de reabilitação dos hospitais de agudos (a rede preconizava a existência de 240). Os centros especializados deviam ter chegados às 600.

A especialidade médica tem feito o mesmo caminho ascendente. Após o grande impulso no pós-Segunda Guerra Mundial, foi reconhecida como especialidade independente na Ordem dos Médicos em 1956, à boleia da melhoria dos cuidados de saúde na Europa ocidental e do reconhecimento crescente da necessidade de cuidados reabilitadores para pessoas com incapacidades. Tem contribuído, aliás, para uma abordagem do doente e da doença que olha para as condicionantes genéticas, factores psicológicos e sociais de contexto, em detrimento de uma atitude meramente clínica.

Há actualmente 633 fisiatras inscritos na Ordem dos Médicos, dos quais mais de 40% terminaram a formação especializada nos últimos 18 anos. E, estima o presidente do colégio da especialidade Pedro Cantista, 120 internos estão hoje a fazer formação.

Ter de voltar

Os doentes neurológicos constituem a maioria dos internados no CRN, um complexo de dois edifícios em frente à praia de Valadares, inaugurado em 2014 (...). O centro, com 90 camas para adultos, passou em Novembro das mãos da Santa Casa para o Centro Hospitalar de Vila Nova de Gaia/Espinho.

Rui Mesquita, de 33 anos, está-se a preparar para pedir ao médico de família para ser novamente internado no centro, onde, durante um mês e meio em 2016, teve acesso a uma série de cuidados intensivos (fisioterapia e hidroterapia, terapia da fala, terapia ocupacional, neuropsicologia, nutrição). Este clínico pode referenciá-lo para ser avaliado na consulta externa, mas a maioria dos utentes chega ao CRN por via de um fisiatria. Quem está hospitalizado por agudização ou complicações associadas à doença tem, naturalmente, prioridade (na Unidade de Reabilitação Geral de Adultos, uma das quatro unidades funcionais do centro, o tempo médio de espera ronda os oito dias).

Rui poderá ter de esperar bem mais. Mas o corpo diz-lhe que tem de voltar. “Fiquei muito melhor da locomoção, da dicção, da disfagia. Não se recupera assim da fisioterapia normal”, acredita. Estava na faculdade, tinha 25 anos, quando foi diagnosticado com um tipo progressivo da doença (secundária progressiva).

[Rui voltou ao CRN, onde já não está internado (...)]

Como a “esclerose múltipla pode mimetizar praticamente tudo, ter efeitos similares a um AVC ou uma lesão medular”, nota a diretora clínica Sofia Viamonte, a prescrição pode ser completamente diferente de pessoa para pessoa. Justifica-se “quando há objetivos muito definidos”, completa Ana Lima, fisiatra responsável pela reabilitação em esclerose múltipla.

Como noutras patologias neurológicas, a terapia da fala assume um papel relevante no tratamento das disfagias (dificuldades em engolir). Com o enfraquecimento dos músculos do esófago ou da garganta, os resíduos alimentares podem passar para a traqueia e aumentar o risco de desenvolvimento de infecções respiratórias (pneumonias de aspiração, por exemplo). A deteção precoce é fundamental, pois em fases avançadas da doença nem todas as pessoas têm sintomas de alerta.

Silenciosa pode também ser a falta de controlo urinário devido a uma lesão neurológica, a chamada disfunção vesico-esfincteriana ou bexiga neurogénica. A incontinência, o principal sintoma, afectará cerca de 80% dos doentes com esclerose múltipla. Ainda poucos se queixam. “Quando chegam ao centro, a maioria tem alterações de bexiga mal estudadas ou não estudadas de todo. E não se tratam apenas de situações de desconforto. Altas pressões na bexiga, por exemplo, podem ao fim de vários anos evoluir para insuficiência renal”, nota Ana Lima.

“Antigamente estas questões não eram colocadas pelos médicos. E os doentes acham que a consulta de fisiatria não é para isso”, completa Ana Trêpa, fisiatra responsável pela consulta de neuro-reabilitação de esclerose múltipla do Serviço de Fisiatria do Hospital de Santo António, no Porto, onde iremos de seguida.

A deteção passa por estudos urodinâmicos, que simulam o enchimento e esvaziamento da bexiga. E seguem-se exercícios de reforço muscular e de reeducação do pavimento pélvico. Quando necessário, medicação. Mais uma vez, a ausência de sintomas não quer dizer que tudo está bem.

Sessões de grupo e panfletos

Idealmente existiria entre estes centros de reabilitação e os hospitais centrais um circuito, uma espécie de “via verde”, que garantisse resposta após um surto e em estados avançados da doença, projecta Ana Martins da Silva, neurologista no Hospital de Santo António, que dirige o grupo de neuroimunologia. No fundo, denota a necessidade de optimizar recursos já existentes, pôr as instituições a trocar informação e a comunicar entre si. E de compensar financeiramente o investimento em tratamentos não farmacológicos. 

