Bom dia Senhora Professora,
Queria agradecer-lhe toda a disponibilidade que tem tido para com o acompanhamento das dificuldades da nossa filha, e também, a ajuda fundamental que nos tem dado enquanto pais na melhor forma de a ajudar. De facto a Maria Ana está profundamente desmotivada para esta disciplina pois os seus resultados são constantemente negativos o que lhe causa um permanente confronto com o insucesso. No outro dia, disse-me a chorar muito, que até hoje tinha tido só negativas e que não valia a pena pois não ia conseguir. Sinto que o seu desinvestimento no trabalho de sala de aula também deverá ser olhado neste sentido, ou seja, de evitar um confronto permanente com o fracasso. Julgo que se não houver momentos em que se sinta valorizada, não vamos conseguir dar a volta que é necessária. Mas as estratégias que sugeriu em sala de aula poderão ajudá-la a estar mais ligada à professora e à matéria. A Maria Ana fez agora 12 anos e não conseguirá gerir sozinha uma estratégia interior de mudança, neste momento em que se sente tão desvalorizada. Agradeço-lhe a hora semanal de apoio que terá, pois vai também servir para que ela se sinta mais próxima da professora, o que poderá representar um incentivo maior para o seu investimento. Agradecemos o seu otimismo que nos permite a todos confiar neste último esforço que se avizinha!
Muito obrigada.
Terminar o segundo período é para uns sinónimo de alegria, satisfação pelo dever cumprido e esperança que o terceiro período tenha resultados melhores ou tão bons quanto este. Para outros, um final com sabor de incerteza, angústia e de quase impotência antecipada, face à próxima e derradeira jornada.
No primeiro grupo incluem-se os alunos que atingiram ou ultrapassaram os objetivos curriculares alcançando resultados positivos ou acima da média, ou seja, aqueles para quem a escolaridade se apresenta como um percurso mais ou menos linear e adaptado às suas potencialidades. São estas as crianças ou jovens para quem a escola poderá representar um lugar seguro e feliz, onde se sentem reconhecidos e compreendem o que deles se espera. Mais do que o fator inteligência, conta aqui o fator adaptação que estes alunos geralmente revelam em muitos níveis das suas vidas.
A sua boa organização interna, a empatia que colocam na relação com a aprendizagem e professores, a tranquilidade com que encaram o processo tentativa e erro, embala-os neste caminho desafiante onde a exigência não é sentida como ameaça. Naturalmente, este é um percurso construído para uma maior convivência com o sucesso.
Para os pais estes são filhos que os descansam e recompensam da exigência que os dias atuais comportam, sobretudo pelo investimento autónomo que revelam na gestão das tarefas escolares. Estes alunos, fazem igualmente a delícia dos professores que veem neles refletida a imagem que comprova terem cumprido com sucesso a sua principal função: a capacidade de ensinar. Certamente, para a maioria deste grupo de alunos, suas famílias e professores, o terceiro período é olhado com ânimo, alegria e garantia de que o dever será seguramente cumprido!
Este é um facto, que confirma a ideia, que comportamento positivo gera comportamento positivo. Esta relação tem à partida muito para dar certo! Neste grupo, encontram-se igualmente, alguns alunos com características de personalidade que podem comprometer o êxito tanto na relação com os professores, quanto com o grupo de pares. Estes são os alunos que se comportam com uma certa arrogância no contexto de sala de aula, pelo êxito dos resultados e acertividade que revelam, e que para alguns, transborda para a incapacidade de ouvir um simples reparo do professor ou colega, sentindo posto em causa o seu saber ou afirmação!
Noutros casos, o sucesso que detêm é utilizado como “arma” mediadora das relações, garantindo alguma distância nas mesmas, defendendo uma posição de exclusividade e superioridade. Em casos extremos, o insucesso ou fragilidades dos outros, inclusive dos professores, são uma porta de entrada fácil para a agressão e desvalorização, como forma de distinção e afirmação do seu poder.
A relação destes alunos com a escola é muito ambivalente, se pensarmos que o atual sistema de ensino é fortemente orientado para os resultados e para garantir uma posição desejada nos rankings nacionais. São alunos que, apesar de algum fracasso ao nível das relações humanas, se encontram fortemente protegidos pelo seu sucesso escolar. São temidos pelos colegas e geram ambivalência nos professores, colocando em causa a sua autoridade em muitas ocasiões, mas redimindo-se através do cumprimento do principal objetivo da escola: aprender com êxito!
Se pensarmos no grupo de alunos com mais ou menos dificuldades escolares, a perspetiva do terceiro período é olhada com alguma apatia ou receio da confirmação mais definitiva e absoluta do seu percurso de insucesso. Estes, são alunos para quem o dia-a-dia escolar se apresenta como um desafio temido ou impossível de aceitar e que os leva a movimentos de desistência e evitação. Desistência do processo tentativa erro, como evitamento do confronto sistemático com o insucesso.
Para a maioria destes alunos, conta menos o fator do índice cognitivo ser abaixo da média para a idade, mas, antes, um conjunto de características psicológicas individuais que têm que ver com a (i)maturidade, ambiente cultural, nível de desenvolvimento intelectual, formas de funcionamento mental, grau de autoestima e segurança, capacidade de relação social, etc...
Estes são os alunos que verdadeiramente desafiam um sistema de ensino que se defende igual para todos, independentemente das diferenças individuais de cada um. Naturalmente, teremos que reconhecer que muitos destes alunos encontram neste sistema uma ajuda preciosa, através da oferta cada vez maior de apoios que muitas escolas já disponibilizam.
No entanto, reconhecemos a exigência que representam para o dia-a-dia dos professores, a quem parecem apelar para um estar lado a lado, com otimismo e confiança nas suas capacidades. Também para os pais, que nunca desistem e procuram dar o exemplo de luta e perseverança na realização dos objetivos, este é um caminho difícil e de muitas dúvidas, no tipo de ajuda eficaz a dar aos filhos, desejando essencialmente que se sintam felizes e seguros.
O perigo do confronto sucessivo com o insucesso pode conduzir a um desinvestimento total, ameaçando fortemente a sua autoestima e consequente diminuição da capacidade de realização. Estes alunos refugiam-se muitas vezes numa certa apatia ou timidez que veste a capa do desinteresse ou desleixo; outros, adotam atitudes apalhaçadas ou de oposição, que ameaçam o bom decorrer das aulas e afetam o aproveitamento global da turma. Mas, o que procuram essencialmente é desviar as atenções sobre as suas reais dificuldades, evitando assim a exposição.
Só através da união de esforços e partilha de saberes sobre as crianças, por parte de escola e família, se tornará possível olhar para “os terceiros períodos” com esperança, neste percurso apaixonante que é o da aprendizagem e do mundo relacional que a escola representa!
Psicóloga de Família
Fonte: Público
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