A consulta de doenças desmielinizantes do Serviço de Neurologia deste hospital, integrado no Centro Hospitalar do Porto, é apontada como um bom exemplo pelo funcionamento da sua equipa multidisciplinar. A partir da neurologia, um doente pode ser encaminhado para a fisiatria, neuropsicologia e psiquiatria e psicologia de ligação, onde há profissionais vocacionados para a esclerose múltipla. Estes reúnem-se pelo menos uma vez por mês. Partilham informação e discutem terapêuticas.

No processo encontram-se formas de contornar as dificuldades de acesso à reabilitação. A fisiatra Ana Trêpa fá-lo com panfletos, onde detalha os cuidados a ter e os exercícios que podem ser feitos em casa, desde o treino de fortalecimento muscular e técnicas de terapia da fala, à contagem da frequência cardíaca para que pessoas com fadiga consigam controlar o exercício aeróbico.

Ganhou o hábito no hospital de Santa Maria da Feira no início dos anos 2000, numa tentativa de evitar que as listas de espera ou o intervalo entre sessões de fisioterapia fizessem com que os doentes ficassem parados. Também é uma alternativa para quem está em fases iniciais da doença. “Se não conseguimos chegar a todos, temos a obrigação de formar os cuidadores”, refere.

Investigação em neuropsicologia

Embora as alterações cognitivas, comportamentais e emocionais associadas à esclerose múltipla mereçam um crescente interesse de investigadores, esta é ainda uma área cinzenta. “Existem dados nesse sentido, mas ainda não está completamente estabelecido que a reabilitação neuropsicológica em doentes com esclerose múltipla tenha eficácia”, explica a neuropsicóloga Sara Cavaco. Os avanços a nível dos fármacos modificadores de doença não foram acompanhados por um avanço a este nível. E as formas progressivas da doença continuam praticamente a descoberto.

Sara Cavaco fundou há nove anos a Unidade de Neuropsicologia do Santo António. A equipa, de seis psicólogos clínicos e uma pessoa dedicada à investigação, avalia utentes com possíveis défices neurológicos — na esclerose múltipla, é comum que haja alterações de memória, de concentração e que a capacidade de processamento se torne mais lenta. No último ano, deram o passo seguinte: fazem reabilitação em 60 doentes selecionados para um projeto de investigação. O estudo de três anos quer perceber o que pode ser importado da reabilitação feita noutras patologias, como traumatismos cranioencefálicos, para a forma surto-remissão desta doença autoimune.

Conhece-se o efeito de reserva, primeiro detectado na doença de Alzheimer, que explica que pessoas mais escolarizadas, mais estimuladas e com ambiente familiar estável, entre outros fatores, tenham menos sequelas — menos sintomas depressivos e alterações cognitivas. Mas a reabilitação neuropsicológica “não vende sonhos”, diz a neuropsicóloga. “Não espero que pessoas com défices cognitivos nos testes deixem de os ter. O que espero é que eles não se traduzam em défices funcionais.”

Joana Pais, neuropsicóloga no Instituto CUF Porto, experimenta outra abordagem, com programas informáticos. Na altura a trabalhar no hospital de Santa Maria da Feira, a ver a lista de utentes maior que as horas de trabalho, ela e um colega começaram a desenvolver um programa de treino cognitivo online com supervisão, o Cogweb. Durante o ano passado, 3500 pessoas, entre 7 e 88 anos, fizeram em média quatro sessões por semana, num total de duas horas e meia. “Feito presencialmente, isto seria incomportável”, afirma. O programa pode ser adquirido por uma instituição, que fica responsável pela sua gestão, ou directamente por um doente, a quem é associado um psicólogo. Custa, neste caso, 40 euros por mês.

“Se queremos dar acesso real às pessoas, às vezes temos de recorrer a ferramentas mais custificadas”, diz. “E usar a imaginação.”

Fonte: Público

sábado, 26 de janeiro de 2019

IR PARA A ESCOLA AOS 6 OU AOS 7? «O RISCO É ENTRAR CEDO DE MAIS»

São cada vez mais as crianças de seis anos no pré-escolar e isso é uma boa notícia, de acordo com os especialistas. Mais um ano para brincar, mais um ano para amadurecer e consolidar aprendizagens e mais um ano para aprenderem a aguentar muito tempo sentados, quietos e calados.

«Quantos anos tens?» «Seis» «Andas em que ano?» «Na “pré”, mas já podia andar no primeiro ano. Os meus pais é que não deixaram.»

Tomé é uma das 9912 crianças que, em 2017, com seis anos, permanecia na educação pré-escolar, número que representava 9,9 por cento dos inscritos nesta valência.

A taxa tem vindo a aumentar e em 2017 era de mais 70 por cento do que em 2007, segundo um relatório do Conselho Nacional de Educação, o que, para o pedopsiquiatra Pedro Strecht, é uma boa notícia. «É um erro os miúdos entrarem [para o primeiro ano] antes dos seis anos. Há todo um tempo de crescimento e de maturidade que é necessário para fazerem a integração e a digestão das próprias experiências».

A explicação para os números não consta do estudo, mas as razões encontrar-se-ão entre a falta de vagas no primeiro ano do ensino básico para todos os alunos condicionais [crianças que fazem seis anos entre 16 de setembro e 31 de dezembro] e a decisão dos pais [destes alunos] de os manter no pré-escolar.

O pediatra Fernando Chaves congratula-se com a falta de vagas para os «condicionais», se for esse o caso, mas considera que, sim, hoje os pais estão mais informados, ou pelo menos procuram mais aconselhamento, sobre o que é melhor para as crianças.

«E isso é que entrem com seis anos, ou sete, quando tanto o desenvolvimento cognitivo como emocional são adequados», diz, reconhecendo que cada vez os miúdos estão mais imaturos, «porque os pais não os frustram, superprotegem-nos e isso atrasa o desenvolvimento e retira-lhes a capacidade de voar sozinhos».

Ana Valente, psicóloga no agrupamento de escolas Anselmo de Andrade, em Almada, concorda e adianta que cada vez mais as próprias escolas, através das educadoras ou dos psicólogos, aconselham os pais a não inscrever as crianças no primeiro ano, se estiverem na situação de condicionais. «As crianças estão mais imaturas e não é negativo, pelo contrário, que tenham mais um ano de pré-escolar.»

Os pais do Tomé acharam o mesmo. Rita e Alexandre consideraram que o filho mais novo, que fez seis anos em novembro de 2017, apesar de ter aprendido a ler sozinho aos cinco, de saber fazer contas e de ter um desenvolvimento cognitivo que provavelmente não seria um obstáculo às aprendizagens, não tinha a maturidade emocional para enfrentar as exigências da «escola dos grandes», nomeadamente a de estar sentado e quieto muito tempo seguido: «no ano passado, era difícil mantê-lo sentado até para comer», diz a mãe, que não se arrepende da decisão, bem pelo contrário. «Este ano [Tomé já está no primeiro], está a correr muito bem.»

Quanto ao diálogo do início do texto, que Rita e Alexandre tiveram que ouvir muitas vezes, é normal e saudável, de acordo com Ana Valente, que acompanha miúdos desde o pré-escolar até ao 12º ano. «Os pais e as educadoras devem explicar a não ida para o 1º ano como algo positivo e reforçar os benefícios de ficar “na pré”. Se escola e pais trabalharem no mesmo sentido, tudo fica mais fácil e os miúdos ao fim de pouco tempo já se esqueceram que uns foram e outros ficaram e não sofrem com isso.»

Tomé não sofreu, até porque os pais decidiram que ele faria o último ano de pré-escolar noutra escola, para não ver todos os amigos irem e ele ficar. No entanto, nem toda a gente apoiou a decisão. «A minha mãe achou mal, a educadora só confessou que achava bem depois de termos decidido – acho que se calhar às vezes têm receio que levemos a mal, que pensemos que estão a dizer que os nossos filhos estão atrasados -, mas uma psicóloga infantil nossa amiga disse uma coisa que foi determinante: “não há risco nenhum de ele não ir já para o primeiro ano, só há risco de ir cedo de mais”», conta Rita.

O pediatra Fernando Chaves pensa o mesmo. Para o especialista, cinco anos é muito cedo para entrar no primeiro ano e, havendo que fazer uma escolha, mais vale entrar com sete do que com cinco. «Dou-lhe um exemplo, uma criança que sigo e que nasceu prematura. Ia entrar com seis anos acabados de fazer. É uma miúda fantástica do ponto de vista cognitivo, mas muito imatura a outros níveis. Aconselhei que se atrasasse a entrada na escola, mas depois de consultar uma psicóloga, a criança entrou e tem sido ano e meio de sofrimento. A mãe reconhece agora que foi a pior coisa que podia ter feito, mas já não dá para voltar atrás.»

E se pensarmos para a frente, que diferença faz? «No fim do dia, nenhuma. É igual se entram na faculdade com 17 ou 18. O problema é outro: muitas vezes chegam ao 9.º ano e ao 12º sem saberem que área escolher ou o que gostariam de fazer no futuro», diz Fernando Chaves.

Adiar pode, então, ser positivo? A psicóloga Ana Valente, que faz orientação curricular, acha que sim. «Aos 14, 15 anos não estão preparados para decidir que área querem seguir. Não se interessam. Vão atrás do que os amigos dizem. São muito infantis e o sistema de ensino não está adaptado à sociedade atual e aos novos adolescentes.»

Por isso, para esta psicóloga faz cada vez mais sentido os sete anos como idade ideal para entrar para o 1.º ano. «A forma como os novos currículos estão construídos, com matérias que eram do 3.º e 4.º anos a serem aquisições a fazer no 2.º, aconselha-o».

Ana Valente não tem dúvidas: «O insucesso escolar, no primeiro ciclo do ensino básico, com mais retenções a acontecerem no 2.º ano, deve-se ao facto de o currículo não estar adaptado ao desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças.» E os números do relatório Estado da Educação 2017 parecem dar-lhe razão: «o 2.º ano continua a ser o ano de escolaridade em que mais alunos ficam retidos (7,4%)». Destes, os que entraram com cinco anos «chumbam» mais do que os que entraram com seis.

Catarina Raio é mãe de dois filhos e bem gostaria que assim fosse. Lamenta que nenhum dos dois tenha nascido depois de 15 de setembro (o segundo nasceu mesmo a 15!), porque assim ser-lhe-ia dada a possibilidade de escolher. E se a tivesse, Catarina não hesitaria, retardaria a entrada dos miúdos no ensino básico para os sete anos.

«Não tenho pressa. Penso que a inteligência emocional deve ser trabalhada antes. Mesmo que as crianças estejam preparadas do ponto de vista cognitivo, não estão em termos emocionais e de concentração. Em relação ao primeiro senti imenso isso, achei que devia ficar a brincar mais um ano e as dificuldades por que passámos no primeiro ano de escola confirmou isso. Foi uma angústia.»

Angústia evitável, se existisse escolha. Nem todas as crianças têm o mesmo ritmo, o mesmo grau de maturidade. «Uma maior flexibilidade no sistema», como defende o pediatra Fernando Chaves, talvez fosse um bom ponto de partida.

Fonte: DN Life

sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Governo aprova regime de adaptação à vida independente para pessoas com deficiência

O Governo aprovou [ontem] um regime de adaptação à vida independente para pessoas com deficiência, que prevê uma transição de seis meses entre o apoio que recebem institucionalmente e o da assistência social.

O regime de adaptação enquadra-se numa alteração ao decreto-lei, de outubro de 2017, que institui o modelo de apoio à vida independente de pessoas com deficiência ou com incapacidades.

Em comunicado, o Conselho de Ministros refere que "importa estabelecer um regime de adaptação em que uma pessoa com deficiência beneficia de um período de transição de seis meses que lhe permita passar de um contexto de apoio residencial para a utilização de assistência social".

Este regime de adaptação é estabelecido num novo decreto-lei, hoje aprovado, "sem prejuízo da necessidade de reafirmar o princípio da não acumulação de apoios públicos prestados às pessoas com deficiência".

O modelo de apoio à vida independente foi criado por decisão do Governo, que entende que deve ser assegurado às pessoas com deficiência o direito de optarem por uma vida autónoma "através da disponibilização de assistência pessoal, em detrimento do apoio residencial".

O serviço de assistência social, gerido por Centros de Apoio à Vida Independente, visa apoiar as pessoas com deficiência ou com incapacidades na realização de atividades diárias, como higiene, alimentação, deslocações, frequência de ações de formação profissional, aulas na universidade e procura de emprego.

Este tipo de apoio é dado por um assistente social durante um determinado número de horas por semana, que, em regra, não excedem as 40.

O novo diploma, hoje aprovado pelo Governo, surge depois de, no final do ano passado, um homem tetraplégico ter pedido, num protesto em frente ao parlamento, urgência na entrada em vigor dos Centros de Apoio à Vida Independente, que têm a incumbência de prestar o serviço de assistência social.

Na altura, o homem foi o rosto das queixas das pessoas com deficiência que estão numa instituição social, como um lar, e alegam não ter apoio suficiente para optar por uma vida autónoma.

Fonte: 24 Sapo por indicação de Livresco

quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

A MARIA TEM UMA NOVA ESCOLA QUE NÃO DEIXA NINGUÉM DE FORA

Maria, a bebé, era bonita e doce, nada a fazer prever o que aí vinha. Maria, com um ano, foi diagnosticada com a síndrome rara de Mowat-Wilson, responsável por atrasos no desenvolvimento físico e cognitivo. Maria, hoje com 5 anos, conhece poucas palavras, aprendeu a comer com terapia, mas é esperta e precisava de estar no ensino regular, com crianças sem necessidades educativas especiais que puxem por ela. E aqui entram os pais da Maria, decididos a encontrar respostas nem que para isso tivessem de criar uma escola diferente de todas as outras que já existem. A Escola da Maria.

«Escolas de ensino especial há muitas e boas, mas não eram indicadas para ela. Procurámos escolas de inclusão, encontrámos uma ou duas a funcionar como deve ser, mas não tinham vaga. Foi uma luta até a Creche do Centro Paroquial do Campo Grande – a única – nos dizer que não sabia se tinha capacidade para tratar da Maria mas ia tentar», conta Rui Negrão, o pai, a desbravar caminho desde os primeiros dias da filha fora da barriga da mãe, Sandra Calheiros.

«Por cá, estima-se que haja umas 15 crianças com esta síndrome de Mowat-Wilson, uma doença genética e sem cura descoberta em 1998 pelos médicos australianos David Mowat e Meredith Wilson», diz. Saber que a filha a tinha foi uma experiência abrupta, emotiva, total. «Só pensávamos “porquê ela?”, assim indefesa e com aquela doença estranha de que se sabia tão pouco.» Mais tarde, a questão que se impunha era como iriam eles levá-la à creche de manhã, buscá-la ao fim da tarde, levá-la e buscá-la outras vezes durante o dia para as sessões de terapia da fala, terapia ocupacional, fisioterapia, natação e sabe lá Deus mais o quê – ou como?

«É uma agenda complicada de gerir, porque os pais têm de trabalhar e as crianças com necessidades especiais têm de ser trazidas para fora das instituições, a fazerem coisas estimulantes», explica Rui Negrão. Não adianta haver serviços médicos, educativos e culturais disponíveis se depois as famílias não tiverem forma de lá levar os pequenos. «Em conversas com amigos fomos desafiados a desenvolver o projeto de uma escola inclusiva, como a que queríamos para a nossa filha, e tentar então arrancar a partir daí.»

O que nos traz novamente de volta à Escola da Maria, o único projeto do país a contemplar esta integração em valências conjuntas, com uma forte ligação ao desporto fora das instituições. «Matutávamos no que faz falta, a acrescentar aqui e ali. De repente tínhamos algo sem precedentes, muito além da escola de inclusão que sonhámos», diz o pai.

Se tudo correr bem daqui para a frente, dependendo da cedência de terreno e dos investidores, esperam conseguir tê-la pronta em três anos com uma oferta pedagógica do berçário ao 2.º ciclo. «Apesar de o rácio não ser fixo, tentaremos trabalhar numa base de 70/30 [a mesma das escolas que conhece], em que 30 são os alunos com necessidades educativas especiais para garantir uma verdadeira inclusão», adianta o mentor.

A pensar nas necessidades terapêuticas das crianças dentro e fora da escola, o projeto engloba ainda uma clínica que disponibiliza psicologia clínica e educacional, terapia ocupacional, da fala, orientação escolar e vocacional, fisioterapia e acupuntura. «Teremos licenciamento da Clínica da Maria no futuro, mas enquanto não houver um espaço vamos trabalhar com médicos disponíveis para receber as crianças nos seus consultórios, mediante protocolos, e usar as instalações da clínica desportiva de apoio ao Clube de Rugby São Miguel, nosso parceiro», conta Rui Negrão.

Estudo acompanhado e babysitting personalizado são outras das valências concebidas para aliviar os pais que não tenham como levar os filhos às atividades, além do transporte com acompanhamento. «As coisas têm vindo a crescer a olhos vistos. A parte do desporto inclusivo – râguebi, judo, ginástica, dança, natação – já está inclusivamente a funcionar graças a vários parceiros interessados que acharam, desde o início, que isto fazia todo o sentido», diz.

Um outro projeto que vão trabalhar em paralelo, a começar por Braga, é o do Plano Nacional de Inclusão Desportiva, concebido para alargar ao resto do país o que têm estado a fazer com os clubes em Lisboa. «Não é difícil implementar: difícil é mudar mentalidades.» A ideia, revela Rui em primeira mão, é vir a ter desporto inclusivo em todas as capitais de distrito no ano de arranque, e em todos os concelhos a cinco anos, com uma viatura de transporte adaptado por cada um deles.

E sim, já antes tinha criado a Associação Síndrome Mowat-Wilson para ajudar outros pais, de crianças como a sua, a encontrarem respostas para a doença. «Essa é outra história que só indiretamente tem a ver com a Associação A Escola da Maria, que criámos de propósito em agosto de 2018 para operacionalizar isto tudo», ressalva. Seja como for, é óbvio que a experiência o ajuda agora nesta jigajoga de ver o que falta, procurar parceiros, tentar contactos, convencer investidores e pôr tudo a girar com a leveza de um malabarista.

«A legislação é muito boa, mas depois na prática faltam condições para operacionalizar, da mesma forma que aquilo que existe serve bem, apesar de ser manifestamente insuficiente», lamenta o pai. A ele preocupa-o sobretudo o facto de ver o tempo a passar e não saber onde vai pôr a Maria no próximo ano letivo, quando a filha já tiver os seis anos. Imagina que seja essa também a preocupação de muita gente. «Só porque a nossa escola ainda não existe, senão não havia dúvidas.»

Fonte: Life DN

quarta-feira, 23 de janeiro de 2019

PCP e Bloco querem mudanças no regime da educação inclusiva

O PCP e o Bloco de Esquerda vão pedir a apreciação parlamentar do regime jurídico da educação inclusiva, defendendo mudanças no atual regime e pedindo os meios necessários às necessidades de todas as crianças com deficiência.

O PCP diz que "sempre foi crítico" do atual regime "pelo que significava de cortes no apoio às crianças e jovens com necessidades especiais, pelo que significava de segregação com a criação de unidades estruturadas e pela sua referenciação médica".

Para o PCP, "esta é uma matéria sobre a qual importa discutir e refletir", defendendo que é "fundamental" a constituição de turmas reduzidas, a formação de professores, a constituição de equipas multidisciplinares, a existência de equipas multiprofissionais para a intervenção precoce na infância e a adaptação dos edifícios e equipamentos.

"É indispensável, para a efetiva inclusão destas crianças e jovens, a existência de ajudas técnicas, de financiamentos, de uma ação social escolar orientada para uma efetiva igualdade de oportunidades, de uma organização e gestão democrática na vida escolar e dos recursos educativos e mentalidades abertas à inovação e à mudança", diz o PCP.

O PCP diz ter "profundas preocupações" em relação ao atual regime, defendendo uma articulação estreita entre a escola, o Serviço Nacional de Saúde (SNS) e a Segurança Social e criticando que o diploma continue a ser "omisso" em matéria de inclusão e integração dos jovens com necessidades especiais no ensino superior.

Para os comunistas, o atual diploma "não tem em conta a realidade das escolas" ou as dificuldades sentidas pelas escolas, pelas crianças e jovens com deficiência ou as suas famílias.

Já o BE defende que a implementação do que está definido no regime jurídico "implica uma reformulação significativa de procedimentos e práticas, mas também uma reflexão aprofundada sobre os princípios da inclusão e a própria cultura da escola".

O partido admite que o atual decreto-lei "é um passo na direção certa", mas pede "alterações e melhoramentos".

"Além de não parecer avisado (para não dizer inviável) implementar uma mudança tão estrutural de uma forma tão repentina, sem dar às escolas o devido tempo de preparação e transição que permitiria não só adaptarem-se ao novo modelo, como também assegurar que este é adequadamente implementado", dizem os bloquistas.

Fonte: Público

Secretário de Estado da Educação no IPS em conferência sobre inclusão

O secretário de Estado da Educação, João Costa, vai estar esta sexta-feira, dia 25, no anfiteatro da Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Setúbal (ESE/IPS) para falar dos “Desafios de uma sociedade inclusiva”. 

A conferência, com entrada livre, tem início pelas 17h30 e integra o programa das atividades de formação desenvolvidas pela pós-graduação em Educação Especial – Domínio Cognitivo e Motor, tendo como destinatários, não só os estudantes, como também os profissionais das áreas da Educação e Saúde que se encontrem a desenvolver atividade em escolas, organizações públicas, privadas e de solidariedade social, em contextos de educação formal, não formal ou informal. 

Trata-se, segundo a organização, de “uma oportunidade para dialogar com quem assume um papel central na implementação do novo enquadramento jurídico da educação inclusiva”. Recorde-se que a inclusão vai ser, a partir de maio próximo, o principal indicador de análise do desempenho das escolas, no quadro do novo ciclo de avaliação conduzida pela Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC), tal como anunciou o governante na última quarta-feira, dia 16. 

Na ocasião, João Costa, citado pelo jornal “Público”, frisou que “uma escola é muito mais do que o resultado dos exames” e que, para existir inclusão, “não basta aprender, é preciso que todos aprendam” e que estas “aprendizagens sejam reais”.

Fonte: Distrito online por indicação de Livresco

terça-feira, 22 de janeiro de 2019

Jovem autista acaba curso de Medicina e quer especializar-se em neurocirurgia

Enã Rezende tem 26 anos e cumpriu um sonho no dia 15 de janeiro: licenciou-se em Medicina. Há 20 anos, uma professora tinha dito que ele não aprenderia a ler. "Eu dizia para mim: tenho que vencer na vida e mostrar que está todo mundo errado. Sempre soube que teria de lutar mais que os outros para conquistar meus objetivos", contou Enã à BBC Brasil. 

Em criança, Enã foi mal diagnosticado. Disseram-lhe que tinha psicose infantil, algo em que a sua mãe, Érica Rezende, nunca acreditou. "Na colação de grau dele, fiquei em choque, sem expressar muita emoção, porque estava me lembrando de tudo o que vivemos desde que ele era pequeno", recordou ao site. Érica tirou psicologia, e desde cedo se certificou que o filho era apoiado. Enã também sofreu dificuldades de fala. "Uma das primeiras coisas que percebemos foi a dificuldade na fala. Ele não articulava bem as palavras. Além disso, ele também tinha dificuldades de compreensão e não conseguia olhar nos olhos. Em contrapartida, tudo o que eu ensinava, ele aprendia na primeira vez", conta a mãe, que tem agora 46 anos. O filho só foi diagnosticado com síndrome de Asperger, uma perturbação do espectro do autismo, quando tinha 19 anos e a família se deparou com o diagnóstico de autismo feito à irmã de Enã.

O jovem médico também teve que lidar com o bullying de que foi vítima, e perdeu o pai aos sete anos. Ele morreu na sequência de um acidente de carro, com um traumatismo cranioencefálico. Desde a morte do pai, em criança, Enã começou a demonstrar interesse pelo corpo humano e como este funcionava. Cresceu e, em 2012, começou a tirar o curso de Medicina na Universidade de Cuiabá. Nunca reprovou em nenhuma cadeira. Um dia, Enã divulgou que era autista nas redes sociais e foi vítima de comentários preconceituosos. Porém, também foi contactado por médicos que eram autistas. 

O jovem deverá especializar-se em neurocirurgia a partir de 2020, depois de cumprir serviço militar como médico. E relatou à BBC Brasil o que pensou no dia em que se licenciou: "Fiquei um pouco nervoso na hora, mas depois foi um alívio. É importante lembrar que tenho uma grande responsabilidade pela frente por ser médico, sendo autista ou não."

Fonte: Sábado

segunda-feira, 21 de janeiro de 2019

Definição dos procedimentos de articulação entre o SNIPI e o Regime Jurídico da Educação Inclusiva

Publica-se de seguida o conteúdo do documento com orientações relativamente aos procedimentos a ter na Intervenção Precoce atendendo à nova legislação da Educação Inclusiva:

O Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI), criado pelo Decreto-Lei nº 281/2009, de 6 de outubro, é desenvolvido através da atuação coordenada de três ministérios: Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Saúde e Educação, com envolvimento das famílias e comunidade. Face à publicação do Decreto-Lei n.º 54/2018 de 6 de julho, importa clarificar e definir procedimentos de modo a promover e agilizar a intervenção das Equipas Locais de Intervenção (ELI).

1. Plano Individual de Intervenção Precoce (PIIP) 

O Sistema Nacional de Intervenção Precoce na Infância (SNIPI) abrange crianças dos 0 aos 6 anos que se enquadrem nos critérios de elegibilidade definidos, independentemente do contexto: domicílios, amas, creches, jardins-de-infância da rede nacional (inclui rede pública privada cooperativa e solidária). 
O SNIPI preconiza um Plano Individual de Intervenção Precoce (PIIP) abrangente e facilitador que responda às preocupações e prioridades das famílias e às necessidades das crianças. 
O PIIP é um documento organizador da intervenção, elaborado em resultado da avaliação da criança nos seus contextos (familiar e outros), que define as medidas e ações a desenvolver com o objetivo de promover a autonomia da família, através do fortalecimento das suas capacidades, da definição conjunta de estratégias de intervenção e da identificação e utilização das fontes de apoio. Trata-se de um instrumento dinâmico que deve ser (re)avaliado sistematicamente, com vista a aferir os progressos e integrar as alterações necessárias. 
O/a educador/a de Infância responsável pelo grupo em que se encontra uma criança acompanhada pelo SNIPI tem acesso ao PIIP, enquanto interveniente privilegiado no respetivo processo educativo e desde que participe, efetivamente, na sua elaboração, implementação e avaliação, designadamente no que respeita aos objetivos a atingir e às estratégias pedagógicas a desenvolver com a criança no jardim-de-infância, respeitando o previsto no Regulamento Geral de Proteção de Dados. 
Para que os/as profissionais possam implementar as estratégias nele contidas, a ação educativa na sala de atividades da educação pré-escolar, pressupõe que os instrumentos de planeamento, bem como os registos e a avaliação dos processos, sejam concretizados e articulados pelos/as docentes e técnicos/as responsáveis pelas crianças em cada contexto educativo. 

2. Articulação entre o SNIPI e o Regime Jurídico da Educação Inclusiva 

a. No sentido de se garantir uma intervenção adequada às características individuais de cada criança e família e otimizar a imprescindível complementaridade e transição entre serviços e instituições, a planificação das medidas e ações a desenvolver devem respeitar o previsto na legislação em vigor. 

b. A publicação do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, permite dotar de moldura legal os princípios e as normas que garantem a inclusão, identificando as medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, as áreas curriculares específicas, bem como os recursos específicos a mobilizar para responder às necessidades educativas de todas e de cada uma das crianças e jovens que frequentam os agrupamentos de escolas e escolas não agrupadas da rede pública e os estabelecimentos de educação pré-escolar e do ensino básico e secundário das redes privada, cooperativa e solidária (adiante designados por escola). 

c. Tal implica a necessária adoção de uma conceptualização e lógica distintas na organização e gestão do funcionamento das respostas educativas, a partir de uma visão holística que procura as melhores soluções do ponto de vista da educação, da saúde e da inclusão social e reforça o envolvimento dos/as docentes, dos/as técnicos/as, dos pais ou encarregados de educação e das próprias crianças e jovens. 

d. Para responder às necessidades, potencialidades e interesses de cada criança são definidas no DecretoLei n.º 54/2018, de 6 de julho um continuum de medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, as quais são organizadas em três níveis de intervenção: universais, seletivas e adicionais. 

e. A identificação de medidas seletivas e adicionais exige a elaboração de um relatório técnico-pedagógico (RTP) sendo que, no âmbito das medidas adicionais, se existir a necessidade de se definir adaptações curriculares significativas, as mesmas devem ser expressas num programa educativo individual (PEI). 

f. O RTP e o PEI são elaborados pela equipa multidisciplinar de apoio à aprendizagem e à inclusão (EMAEI) da escola, que deve contar, sempre que necessário, com a participação da ELI enquanto recurso específico da comunidade a que se refere a alínea a) do n.º 3 do Artigo 11.º do Decreto-Lei. n.º 54/2018, de 6 de julho. 

g. Assim, caso se trate de uma situação que implique a mobilização de medidas adicionais e/ou seletivas, as quais estão registadas no RTP, estas deverão ser articuladas com o PIIP; e quando se revele necessária a operacionalização de adaptações curriculares significativas, o que implica a elaboração de um PEI, deve ser acautelada a complementaridade entre o PIIP e o PEI, conforme o previsto na alínea f) do n.º 2 do Artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 281/2009 e no n.º 5 do Artigo 24.º do Decreto-Lei. n.º 54/2018, devendo ser garantida a necessária coerência e articulação entre ambos. 

h. Atendendo à faixa etária das crianças que integram a intervenção do SNIPI, há que considerar as Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, as quais têm por base os objetivos pedagógicos definidos na Lei-Quadro n.º 5/97, de 10 de fevereiro, e destinam-se a apoiar a construção e gestão do currículo no jardim-de-infância, o qual deve ter em conta o contexto social, as características das crianças e das famílias e a evolução das aprendizagens de cada criança e de cada grupo. 

i. A inclusão de todas e de cada uma das crianças na educação pré-escolar exige a adoção de práticas pedagógicas diferenciadas que respondam às necessidades e características individuais, sendo da competência do/a educador/a planear, desenhar e avaliar a ação educativa com base numa leitura holística das evidências recolhidas. 

j. Observando o caráter abrangente e flexível das Orientações Curriculares para a Educação Pré-Escolar, a elaboração de um PEI, conforme o previsto no Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, será efetuada apenas quando as caraterísticas e condições da criança determinam um nível de envolvimento e participação muito reduzido, por parte desta, com impacto significativo nas aprendizagens. 

k. A transição das crianças para a educação pré-escolar ou para o 1.º ciclo do ensino básico deve ser preparada e planeada atempadamente. O aspeto central na planificação da transição é garantir que cada família conhece o sistema de apoio e adquiriu a capacidade e o conhecimento necessários para usar os recursos colocados à sua disposição. 

l. A planificação e preparação cuidadas de cada transição, a iniciar preferencialmente seis meses antes dessa mudança, deve assegurar que a mesma ocorre de forma oportuna e eficaz. Para o efeito, a ELI deverá auscultar a família sobre qual a escola/jardim de infância que esta pretende que o seu educando frequente e informar o/a diretor/a do respetivo estabelecimento. Neste processo devem estar envolvidos a família, a ELI e a EMAEI da estrutura educativa que a criança vai frequentar. 

m. Devem ser partilhados todos os dados acordados com a família entre a ELI e a EMAEI da Unidade Orgânica que vai integrar a criança. n. Os elementos da ELI, enquanto recurso da comunidade, devem ser convidados a integrar a EMAEI pelo/a Coordenador/a desta, como elemento variável, quando acompanham crianças no âmbito do SNIPI, garantida a devida articulação com o/a Coordenador/a da ELI. 

o. Assume especial importância o trabalho colaborativo dos/as profissionais de Intervenção Precoce na Infância (IPI) com o/a educador/a de grupo, no âmbito da abordagem multinível a que se refere o Artigo 7.º do Decreto-Lei n.º 54/2018, de 6 de julho, de modo a evitar sobreposição de ações. 

p. Os/as docentes, à semelhança dos/as restantes técnicos/as que integram as ELI, enquanto profissionais de IPI, atuam como mediadores de caso e/ou assumem uma intervenção complementar noutros processos. Neste sentido, intervêm nos diferentes contextos de vida da criança definidos no PIIP. 

q. Os/as docentes e os/as outros/as profissionais que integram as ELI desenvolvem a sua intervenção nos contextos naturais. A intervenção destes profissionais deve decorrer da avaliação autêntica da criança e dos objetivos estabelecidos e consensualizados em sede de PIIP e assume-se como cooperante e articulada, enquanto recurso específico existente na comunidade. Em caso algum é substitutiva da intervenção dos recursos humanos e organizacionais específicos da escola, os quais deverão ser mobilizados para a operacionalização das medidas de suporte à aprendizagem e à inclusão, identificadas nos documentos próprios. 

r. Os/as profissionais que integram as ELI deverão sustentar a sua intervenção no modelo transdisciplinar, preconizado no Guia “Práticas Recomendadas em Intervenção Precoce na Infância”. 

A Comissão de Coordenação do SNIPI 

(Documento aprovado em reunião plenária da Comissão de Coordenação do SNIPI em 07/12/2018, conforme consta em ata))